PPP contra o bicudo-do-algodoeiro

Cotonicultores, governo e comunidade científica unem forças em uma investida de R$17,7 milhões contra a mais perniciosa praga das lavouras de algodão

06.09.2017 | 20:59 (UTC -3)
Catarina Guedes

A assinatura de um Acordo de Cooperação Técnica entre a Associaçãoeira dos Produtores de Algodão (Abrapa), o Instituto Mato-grossensse do Algodão (IMAmt), a Embrapa e a Fundação Eliseu Alves, no valor de R$17,7 milhões, para o desenvolvimento de uma variedade de algodão transgênico resistente ao bicudo-do-algodoeiro pode ser o primeiro passo para o Brasil galgar patamares mais altos no ranking dos maiores exportadores mundiais de algodão. O país ocupa o quarto lugar nesse pódio, e, pela estimativa dos cotonicultores, pode alcançar o segundo, em cinco anos, hoje ocupado pela Índia, se crescer a uma média de 15% ao ano. Para isso, erradicar a praga que representa um acréscimo de cerca de 10%, ou US$250 por hectare, nos custos de produção é uma prioridade para cotonicultores, governo e iniciativa privada. A Parceria Público Privada (PPP) foi estabelecida na manhã dessa quarta-feira (06/09), na sede da Embrapa, em Brasília.

Os recursos disponibilizados pelo IBA para a cooperação técnica serão utilizados para acelerar as pesquisas que já existem em desenvolvimento de plantas resistentes ao bicudo e possibilitar a intensificação dos trabalhos, através da Plataforma do Algodão. Ela prevê etapas em curto, médio e longo prazos, até que se chegue à planta definitiva, o que costuma levar de dez a 15 anos. No Acordo de Cooperação Técnica, caberá à Abrapa captar os recursos junto ao IBA e repassá-lo, conforme cronograma físico-financeiro, para a Fundação Eliseu Alves, que será responsável pela gestão do montante a ser utilizado pela Embrapa, e para o IMAmt, que executará parte do projeto. A Embrapa e a Abrapa se comprometem a, em um prazo de 30 dias após a assinatura do termo, constituir um comitê gestor que irá elaborar um regimento interno, constituído por três representantes da Embrapa e três da Abrapa.

 A cerimônia de assinatura contou com a presença do chefe de gabinete do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), Coaraci Castilho, representando o ministro Blairo Maggi, dos presidentes da Embrapa, Maurício Lopes, e da Abrapa, Arlindo de Azevedo Moura, do presidente executivo do Instituto Brasileiro do Algodão (IBA), Haroldo Cunha, do diretor do Instituto Mato-grossense do Algodão (IMAmt), Alvaro Salles, do diretor presidente da Fundação Eliseu Alves, Alexandre Barcellos, da diretora-executiva da Embrapa, Lúcia Gatto, do chefe-geral da Embrapa Algodão, Sebastião Nascimento, do diretor executivo da Abrapa, Marcio Portocarrero, dentre diversos membros da comunidade científica.

Produtores tecnificados

Em seu discurso, o presidente da Embrapa, Maurício Lopes, rememorou a história da atividade algodoeira no país, enfatizando o período de migração para o cerrado que, segundo ele, ressignificou a cotonicultura nacional. "Esse setor representa muito bem o que o Brasil se tornou: mais que uma nação agrícola, uma potência em agricultura no mundo, e é um orgulho para a Embrapa ter participado desse processo", disse Lopes, dando como exemplo os resultados da safra 2016/2017, que deve fechar em 1,5 milhões de toneladas de pluma. "O Brasil já importou algodão, depois se tornou um grande produtor, até que veio o bicudo. A migração para o cerrado representa uma retomada da nossa cotonicultura", explica o presidente da Embrapa.

O presidente da Abrapa, Arlindo de Azevedo Moura, disse que o incremento nas exportações brasileiras, com o combate mais assertivo ao bicudo, pode fazer a cultura voltar a ser expressiva em estados como Alagoas, que sediou, na última semana, entre os dias 29 de agosto e 1° de setembro, o 11° Congresso Brasileiro do Algodão (11° CBA). "Alagoas já foi um grande produtor e processador da fibra, tanto que o algodão está até na bandeira do estado. Mas não produziu um único capulho nas últimas safras, e o bicudo é uma das razões pela qual a atividade foi devastada em seu território. Com a volta dessas regiões à produção, mesmo com produtores de pequenas áreas, vamos contribuir para incrementar a oferta brasileira da fibra. Este projeto nos possibilitará alcançar a meta de dobrar a produção em cinco anos", afirmou. Ainda segundo o presidente da Abrapa, Arlindo Moura, o algodão não precisa ser uma atividade de grandes produtores. "Mas precisa ser de cotonicultores tecnificados. E a tecnologia pode ser difundida para os pequenos. Isso fará dele a grande commodity do Brasil", disse.

Marco histórico

Possibilitado pelo aporte de recursos do Instituto Brasileiro do Algodão (IBA), o desenvolvimento de uma variedade resistente ao bicudo será um marco na atuação do IBA. "Será, sem dúvida, um divisor de águas. Atualmente o bicudo é um problema quase exclusivo do Brasil, se considerarmos que se trata de uma praga que incide majoritariamente na América do Sul, e, nessa região, nosso país é o produtor que impacta na oferta mundial da fibra. Sendo assim, muito dificilmente haveria investimento internacional para buscar soluções. O êxito nessa iniciativa vai resultar em uma tecnologia exclusivamente pensada para as nossas condições, que vai favorecer diretamente a produtividade, a redução dos custos e, consequentemente,  a competitividade do Brasil no cenário mundial", afirma Haroldo Cunha, presidente executivo do IBA. 

Nas palavras do chefe de gabinete do MAPA, Coaraci Castilho, a Plataforma do Algodão representará um impacto positivo, tanto na produtividade quanto na geração de renda em toda a sua cadeia produtiva. "Iniciativas como esta precisam ser aplaudidas e incentivadas. As parcerias com o setor privado são fundamentais, na visão do ministro Blairo Maggi, para impulsionar a ciência e a tecnologia em nosso país", recomendou Castilho. O bicudo chegou ao Brasil há aproximadamente três décadas e é considerado o maior problema fitossanitário da cultura do algodão.

A nova plataforma, segundo o diretor do Instituto Mato-grossense do Algodão (IMAmt), Alvaro Salles, representa um grande desafio. "O Brasil produzindo biotecnologia é algo que pode parecer impossível para muitas pessoas, que acham que isso é tarefa para multinacionais e instituições internacionais de pesquisa. Porém, há bastante tempo, nós temos observado que é factível, sim, e isso vai ser o contraponto, assim como um grande salto em tecnologia. Vários caminhos vão se abrir com esse projeto", afirmou Salles

 


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