Redução da pegada hídrica da agricultura irrigada

Por José Henrique Nunes Flores, Universidad Viña del Mar (Chile)

03.07.2023 | 09:55 (UTC -3)

No contexto atual, é comum que termos relacionados à sustentabilidade causem preocupação e insegurança aos produtores rurais, especialmente em relação ao seu impacto na cadeia produtiva. Um desses termos é a “pegada”, uma medida que avalia o impacto ambiental de um sistema de produção na agricultura. Este conceito leva em conta a quantidade de recursos naturais, como água e energia, utilizados para produzir e consumir um produto ou serviço, e sua compreensão é fundamental para avaliar o desempenho ambiental do sistema e adotar medidas para reduzir seu impacto. Neste sentido, existem distintas pegadas, sendo possível destacar a de carbono, a energética e a hídrica.

Ao considerar as pegadas na agricultura, é possível identificar oportunidades de melhoria na eficiência do uso de recursos naturais, o que pode resultar em redução de custos de produção, além de contribuir para a sustentabilidade (econômica, social e ambiental) do setor. Por isso, é importante entender seu conceito e aplicações na produção agrícola. Neste artigo, vamos explorar de forma mais detalhada o uso deste termo na agricultura irrigada, mostrando como a adoção de medidas sustentáveis podem contribuir para a garantia de um futuro mais seguro para a produção agrícola.

De acordo com o dicionário, a definição de pegada é “marca ou sinal deixado pelo pé ou por calçado na superfície onde se pisa”. No entanto, no contexto deste artigo, pegada se refere ao impacto causado por uma determinada atividade humana ou produto, ou seja, a marca que determinado produto deixa no ambiente. É calculada através da quantificação dos recursos naturais utilizados e dos resíduos gerados em todas as etapas do processo produtivo, desde a extração de matérias-primas até o descarte final do produto. Pode ser calculada através de diversas metodologias e ferramentas, que variam de acordo com o tipo de pegada em questão. De modo geral é preciso realizar uma análise detalhada do ciclo de vida do produto ou serviço, avaliando todas as etapas desde a extração de matérias-primas até a disposição final do produto. Com base nessa análise, é possível identificar as principais fontes de impacto e adotar medidas para reduzir esses impactos.

A gestão da pegada pode trazer benefícios econômicos, ambientais e sociais para as empresas, como a redução de custos de produção, a melhoria da imagem da empresa, o atendimento às demandas dos consumidores por produtos mais sustentáveis e a redução do impacto ambiental. Além disso, a gestão da pegada pode contribuir para a transição para uma economia mais circular e sustentável.

Adentrando nos distintos tipos de pegada, a de carbono é uma medida que avalia a quantidade de gases de efeito estufa, principalmente dióxido de carbono, emitidos por uma atividade, produto ou serviço. Na agricultura irrigada, a pegada de carbono pode ser influenciada por diversas atividades, desde a produção de fertilizantes até o transporte de insumos e produtos, a utilização de maquinários pesados e a energia utilizada na irrigação. Por esse motivo, é importante que os produtores adotem práticas mais sustentáveis e eficientes para reduzir a emissão de gases de efeito estufa em todas as etapas do processo produtivo. A gestão da pegada de carbono não apenas ajuda a minimizar os impactos ambientais, mas também pode gerar oportunidades de redução de custos e aumentar a competitividade no mercado internacional, onde a preocupação com a sustentabilidade é cada vez maior.

Nesse sentido, tem se apresentado inúmeras possibilidades aos produtores, não só aqueles que se utilizam da irrigação, mas também aqueles que cultivam culturas de sequeiro. O mercado de créditos de carbono tem sido cada vez mais procurado por empresas que buscam compensar suas emissões de gases de efeito estufa e atender às demandas de consumidores e investidores que buscam empresas mais sustentáveis. Assim, os produtores rurais podem se beneficiar ao adotar práticas agrícolas mais sustentáveis e gerar saldos positivos de carbono que podem ser vendidos no mercado de créditos de carbono. Além disso, a gestão da pegada de carbono pode levar a oportunidades de melhoria da eficiência e redução de custos, trazendo benefícios tanto para o meio ambiente quanto para a economia da empresa.

Já a pegada energética é uma medida que indica a quantidade de energia necessária para produzir e consumir um determinado produto ou serviço. No contexto da agricultura irrigada, a pegada energética é influenciada diretamente pela energia utilizada pelo sistema de bombeamento, que é responsável pela distribuição de água. A redução do consumo energético é importante para o produtor rural, uma vez que pode resultar em redução dos custos de produção. É importante destacar que, no Brasil, a matriz energética é majoritariamente hidroelétrica, o que tem levado ao aumento dos custos de bombeamento devido à redução de vazão dos cursos d’água. Essa relação entre água e energia tem sido estudada por pesquisadores ao redor do mundo por meio do conceito do Nexo Água-Energia-Alimento (Water-Energy-Food Nexus). Compreender essa interrelação é fundamental para garantir a segurança alimentar e energética da população e para o desenvolvimento sustentável da agricultura irrigada.

Ao falar sobre a interrelação entre água e energia, é impossível não mencionar a pegada hídrica, que mede a quantidade de água utilizada em um produto ou serviço. Na agricultura irrigada, a pegada hídrica é influenciada diretamente pelo volume de água utilizado para irrigação das plantas. É importante destacar que, além do consumo de água propriamente dito, a agricultura irrigada também pode gerar impactos indiretos na disponibilidade de água em uma determinada região, especialmente em áreas que já apresentam escassez hídrica. Por isso, é fundamental adotar práticas sustentáveis de gestão de água na agricultura irrigada, buscando a eficiência no uso da água e reduzindo o desperdício.

A pegada hídrica é especialmente relevante na agricultura irrigada, já que esta é um dos principais usuários de água em todo o mundo. Existem três tipos de água que compõem a pegada hídrica: água azul, verde e cinza. A água azul é a água que é retirada de fontes de água superficiais ou subterrâneas e utilizada para irrigação. A água verde é a água da chuva que é captada e utilizada pelas plantas durante o seu crescimento. Já a água cinza é a água poluída que é gerada durante o processo de produção e que precisa ser tratada antes de ser descartada.

Para reduzir a pegada hídrica da agricultura irrigada, é importante adotar práticas de manejo da água que maximizem sua eficiência, como a irrigação por gotejamento e a utilização de sensores de umidade do solo para determinar as necessidades de irrigação das culturas. Além disso, o uso de culturas mais resistentes à seca e a adoção de sistemas de cultivo mais adaptados ao clima local podem ajudar a reduzir a pegada hídrica da agricultura irrigada.

Devemos ter em mente que a redução da pegada hídrica pode estar diretamente ligada a eficiência do uso de água pela cultura. A eficiência no uso de água é a relação entre a produção da cultura e a lâmina aplicada pela cultura. Este termo se mistura com a produtividade da água, porém, este é assunto para outro artigo, assim como as eficiências dos sistemas de irrigação.

Fica evidente, portanto, produtor e irrigante, que a “pegada” não é necessariamente mais um termo qualquer, ou que esteja ligado somente a sustentabilidade ambiental. Este termo pode lhe auxiliar a melhorar a rentabilidade da sua propriedade, uma vez que melhorar estes índices pode impactar diretamente no seu lucro, de duas formas principais. Primeiro, reduzindo o custo da produção, e segundo, incrementando a sustentabilidade da propriedade, gerando marketing positivo a sua produção.

Por José Henrique Nunes Flores, Universidad Viña del Mar (Chile)

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