Da biologia ao controle do percevejo-marrom - Euschistus heros
Por Vanessa Exteckoetter; Karolina Gomes de Figueiredo; Geísy Nascimento Leal; Mariana de Souza Gonzaga; e Nathan Jhon Lopes, Universidade Federal de Lavras
A safra 2023/2024 vem enfrentando diversos cenários desafiadores no Brasil. Isso se dá, em grande parte, pelas características climáticas que o ano impôs sobre toda a cadeia produtiva do agronegócio. De fato, até safra passada (2022/2023), agricultores do Sul do Brasil vinham enfrentando forte escassez hídrica. No entanto, para esta safra, o efeito causado pelo “El Niño” trouxe consigo um grande volume de chuvas nos meses de setembro a novembro no Sul do Brasil, enquanto a metade norte do país sofreu com a escassez hídrica. Essas variações climáticas extremas causam impactos significativos nos sistemas de produção e consequentemente na dinâmica populacional de insetos-praga. Esse é o caso das lagartas. Atualmente, notamos um aumento na frequência de surtos de lagartas na cultura da soja, com relatos de densidades acima de dez lagartas por m² no Mato Grosso, Paraná e Rio Grande do Sul. Comparativamente às safras anteriores, a densidade populacional de lagartas em áreas de soja está significativamente maior.
Existem diversas razões para a ocorrência de um surto populacional de uma praga específica, entretanto, considerando a diversidade de ambientes de produção, e similaridade das espécies ocorrentes, buscamos elencar alguns fatores que são de comum ocorrência. Inicialmente, notamos que no sul do Brasil, tivemos um inverno relativamente quente, com temperaturas mínimas superiores às normais climatológicas. Isso permitiu a sobrevivência da maioria das espécies de insetos-praga (mesmo em baixa densidade) em plantas hospedeiras ou alternativas durante a entressafra. Durante o início do desenvolvimento da cultura da soja, houve grande frequência de precipitação, fator que dificultou as operações de manejo fitossanitário em grande parte das propriedades agrícolas. Dessa forma, a população de lagartas presente desde a entressafra aumentou significativamente.
No caso do Centro-Oeste, a escassez hídrica dificultou significativamente a semeadura dentro das janelas ideais. Devido a esse descompasso na semeadura, houve uma grande ocorrência de áreas próximas com estádios fenológicos drasticamente distintos. Nesses cenários, áreas mais velhas tendem a servir como sorvedouros de insetos-praga para áreas mais novas. Em geral, devido à escassez hídrica, manejos fitossanitários também não puderam ser empregados de forma efetiva, seja por conta da frustração financeira devido ao descompasso da semeadura, seja por conta de as condições meteorológicas não serem as ideais para a operação. Dessa forma, situações como as atuais favorecem a ocorrência de surtos populacionais, não apenas de lagartas, mas da maior parte dos insetos-praga da cultura da soja.
Mais especificamente, alertamos para a importância da temperatura sobre a ocorrência de surtos. Esta variável é um fator limitante para o desenvolvimento dos insetos. Ambientes com temperaturas mais altas proporcionam maior taxa de reprodução e velocidade de desenvolvimento, levando à ocorrência de surtos populacionais. Dentre as principais espécies de lagartas associadas à cultura da soja, estão: Anticarsia gemmatallis, Chrysodeixis includens, Rachiplusia nu, Helicoverpa spp., Chloridea virescens, Elasmopalpus lignosellus, Epinotia aporema, Omiodes indicata e o complexo Spodoptera (Spodoptera frugiperda, S. cosmioides, S. eridania e S. albula). Por meio da Tabela 1 é possível verificar as faixas ideais de temperatura e seus respectivos ciclos ovo-adulto aproximados para cada uma dessas espécies. Destacamos que esses intervalos de temperatura são considerados ideais para o desenvolvimento dessas espécies, mas não são considerados limitantes, ou seja, pode haver ocorrência em temperaturas fora das faixas indicadas.
Na safra atual, dentre as espécies citadas, notamos maior ocorrência do complexo Spodoptera (Figura 1) em diversas regiões do Brasil, e em diferentes estádios fenológicos da cultura da soja. Conforme mencionado anteriormente, altas temperaturas, disparidade entre estádios fenológicos em áreas próximas, dificuldade operacional para o controle, além da presença de pontes verdes, proporcionam surtos populacionais recorrentes. Sendo assim, durante esta safra está sendo comum observar lagartas causando danos relacionados ao estande de plantas, área foliar, flores e vagens.
Em termos de manejo, destacamos que a principal ferramenta de controle segue sendo o monitoramento intensivo. Por meio dele, é possível detectar o início das infestações, bem como a fase de desenvolvimento de cada uma das espécies. Desta forma, a tomada de decisão para o controle e a escolha da ferramenta adequada é embasada em dados. Citamos um exemplo de variação no controle de lagartas da espécie Spodoptera frugiperda em função do seu tamanho (Figura 2). Também destacamos a importância de ferramentas adequadas quanto à tecnologia de aplicação, à adição de adjuvantes espalhantes, adesivos, surfactantes, bem como de óleos essenciais com atividade inseticida que sejam compatíveis com princípios ativos e acrescentem eficácia de controle.
Sendo assim, esta safra está sendo marcada por desafios distintos, mas que estão relacionados. Portanto, o monitoramento e a compreensão da complexidade do sistema produtivo permitem que possamos traçar estratégias de manejo e implementar táticas de controle de forma mais assertiva.
Por Eduardo Engel, Daniele Caroline Hörz (Esalq/USP); Thomas Eliel Hörz, Maísa Jungbeck, Leonardo Wallauer Van Ass (Next Agrociência LTDA); Marcelo Zakseski (Conhecimento Agronômico)
Artigo publicado na edição 296 da Revista Cultivar Grandes Culturas
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