O trator perfeito para o produtor brasileiro

Por Job Teixeira de Oliveira e Fabio Rojo Baio, professores da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campus Chapadão do Sul

03.01.2024 | 17:06 (UTC -3)

Em vez de perguntar como deve ser o conforto de um trator, não seria melhor perguntar do que um tratorista precisa? É mais ampla a pergunta, podendo ter múltiplas respostas. Além do mais, eventualmente outras pessoas na propriedade rural podem ter que trabalhar com o trator em campo e se deseja que estejam em segurança. Em boa parte das propriedades, é o próprio agricultor quem opera o trator, e ele deseja uma máquina confortável para si e também para outros operadores da máquina na propriedade.

Mas, o agricultor brasileiro em geral no momento da compra, sempre foi guiado pelo preço de aquisição. Essa característica está lastreada na população toda. Muito provavelmente por termos passado por inúmeras crises financeiras que duraram décadas. Esse “driver” enraizado em nossas mentes, o preço, direcionou as fábricas a oferecerem pacotes tecnológicos nos tratores defasados em anos no que diz respeito a tecnologia já disponível em outros países, como em países da Europa, a exemplo França, Espanha e Alemanha. Na grande maioria das vezes, as evoluções tecnológicas nos tratores são pensadas para melhorarem a capacidade operacional, ou eficiência energética do motor, diminuição da poluição pela queima do combustível, mas também são pensadas para melhorarem a ergonomia para o operador. 

A decisão pelo preço no momento da compra acarreta muitas vezes a escolha de tecnologia bem defasada. Em um exemplo simples, em um outro país muito parecido com o Brasil nesse ponto, é o caso do México. Naquele país, o qual também tem o driver preço enraizado, grande parte dos tratores comercializados ainda hoje possuem caixa de câmbio mecânica com disponibilidade de 9 velocidades à frente (lembra de algum trator com essa configuração aqui no Brasil?; vários). Essa característica técnica limita e muito o posicionamento da rotação de trabalho em relação ao ponto de consumo específico mínimo do motor. Portanto, é mais “barato”. Todavia, será que esse barato durante a vida útil do trator não traria maior consumo de combustível durante todo o tempo de trabalho? É algo a se estudar. 

Tração 4x2 TDA (tração dianteira auxiliar, vulgo “4x4”) foi uma outra mudança recente no cenário mercadológico de adoção de tecnologia por parte do brasileiro. A expansão da agricultura para o cerrado forçou o aumento da potência dos tratores. Áreas maiores precisavam ser cultivadas, e os tratores clássicos de 75 cv utilizados no Sul já não faziam mais sentido. O aumento da potência trouxe consigo a necessidade de maior capacidade tratória, levando a adoção nessa região de maior número de tratores 4x2 TDA e em muitos casos o 4x4 de fato. Esse aumento no “tamanho” dos tratores possibilitou as fábricas a embarcarem maior tecnologia nos tratores sem grande mudança nos preços por cavalo vapor. Portanto, passamos a utilizar aqui no Brasil tratores com caixa de câmbio mecânica-hidráulica, muitas vezes com 24 velocidades à frente, e mais atualmente alguns casos de caixa de câmbio CVT, passamos a utilizar cada vez mais tratores cabinados, e diversas outras tecnologias de grande impacto, como pneus radiais (e mais recentemente, pneus de grande flutuação). E diversas outras tecnologias poderiam ser aqui apontadas, as quais geralmente estão também associadas a mudanças positivas em ergonomia ao operador.

No mundo, há diferentes perfis de operadores de máquinas agrícolas. No Brasil, grande parte dos operadores de máquinas são contratados das empresas rurais. Claro que essa característica depende e muito das diferentes regiões, sendo que isso é diferente nas regiões Sul e Nordeste. Mas na Europa ocidental grande parte dos operadores agrícolas são os próprios agricultores, os quais demandam grande evolução tecnológica nas máquinas do ponto de vista ergonômico. Por esse motivo, as grandes evoluções em termos de ergonomia “aparecem” primeiro nos tratores europeus. 

Há momentos, em que mudanças legislativas obrigam a mudanças tecnológicas nos tratores. Observamos isso no início da adoção da mistura de Biodiesel aqui no Brasil, obrigando a estudos e adaptações nos sistemas de alimentação dos tratores. Outro exemplo atual é a pressão existente para a adoção e obrigatoriedade do uso de tratores cabinados para aplicação de defensivos agrícolas. No cerrado isso não seria um problema, uma vez que praticamente em toda propriedade maior que um mil hectares possui e utiliza autopropelidos, os quais são cabinados (sem entrar na discussão da “efetividade” da cabine em diminuir a contaminação do ar ao redor do operador). Mas e na região Sul? Há tratores em uso com mais de 30 anos, e grande maioria sem cabine. Naquele ambiente, os tratores geralmente de menor “cavalagem” são utilizados para todas as operações agrícolas na propriedade, inclusive aplicação de defensivos. Outro ponto: o custo na compra de um trator cabinado, principalmente em tratores abaixo de 100 cv, elevam o custo de aquisição em algo como 25-35%; e o agricultor é convidado a custear mais essa decisão. Será que o uso correto e efetivo de EPI já não estava adequado? Talvez, um dos principais percalços nesse tipo de decisão monocrática, seja o fato do Brasil ser um gigante, com diversos cenários, e que precisam ser avaliados, principalmente hoje, na era da inclusão. 

Após essa contextualização, vamos conhecer o mundo dos tratores modernos e ergonômicos que estão oferecendo um novo conceito de trabalho. Os atuais tratores se encaixam nas necessidades de muitos tratoristas e são perfeitos para as precárias estradas e declividades de lavouras brasileiras em muitas regiões, incluindo a região centro-sul. Definitivamente os tratores ergonômicos conquistaram um espaço de respeito no trabalho mundial. Fortes e confortáveis, os tratores modernos já são bem mais cômodos a nível mundial, já podendo ser notado um número crescente de adeptos que se preocupam com a ergonomia nas fazendas Brasil afora.

Vou adiantar algo para vocês: Os tratores ergonômicos são muito bons para “pilotar” em terrenos ruins! Mas o que é ergonomia? Ergonomia é uma ciência que busca entender a relação do homem com as condições de trabalho, estabelecendo normas para melhorar esse relacionamento. No nosso caso, melhorar o conforto e as condições de trabalho do operador no trator.

Olhando rapidamente, você vai dizer que eles apresentam muita tecnologia. Mas logo você vai fazer a seguinte pergunta: Deve ser interessante trabalhar com uma dessas máquinas nas lavouras? Aí está o pulo do gato! De cara você vai notar o tamanho dos pneus, escadas de subida para a cabine de fácil acesso, cabines vedadas com ar condicionado e um painel lindo, incrivelmente avançado e cheio de comandos. A Figura 1 mostra os painéis de uma máquina agrícola.

Figura 1
Figura 1

O que você precisa saber é que os tratores têm geometria e configurações de suas peças desenvolvidas para ter excelente desempenho em terrenos acidentados, terra solta, terrenos com solo revolvido, alguns obstáculos e também em estradas e ruas pavimentadas com asfalto nas fazendas. 

Configuração de um trator moderno ergonômico

  • Pneus mais largos com maior diâmetro em comparação com os pneus de um trator mais antigo. O pneu radial foi desenvolvido para diminuir o patinamento, não para melhorar a ergonomia, a princípio. Proporcionam maior flutuação, são mais macios, absorvem os impactos e imperfeições dos terrenos, ou seja, é uma clara indicação de que esses tratores podem enfrentar percursos quase que impensáveis com conforto para o tratorista. Há ainda a opção de rodado duplo, também chamado de sistema filipado, que proporciona maior tração da máquina, reduzindo o patinamento e aumentando a eficiência do sistema.

A Figura 2 mostra fotos com sistema de pneus filipados.

Figura 2
Figura 2
  • Direção hidráulica, macia e com grau de giro maior, na sua maioria, proporcionando manobras mais rápidas e fáceis em fim de linhas de plantio. Esta vantagem fornece ao operador a facilidade para executar menos manobras, evitando uso e forças braçais, diminuindo o cansaço. Além de volantes acolchoados, macios. 
  • Relação de marchas: Um mix de fácil mudança, proporcionado por câmbios CVT e power shift. Esta relação é vantajosa pelo fato de não precisar pisar na embreagem, evitando usar a força das pernas, diminuindo o cansaço.
  • Freios mais eficientes com tambores de grandes diâmetros, garantindo uma parada imediata, reduzindo riscos de acidentes. Em alguns casos, até compostos por freios ABS, que não deixam as rodas travar, garantindo uma frenagem segura. 
  • Pedais de acionamento de freios e embreagem macios, hidráulicos, contribuindo, assim, com o aumento de rendimento de trabalho do tratorista, que fará pouco esforço com as pernas.
  • Instalação de diversos bagageiros, suporte para garrafas térmicas e outros acessórios, permitindo ao operador fácil acesso aos itens pessoais.
  • Iluminação interna e externa, com várias luzes de sinalização, aumentando a visão do tratorista, permitindo uma operação segura à noite e para realizar manobras.
  • Bancos com suspensão a ar que se adaptam ao peso do tratorista, com regulagem eletrônica de altura, distância e inclinação. Desta forma, o ajuste do operador no banco acontece de forma muito confortável, sem problemas na coluna ou dores ao final de uma longa jornada de trabalho.
  • Comandos ao alcance do tratorista, sem necessidade de retirar a mão do volante, geralmente acionados com simples toques de botões acionadores.
  • Retrovisores grandes nas laterais e na parte traseira, auxiliando nas manobras e no acoplamento de implementos, ampliando o ângulo de visão do operador e reduzindo os pontos cegos de visão que podem causar acidentes.
  • Piso das cabines com tapetes de borracha, que proporcionam facilidade de limpeza e evitam escorregamento, além de conforto e isolamento térmico.
  • Cabines fechadas com isolamento térmico e acústico, que também evitam a entrada de poeira que pode causar danos à saúde do operador.
  • Conectividade, repassando em tempo real as informações da operação do trator para o escritório da fazenda. Isso possibilita capacidade ou possibilidade de operar em um ambiente interligado, recebendo avisos, instruções ou tarefas de forma mais rápida e fácil.
  • Painel de instrumentos com facilidade de visualização, com informações completas de rendimento de trabalho, consumo de combustível, temperatura, através de computadores de bordo.

Diante de tanta tecnologia, pode-se perceber que o trabalho em um trator deixou de ser uma tarefa árdua, difícil, desconfortável, que era feita por obrigação, e passou a ser prazerosa, gratificante acima de tudo, contribuindo para o bem-estar e a saúde do operador.

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