Resistência a doenças do milho: é preciso fazer parte do manejo

Por Dagma Dionísia da Silva, Luciano Viana Cota, Rodrigo Véras da Costa e Lauro José Moreira Guimarães, Pesquisadores Embrapa Milho e Sorgo

28.12.2023 | 16:04 (UTC -3)
Estria bacteriana (Xanthomonas vasicola pv. vasculorum)
Estria bacteriana (Xanthomonas vasicola pv. vasculorum)

O Brasil apresenta uma grande diversidade climática, possuindo em toda a sua extensão condições que favorecem o ataque de diferentes patógenos ao milho (Contini et al., 2019). As doenças podem ocorrer nas raízes, colmos, folhas e nos grãos, tirando o sossego do produtor de milho desde o início da semeadura. Isso leva à dependência de controle químico, justificável, pelas condições climáticas favoráveis aos patógenos e ao tamanho da área cultivada (estimada pela Conab (2020), em 17,54 milhões de hectares, somando-se a safra, safrinha e terceira safra de 2019/20). Porém, é preciso racionalizar o uso de produtos, reduzindo custos e favorecendo a sustentabilidade ambiental. 

Uma estratégia de controle de doenças é o semeio de cultivares resistentes. A resistência genética é um método de controle eficiente, não aumenta o custo das sementes e pode ajudar a reduzir o uso de fungicidas. 

Resistência genética a doenças do milho

Antes de qualquer decisão, é necessário conhecer as doenças que ocorrem na região a ser cultivada com o milho. No Brasil, as principais doenças da cultura são a mancha-branca (Pantoea ananatis), as ferrugens comum (Puccinia sorghi), polisora (Puccinia polysora) e branca (Physopella zeae), a helmintosporiose (Exserohilum turcicum), a cercosporiose (Cercospora zeae maydis), os enfezamentos (Spiroplasma kunkelli e Phytoplasma), a mancha-de-bipolaris (Bipolaris maydis), a mancha-de-diplodia (Stenocarpella macrospora) e as podridões de colmo (Fusarium sp., Colletotrichum graminicola e outros). Além dessas, em algumas regiões, como no estado do Tocantins, a macrophomina (Macrophomina phaseolina) tem ocorrido com frequência (Costa et al., 2018) e a estria bacteriana (Xanthomonas vasicola pv. vasculorum) foi relatada no Paraná em 2018, causando perdas significativas (Leite et al., 2018). 

Nas fases finais do desenvolvimento do milho, ocorrem as podridões de colmo e as podridões de espiga/grãos ardidos. As podridões de colmo, tem como efeito negativo, o quebramento/tombamento das plantas, dificultando a colheita e expondo os grãos a insetos, patógenos e animais que danificam e favorecem o apodrecimento dos mesmos. Já as podridões de espiga/grãos ardidos reduzem diretamente a produção e afetam a comercialização dos grãos devido aos descontos estabelecidos no mercado. Se houver síntese de micotoxinas por algumas espécies de fungos que infectam grãos (como Fusarium sp., Aspergillus sp. e Penicillium sp.), a situação pode ficar ainda mais preocupante, pois estes metabólitos causam problemas de saúde em humanos e animais, sendo barreira comercial cada vez mais forte em nível mundial.

Mancha-branca sul (Pantoea ananatis)
Mancha-branca sul (Pantoea ananatis)

Um fato a ser considerado é que muitas vezes, o híbrido é suscetível a mais de uma doença e a importância delas é variável de ano para ano e de região para região, em função das condições climáticas, do nível de suscetibilidade das cultivares semeadas, do sistema de plantio utilizado e do manejo da cultura (Costa et al., 2017). 

A variabilidade para resistência às doenças é comum no germoplasma de milho, porém, os programas de melhoramento buscam cultivares que apresentem características agronômicas para alta produtividade aliada a adaptação e estabilidade às condições climáticas do país. Este é um trabalho que exige anos de dedicação em pesquisa e desenvolvimento dos cultivares e assim, a resistência a doenças, que embora seja almejada, nem sempre pode ser alcançada, ficando a sanidade das lavouras, muitas vezes, a depender do controle químico. Por outro lado, cultivares com características agronômicas desejáveis e com resistência a doenças estão disponíveis e produtores podem buscar os mesmos. Para isso, é necessário ter conhecimento sobre as doenças que ocorrem na área de produção, como já dito.  

Enfezamento-pálido 
Enfezamento-pálido 

As empresas de sementes possuem em seu portfólio, informações sobre o nível de resistência da maioria dos cultivares de milho que comercializam. A Embrapa Milho Sorgo, anualmente faz uma compilação das características agronômicas e da resistência a doenças para os cultivares de milho disponíveis para comercialização no Brasil. Essas informações também foram obtidas pelo aplicativo Doutor Milho Cultivares. O aplicativo é gratuito e pode ser baixado em smartphones que utilizam as plataformas Android ou iOS. De acordo com os levantamentos realizados, os pesquisadores concluem que para todas as regiões de cultivo, o produtor tem em mãos materiais com tecnologias, tipos e ciclos diferenciados, o que lhe permite ampla escolha dentro do objetivo para o qual a cultura será destinada (Pereira Filho e Borghi, 2018).

Resistência genética deve ser associada a outras práticas de controle  

Há muito o que se pesquisar no país sobre a interação da resistência genética e outras práticas de manejo de doenças. Para as doenças foliares do milho, que possuem maior quantidade de produtos registrados no Mapa, o controle químico, usado inadequadamente, apresenta problemas, havendo relatos de baixa eficiência, como tem ocorrido em relação à mancha branca. Muitos trabalhos relatam haver inconsistências da aplicação de fungicidas, sua relação com a produtividade e com os benefícios econômicos, quando a severidade de doenças é baixa e a produtividade esperada é alta. Esses trabalhos mostram que híbridos resistentes são menos responsivos ao tratamento com fungicida que híbridos suscetíveis, e que, em várias situações, uma aplicação é economicamente mais viável quando comparada a um maior número de aplicações (Costa et al., 2012  Munkvold et al., 2001, Paul et al., 2011; Wise e Mueller, 2011). Dessa forma, reduzir o número de aplicações de acordo com o nível de resistência do cultivar pode sim, ser uma recomendação. 

Enfezamento-vermelho
Enfezamento-vermelho

Considerando que as estratégias de controle, principalmente se usadas isoladamente, não apresentam eficiência para todas as doenças, outras estratégias devem ser pesquisadas e inseridas em um programa de manejo integrado. Além das estratégias já conhecidas e pesquisadas, linhas como o controle biológico, devem ser incentivadas e associadas à resistência genética, tornando a produção mais sustentável e economicamente viável. Na tabela 2 estão descritas as principais estratégias de controle de doenças e sua eficiência para o milho. A resistência genética é a única que pode ser eficiente em todos os casos, porém, vale lembrar que desenvolver um cultivar com resistência a múltiplas doenças é difícil, de forma que, associar a resistência a outras estratégias, pode gerar resultados mais eficazes.

Exemplos da importância da resistência genética para doenças e desta fazer parte do manejo com outras práticas pode ser dado para as podridões de colmo, as podridões de espigas e os enfezamentos. As podridões de colmo e de espigas aparecem geralmente, ao final do ciclo da cultura, havendo poucas estratégias eficientes no controle de ambas as doenças. Assim, a resistência genética deve ser priorizada e, aliada à rotação de culturas e ao manejo da irrigação. Para os enfezamentos, não existe tratamento químico disponível no controle dos patógenos. Assim, ações importantes para reduzir prejuízos são: semear cultivares de milho que apresentem bons níveis de resistência, a eliminação de tigueras, plantio em época adequada para a região e controle da cigarrinha Dalbulus maidis (transmissora dos Molicutes) (Oliveira et al., 2017; Cota et al.; 2018; Costa et al.; 2019).  

Concluindo, o manejo de doenças deve ser planejado antes da semeadura, buscando-se os cultivares resistentes às principais doenças que ocorrem na propriedade.  Isso, aliado ao bom manejo, dentre os quais, fazer plantio de mais de uma cultivar, preferencialmente com resistência aos patógenos mais severos na área, tratar as sementes com fungicidas e inseticidas, semear em época adequada para o cultivar na região; evitar colheita tardia; usar a adubação de forma equilibrada, usar princípios ativos registrados para a doença que se pretende controlar. Vale sempre ressaltar que nunca se deve aplicar na dose acima ou abaixo da recomendada pelos fabricantes, para se evitar que isolados de patógenos resistentes aos princípios ativos sejam selecionados e reduzam a vida útil da resistência genética. Estas são ações que precisam ser implementadas para bem de nosso agro.

*Por Dagma Dionísia da Silva, Luciano Viana Cota, Rodrigo Véras da Costa e Lauro José Moreira Guimarães, Pesquisadores Embrapa Milho e Sorgo

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