Sistema de Plantio Direto alia sustentabilidade à preservação ambiental

03.12.2009 | 21:59 (UTC -3)

Já bem dizia a composição de Chico Buarque de Hollanda e Milton Nascimento, escrita em 1976. "Afagar a terra... Conhecer os desejos da terra... Cio da terra, a propícia estação... E fecundar o chão".

A música O Cio da Terra estabelece uma analogia entre os períodos da vida vegetal, trigo e cana-de-açúcar, deixando implícita a comparação entre os ciclos de reprodução biológica. O trecho alerta que é preciso tratar o solo com carinho, conhecê-lo melhor e, na época propícia, permitir a fecundação. Essa é a receita que o produtor rural, Manoel Henrique Pereira, 70 anos, o Seu "Nonô", como é conhecido, pôs em prática em sua propriedade, na região dos Campos Gerais do Paraná. Em meio a solos arenosos, declividade acentuada e regime pluviométrico bem distribuído ao longo do ano, a forma convencional deu lugar ao Sistema de Plantio Direto na Palha (SPDP) que, como o próprio nome diz, tem a semeadura feita na palha da cultura anterior.

A erosão causada pela chuva nos anos 70 provocou situação tão crítica para Seu Nonô, que a própria Associação Conservacionista, que organizava o plantio para os bancos financiadores da região, recomendou que abandonasse a atividade agrícola. O laudo da equipe técnica classificava o solo como agronomicamente não adequado, em razão da declividade, que impossibilitava a instalação de terraços. Endividado, sem formação acadêmica, apenas com conhecimentos herdados da família de homens do campo, saiu à procura de alternativas para desenvolver o plantio agrícola de forma diferenciada.

Clube da Minhoca - Conheceu centros de pesquisas e outros produtores do Brasil e do exterior, colecionou informações e, junto com uma cooperativa da região, avançou no processo do SPDP. "Promovemos algumas expedições ao exterior e criamos o Clube da Minhoca, com a mentalidade de fazer o plantio direto e provar que o solo coberto com palha promoveria melhor atividade biológica. A minhoca é um importante parâmetro de fertilidade e qualidade do solo", afirma Seu “Nonô”.

Primeiros Passos - Depois de aprofundar os conhecimentos e inúmeras tentativas, a colheita passou a ser mais farta que as médias anteriores. A produtividade do milho saltou de quatro para oito sacas por hectare e a soja, de 1.500 para 3.000 mil quilos/hectare. A produção de trigo, que raramente resultava em duas toneladas por hectare, chegou a quatro toneladas. "A partir do momento que saiu a primeira planta de dentro da palha, vimos que estávamos criando outro mundo. Sobre as palhas, as plantas iam nascer e produzir. A floresta vive assim, os galhos se decompõem no solo e alimentam as raízes das árvores para que continuem produzindo. Ninguém aduba as florestas e elas estão lá, num processo de autoajuda. É assim que funciona o sistema de plantio direto", ensina Pereira ao recordar o sucesso, que possibilitou a prosperidade de sua família.

O SPDP impede que o solo seja levado pelas erosões, possibilita o armazenamento de mais nutrientes, fertilizantes e corretivos. A concentração orgânica originada do plantio direto, salta de pouco mais de 1% para acima de 3%. Segundo Pereira, o Sistema de Plantio Direto na Palha melhora a qualidade ambiental pela conservação do solo, da água e do ar. “Hoje, quando um produtor queima uma área é um crime, também porque ele está jogando fora uma contribuição extraordinária da natureza”, afirma. Pereira adianta que um dos benefícios do plantio direto é o sequestro de carbono.

Hoje, dos 1.625 hectares da propriedade, 1.300 são de plantio direto. No Brasil, de 47 milhões de hectares ocupados pelas plantações de grãos, 25 milhões são pelo SPDP. A maior parte está concentrada na região Sul, com cinco milhões de hectares só no Paraná.

Cerrado - O Sistema de Plantio Direto na Palha contribuiu para melhorar a operacionalidade e produtividade agrícola do Cerrado brasileiro, região de solo de savana tropical, com deficiência em nutrientes, mas rico em ferro e alumínio. O total de áreas cultivadas com o uso da palha, nos últimos 17 anos, aumentou de 180 mil para 10 milhões de hectares, com predomínio da soja, milho, algodão e feijão. “Nas culturas irrigadas, o plantio direto é muito importante porque evita a evaporação e reduz o uso da água, em razão da cobertura do solo”, destaca o diretor de relações internacionais e novos projetos da Associação de Plantio Direto do Cerrado, John Landers, 70 anos.

Jean Peverari

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