Empregador rural pessoa jurídica deve contribuir para a seguridade social e para o Senar

Caso é mais um dentre os recentes julgados do STF que mantêm tributação do setor agropecuário

21.01.2023 | 11:00 (UTC -3)
Schubert Peter

O Supremo Tribunal Federal declarou constitucional a contribuição sobre a receita bruta do empregador rural pessoa jurídica resultante da comercialização da sua produção. A decisão ocorreu no julgamento do Recurso Extraordinário 700922. É mais uma decisão que mantém a tributação do setor agropecuário.

Recentemente, o mesmo STF julgou constitucionais as contribuições diferenciadas ao Senar (RE 816830) e a do artigo 22-A, da Lei 8.212/1991, para a agroindústria (RE 611601). Essas questões têm pontos em comum. Mas não são idênticas.

No caso do RE 700.922, conforme divulgado pelo STF, o contribuinte alegou, entre outros pontos, que a Lei 8.870/1994 incorreria em "vício de bitributação" (na verdade, bis in idem). Isso porque previu tributos sobre a mesma base de cálculo adotada para PIS e Cofins -- o faturamento. Também havia alegação de inconstitucionalidade formal.

A bitributação, no Direito Tributário, ocorre quando dois entes exigem tributo em razão do mesmo "fato gerador". Por sua vez, bis in idem refere-se a uma situação em que o mesmo ente exige tributos distintos sobre o mesmo fato gerador. A expressão latina bis in idem significa, literalmente, "mais do mesmo".

No julgamento do caso pelo Tribunal Regional Federal da 4º Região (RS, SC e PR), o tributo fora julgado inconstitucional. Como fundamento, apontaram os desembargadores: (a) o bis in idem; e (b) a criação por lei ordinária, quando o correto seria o uso de lei complementar.

Parte da ementa do acórdão:

"[...] 2 - A inconstitucionalidade do art. 25, incisos I e II, da Lei nº 8.870/94 foi reconhecida por este Tribunal, na Arguição de Inconstitucionalidade na AMS nº 1999.71.00.021280-5/RS.

3 - É inexigível a contribuição sobre a receita bruta proveniente da comercialização da produção rural, devida pelo empregador rural pessoa jurídica, instituída por esse dispositivo legal.

4 - A Lei nº 10.256/2001, ao modificar a redação do caput do art. 25 da Lei nº 8.870/1994, não alterou a essência do dispositivo original."

O acórdão da citada arguição de inconstitucionalidade recebeu a seguinte ementa:

" TRIBUTÁRIO. ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 25, CAPUT, INCISOS I E II E § 1º, DA LEI Nº 8.870/94. CONTRIBUIÇÃO À SEGURIDADE SOCIAL SOBRE A PRODUÇÃO RURAL, EQUIVALENTE A FATURAMENTO. SAT. SENAR. EMPREGADOR PESSOA JURÍDICA. COFINS. DUPLA INCONSTITUCIONALIDADE (CF, ART. 195, I E SEU § 4º). BITRIBUTAÇÃO.

[...] 3. A modificação da base de cálculo das contribuições sociais do empregador rural pessoa jurídica para a produção rural foi motivada pelo maior retorno financeiro, pois a contribuição sobre a folha de pagamento, dada a histórica informalidade das relações de trabalho desenvolvidas no meio rural e a mecanização da produção agrícola, não satisfazia a necessária e obrigatória previsão de cobertura total de financiamento da previdência e assistência social do homem do campo.

4. O art. 25, caput, incisos I e II e § 1º da Lei 8.870/94, ao enquadrar o empregador, pessoa jurídica, como contribuinte sobre a receita bruta proveniente da comercialização de sua produção rural, à alíquota de 2,5%, 0,1% para o SAT e 0,25% para o SENAR, contrariou frontalmente os artigos 195, §§ 4º e 8º, da CF/88, ocasionando dupla inconstitucionalidade sob o aspecto material, não se tratando de um simples alargamento da sujeição passiva para atingir contribuinte diverso, mas também bitributação, porque fez incidir novamente o tributo sobre o faturamento, que é previsto no artigo 195, § 8º, da Carta Magna.

5. O Produtor rural pessoa jurídica é equiparado a empresa, assim como a receita bruta da comercialização da produção rural é equiparada a faturamento, sobre o qual já incide a COFINS (art. 195, I, b), esgotando a possibilidade constitucional de instituição de contribuição, através de lei ordinária, sobre a mesma base de cálculo.

6. O art. 195, § 4º, c/c 154, I, da CF/88 impede a superposição de contribuição à Seguridade Social com mesmo fato gerador. Não se assemelha o caso concreto à admissão constitucional da mesma base de cálculo para a COFINS (art. 195, I), PIS (art. 239), contribuição aos entes de cooperação integrantes do sistema S (art. 240), hipóteses em que a Carta Magna autoriza a superposição tributária sobre fatos geradores símeis, em razão de terem fundamentos de validade diferenciados, possuindo gênese em dispositivos dispersos.

7. Igualmente atingido pela inconstitucionalidade o § 1º do art. 25 da Lei nº 8.870/94, que modificou a base de cálculo da contribuição ao SENAR para 0,1% sobre a produção rural, aumentada para 0,25% pela Lei nº 10.256/2001, subsiste a contribuição nos moldes do art. 3º, I, da Lei n.º 8.315/91, que criou esse serviço, à alíquota de 2,5% sobre a folha de salários.

8. Muito embora entenda o STF que o conceito de faturamento engloba o produto da venda da produção, nos moldes da Lei 8.870/94, há de ser insofismavelmente reconhecida a inconstitucionalidade ventilada porque o art. 195, parágrafo 4º da CF/88 possibilita a genetização de outras fontes de custeio que não aquelas previstas expressamente.

9. Acolhida a argüição de inconstitucionalidade, integralmente, para declarar inconstitucional o art. 25, caput, incisos I e II e § 1º da Lei 8.870.

(TRF4, INAMS 1999.71.00.021280-5, CORTE ESPECIAL, Relator ÁLVARO EDUARDO JUNQUEIRA, D.E. 06/12/2006)".

Apesar desses argumentos, outro foi o entendimento da maioria dos ministros do STF.

STF mantém a tributação

No STF, contudo, prevaleceu o voto do ministro Alexandre de Moraes (foto de Fellipe Sampaio). Ele sustentou que a jurisprudência do Supremo "é pacífica no sentido de que as contribuições sociais podem ser instituídas por lei ordinária, desde que se insiram nas hipóteses constitucionais (artigo 195)". Ele pontuou, ainda, que a receita bruta decorrente da comercialização equivale ao conceito de faturamento.

Ainda segundo Alexandre de Morais, o artigo 240 da Constituição autoriza a tributação sobre fatos geradores idênticos no caso de "entidades privadas de serviço social e de formação profissional vinculadas ao sistema sindical".

Por terceiro, o ministro disse que a contribuição do Senar é autorizada pelo artigo 149 da Constituição Federal, pois se trata de contribuição de interesse das categorias profissionais.

A posição vencedora foi seguida pela ministra Cármen Lúcia e pelos ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Nunes Marques.

O acórdão ainda não está disponível.

As atas de julgamento são as seguintes:

Decisão: Após os votos dos Ministros Marco Aurélio (Relator) e Edson Fachin, que conheciam do recurso extraordinário, negavam-lhe provimento e fixavam a seguinte tese (tema 651 da repercussão geral): "É inconstitucional a contribuição à seguridade social, a cargo do empregador rural pessoa jurídica, incidente sobre o produto da comercialização da produção, prevista no artigo 25, incisos I e II, da Lei nº 8.870/1994”; e do voto do Ministro Alexandre de Moraes, que divergia do Relator para dar provimento ao recurso extraordinário da União e denegar a segurança pleiteada, com a fixação da seguinte tese: "É constitucional, à luz dos artigos 195, I, b, e § 4º, e 154, I, da Constituição Federal, o art. 25, I e II, e § 1º, da Lei 8.870/1994, que instituiu as contribuições devidas à seguridade social pelo empregador, pessoa jurídica, que se dedique à produção rural incidente sobre a receita bruta proveniente da comercialização da sua produção", pediu vista dos autos o Ministro Dias Toffoli (Presidente). Falaram: pela recorrente, a Dra. Geila Lídia Barreto Barbosa Diniz, Procuradora da Fazenda Nacional; e, pela assistente, o Dr. Manuel Eduardo Cruvinel Machado Borges. Plenário, Sessão Virtual de 28.8.2020 a 4.9.2020.

Decisão: O Tribunal, por maioria, apreciando o tema 651 da repercussão geral, deu provimento ao recurso extraordinário da União, para denegar a segurança pleiteada, nos termos do voto do Ministro Alexandre de Moraes, Redator para o acórdão, vencidos os Ministros Marco Aurélio (Relator), Edson Fachin, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber (Presidente), que negavam provimento ao recurso. Na sequência, o julgamento foi suspenso para fixação de tese em assentada posterior. Não vota o Ministro André Mendonça, sucessor do Relator. Plenário, Sessão Virtual de 9.12.2022 a 16.12.2022.

ATUALIZAÇÃO (15.03.2023): O plenário do STF, com base nesse julgamento, prolatou as seguintes teses (tema 651 da repercussão geral):

1) É inconstitucional a contribuição à seguridade social a cargo do empregador rural pessoa jurídica incidente sobre a receita bruta proveniente da comercialização da sua produção, prevista no artigo 25, incisos I e II, da Lei 8.870/1994, na redação anterior à Emenda Constitucional 20/1998.

2) É constitucional a contribuição à seguridade social a cargo do empregador rural pessoa jurídica incidente sobre a receita bruta proveniente da comercialização da sua produção, prevista no artigo 25, incisos I e II, da Lei 8.870/1994, na redação dada pela Lei 10.256/2001.

3) É constitucional a contribuição social destinada ao Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) de que trata o artigo 25, parágrafo 1º, da Lei 8.870/1994, inclusive na redação conferida pela Lei 10.256/2001.

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