Controle térmico de invasoras

Protótipo desenvolvido por pesquisadores da Universidade Federal de Pelotas possibilita o controle térmico de plantas invasoras, num projeto simples e barato destinado a pequenas propriedades e aplicações específicas

12.06.2023 | 14:24 (UTC -3)

Protótipo desenvolvido por pesquisadores da Universidade Federal de Pelotas possibilita o controle térmico de plantas invasoras, num projeto simples e barato destinado a pequenas propriedades e aplicações específicas.

A busca da sociedade pela preservação do meio ambiente e por produtos agrícolas mais saudáveis e isentos de contaminantes químicos tem levado muitos produtores a optar pela agricultura orgânica, que além de um mercado em expansão lhes permite trabalhar e produzir sem o risco de prejudicar a sua saúde. No Brasil, a produção orgânica encontra-se principalmente vinculada às unidades familiares de produção. Entretanto, este mercado é crescente e, atualmente, se verificam diversas iniciativas de produção orgânica em unidades agrícolas de maior escala, que se dedicam normalmente à produção de produtos agrícolas para exportação, como é o caso da soja e do arroz, cuja produção orgânica vem tomando corpo nos últimos anos.

Os agricultores responsáveis pela produção de alimentos orgânicos encontram dificuldades no que diz respeito principalmente ao manejo de plantas espontâneas, sem a utilização de agroquímicos. As técnicas mais comuns para este tipo de controle são as mecânicas que, além de apresentarem baixo rendimento, promovem grande revolvimento de solo e podem levar à erosão, necessidade de vários repasses ao longo do ciclo produtivo, possibilidade de danificar as raízes ou a própria planta da cultura implantada, entre outros aspectos.

Como método alternativo ao controle químico e mecânico, alguns fabricantes têm proposto a utilização de descarga elétrica. Equipamentos deste tipo são dotados de geradores de alta tensão, os quais provocam uma descarga elétrica na planta, alterando sua fisiologia e levando-as à morte. Embora eficazes, equipamentos deste tipo apresentam alto custo, tornando onerosa sua aquisição, vindo a ser um fator de impedimento para a sua utilização, principalmente por parte de agricultores familiares, os quais normalmente possuem baixa renda, sendo também os que concentram a maior produção de alimentos orgânicos no Brasil.

Controle térmico

Uma alternativa à capina mecânica e à descarga elétrica vem a ser o controle térmico, pois além de ser considerado uma tecnologia “limpa” (já que não há utilização de agroquímicos), não altera a estrutura do solo, sendo também o equipamento menos oneroso quando comparado ao equipamento que provoca descarga elétrica. 

A utilização do controle térmico como forma de manejo às plantas espontâneas não é um conceito novo - várias tentativas de desenvolvimento de equipamentos capazes de aplicar calor no controle de plantas espontâneas foram realizadas. O primeiro mecanismo deste tipo foi patenteado em 1921 e vários modelos foram desenvolvidos, testados e produzidos comercialmente entre 1940 e 1975. Entretanto, com o surgimento e a expansão da utilização dos agroquímicos, esta técnica tornou-se economicamente inviável e praticamente inutilizada pelos agricultores. Contudo, ultimamente, devido à crescente demanda por produtos orgânicos, os quais não podem ser produzidos com a utilização de agroquímicos, tem ocorrido a busca por alternativas à utilização do controle químico, e uma das técnicas que têm apresentado interesse é o controle térmico. Esta tecnologia prevê a inativação das plantas por meio de calor, fazendo com que as mesmas apresentem dificuldade em ter nova brotação, não havendo também prejuízos à estrutura e à biologia do solo, já que não há aumento significativo de temperatura em profundidades superiores a 2cm.

No sentido de contribuir tanto com os agricultores (principalmente os familiares) como com a indústria de máquinas agrícolas, o Núcleo de Inovação em Máquinas e Equipamentos Agrícolas (Nimeq), da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), projetou um equipamento aplicador de calor para o controle de plantas espontâneas. As premissas básicas no projeto foram, além do efetivo controle das plantas espontâneas, o baixo custo de produção, operação e manutenção, possibilitando que o mesmo possa vir a ser adquirido por unidades familiares de produção.

Para o desenvolvimento do equipamento utilizou-se a metodologia de projeto com abordagem sistemática do produto, que vem a ser uma prática cada vez mais comum em empresas de alto nível, as quais buscam maior qualidade dos seus produtos. Desta forma, buscou-se incorporar todos os atributos indispensáveis ao cumprimento da tarefa a que se destina o equipamento, não somente aqueles de ordem funcional, mas também os de qualidade, os comerciais e os de fabricabilidade. Para tanto, o projeto da máquina foi dividido em quatro fases (projeto informacional, projeto conceitual, projeto preliminar e projeto detalhado), assim tornou-se possível organizar as informações, os resultados e os momentos de tomada de decisão no sentido de gerar um produto adequado às necessidades dos clientes, tanto de ordem funcional, quanto de aquisição.

A fim de atender estes princípios, foram geradas várias concepções da máquina, selecionando-se a mais promissora, a qual foi posteriormente otimizada pela equipe do Nimeq, dando origem a um protótipo. Este basicamente compõe-se de alguns sistemas: de aplicação de calor, de regulagem de espaçamento entre linhas aplicadoras, de isolamento térmico, de armazenamento de combustível, dosador de combustível e de regulagem da altura de aplicação de calor. 

O funcionamento do sistema de aplicação de calor ocorre por meio de um distribuidor, o qual é ligado ao sistema de ignição no sentido de gerar faísca para combustão do gás em cada um dos queimadores. O acionamento do sistema elétrico pode ser realizado pela bateria do trator ou por outra fonte de energia acoplada ao mecanismo. A ativação do sistema de aplicação de calor se dá por meio de um painel de comando composto por duas chaves. A primeira chave aciona a válvula para a liberação de gás, e a segunda permite o acionamento do motor, ou seja, o sistema de ignição não pode ser acionado sem que o gás seja liberado. Desta forma, o operador possui domínio tanto da liberação de gás, quanto de ativação e desligamento dos queimadores. Este procedimento durante a operação de trabalho da máquina evita desperdício de combustível, por exemplo, durante as manobras na cabeceira da lavoura.

Testes

No sentido de comprovar a eficácia de funcionamento foram executados testes de campo com o protótipo, onde foram utilizadas diferentes velocidades de trabalho e vazões de gás. De forma geral, a maior eficiência no controle foi observada com pressões de gás maiores e velocidades de deslocamentos menores. Verificou-se que o melhor controle ocorreu em duas situações: a uma velocidade de aplicação de 2km/h com pressão de gás de 196 kPa (consumo médio de gás da ordem de 0,42kg/min) e a uma velocidade de 2,8km/h combinada com a pressão de gás de 245kPa (consumo médio de gás da ordem de 0,51kg/min).

Levando-se em conta somente os gastos com GLP, obteve-se um custo máximo de cerca de R$ 390,00 por hectare, considerando-se o preço do botijão de gás de 13kg a R$ 65,00. Outra vantagem vem a ser o pouco tempo dispensado para a execução da tarefa, o que minimiza os custos referentes ao combustível do trator e à hora homem trabalhada. Já o custo de produção da máquina foi estimado em cerca de R$ 3.000,00.

Este equipamento é bastante versátil, pois pode atuar tanto em uma largura uniforme de trabalho como entre linhas das culturas. Devido ao seu baixo custo de produção e operação, vem a ser uma alternativa viável, principalmente para agricultores familiares que se dedicam à produção orgânica.

Antônio Lilles Tavares Machado, Roger Toscan Spagnolo, Angelo Vieira dos Reis, Tiago Vega Custódio, Fabrício Ardais Medeiros, Roberto Lilles Tavares Machado, Nimeq – UFPel; Carlos Alberto Barbosa Medeiros, Embrapa – CPACT; André Oldoni, IFSul

Artigo publicado na edição 185 da Cultivar Máquinas, mês junho, ano 2018.

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