Manejo integrado do bicudo em cana-de-açúcar

Adoção do manejo integrado e a busca por novas alternativas de combate são necessárias para enfrentar este grande desafio

05.04.2022 | 15:18 (UTC -3)

Praga importante e de difícil controle, Sphenophorus levis é capaz de comprometer seriamente a produtividade e a longevidade dos canaviais.  A adoção do manejo integrado e a busca por novas alternativas de combate são necessárias para enfrentar este grande desafio.

Sphenophorus levis (Coleoptera: Curculionidae), é uma importante praga em cana-de-açúcar. As larvas desse inseto destroem o rizoma da planta, pois provocam prejuízos da ordem de 30 toneladas de cana por hectare, além de reduzir a longevidade do canavial. Esse inseto encontra-se espalhado por praticamente todas as áreas de cana-de-açúcar, principalmente em São Paulo, causando prejuízos de até 60% de perdas em toneladas de cana por hectare, causando a morte de perfilho. Os danos são causados pelas larvas que se abrigam no interior do rizoma e danificam os tecidos. Com isso pode ocorrer a morte da planta e falhas nas brotações das soqueiras, com perdas até 30 toneladas de cana/ha/ano. Os seguidos ataques nas áreas de soqueiras e a consequente redução do “stand” da cultura ocasionam perdas cumulativas nos cortes, obrigando a reformas precoces do canavial, que muitas vezes não passam do segundo corte (Gallo et al. 2002).

Não é possível controlar o bicudo-da-cana com uma única estratégia. O manejo integrado, através de várias práticas de controle, permite que se consiga equilíbrio da população da praga e uma “convivência”, visto que não será mais possível eliminar esse inseto da lavoura. Portanto, a prevenção através de vistoria das mudas de cana antes do plantio, bem como o conhecimento da procedência dessas mudas, de uma área não infestada, é fundamental para se evitar a propagação de S. levis.

A correta identificação e o monitoramento na fase adulta são indispensáveis ao manejo
A correta identificação e o monitoramento na fase adulta são indispensáveis ao manejo

 O monitoramento do inseto na fase adulta é o início do manejo, pois sem conhecimento da praga, bem como o seu índice populacional, não é possível aplicar as práticas de controle corretamente. Esse monitoramento é realizado com armadilhas confeccionadas com toletes de cana de 0,5 metro, cortados ao meio. As armadilhas de toletes são colocadas nas bases das touceiras e revestidas com palha da cana na razão de 100 toletes para cada hectare. Passados 20 dias, a avaliação da incidência de adulto é feita com base na quantidade de insetos mortos (Almeida, 2005).

Os principais métodos de controle, assim que se tem conhecimento da praga na lavoura, são: destruição de soqueiras, controle biológico e controle químico com iscas tóxicas.

O controle biológico é uma importante estratégia de combate ao inseto
O controle biológico é uma importante estratégia de combate ao inseto

A destruição mecânica das soqueiras no período de plantio, quando se dá a reforma do canavial, é o método mais utilizado no controle do bicudo-da-cana, pois tem por objetivo expor ao máximo as larvas aos seus predadores. Entretanto, essa prática apresenta resultado satisfatório somente no primeiro corte, pois muitas larvas conseguem sobreviver alimentando-se da matéria orgânica deixada no campo, após a destruição das soqueiras, não afetando também as formas adultas do inseto (Almeida, 2005).

O uso de iscas tóxicas pode ser empregado na manutenção da área destruída livre de vegetação hospedeira por um período acima de 3 meses e no plantio com aplicação de fipronil 800 WG (250 g/ha). Entretanto, apesar de todas essas medidas, ainda ocorre incremento nas populações da praga, sendo frequentes os registros de novas áreas infestadas. Isso demonstra a dificuldade de controle desse inseto, ressaltando a importância da continuidade de pesquisas na busca por alternativas mais eficazes (Leite et al., 2006).

Destruição de soqueiras, controles biológico e químico com iscas tóxicas são métodos utilizados contra a praga
Destruição de soqueiras, controles biológico e químico com iscas tóxicas são métodos utilizados contra a praga

As iscas tóxicas ainda são muito comuns no campo. Foram realizadas pesquisas para aperfeiçoar a atração de adultos de S. levis, (Giron-Pérez et al., 2009). Esses autores verificaram que os entrenós da cana-de-açúcar misturados com melaço a 10% e fermentados por 24h e 48h foram altamente atrativos a S. levis, superando outros substratos como casca de abacaxi + melaço ou água, e cana + água.

O controle biológico também pode ser uma importante estratégia de controle, porém ainda são necessários ajustes para o emprego de microrganismos entomopatogênicos, ou mesmo insetos entomófagos.

O início do controle microbiano de S. levis ocorreu através da seleção de isolados de M. anisopliae (ESALQ 259) e B. bassina (ESALQ 447), na Esalq/USP em 1990 (Badilla & Alves 1991).

Foram realizadas pesquisas de seleção de isolados de nematoides entomopatogênicos, onde Steinernema braziliense IBCBn 06 foi o mais virulento. A aplicação de nematoides entomopatogênicos em campo também foi estudada, produzindo resultados satisfatórios no controle de S. levis, podendo ser aplicado de forma combinada com fungos. O Instituto Biológico ,em parceria com o Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) e a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), realizaram pesquisas com os nematoides Heterorhabditis indica e S. brazilense e fungos entomopatogênicos, M. anisopliae e B. bassiana. Em casa de vegetação, S. brazilense causou mortalidade acima de 70% de larvas dentro do rizoma da planta, na dosagem de 1x108 juvenis infectivos/ha (Tavares et al. 2007). Em condições de campo, a aplicação de nematoides proporcionou mais de 60% de mortalidade de adultos e produziu ganhos de 17 toneladas/ha de cana-de-açúcar (Leite et al. 2012).

Da mesma maneira, a associação do nematoide com o inseticida químico thiamethoxam 250 WG também proporcionou ganhos em peso da cana de até 28 ton/ha, onde o nematoide foi aplicado com uma sub dosagem de 500 g thiamethoxam 250 WG/ha (Leite et. al. 2012).

O isolado IBCBn 06 de S. braziliense é produzido pela empresa BioControle Métodos de Controle de Pragas, de Indaiatuba, São Paulo, com o registro no Ministério da Agricultura e Pecuária  (Mapa) com dosagem recomendada de 1 kg/ha em 400 Litros de água (aplicação terrestre) (BRASIL, 2015).

Simi (2014) selecionou os isolados IBCB 383 de M. anisopliae e IBCB 170 de B. bassiana para S. levis, isolados do Instituto Biológico. Observou que na aplicação combinada o nematoide S. braziliense, em condições campo, o efeito com M. anisopliae foi antagônico e com B. bassiana sinergético na mortalidade de larvas de Galleria mellonella.

Para uso do fungo, a estratégia utilizada é a aplicação de 500 g de conídios/ha em iscas feitas de caules de cana-de-açúcar, partidos longitudinalmente e impregnados com os conídios dos fungos, distribuindo 200 iscas por hectare. Os insetos adultos são atraídos pelas iscas, contaminam-se com o fungo aplicado e morrem na isca ou próximos, disseminando a doença na área, devido à elevada densidade de iscas. Essa estratégia é interessante para ser aplicada durante o período de outono – inverno, quando ocorre uma diminuição de adultos na lavoura. A aplicação de 1013 conídios/ha com arroz + fungo ou pulverizado, também pode ser realizada durante o período da primavera – verão, principalmente nos meses de novembro a março, quando se tem maior trânsito de adultos na lavoura. Com a integração dessas técnicas de aplicação do fungo B. bassiana, já foi observado um parasitismo de adultos de 75% (J. E. M. Almeida, comunicação pessoal).

O manejo integrado de pragas é a melhor maneira de controlar S. levis em cana-de-açúcar.  Porém são necessárias pesquisas com novos métodos de controle cultural, novas moléculas químicas e ou alternativas de aplicação na lavoura, além do controle biológico com nematoides e microrganismos entomopatogênicos. Se não houver uma aplicação conjunta dessas medidas, o bicudo-da-cana continuará a ser um grande desafio para a cultura, trazendo enormes prejuízos na produção de açúcar e etanol, por ser uma praga de difícil controle.

Artigo publicado na edição 219 da Cultivar Grandes Culturas, mês agosto, ano 2017. 

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