Como fazer o correto manejo de resistência em cultivares Bt
Observar áreas de refúgio, uso de inseticidas não Bt, tratamento de sementes e de aplicações na parte aérea fazem parte das alternativas para manejo
O produtor de algodão prepara-se para semear uma nova safra, e as pragas iniciais demandam estratégias de manejo para a manutenção do estande e o melhor desenvolvimento das plantas. O agroecossistema utilizado no Centro-Oeste é um ambiente favorável à multiplicação de pragas, onde o algodoeiro vem sendo utilizado no sistema de rotação de culturas, principalmente com a cultura da soja. Desta forma, os cultivos sucessivos, hospedeiros de diversas pragas, aliados a fatores como condições climáticas favoráveis, de altas temperaturas e de inverno ameno, tornam-se ideais para a multiplicação dos insetos.
A semente é o início de uma nova vida, carrega diversas características genéticas que definem o potencial produtivo, além de outros itens como químicos, inoculantes, estimulantes, entre outros. Para se ter uma boa semente envolveram-se diversas pessoas, empresas, proporcionando um alto valor agregado para a nova cultura. O aumento de custo das sementes é inegável ao longo dos anos em função de toda a tecnologia embarcada.
Um bom desenvolvimento inicial da cultura tende a levar maior acúmulo de massa, fazendo com que a cultura consiga suportar um maior número de estruturas reprodutivas, levando à maior produtividade.
Existem diversas pragas ocorrendo na fase inicial da cultura do algodoeiro e, nos últimos anos, algumas têm se destacado. Entre estas, podem-se citar tripes, lagartas (gêneros Spodoptera e Helicoverpa armigera), lagarta Elasmopalpus lignosellus, pulgão, entre outras pontuais.
O algodoeiro brasileiro caracteriza-se pela presença de grandes propriedades, altamente mecanizadas. Atualmente, muitos dos produtores fazem uso de culturas de cobertura, dentro do sistema plantio direto, proporcionando alimento para diversas pragas, o que resulta na ausência de intervalos para a quebra nos ciclos desses insetos.
A lagarta-elasmo (Elasmopalpus lignosellus) é uma das principais pragas iniciais na cultura do algodoeiro. O seu principal dano consiste na redução no estande de plantas e por consequência leva a perdas de produtividade. Esta praga apresenta grande polifagia, além do algodoeiro ataca a soja, o milho e outros vegetais. Diversas plantas daninhas servem como hospedeiros alternativos, como capim-braquiária, capim pé-de-galinha, capim-colchão, milheto e outras.
As lagartas apresentam coloração variável de esverdeada a arroxeada, com a cabeça escura. Perfuram as plantas na região do colo, fazendo galerias e consequentemente provocam a morte de plântulas. Como forma de abrigo, constroem um casulo com teias, facilmente encontrado no campo. Os adultos são mariposas de coloração cinza a cinza-claro, asas com envergadura de aproximadamente 10mm. Ao completarem seu ciclo larval, as lagartas empupam próximo à planta em sua base ou no solo (Tomquelski e Martins 2017). Áreas com textura arenosa, sujeitas a estresses hídricos, ou mesmo com a presença de plantas hospedeiras são mais propensas ao ataque e demandam maior cuidado do produtor.
Nos últimos anos, as lagartas com hábito de “rosca” ou mesmo “desfolhadoras na fase inicial” têm ocorrido em maior quantidade em função do sistema de produção. A Spodoptera frugiperda (lagarta-do-cartucho-do-milho) se apresenta atualmente como um grande desafio. Esta praga possui alta taxa reprodutiva, sendo as massas de ovos em torno de 150 ovos, podendo a espécie colocar até mil ovos. As lagartas se caracterizam pela variação de coloração marrom e são difíceis de encontrar, pela localização neste momento próxima ou no solo. Apresentam um “Y” invertido na parte frontal da cabeça e quatro pontos equidistantes no final do seu dorso. É uma praga que permanece de 12 a 30 dias no estádio de lagarta, alcançando, em média, 5cm de comprimento. A pupa é frequentemente encontrada no solo. O adulto é uma mariposa com asas anteriores mais escuras e desenhadas que as posteriores, medindo 3,5cm de envergadura.
O aumento desta praga nas diversas regiões é um ponto que merece atenção, e sua polifagia (vários hospedeiros disponíveis), tem levado à maior permanência da praga no sistema. As plantas tigueras de milho, comumente presentes nas diversas regiões do Brasil, também demandam atenção.
No Brasil, pragas como Spodoptera frugiperda podem apresentar muitas gerações em função da tropicalidade das regiões, e algumas biotecnologias por selecionarem indivíduos resistentes, têm levado a escapes de controle desta praga, necessitando de ferramentas para auxiliar no controle.
Outra praga de grande importância, os tripes atualmente apresentam grande relevância na cultura do algodoeiro. O seu ataque no início do desenvolvimento da cultura leva a prejuízos significativos, sendo, em alguns casos, responsável pela perda de toda a aplicação de nitrogenado. A predominância desta praga é de Frankliniella schultzei na cultura do algodoeiro, porém podem-se encontrar também as espécies Thrips palmi e Caliothrips phaseoli (Goussain et al., 2015; Lima et al., 2013; Monteiro, 2002).
Os danos diretos ocorrem no tecido vegetal durante a alimentação. Esta praga apresenta um destaque maior em função da transmissão de agentes fitopatogênicos, especialmente vírus. Dentre os transmitidos por tripes, os tospovírus (Ortotospovirus) e Ilarvirus estão entre os mais importantes, levando a perdas econômicas em várias culturas no mundo, em algodoeiro, soja e tomate, além das plantas daninhas (Barbosa et al., 2001; Monteiro et al., 2001). Dependendo da região, a presença de determinadas plantas daninhas pode ser um fator agravante no sistema, em função da origem regional.
Normalmente, se estabelecem em tecidos novos, tanto na face inferior como superior de folhas enroladas, e com o aparato bucal levam a injúrias que irão posteriormente levar à deformação das folhas, consequentemente afetando a fotossíntese das plantas. Com o início do período reprodutivo, esta praga tende a buscar as flores. Se o ataque é intenso, inicialmente as folhas apresentam um aspecto queimado, prateado, podendo cair.
O ciclo é por hemimetabolia, apresentando ovos, ninfas e adultos. Ovos são colocados nas plantas e posteriormente as ninfas colonizam os tecidos. Durante um período, descem ao solo, onde podem terminar a fase ninfal e posteriormente, na fase adulta, atacam novas plantas. Esta fase no solo leva a grande dificuldade, em função dos diversos hospedeiros, dificultando o controle de toda a população da praga no talhão.
O pulgão é uma praga clássica na cultura do algodoeiro, chegando, na região dos Chapadões, a representar mais de 70% das pulverizações na cultura nos anos de 1998 a 2000. Aphis gossypii ocorre inicialmente, sendo em muitas regiões uma das primeiras na cultura, colonizando as plantas pequenas, levando a danos que impactam no desenvolvimento e na produtividade. São insetos de tamanho pequeno, coloração variável de amarelo-claro a verde-escuro. Vivem sob as folhas e os brotos novos das plantas, sugando a seiva. Os adultos apresentam tamanho em torno de 1,5mm, sendo o ciclo médio de oito dias. É uma praga em que a fêmea pode gerar de 25 a 50 indivíduos, sendo a longevidade média dos indivíduos de 20 dias.
O pulgão suga a seiva, reduzindo o crescimento e o desenvolvimento das plantas, provoca encarquilhamento das folhas e deformação dos brotos. Os pulgões também são transmissores de vírus causadores de doenças, como o vermelhão do algodoeiro, a doença azul (mosaico das nervuras – “forma Ribeirão Bonito”) e, nas últimas safras, a virose atípica. Os sintomas dessa última doença são palidez das nervuras e enrugamento das bordas, e com sua progressão as folhas ganham coloração avermelhada-arroxeada. Seus prejuízos têm sido comumente observados nas mais diversas localidades brasileiras, sendo comum a observação ao final do desenvolvimento das plantas. Vale destacar que diversas plantas daninhas podem ser hospedeiras destas viroses, levando à chamada “ponte verde” para a doença.
A capacidade de reprodução destes insetos é enorme e favorecida por temperaturas elevadas e condições normais de umidade relativa. Sua reprodução por partenogênese telítoca (sem a presença do macho) leva rapidamente a grandes populações. Períodos de estiagem inicialmente levam a dificuldades de manejo, em função da menor eficiência da tecnologia de aplicação e menor quantidade de inimigos naturais.
Diante deste grande número de pragas na cultura, o Manejo Integrado de Pragas (MIP) é de grande necessidade, a fim de evitar os prejuízos e custos. Nenhuma estratégia deve ser considerada isoladamente para o controle das pragas e sempre deve-se integrar os métodos de controle.
O MIP, em função desta complexidade, precisa ser tratado de forma mais estratégica neste âmbito multicultural. De certa forma, o conhecimento da praga, assim como da lavoura pelo “produtor-técnico”, torna-se a base para a construção das estratégias de manejo. Ou seja, conhecimento da biologia das principais pragas ocorrentes na região e uma boa amostragem a campo.
A amostragem deve ser constante em virtude da presença de plantas no campo o ano todo. O treinamento da equipe antes do início da safra proporciona alinhamento das estratégias de manejo, além da melhoria – aperfeiçoamento do processo. A construção de um histórico das áreas com informações sobre a dinâmica populacional desses insetos, pode ajudar na definição do manejo. Algumas pragas são observadas visualmente, através de contagem direta nas plantas, no entanto, atualmente o uso de armadilhas tem auxiliado no entendimento das populações.
Entre as estratégias de MIP, o tratamento de sementes é a base em pragas iniciais. Tem por objetivo “quebrar a dinâmica populacional”, mantendo as populações em níveis adequados, ou seja, controla da primeira geração que possa vir a colonizar a lavoura e mesmo parte da população já presente.
É considerada por muitos produtores-técnicos como um “seguro”. Entre os inseticidas de tratamento de sementes, as moléculas de fipronil, thiametoxan, imidacloprid + tiodicarbe, imidacloprido + bifentrina, clothianidim, clorantraniliprole e ciantraniliprole isoladamente e em diversas associações têm proporcionado bom controle, desde que analisados as infestações e os alvos.
A biotecnologia é uma ferramenta adotada na maioria das áreas, alcançando em algumas propriedades mais de 90%. Porém, há de se considerar que é uma estratégia, e como sempre deve se integrar às demais. Lagartas, tanto cortadeiras como E. lignosellus, têm atacado nas diversas regiões. Mesmo com o controle pela ferramenta, se acaba perdendo plantas.
O controle de praga presente nas culturas de cobertura quando da dessecação e semeadura em intervalos curtos (três dias a sete dias) requer pulverizações, a fim de levar menor ataque inicial. Alguns inseticidas encontram-se registrados nesta modalidade de manejo, sendo importante destacar diamidas, carbamatos e também alguns piretroides.
De modo geral, com toda esta adversidade, como aumento populacional de pragas, quebras de tecnologias, pragas do sistema de produção, e a busca por maiores rentabilidades, de nada adianta o produtor ter uma boa escolha de materiais, boas práticas da semeadura-correção-adubação, bons maquinários, se começar perdendo o jogo.
Problemas no início do desenvolvimento das lavouras são irreversíveis. Uma boa base faz toda a diferença no resultado.
Germison Tomquelski, Fundação Chapadã
A cada nova edição, a Cultivar Grandes Culturas divulga uma série de conteúdos técnicos produzidos por pesquisadores renomados de todo o Brasil, que abordam as principais dificuldades e desafios encontrados no campo pelos produtores rurais. Através de pesquisas focadas no controle das principais pragas e doenças do cultivo de grandes culturas, a Revista auxilia o agricultor na busca por soluções de manejo que incrementem sua rentabilidade.
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