Vantagens do levantamento dos agentes do complexo do enfezamento do milho por PCR em tempo real

Por Caroline Wesp Guterres, Professora Adjunta do Departamento de Fitotecnia da UFRGS e especialistas do Agronômica Laboratório de Diagnóstico Fitossanitário: Cristina Lage de Andrade, Coordenadora de Pesquisa; Juliane Fernandes, Analista da Virologia e Biologia Molecular; Marisa Dalbosco, Coordenadora Técnica; Pâmella Ortiz, Assistente da Bacteriologia; Tatiana Mituti, Supervisora de Virologia e Biologia Molecular; e Yuliet Cardoza, Supervisora da Bacteriologia

26.01.2024 | 15:59 (UTC -3)

O milho é uma das maiores commodities do agronegócio brasileiro, fundamental para alimentação humana, animal e produção de bioenergia. Seu cultivo vem aumentando no Brasil, em especial o milho safrinha. Segundo a Conab, na safra 22/23 foram produzidas 102.179 milhões de toneladas de milho em 17.179,6 milhões de hectares cultivados, consolidando como a maior produção brasileira até então.

As doenças no milho ocorrem dependendo de diversos fatores, como condições ambientais (associações com os fenômenos El Niño e La Niña), hospedeiro (característica do híbrido: mais resistente ou mais tolerante), patógeno, estádio da lavoura em que ela é infectada (vegetativo ou reprodutivo), manejo utilizado (presença de milho tiguera), época de semeadura, histórico de doenças e pressão de pragas na região. 

O complexo de enfezamentos causados por Candidatus Phytoplasma (enfezamento-vermelho), Spiroplasma kunkelii (enfezamento-pálido) e Mayze rayado fino virus (vírus-da-risca) (MRFV) em condições de alta pressão do inseto vetor (cigarrinha) reduz a produtividade do milho, proporcionando perdas econômicas superiores a 70%. Os agentes causais alojam-se no floema das plantas de milho e a cigarrinha do milho (Dalbus maidis), até pouco tempo era conhecida como o único vetor de transmissão desses agentes no campo. Entretanto, Ferreira et al. (2023) identificaram uma nova espécie de cigarrinha, chamada de africana (Leptodelphax maculigera), capaz de transmitir fitoplasmas. No mesmo ano, Bortolotto et al. (2023) e Canale et al. (2023) comprovaram que vários exemplares da cigarrinha africana estavam infectivas com o vírus MRFV, gerando preocupação por parte dos produtores, apesar da população desta espécie ser consideravelmente menor nos campos de produção.  

Diante desse cenário agrícola e considerando que em todas as fases de cultivo do milho os produtores dependem de um monitoramento constante, aliado à utilização de controle químico e biológico para manejo das cigarrinhas para fins de redução de danos econômicos causados pelo complexo do enfezamento, as ferramentas moleculares tornam-se aliadas interessantes no manejo. 

Dentre as análises moleculares, destaca-se a técnica da PCR em tempo real em multiplex, que apresenta como principais vantagens a alta sensibilidade para detecção e quantificação, permitindo que os agentes do complexo do enfezamento sejam detectados e quantificados em plantas assintomáticas e de forma simultânea, ou seja, numa única corrida de PCR em tempo real. Também é importante ressaltar que somente a presença da cigarrinha não garante a ocorrência da doença, ela precisa estar infectada pelos molicutes e vírus, logo, na mesma análise é possível ainda verificar essa infectividade, principalmente, no período entre a emergência e o estádio V5 das plantas, intervalo considerado crítico para controle deste inseto. Assim, medidas de manejo podem ser aplicadas de forma direcionada, otimizando custos e intervalos de aplicações de inseticidas. 

Pensando na epidemia da doença no campo e na possibilidade de quantificar os agentes do complexo do enfezamento, a técnica de PCR em tempo real pode auxiliar os pesquisadores a conhecerem melhor a doença a partir do monitoramento da quantidade (a partir dos valores de ciclo de quantificação) e comportamento dos agentes em relação à determinado híbrido (tolerante ou resistente), condições de manejo e condições climáticas, sob menor ou maior pressão da cigarrinha. Dessa forma, o pesquisador e/ou produtor consegue manter um histórico de dados e de informações acerca da sua área de cultivo. 

Em 2023, o Laboratório Agronômica, localizado em Porto Alegre, RS, analisou 1.341 amostras de plantas de milho de diferentes regiões do país, das quais 71,8% foram positivas para o vírus (MRFV), 55,5% para fitoplasma, 21,3% para espiroplasma, 40,3% positivas para MRFV + fitoplasma, 6,4% positivas para MRFV + espiroplasma, 3,9% positivas para fitoplasma + espiroplasma e 9% foram positivas para os três principais agentes do enfezamento (Fig. 1). 

Neste mesmo período, foram analisadas 214 amostras de cigarrinhas, sendo que 46,7% foram positivas para o vírus da risca (MRFV) e 0,5% para a presença de fitoplasma (Fig. 2).

Figura 1: percentagem de plantas de milho positivas para os agentes do complexo do enfezamento do milho em 2023, analisadas no Laboratório Agronômica 
Figura 1: percentagem de plantas de milho positivas para os agentes do complexo do enfezamento do milho em 2023, analisadas no Laboratório Agronômica 
Figura 2: percentagem de amostras de cigarrinhas positivas para os agentes do complexo do enfezamento do milho em 2023, analisadas no Laboratório Agronômica
Figura 2: percentagem de amostras de cigarrinhas positivas para os agentes do complexo do enfezamento do milho em 2023, analisadas no Laboratório Agronômica

A diferença no percentual de positivos entre as matrizes plantas e cigarrinhas pode estar atrelada ao fato das amostras de plantas geralmente serem enviadas para análise após a observação dos sintomas suspeitos no campo, enquanto que as amostras de cigarrinhas não possuem este direcionamento. Outros pontos a serem levantados são de que as cigarrinhas presentes no campo nem sempre são infectivas ou nem toda a totalidade da população presente em uma área está infectiva e a amostragem de cigarrinhas analisadas foi menor do que a amostragem de plantas.

Os dados de percentual de detecção dos agentes do complexo do enfezamento demonstram a distribuição e variabilidade dos agentes de enfezamento e são de grande importância para o monitoramento de campo. Nas amostras de milho analisadas, houve maior predominância na detecção dos vírus da risca e de fitoplasma, de forma isolada ou simultânea. Uma hipótese seria a maior capacidade da cigarrinha em transmitir esses patógenos, entretanto, estudos laboratoriais e de campo são necessários para confirmar esta teoria. 

O enfezamento do milho segue preocupando produtores e pesquisadores, pois reduz o tamanho de espigas e consequentemente a queda na produtividade. No campo, os sintomas geralmente são percebidos tardiamente. Entretanto, é possível identificar a presença do inseto na lavoura desde os primeiros estádios de desenvolvimento da planta. 

Diante desse cenário, a diagnose precoce dos agentes do complexo do enfezamento do milho utilizando a PCR em tempo real é uma ferramenta importante para auxiliar produtores e pesquisadores na tomada de decisões a fim de evitar danos à produção, considerando o monitoramento das plantas no estádio vegetativo, das cigarrinhas e verificando a sua infectividade. Além disso, os dados levantados pelo Laboratório Agronômica contribuem com informações para o melhoramento genético, direcionando o desenvolvimento de híbridos mais tolerantes aos agentes predominantes no campo. Mais estudos em relação à transmissibilidade dos agentes do complexo de enfezamento auxiliarão na compreensão de epidemias e consequentemente, no desenvolvimento de medidas mais assertivas de manejo. 

*Por Caroline Wesp Guterres, Professora Adjunta do Departamento de Fitotecnia da UFRGS e especialistas do Agronômica Laboratório de Diagnóstico Fitossanitário: Cristina Lage de Andrade, Coordenadora de Pesquisa; Juliane Fernandes, Analista da Virologia e Biologia Molecular; Marisa Dalbosco, Coordenadora Técnica; Pâmella Ortiz, Assistente da Bacteriologia; Tatiana Mituti, Supervisora de Virologia e Biologia Molecular; e Yuliet Cardoza, Supervisora da Bacteriologia

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