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A próxima revolução agrícola pode vir das beiradas dos campos. Um grupo de cientistas propõe uma mudança radical: aproveitar os genes adaptativos das plantas daninhas para tornar lavouras mais resistentes às mudanças climáticas e às pressões ambientais. A proposta baseia-se em avanços recentes em genômica de plantas invasoras.
Ao longo de séculos, agricultores tentaram erradicar ervas daninhas. No entanto, essas espécies desenvolveram resiliência em ambientes dominados por práticas agrícolas intensivas. Essa capacidade genética de sobrevivência pode ser usada agora como um novo reservatório para melhorar o desempenho de culturas como arroz, milho, sorgo e beterraba.
Os autores do estudo argumentam que as daninhas evoluíram ao lado das lavouras em condições similares. Isso torna suas adaptações particularmente úteis e transponíveis. Elas resistem à seca, calor, frio, alagamentos e ainda lidam com pragas. Diferente de outros recursos genéticos, suas adaptações não foram isoladas em ambientes laboratoriais, mas selecionadas naturalmente em condições reais de cultivo.
Essa proposta surge num momento em que a agricultura enfrenta três desafios simultâneos: a necessidade de aumentar a produção de alimentos, a limitação do uso de novas terras e os efeitos crescentes das mudanças climáticas. A erosão genética das culturas modernas, que passaram por estreita seleção genética desde a Revolução Verde do século XX, reduziu a diversidade de genes úteis disponíveis. Genes de daninhas podem reverter parte dessa perda.
A tecnologia atual já permite identificar e isolar genes adaptativos com precisão. Ferramentas como edição genética e inteligência artificial ajudam a analisar genomas de plantas invasoras. Segundo os autores, as daninhas são uma fonte natural de informação evolutiva — prontas para serem decifradas e aplicadas. Espécies como Amaranthus palmeri e Chenopodium album se destacam por sua resiliência e podem ser exploradas, inclusive, para uma domesticação de novas culturas alimentares.
Mas a abordagem também levanta riscos. Ao incorporar traços de persistência e competitividade em lavouras, existe a possibilidade de que elas escapem ao cultivo e se tornem "superervas", desafiando os sistemas de manejo agrícola. O caso do arroz é citado como exemplo de desdomesticação. Cultivares geneticamente modificadas para resistência ao herbicida já causaram problemas ao se naturalizarem fora do controle humano.
Outro obstáculo é a complexidade genética de muitos dos traços desejados. A tolerância a estresses ambientais, por exemplo, depende de múltiplos genes e pode variar conforme o ambiente. Ainda assim, os autores acreditam que o avanço nas ferramentas moleculares e a colaboração entre cientistas de diferentes áreas — fisiologistas, agrônomos, melhoristas e bioinformatas — pode superar essas barreiras.
Há também um imperativo ético: ignorar fontes naturais de resiliência pode se tornar insustentável diante da crise climática e da insegurança alimentar global. A proposta insere-se na lógica da agricultura inteligente para o clima, que busca sistemas produtivos mais adaptáveis, diversos e sustentáveis. Para os cientistas, incorporar traços de daninhas nas culturas é mais que uma alternativa: é uma necessidade.
A ideia remete à ousadia da primeira Revolução Verde. Se bem-sucedida, essa nova etapa poderá manter a produção em áreas já cultivadas, preservar ecossistemas e aumentar a estabilidade alimentar. Pode até permitir a expansão de cultivos para áreas hoje marginais, com menor impacto ambiental. A domesticação de plantas daninhas resistentes, como alternativa ou complemento às lavouras atuais, também se apresenta como um caminho.
Mais informações em doi.org/10.1111/nph.70224
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