Tecnologias para uma aplicação completa e bem sucedida
O tomate (Solanum lycopersicum), pertencente à família das solanáceas, é uma das hortaliças mais cultivadas no mundo, sendo amplamente utilizado tanto na alimentação in natura quanto na indústria. No Brasil, a produção se destaca devido ao clima diversificado, às diferentes formas de cultivo e à grande variedade de cultivares disponíveis, atendendo tanto ao mercado interno quanto ao externo.
Atualmente, a China lidera a produção mundial de tomate, enquanto o Brasil ocupa a nona posição no ranking global. A safra de tomate industrial de 2024 alcançou 1,7 milhão de toneladas, volume que, embora estável em relação aos anos anteriores, mantém o setor atento às oscilações do mercado e aos desafios produtivos.
As condições climáticas adversas ao longo do ano impactaram diretamente a cultura, atrasando o transplante de mudas e favorecendo a incidência de doenças. O tomateiro é especialmente suscetível a uma ampla variedade de patógenos, principalmente quando o ambiente oferece condições favoráveis ao seu desenvolvimento. As perdas na produção podem variar entre 10% e 30%, mas, sem práticas de manejo eficazes, esse percentual pode aumentar significativamente, comprometendo toda a safra.
Entre as doenças bacterianas que afetam a cultura do tomate, a mancha-bacteriana se destaca como uma das mais prejudiciais. Ela é responsável por manchas e lesões nas folhas e nos frutos, impactando diretamente a qualidade e o rendimento da produção. Atualmente, está disseminada em todas as principais regiões produtoras do Brasil, representando uma grande ameaça à cultura, pois pode gerar perdas significativas, comprometendo tanto a quantidade quanto o valor comercial dos frutos.
A mancha-bacteriana é causada por quatro espécies do gênero Xanthomonas (X. vesicatoria, X. euvesicatoria, X. gardneri e X. perforans), sendo esta última a mais prevalente. A presença de múltiplas espécies associadas à doença contribui para sua ampla disseminação nas regiões produtoras. Sabe-se que X. perforans é mais agressiva ao tomateiro em temperaturas em torno de 30°C, enquanto X. gardneri apresenta maior severidade em temperaturas médias próximas a 20°C, sendo mais comum em áreas de maior altitude.
As sementes infectadas ou contaminadas pela bactéria são uma das principais fontes de inóculo da mancha-bacteriana nos campos de cultivo. A disseminação da doença também é favorecida por plantas voluntárias de ciclos anteriores (tigueras), pelo cultivo escalonado, pelos restos culturais infectados e pela presença de plantas daninhas ou outras solanáceas em áreas próximas, que atuam como reservatórios do patógeno.
Além do tomateiro, o pimentão, o joá-de-capote (Nicandra physaloides), a maria-pretinha (Solanum americanum) e o leiteiro/amendoim-bravo (Euphorbia heterophylla) podem servir como hospedeiros alternativos, contribuindo para a persistência e propagação da bactéria. Estudos indicam que X. perforans ocorre naturalmente em joá-de-capote, enquanto X. gardneri já foi relatada em leiteiro/amendoim-bravo.
A bactéria aproveita qualquer abertura natural ou ferimento na planta como ponto de entrada, utilizando a água presente na superfície vegetal para facilitar sua penetração nos tecidos das folhas e dos frutos. Os sintomas da doença podem afetar toda a parte aérea da planta, geralmente começando nas folhas mais velhas, com manchas irregulares de coloração marrom.
Nos folíolos, as manchas iniciais são aquosas e rapidamente evoluem para lesões necróticas, rodeadas por um halo amarelado, caracterizando a infecção. As lesões causadas por Xanthomonas perforans se distinguem das de outras espécies do gênero pela sua evolução. À medida que a infecção avança, a região central das lesões pode se destacar, resultando em perfurações, um sintoma característico dessa bactéria.
Nos frutos, as lesões começam como áreas encharcadas, que rapidamente escurecem e se tornam profundas, comprometendo sua qualidade e viabilidade para comercialização.
É comum que os sintomas iniciais da mancha-bacteriana sejam confundidos com os de outras doenças importantes para o tomateiro, como a pinta bacteriana (causada pela bactéria Pseudomonas syringae pv. tomato), a pinta-preta (Alternaria solani) e a septoriose (Septoria lycopersici).
Para um controle eficaz da mancha-bacteriana em cultivos de tomate, é essencial adotar uma combinação de práticas de manejo. O produtor deve priorizar a prevenção, sendo o plantio de cultivares de tomateiro resistentes ou tolerantes à doença uma das primeiras e mais indicadas estratégias. As cultivares Ohio 8245, Heinz 9553 e Yuba são alguns exemplos que demonstram eficiência.
Para garantir a qualidade fitossanitária, as sementes e mudas devem estar isentas de bactérias. No caso da produção de mudas, é fundamental que as sementes não sejam retiradas de frutos com sintomas de mancha-bacteriana. Quando as sementes forem provenientes de campos onde a bactéria está presente, recomenda-se a aplicação de tratamento térmico úmido (56°C por 30 minutos) ou químico (0,8% de ácido acético por 24 horas).
A definição da época de plantio é um fator essencial, sendo recomendável evitar períodos chuvosos, pois a alta umidade favorece a proliferação da doença. Medidas como o cultivo protegido ou a irrigação por gotejamento são estratégias eficazes para reduzir a exposição direta da parte aérea das plantas à água, minimizando o risco de infecção.
Em áreas com histórico de mancha-bacteriana, a rotação de culturas, alternando soja, milho e feijão, auxilia na redução da doença ao diminuir as fontes de inóculo bacteriano. Além disso, a eliminação de plantas voluntárias que possam hospedar o patógeno, como joá-de-capote, maria-pretinha e leiteiro/amendoim-bravo, é fundamental, assim como a remoção de restos culturais nas áreas de cultivo.
No contexto do controle químico, a utilização de produtos registrados no Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) pode ser uma estratégia eficaz, especialmente em áreas com histórico da doença ou quando os primeiros focos são detectados. Destacam-se os produtos à base de cobre, bem como formulações que combinam cúpricos com antibióticos agrícolas, como a kasugamicina. No entanto, estudos indicam que o uso contínuo desses defensivos pode favorecer a seleção de estirpes resistentes do patógeno, reduzindo sua eficácia ao longo do tempo.
Como alternativa aos antibióticos, os indutores de resistência têm se mostrado promissores no manejo de doenças. Embora não eliminem diretamente os patógenos, esses compostos ativam as defesas naturais das plantas, dificultando a colonização dos tecidos. Entre os mais utilizados, destaca-se o acibenzolar-S-metil (ASM), que reduz os sintomas da mancha-bacteriana.
O uso de agentes biológicos é uma alternativa promissora no manejo integrado de doenças, com demanda crescente em diferentes sistemas produtivos. O gênero Bacillus é um dos mais estudados para aplicação no controle biológico. Atualmente, há diversos produtos comerciais à base dessas bactérias, como o Serenade (Bayer), que contém B. subtilis QST713. Esses produtos oferecem proteção duradoura e sistêmica contra doenças bacterianas, sendo especialmente relevantes no controle da mancha-bacteriana.
Por Luana Laurindo de Melo e Tadeu Antônio Fernandes da Silva Júnior, FCAV/Unesp
Artigo publicado na edição 157 da Revista Cultivar Hortaliças e Frutas
Receba por e-mail as últimas notícias sobre agricultura