Como realizar a manutenção correta nos comandos hidráulicos

Os comandos hidráulicos evoluem constantemente. No entanto, a única garantia de um funcionamento pleno e prolongado é manter a manutenção em dia tomar cuidados básicos com óleos utilizados no sistema

02.09.2022 | 16:15 (UTC -3)

O proprietário, agricultor autêntico e bastante indignado, foi logo lascando: “escuta aqui tchê, nessa sua palestra nós vamos ver alguma coisa de hidráulico e óleo da caixa?” E a resposta também saiu de talagaço: “Olha seu ..., se não íamos ver; agora vamos. Vamos discutir todas as dúvidas e buscar a melhor solução.” Ao que o agricultor retrucou: “então tá bueno.” E, ainda em dúvida, levantou as sobrancelhas e com a voz baixa comentou com quem estava ao seu lado: “quero só ver.”

O uso e aplicação da força hidráulica estão cada vez mais presentes no maquinário agrícola, uma realidade visível em todo o meio rural, onde a força braçal do ser humano retira-se de cena para dar lugar a hastes, cilindros, alavancas e motores hidráulicos, que através de movimentos lineares e rotativos, multiplicam forças e executam serviços com mais rapidez e agilidade e menos pessoas envolvidas. Tarefas como transportar, levantar, girar, transpor obstáculos, que antes envolviam cinco ou mais pessoas e levavam uma manhã inteira, hoje são executadas por uma ou duas pessoas em poucos minutos. Assim também no preparo do solo, plantio e colheita os implementos todos contam com a força do sistema hidráulico. Os sistemas hidráulicos são recursos bastante simples e eficientes o que, em muitos casos, acabam esquecidos que necessitam de manutenção e cuidados operacionais.

Operação e manutenção andam lado-a-lado nos diversos serviços e tarefas do dia-a-dia na propriedade rural. O preparo e capacidade técnica operacional dos operadores deve ser a base para o correto desempenho do maquinário.

É o operador que está o maior tempo junto à máquina, é como se fosse uma extensão de seus braços e pernas. O domínio dos comandos e controles passa a ser algo tão natural que acaba levando ao automatismo, o que pode acarretar riscos e danos. Por isso o operador deve estar em permanente estado de alerta e executar os comandos sempre de maneira atenta com domínio de tudo que acontece em sua volta e se de fato houve o resultado esperado da ação do comando executado.

Cada vez mais os sistemas hidráulicos estão presentes nas máquinas agrícolas
Cada vez mais os sistemas hidráulicos estão presentes nas máquinas agrícolas

Os comandos hidráulicos evoluíram bastante, desde as alavancas e hastes metálicas, que atuavam diretamente nas válvulas de controle, até os comandos a distância através controladores remotos, passando por comandos eletro-hidráulico e controles tipo joystick e central de controle manifolds. Há na hidráulica uma evolução bastante significativa, porém o resultado final é sempre aplicação e multiplicação de forças.

Se compararmos um operador manuseando uma alavanca onde o comando atuava diretamente na válvula, fazendo ele perceber o deslocamento e a passagem do óleo sob pressão, com os procedimentos de comando atuais, onde ele movimenta um leve joystick em uma cabine climatizada e acústica e não tem a mesma percepção do deslocamento do óleo, há bastante diferença na percepção do esforço do conjunto. Porém o sistema hidráulico está presente e até com pressão mais elevada, e portanto com maior multiplicação de forças e resultados, ou estragos, se os cuidados e atenção não se fizerem presentes. Melhorou muito em conforto, facilidades, rapidez e resultados, mas também requer muito mais agilidade e capacidade de percepção do operador. Já presenciei casos de acidentes graves com máquinas que tombaram ou colidiram com obstáculos, onde o operador relata que não viu e nem percebeu os riscos por estar em uma posição confortável e distraída. Vigilância permanente, muita orientação e trabalho em equipe, e apoio dos setores gerencial e operacional.

MANUTENÇÃO

E a manutenção? Vamos levando do jeito que está até quanto agüentar? A manutenção de sistemas hidráulicos é bastante simples quando comparadas com outros conjuntos mecânicos. Claro, manutenção preventiva, pois a corretiva é outro enfoque, mais dispendiosa e requer ferramental e equipes de trabalho especializadas. A seguir vamos abordar alguns itens da manutenção preventiva dos conjuntos hidráulicos.

FILTROS

A substituição dos elementos filtrantes deve serem executada dentro dos períodos recomendados pelo fabricante da máquina, ou dependendo das condições de trabalho, antecipar a troca, mas nunca postergar. É importante destacar a observância das especificações da capacidade de filtragem dos elementos, pois se tal capacidade não estiver de acordo poderá comprometer todo o sistema, ou simplesmente não acontecer o processo de filtragem ocasionando danos aos componentes do sistema. Normalmente o serviço de troca de filtros hidráulicos está inserido em conjunto com outros serviços da preventiva, podendo variar o número de horas recomendado, situando-se entre 300 e 1.000 horas de funcionamento, dependendo da marca ou modelo do equipamento ou no máximo um ano de uso. Nos climas frios e úmidos o período deve ser abreviado.

Os filtros garantem que impurezas presentes no óleo sejam retidas e tiradas de circulção do sistema
Os filtros garantem que impurezas presentes no óleo sejam retidas e tiradas de circulção do sistema

ÓLEO HIDRÁULICO

É aqui que reside um dos itens principais da manutenção preventiva, e por paradoxal que pareça é onde mais negligenciado na execução do serviço de troca desse fluído. Talvez pelo custo ou por desconhecimento da importância da substituição, pois muitas vezes a aparência do óleo não demonstra necessidade da troca. Mas é um dos serviços que em vários momentos já presenciamos a não observância, pois o aspecto visual do óleo engana muito, embora sua aparência possa ser boa, na verdade ele já não apresenta as mesmas características físico-químicas necessárias para o desempenho correto para o qual foi projetado. E, sendo assim, o resultado final da aplicação da força hidráulica não será mais a mesma, além da perda de rendimento, também acarretará em outros problemas junto às válvulas do sistema e, principalmente, nas centrais de controle tipo manifolds.

Portanto, não vale a pena postergar a troca do fluído hidráulico, mesmo tento um custo relativamente elevado. Os custos decorrentes, pela não substituição, serão maiores, sem dúvidas.

Outro item importante a se destacar é a observância de seguir as especificações recomendadas pelo fabricante e não misturar óleos diferentes. Aqui há um problema homérico no meio rural, pois os implementos acoplados ao trator, em muitos casos, trabalham com óleos de diferentes especificações, porém utilizam o sistema hidráulico do trator. É fácil perceber quanta mistura de óleo acontece “campo afora” nessa imensidão de máquinas, implementos e serviços a serem feitos. A imensa maioria dos implementos utiliza uma das três seguintes especificações da ISO VG, que é uma norma internacional para grau de viscosidade de óleo hidráulico, sendo que os implementos mais antigos usavam o conhecido “68”, depois era o “46” e atualmente o “32”, todos pela norma ISO. Porém, os fabricantes de tratores nem sempre adotam tal norma, mas há uma tabela de equivalência, que nem sempre é observada. E aí vem problema de operação e de manutenção.

E quando o óleo do trator é de especificação diferente do implemento? Exemplo o trator utiliza o “68” e o implemento foi dimensionado para o “46”. Boa parte dos operadores diria para usar assim mesmo que não haverá problema. Será? Pode até não dar problema imediato, mas logo-logo a manutenção terá serviços de consertos, além do implemento não ter o correto desempenho.

Mas, qual seria a solução? No momento de aquisição do implemento verificar se está de acordo com o trator. Claro, bem sabemos que não é esta a nossa realidade. Vários são os tipos de implementos e portanto com diferentes especificações de óleo, bem como os tratores nas propriedades também são diversificados. Temos um longo caminho para solucionar essas nuances do fluído hidráulico nos implementos agrícolas. Talvez uma das soluções seria o implemento possuir sistema exclusivo e com reservatório próprio, fato que já ocorre em implementos de maiores proporções, onde utiliza a barra de tração e a tomada de força do trator e não o hidráulico.

MANGUEIRAS E CONEXÕES

Mangueiras e conexões são componentes que normalmente apresentam-se expostos e portanto sofrem a ação das mudanças climáticas e dos diversos tipos de serviços onde há presença de poeiras e produtos abrasivos e corrosivos utilizados no meio rural. Sendo assim devem-se verificar periodicamente as condições físicas das mangueiras, principalmente quanto a presença de rupturas e trincas no material flexível, bem com a presença de vazamentos junto as conexões. Diante de quaisquer desses fatos deve ser providenciado a substituição, visto que não há um período pré-determinado para troca, então as equipes de operação e manutenção é que devem inspecionar frequentemente tais componentes. O certo é que se não realizado o problema de rompimento das mangueiras ou conexões ocorrerá quando o sistema estiver executando serviços, e aí os estragos serão maiores inclusive com riscos de acidentes, além do atraso na execução os custos para a manutenção corretiva, que são maiores.

As partes expostas sempre estão sujeitas a maiores complicações por causa da poeira
As partes expostas sempre estão sujeitas a maiores complicações por causa da poeira

Manutenção preventiva em dia e operadores treinados, eis o rumo a seguir, ou teremos problemas permanentes no trator e seus conjuntos mecânicos, inclusive caixa e hidráulico. Fatos concretos de bom planejamento da manutenção já são possíveis de serem observados em algumas propriedades rurais e estamos caminhando nesse sentido.

Como garantir uma manutenção em dia?

Treinamento e qualificação aliada a ética profissional. Como aplicar nas rotinas rurais? Não existe uma fórmula pronta, pois as peculiaridades se modificam conforme cada realidade, mas podemos traçar um fio condutor de orientações básicas para operadores. Enumeramos alguns:

• Mostrar e identificar aos os operadores os diversos conjuntos estruturais e seus funcionamentos na máquina. Quanto mais o operador conhecer a estrutura e funcionamento, mais saberá tirar rendimento e reconhecer os limites da máquina.

• Treinar os operadores para que executem a inspeção diária da máquina dentro do recomendado pelo fabricante e/ou pelas equipes de manutenção, pois uma inspeção feita corretamente antes de iniciar a jornada diária evita muita panes e problemas ao longo do dia e a conseqüente perda de rendimento. Fazer a inspeção e tomar as medidas necessárias para solução de problemas detectados.

• Orientar permanentemente as equipes para a importância de um comportamento ético e profissional adequada ao exercício das tarefas. Esse é aspecto que destacamos com bastante ênfase na nossa realidade atual, pois nossa sociedade está passando por uma crise desses valores. Quem lida com máquinas, se não dispuser desses comportamentos, transforma-se em uma ameaça para todos a sua volta. Além, é claro, de ser um destruidor do equipamento – um “esmerilhador” de máquina.

Artigo publicado na Revista Cultivar Máquinas nº 201

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