Sazonalidade do crescimento vegetativo do café

Entender as características sazonais do crescimento vegetativo do café auxilia na otimização do manejo da cultura, bem como no planejamento do programa de fertilização da lavoura

30.06.2022 | 15:07 (UTC -3)

Entender as características sazonais do crescimento vegetativo do café auxilia na otimização do manejo da cultura, bem como no planejamento do programa de fertilização da lavoura. Por isso a importância de compreender esse processo e suas particularidades nas principais regiões produtoras.

Temperatura e estresse hídrico se caracterizam como os fatores climáticos que mais afetam o desenvolvimento do cafeeiro. As temperaturas inferiores a 13ºC e déficit hídrico acentuado afetam diversos componentes envolvidos no processo fotossintético, pois acarretam a redução da condutância estomática, da fotossíntese líquida, da eficiência fotoquímica dos fotossistemas, do transporte de elétrons nas membranas dos tilacóides, da atividade enzimática, bem como o metabolismo do carbono, alterando ainda a composição e a estrutura dos complexos de pigmentos fotossintéticos, classes lipídicas e ácidas graxos com intensidades distintas entre genótipos e espécies.

Altas temperaturas do ar podem causar desnaturação e agregação de proteínas, aumento da produção de espécies reativas de oxigênio, da síntese de etileno e da demanda evaporativa, o que poderá provocar o fechamento estomático e a redução do suprimento de CO2, com consequente diminuição da fotossíntese líquida. Por sua vez, quando em condições de maior concentração de CO2, esses danos metabólicos são mitigados devido ao efeito de “fertilização” causado a planta, em função do aumento das taxas fotossintéticas e produção de fotoassimilados.

Compreender as características sazonais do crescimento vegetativo do café auxilia na otimização do manejo da cultura, principalmente na poda, irrigação, bem como no planejamento do programa de fertilização da lavoura. Além disso, deve-se considerar que o sucesso de produção da lavoura está condicionado a um bom crescimento e desenvolvimento da planta, uma vez que a produção de grãos ocorre em gemas novas e a emissão de gemas depende do alongamento dos ramos plagiotrópicos e ortotrópicos. Nesse contexto, foi avaliado o comportamento sazonal do C. canephora nas três principais regiões produtoras (Espírito Santo, Bahia e Rondônia) e no Rio de Janeiro, bem como particularidades regionais e de manejo.

Espírito Santo: avaliação de diferentes genótipos

O trabalho foi realizado no município de Nova Venécia, Espírito Santo, avaliando-se ramos plagiotrópicos e ortotrópicos de 14 genótipos. Contudo, serão apresentados dois genótipos, um representativo (comportamento similar ao da maioria) e outro que corresponde a exceção (comportamento distinto). O trabalho foi publicado na integra na Journal of Agricultural Science, v. 5, n. 8, p. 108-116, 2013.

Os resultados sugerem que a taxa de crescimento dos ramos ortotrópicos e plagiotrópicos do C. canephora são divergentes entre os genótipos e, apresentam variação sazonal durante todo o período do ano, influenciada principalmente pelas variações de temperatura do ar. Sob temperaturas mínimas do ar abaixo de 17,2ºC, a taxa de crescimento dos ramos é bastante reduzida para maioria dos genótipos estudados (Figura 1A), com excessão do genótipo V8 (Figura 1B) que manteve elevada taxa de crescimento antes e após a queda da temperatura em meados de agosto.

Figura 1. Taxa de crescimento vegetativo de grupos de ramos ortotrópicos e plagiotrópicos de C. canephora no Espírito Santo, ao longo do ano. Genótipo 02 (A) e genótipo 8V (B). As barras representam o erro padrão da média. 
Figura 1. Taxa de crescimento vegetativo de grupos de ramos ortotrópicos e plagiotrópicos de C. canephora no Espírito Santo, ao longo do ano. Genótipo 02 (A) e genótipo 8V (B). As barras representam o erro padrão da média. 

Esses resultados sugerem diferentes mecanismos de adaptação entre os genótipos à baixa temperatura. Logo, a maioria dos genótipos de café Conilon cultivados no Norte do Espírito Santo demandam maior quantidade de nutrientes para o crescimento entre meados de setembro até a segunda semana de maio.

Bahia: cafeeiro irrigado e não irrigado

O trabalho foi realizado no município de Itabela, Bahia, para avaliar ramos plagiotrópicos e ortotrópicos do genótipo denominado “02” da Emcapa, irrigado e não irrigado. Serão apresentados apenas o comportamento dos ramos ortotrópicos. O trabalho foi publicado na integra na Acta Scientiarum, v. 38, n. 4, p. 535-545, 2016.

De forma geral, o trabalho permitiu afirmar que a irrigação proporciona aumento de produtividade de café Conilon na região Atlântica da Bahia, mesmo em anos com precipitação superior a 1200 mm. A taxa de crescimento dos ramos ortotrópicos (Figura 2) e plagiotrópicos é superior nas plantas irrigadas em comparação às não irrigadas. As máximas taxas de crescimento ocorrem na primavera.

Figura 2. Taxa de crescimento de ramos ortotrópicos (Orto) de café Conilon na Bahia, em função dos regimes hídricos (não irrigado e irrigado) por dois anos. As barras representam o erro padrão da média.
Figura 2. Taxa de crescimento de ramos ortotrópicos (Orto) de café Conilon na Bahia, em função dos regimes hídricos (não irrigado e irrigado) por dois anos. As barras representam o erro padrão da média.

Diferente do que ocorre no Espírito Santo e Rio de Janeiro, a taxa de crescimento dos ramos de café Conilon não é limitada pela temperatura mínima média do ar. A maior demanda nutricional, para o crescimento vegetativo ocorre de setembro a janeiro.

Amazônia:cafeeiro adubado e não adubado

A pesquisa foi realizada no município de Rolim de Moura, Rondônia, avaliando-se ramos plagiotrópicos e ortotrópicos de plantas adubadas e não adubadas. O trabalho foi publicado na integra na Coffee Science, v. 12, n. 2, p. 50 - 59, 2017.

A pesquisa permitiu verificar que a adubação mineral proporciona maiores taxas de crescimento dos ramos plagiotrópicos (Figura 3) de cafeeiros em determinados períodos, nas condições estudadas. Há ocorrência de variações sazonais de crescimento vegetativo ao longo do ano na Amazônia Sul Ocidental, com máximo crescimento entre meados de setembro ao início de abril, quando ocorre maior precipitação pluviométrica e a média das temperaturas máximas inferior a 33ºC. Portanto, a adubação, associada ao crescimento vegetativo deve ser priorizada neste período, devido a maior exigência nutricional da planta para manter as taxas de crescimento e para produção de grãos, que ocorrem concomitantemente neste período.

Figura 3. Crescimento vegetativo de ramo plagiotrópico de cafeeiro adubado e não adubado em Rondônia. As barras representam o erro padrão da média.
Figura 3. Crescimento vegetativo de ramo plagiotrópico de cafeeiro adubado e não adubado em Rondônia. As barras representam o erro padrão da média.

Rio de Janeiro: Diferentes idades de ramos

A quarta região apresentada refere-se a um trabalho realizado em Campos dos Goytacazes, Rio de Janeiro, para avaliar ramos plagiotrópicos de diferentes idades e ramos ortotrópicos. O trabalho foi publicado na integra na Coffee Science, v. 12, n. 2, p. 50 - 59, 2017.

A taxa de crescimento varia ao longo do ano (Figura 4). Foi observada taxa mais elevada quando a média da temperatura mínima do ar foi superior a 17ºC e a média das temperaturas máximas inferior a 31,5ºC. Abaixo de 17ºC a taxa de crescimento dos ramos diminuiu significativamente. O padrão sazonal de crescimento dos ramos é semelhante, contudo, os ramos plagiotrópicos de diferentes idades apresentam taxas de crescimento diferentes no mesmo período do ano. Assim, estudos sobre o crescimento vegetativo sazonal dos ramos devem se basear em grupos de ramos com idades diferentes.

Figura 4. Taxa diária de crescimento vegetativo de grupos de ramos plagiotrópicos de diferentes idades e ramos ortotrópicos de cafeeiro Conilon no Rio de Janeiro. As barras representam o erro padrão da média.
Figura 4. Taxa diária de crescimento vegetativo de grupos de ramos plagiotrópicos de diferentes idades e ramos ortotrópicos de cafeeiro Conilon no Rio de Janeiro. As barras representam o erro padrão da média.

BOX - O café

O gênero Coffea é representado por pelo menos 125 espécies, das quais C. arabica (café Arábica) e C. canephora (café Conilon ou Robusta) correspondem à produção de 99% daquele que é um dos mais valiosos produtos da economia global, o café. No mundo, em 2016 foram colhidas mais de 150 milhões de sacas, sendo 95 milhões de C. arabica e 56 milhões de C. canephora. Se caracteriza como um produto com grande importância social e econômica, pois movimenta 175 bilhões de dólares, sendo produzido por mais de 25 milhões de famílias.

O Brasil é líder mundial na produção e exportação de café, totalizando 51,4 milhões de sacas beneficiadas em 2016, sendo 43,38 milhões de Arábica e 7,99 milhões de Conilon/Robusta. Há muitos anos o café Conilon é a principal matéria prima do café solúvel. Nos últimos anos está sendo adicionado, de forma crescente ao café Arábica para acentuar o sabor da bebida ou até mesmo consumido puro. Com isso há aumento significativo na busca por melhorias na produção para agregar qualidade ao produto, e tais melhorias estão ligadas ao manejo da lavoura, beneficiamento e preparo do café.

Artigo publicado na edição 223 da Cultivar Grandes Culturas, mês dezembro 2017/janeiro 2018. 

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