Futuro da proteção vegetal inovadora é ‘ensinar’ as plantas a se protegerem
Por Mariana Yama, gerente de biocontrole da UPL Brasil
A agricultura moderna enfrenta desafios crescentes, com perdas significativas na produtividade causadas por doenças e pragas. Patógenos como fungos, bactérias e vírus são responsáveis por uma parcela considerável dessas perdas, forçando os produtores a investirem intensamente no controle químico.
Contrariando a percepção comum, as plantas apresentam uma defesa secreta contra patógenos. Ao longo de milhões de anos de coevolução com microrganismos, as plantas desenvolveram um sofisticado sistema imunológico, capaz de reconhecer invasores e ativar uma série de mecanismos de defesa. Este "sistema imunológico" vegetal é a chave para a sobrevivência das plantas em ambientes hostis e representa uma fronteira promissora para a inovação agrícola.
A indução de resistência é um mecanismo fundamental para as plantas se defenderem de patógenos e insetos. Isso significa que, após um contato inicial com microrganismos (benéficos ou patogênicos) ou substâncias específicas (elicitores), a planta se torna mais resistente a ataques ou infecção subsequentes. É como se a planta desenvolvesse um "estado de alerta", permitindo-lhe reagir de forma mais rápida e intensa quando uma ameaça real se manifesta.
Essa ferramenta promove resistência a doenças e aumenta a produção de compostos de interesse, sendo fundamentais para o manejo sustentável. As plantas possuem mecanismos para resistir localmente à infecção, incluindo a imunidade desencadeada por padrões moleculares (PTI) e a imunidade desencadeada por efetores (ETI).
Ainda, possuem dois tipos de imunidade vegetal sistêmica, conhecidos como Resistência Sistêmica Adquirida (SAR) e Resistência Sistêmica Induzida (ISR). Estes mecanismos se relacionam entre si, mas cada um tem um sinalizador (gatilho), uma via e alcance distintos. Com base nesses mecanismos, destacamos como eles funcionam e como o uso de elicitores pode ser uma ferramenta valiosa no manejo integrado de doenças.
A resistência sistêmica das plantas a patógenos pode ser obtida por duas vias principais. A primeira é a Resistência Sistêmica Adquirida (SAR), que depende do contato direto da planta com o patógeno. Após a infecção, a planta desenvolve uma espécie de “memória imunológica”. Este tipo de resistência requer ácido salicílico, de modo que as regiões infectadas enviam sinais para as partes ainda saudáveis, ativando defesas naturais e preparando todo o organismo contra futuros ataques.
Um dos mecanismos característicos da SAR é a resposta hipersensível, em que, no ponto da infecção, ocorre a morte celular programada. Neste caso, ocorre o isolamento do patógeno, impedindo que ele se mova para outros órgãos da planta, já que não encontra mais tecidos vivos com vasos condutores para se espalhar.
Além disso, a SAR ativa genes relacionados à patogênese, que estimulam a produção de enzimas e proteínas com ação direta contra fungos e bactérias. Esse tipo de resistência é especialmente importante contra patógenos biotróficos, que precisam de células vivas para completar seu ciclo.
A segunda via é a Resistência Sistêmica Induzida (ISR), que não depende da infecção, mas sim da interação da planta com microrganismos benéficos do solo, como rizobactérias. Esses organismos funcionam como elicitores, e o estabelecimento da ISR depende da sensibilidade da planta aos hormônios ácido jasmônico e etileno. Dessa forma, a planta entra em um estado de alerta, conhecido como “priming”, ficando preparada para responder mais rápido e de forma robusta a futuros ataques.
As defesas acionadas pela ISR incluem a produção de enzimas como quitinases e glucanases, que degradam a parede celular de fungos e oomicetos; e peroxidases, que reforçam as paredes celulares por meio da lignificação, criando barreiras físicas contra a penetração de patógenos; além da liberação de espécies reativas de oxigênio (ROS) e de metabólitos secundários com ação antimicrobiana.
O reconhecimento de uma ameaça é o primeiro e crucial passo na ativação da imunidade vegetal. As plantas possuem uma rede complexa de receptores, localizados tanto na superfície celular quanto no interior das células, que são especializados em detectar elicitores. Existem dois grandes sistemas de reconhecimento que operam em camadas distintas.
A primeira linha de defesa, é conhecida como imunidade desencadeada por Pamp (PTI). Ela é ativada quando receptores reconhecem padrões moleculares típicos de patógenos (Pamps) ou de microrganismos (Mamps), como a quitina fúngica, a flagelina bacteriana e os polissacarídeos. Essa resposta pode ser acionada por estímulos endógenos que estão associados a danos (Damps) (Figura 1). Exemplos incluem a flagelina bacteriana (reconhecida pelo receptor FLS2) e a quitina fúngica. A PTI é uma resposta basal, rápida e de baixa intensidade, mas eficaz contra a maioria dos potenciais patógenos.
A segunda linha de defesa é conhecida como imunidade desencadeada por efetores (ETI). Patógenos mais virulentos desenvolveram a capacidade de suprimir a PTI, injetando moléculas chamadas efetores dentro das células vegetais (Figura 1). Em resposta, as plantas desenvolveram uma segunda linha de defesa, mais robusta, mediada por proteínas R (Resistência). Essas proteínas R, frequentemente localizadas no citoplasma, reconhecem diretamente ou indiretamente os efetores patogênicos, desencadeando uma resposta imune mais intensa, que muitas vezes inclui a morte celular programada (Resposta de Hipersensibilidade - HR) no local da infecção, para conter a disseminação do patógeno. Normalmente, a ETI pode gerar uma SAR.
Para que a planta possa ativar suas defesas, ela precisa primeiro perceber que há uma ameaça. Essa percepção é realizada por receptores, localizados tanto na superfície externa das células vegetais quanto em seu interior.
Esses receptores funcionam como "antenas" altamente especializadas, capazes de captar sinais específicos que indicam a infecção ou o ataque, iniciando a cascata de sinalização. Um dos tipos mais importantes são os receptores de reconhecimento de padrões (PRRs) que são divididos em Receptor-Like Kinases (RLKs) e Receptor-Like Proteins (RLPs). Eles estão situados na membrana plasmática e são responsáveis por detectar Pamps, Mamps, Damps e Hamps (padrões associados à herbivoria), desencadeando a defesa da planta.
Um exemplo clássico é o receptor FLS2 (RLKs), que reconhece a flagelina, uma proteína presente no flagelo de muitas bactérias. Ao detectar a flagelina, o FLS2 desencadeia uma série de eventos intracelulares que alertam a planta para a presença bacteriana.
Os NRLs (receptores com domínio de ligação a nucleotídeos e repetições ricas em leucina) são a principal classe de receptores intracelulares responsáveis por detectar efetores de patógenos dentro das células vegetais, desencadeando respostas imunes potentes e específicas. Ativam a segunda linha de defesa (ETI), reconhecem efetores que escapam da detecção por PRRs de membrana e desencadeiam respostas como morte celular programada (hipersensibilidade).
Uma vez que um receptor detecta uma ameaça, essa informação precisa ser transmitida e amplificada dentro da planta para que uma resposta de defesa adequada seja montada. É aqui que entram os peptídeos sinalizadores, comunicando o estado de perigo entre as células e os tecidos da planta.
Os peptídeos sinalizadores não atacam o patógeno diretamente. Eles ativam os mecanismos naturais de defesa da planta, como produção de fitoalexinas, reforço da parede celular e expressão de genes protetores, preparando-a para resistir melhor às doenças e manter produtividade com mais eficiência e segurança.
Entre os Mamps mais bem estudados, está o flg22, um peptídeo de 22 aminoácidos derivado da proteína flagelina bacteriana, proteína que compõe os flagelos bacterianos - estruturas responsáveis pela locomoção dessas células. Quando fragmentos como o flg22 entram em contato com a planta, eles são rapidamente reconhecidos pelo receptor FLS2, localizado na membrana celular.
Esse reconhecimento funciona como um sinal de que há um microrganismo presente e coloca a planta em estado de defesa (Figura 2). A partir daí, diferentes respostas são disparadas em sequência: alterações nos níveis de cálcio (Ca²⁺) dentro das células, ativação de enzimas sinalizadoras como as MAPKs, produção de fitoalexinas e reforço da parede celular com calose, além do fechamento dos estômatos. Entre essas respostas, destaca-se a chamada explosão oxidativa, caracterizada pelo acúmulo de espécies reativas de oxigênio (EROs) e óxido nítrico (NO), que ajudam a conter a infecção e ainda sinalizam outras células a se prepararem. Esse exemplo mostra como um simples fragmento proteico é capaz de acionar uma rede complexa de defesas nas plantas.
De acordo com informações da UPL Brasil, oficialmente registrado no MAPA (Ministério da Agricultura e Pecuária) LUMINUS se destaca como o único produto no mercado desenvolvido com base no componente flg-22, um inovador indutor de defesa vegetal. Sua exclusiva tecnologia de síntese e formulação permite a aplicação foliar direta, garantindo resultados comprovados no controle de doenças foliares em soja e milho (Figura 3, 4 e 5). LUMINUS representa um marco na agricultura moderna, unindo ciência, inovação e sustentabilidade para fortalecer as plantas de forma natural e eficaz.
As plantas contam com um sistema imune sofisticado e multiestratificado, capaz de reconhecer patógenos, ativar sinalizações complexas e desencadear respostas locais e sistêmicas. O avanço no entendimento desses mecanismos abriu caminho para soluções aplicadas diretamente no campo, como os elicitores, que ativam as defesas vegetais de forma segura e compatível com insumos químicos, permitindo sua integração ao manejo integrado de pragas e doenças.
O Brasil, líder mundial no uso de bioinsumos, vem convertendo esse conhecimento em produtos comerciais, que reduzem a dependência de defensivos químicos, diminuem a pressão de seleção sobre patógenos e agregam sustentabilidade aos sistemas produtivos.
Camila Ferreira de Pinho,
Rita de Cássia Silva,
Lucas Rêgo
Mendonça Marinho,
UFRRJ;
Gabriela de Souza da Silva,
Halina Schultz,
Metabolic Biosolutions;
Diego Henrique Mendes Costa,
gerente de Pesquisa e Desenvolvimento UPL;
Edson Sentinello,
pesquisador
Global Fungicidas UPL
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