Cuidados iniciais na cultura do milho

Por Crébio José Ávila, Embrapa Agropecuária Oeste; Charles Martins de Oliveira, Embrapa Cerrados; Ivana Fernandes da Silva, Universidade Federal da Grande Dourados

13.07.2023 | 16:05 (UTC -3)
Lagarta-elasmo ("Elasmopalpus lignosellus")
Lagarta-elasmo ("Elasmopalpus lignosellus")

Os sistemas de produção de grãos da região Centro-Oeste constituem um ambiente favorável para o estabelecimento de pragas, pois prevalece o cultivo do milho em áreas extensivas tanto no período de verão quanto na safrinha, além do cultivo de plantas de cobertura entre o cultivo de inverno e o de verão. Com a expansão da cultura do milho para novas regiões agrícolas, tem-se observado um número crescente de pragas que atacam as plântulas. Veja-se:

• Lagartas na cobertura: diversas lagartas já estão normalmente presentes na cultura utilizada como cobertura no Sistema Plantio Direto (SPD) e que será dessecada para a semeadura do milho, especialmente para o milho cultivado no período de verão. Essa cobertura vegetal é destinada à produção de palha no SPD (exemplo: aveia, trigo e braquiária), mas pode também proporcionar o desenvolvimento de altas populações de lagartas, especialmente da espécie Spodoptera frugiperda, nos períodos mais secos do ano.

Caso a semeadura seja realizada imediatamente após a dessecação da cobertura, as lagartas presentes na área, se não forem controladas, podem cortar as plantas do milho rente ao solo ou alimentar-se de sua folhagem, podendo causar a sua morte e, consequentemente, a redução do estande da cultura. Além de S. frugiperda, outras espécies, como S. eridanea, S. cosmioides, Mocis latipes e até mesmo a lagarta-rosca, Agrotis ipsilon, podem ocorrer.

• Lagarta-elasmo (Elasmopalpus lignosellus): é uma praga que pode danificar as plantas jovens de milho, especialmente quando o inseto já estiver presente na cobertura a ser dessecada para a semeadura da cultura. O inseto é considerado polífago, ou seja, alimenta-se de diversas espécies de plantas cultivadas, silvestres e daninhas, em especial aquelas pertencentes ao grupo das gramíneas e leguminosas. O adulto faz a postura nas plantas de milho ou em restos culturais presentes na área. Após a eclosão, as larvas alimentam-se inicialmente de matéria orgânica ou raspando o tecido vegetal e, em seguida, penetram no colo da planta de milho, um pouco abaixo do nível do solo, onde constroem uma galeria ascendente. Próximo ao orifício de entrada, as larvas tecem um casulo formado de excrementos, restos vegetais e partículas de terra, sinais estes que caracterizam a presença da praga na lavoura. Uma mesma lagarta pode atacar até três plantas de milho durante a sua fase larval, da emergência até aos 30 dias de desenvolvimento das plantas, período este considerado o mais suscetível à lagarta-elasmo.

O ataque dessa praga causa o sintoma denominado de “coração morto”, caracterizado pelo murchamento das folhas centrais, as quais se destacam facilmente quando puxadas, causando a obstrução no transporte de água e de nutrientes do solo para a parte aérea da planta. Nestes casos, pode ocorrer a morte da planta, reduzindo o estande da cultura ou o perfilhamento, o que torna a planta improdutiva. A intensidade de danos da lagarta-elasmo no milho é maior e mais frequente em condições de alta temperatura e de déficit hídrico no solo, especialmente em solos arenosos ou mistos conduzidos em plantio convencional, como frequentemente ocorre na região do Cerrado brasileiro.

• Percevejos barriga-verde: as espécies Diceraeus melacanthus e D. furcatus, embora sejam relatadas como pragas secundárias da soja em várias regiões do Brasil, vêm sendo encontradas em lavouras de milho do país desde a década de 1990.

Os insetos apresentam a parte dorsal marrom e a ventral verde, daí o nome barriga-verde. Os ovos, de coloração verde azulada, são colocados sobre as folhas do milho ou até mesmo de plantas daninhas. Durante a alimentação, esses percevejos posicionam-se, normalmente, no sentido longitudinal da planta, com a cabeça orientada para a região do colo. Se, no processo de alimentação, o meristema apical for danificado, as folhas centrais da plântula murcham e secam, manifestando o sintoma denominado “coração morto”, podendo também ocorrer o perfilhamento ou a morte da planta.

Se o meristema apical não é danificado, as primeiras folhas que se desenrolam do cartucho apresentam estrias esbranquiçadas transversais, muitas vezes com perfurações de halo amarelado, provenientes das punções que o inseto fez durante a alimentação na base da planta ainda jovem. Quando as folhas do cartucho não conseguem se desenrolar, conferem um aspecto de “encharutamento” na planta. Os danos causados por percevejos no milho têm sido mais acentuados na época de cultivo safrinha, uma vez que o inseto se multiplica no verão, no final do ciclo da soja.

Vale ressaltar que além do barriga-verde, outras espécies de percevejo como Euschistus heros e Nezara viridula podem atacar as plântulas de milho, porém com menor capacidade de causar danos, quando comparado ao barriga-verde.

Percevejos barriga-verde
Percevejos barriga-verde

• Cigarrinha-do-milho: a cigarrinha-do-milho, Dalbulus maidis, é um inseto sugador pertencente à família Cicadellidae. Apresenta quatro fileiras de espinhos nas tíbias das pernas posteriores, coloração amarelo-palha, mede de 3,7mm a 4,3mm de comprimento e apresenta duas manchas circulares negras facilmente visíveis na parte dorsal da cabeça, entre os olhos compostos, característica que facilita a sua identificação no campo. O inseto apresenta também o comportamento de se deslocar lateralmente sobre a planta quando perturbado e é encontrado preferencialmente no interior do cartucho das plantas de milho.

Atualmente, a cigarrinha-do-milho é considerada uma praga-chave do milho pela transmissão dos patógenos responsáveis pelas doenças comumente conhecidas como enfezamentos. Os enfezamentos são doenças provocadas por duas bactérias, denominadas fitoplasma, que causam o enfezamento vermelho, e espiroplasma (Spiroplasma kunkelii), responsáveis pelo enfezamento pálido, sendo que ambos os patógenos ocorrem no floema e são transmitidos de forma persistente pela cigarrinha. Essas duas doenças são consideradas hoje como principais desafios fitossanitários da cadeia produtiva do milho no Brasil. Além dos enfezamentos, a cigarrinha pode transmitir os vírus responsáveis pelas doenças chamadas virose da risca e virose do mosaico estriado do milho.

Os enfezamentos (vermelho e pálido) são doenças sistêmicas vasculares que se alojam e colonizam os vasos condutores (floema) do milho, provocando desordens fisiológicas, hormonais e bioquímicas, que se refletem em sintomas foliares e na formação das espigas menores e deformadas, prejudicando assim o desenvolvimento da planta e, consequentemente, reduzindo a sua produtividade da cultura. Embora D. maidis possa ocorrer durante todo

o ciclo da cultura, nós consideramos essa espécie como praga de plântulas, uma vez que essa fase de desenvolvimento do milho é a mais suscetível ao ataque da cigarrinha. Dependendo das condições do ambiente, do híbrido utilizado e da idade em que as plantas são infectadas, essas doenças podem provocar perdas expressivas, e quanto mais precoce for a infecção da planta pelos patógenos, maiores serão os danos na cultura.

Manejo dessas pragas

O manejo integrado de pragas (MIP) em milho deve ser iniciado antes do plantio, por ocasião da dessecação da espécie utilizada no SPD. Nesse momento é necessário fazer uma pergunta: existem lagartas na cobertura a ser dessecada?

Para responder isso é necessário amostrar as plantas da cobertura. Em caso negativo, deverá ser feita a pulverização apenas com o herbicida para dessecar a cobertura e nunca adicionar inseticidas. No entanto, caso haja presença de lagartas na cobertura, e se a semeadura for realizada logo após a dessecação, recomenda-se então aplicar um inseticida (lagarticida) em pulverização com alto volume (mínimo 150L/ha). Devemos utilizar produtos que tenham pouco ou nenhum efeito sobre os inimigos naturais (predadores, parasitoides e entomopatógenos), como as diamidas, as spinosinas e os produtos fisiológicos.

Para a lagarta-elasmo, tem sido comprovado que chuvas bem distribuídas, durante os primeiros 30 dias de desenvolvimento da cultura, praticamente eliminam a infestação desse inseto nas lavouras. No sistema plantio direto, que propicia melhor conservação da umidade do solo, essa praga tem ocorrido em menor intensidade quando comparado ao sistema convencional. A pulverização de inseticidas na parte aérea do milho tem proporcionado baixa eficiência de controle da lagarta-elasmo (< 50%), em razão da posição em que a praga fica alojada na planta. O tratamento das sementes do milho com inseticidas sistêmicos, especialmente contendo neonicotinoides isolados ou em mistura com piretroides, carbamatos ou diamidas, tem se mostrado uma tática eficiente para o controle da lagarta-elasmo.

O controle do percevejo barriga-verde pode ser realizado preventivamente, empregando-se inseticidas nas sementes ou em pulverização sobre as plântulas. O período de maior cuidado com o percevejo é durante a fase inicial de desenvolvimento da cultura, entre a emergência e o surgimento da quarta folha aberta (V4), que corresponde à idade entre 15-20 dias após a emergência das plantas. Cabe-se ressaltar que é durante essa fase de desenvolvimento que a planta de milho define o seu potencial produtivo.

Antes de realizar a semeadura do milho, recomenda-se fazer uma inspeção na área em que a lavoura será implantada, visando constatar a presença de ninfas e de adultos do percevejo barriga-verde, para avaliar a necessidade ou não de se tratar as sementes ou até mesmo de efetuar uma pulverização com inseticida após a emergência das plantas. Os inseticidas recomendados, em pulverização, para o complexo de percevejos fitófagos da soja são normalmente eficientes no controle do percevejo barriga-verde, no milho. Trabalhos conduzidos na Embrapa Agropecuária Oeste evidenciaram que o nível de dano para o controle do percevejo-barriga-verde no milho safrinha é inferior a um inseto para cada cinco plantas de milho na lavoura.

Para o manejo das populações da cigarrinha D. maidis e dos enfezamentos na cultura do milho são recomendadas diversas práticas agrícolas, essencialmente de caráter preventivo, as quais são baseadas nas táticas de controle químico, biológico e cultural. É desejável que essas práticas de controle sejam adotadas de forma conjunta tanto em nível de propriedade quanto da região produtora. A fase inicial de desenvolvimento do milho é considerada o período crítico para o controle da cigarrinha, uma vez que quanto mais precoce ocorrer a infecção das plantas, maiores serão os prejuízos à produção.

O controle eficiente do milho tiguera, durante o cultivo de soja no verão, é uma das estratégias mais importantes para a redução populacional da cigarrinha e dos patógenos por ela transmitidos nos cultivos do milho safrinha. Além do milho tiguera, o cultivo de milho verde para consumo humano em chácaras e sítios na região contribui para o desenvolvimento populacional da cigarrinha-do-milho e das doenças associadas a ela. Além disso, a colheita bem-feita e o transporte adequado do milho reduzem a possibilidade de surgimento de plantas de milho tiguera nas áreas de produção e nas rotas de transporte dos grãos.

O controle químico da cigarrinha-do-milho pode ser realizado por meio do tratamento das sementes e em pulverizações foliares nas fases iniciais de desenvolvimento da cultura (entre a emergência e a fase V8). O tratamento de sementes industrial tem sido mais adequado quando comparado ao tratamento de sementes feito pelos próprios produtores em suas propriedades (on farm), em razão da maior precisão e da uniformidade da dose do inseticida aplicado nas sementes. No caso de pulverização, é imprescindível o monitoramento das populações da cigarrinha nas plantas de milho para verificar a necessidade ou não do seu controle. O uso de patógenos, como Beauveria bassiana ou Isaria fumosorosea, aplicados em pulverização tem se tornando uma ferramenta importante para o manejo da cigarrinha. A implementação exclusiva de um único método de controle não garante um manejo eficaz do inseto-vetor e das doenças transmitidas por ele na cultura do milho. A associação de inseticidas químicos e biológicos tem proporcionado uma melhor performance na eficiência de controle da cigarrinha quando comparada à utilização dos produtos isoladamente.

Os híbridos comerciais de milho apresentam diferentes graus de resistência/ tolerância aos enfezamentos. Dessa forma, a utilização de híbridos mais resistentes/ tolerantes a essas doenças pode também reduzir os riscos de perdas na produção. Estudos têm demonstrado que, sob as mesmas condições, alguns híbridos podem apresentar menos de 10% de incidência de enfezamentos, enquanto outros podem atingir mais de 65% de plantas infectadas.

Por Crébio José Ávila, Embrapa Agropecuária Oeste; Charles Martins de Oliveira, Embrapa Cerrados; e Ivana Fernandes da Silva, Universidade Federal da Grande Dourados

Artigo publicado na edição 281 da Revista Cultivar Grandes Culturas

Compartilhar

Newsletter Cultivar

Receba por e-mail as últimas notícias sobre agricultura

LS Tractor Fevereiro