Cordyceps javanica

30.05.2025 | 09:09 (UTC -3)

Cordyceps javanica (Frieder. & Bally) é um fungo entomopatogênico ascomiceto da família Cordycipitaceae, anteriormente classificado como Isaria javanica. Caracteriza-se como agente de controle biológico altamente eficaz contra insetos praga, especialmente hemípteros sugadores como mosca-branca (Bemisia tabaci), psilídeos e afídeos. O fungo atua por infecção cuticular, colonização hemolinfática e produção de toxinas, oferecendo alternativa sustentável aos inseticidas químicos no manejo integrado de pragas (MIP).

Identificação taxonômica

Classificação atual:

  • Reino: Fungi
  • Filo: Ascomycota
  • Classe: Sordariomycetes
  • Ordem: Hypocreales
  • Família: Cordycipitaceae
  • Gênero: Cordyceps
  • Espécie: Cordyceps javanica (Frieder. & Bally) Kepler, B. Shrestha & Spatafora

Sinonímia: Isaria javanica (Friedr. & Bally) Samson & Hywel-Jones; Paecilomyces javanicus (Friedr. & Bally) A.H.S. Brown & G. Sm.

Cepas comerciais registradas: diversas linhagens são comercializadas globalmente, incluindo isolados brasileiros mantidos na coleção de microrganismos entomopatogênicos da Embrapa, com destaque para cepas adaptadas às condições tropicais e subtropicais.

Morfologia e ciclo de vida

O anamorfo de Cordyceps javanica produz conidióforos simples ou ramificados, com fiálides cilíndricas a fusiformes organizadas em verticilos. Os conídios são unicelulares, ovoides a cilíndricos, hialinos, com dimensões típicas de 2,5-4,0 × 1,5-2,5 μm. A fase teleomórfica (sexual) é caracterizada pela formação de peritécios imersos em estromas clavados ou capitados, de coloração amarelo-alaranjada.

O ciclo infectivo compreende cinco estágios distintos: adesão dos conídios ao tegumento do hospedeiro, germinação com formação de apressórios, penetração através da cutícula por ação de enzimas proteolíticas e quitinolíticas, colonização da hemocele com proliferação de blastosporos, e morte do inseto por toxicose e/ou depleção nutricional. O período de incubação varia entre 4-10 dias, dependendo das condições ambientais e suscetibilidade do hospedeiro.

C. javanica demonstra capacidade saprofítica limitada no solo, com viabilidade dos conídios mantida por 30-60 dias em condições favoráveis. A sobrevivência é influenciada pela textura do solo, matéria orgânica, microbiota competitiva e fatores abióticos. Estudos indicam potencial endofítico em algumas culturas, conferindo proteção adicional contra estresses ambientais.

Hospedeiros-alvo

Cordyceps javanica apresenta amplo espectro de ação, sendo particularmente eficaz contra:

  • Hemiptera: Bemisia tabaci (mosca-branca), Myzus persicae (pulgão-verde), Aphis gossypii (pulgão-do-algodão), Diaphorina citri (psilídeo-dos-citros)
  • Lepidoptera: Plutella xylostella (traça-das-crucíferas), Spodoptera frugiperda (lagarta-do-cartucho) - estágios iniciais
  • Coleoptera: Diabrotica speciosa (vaquinha), larvas de curculionídeos

A eficácia varia conforme o estágio de desenvolvimento do hospedeiro. Ninfas e adultos jovens apresentam maior suscetibilidade devido à menor esclerotização cuticular. Ovos são geralmente resistentes, enquanto adultos maduros podem apresentar redução da mortalidade. A penetração é facilitada em regiões menos esclerotizadas como articulações, estigmas respiratórios e ânus.

Mecanismo de ação

Adesão ao tegumento: a adesão inicial ocorre através de interações hidrofóbicas e eletrostáticas entre conídios e cutícula do hospedeiro. Glicoproteínas de superfície (adesinas) facilitam o reconhecimento específico e ancoragem dos propágulos fúngicos.

Germinação e penetração cuticular: após adesão, os conídios germinam formando tubos germinativos que desenvolvem apressórios especializados. A penetração cuticular é mediada por complexo enzimático incluindo quitinases, proteases (Pr1, Pr2) e lipases, em sinergia com pressão mecânica exercida pelo apressório.

Colonização hemolinfática: no interior do hospedeiro, o fungo diferencia-se em blastosporos que se multiplicam na hemocele, evadindo respostas imunológicas através de fatores de virulência como ciclosporina A e destruxinas. A colonização é acompanhada por depleção de nutrientes e alterações no balanço osmótico.

Morte do inseto: a mortalidade resulta da combinação de toxicose (destruxinas e outras micotoxinas), inanição nutricional, obstrução do sistema circulatório e comprometimento de órgãos vitais. Post-mortem, ocorre conidiogênese externa sob condições de alta umidade relativa.

Fatores que afetam a eficácia

Temperatura: faixa ótima situa-se entre 25-28°C, com germinação reduzida abaixo de 15°C e acima de 35°C. Temperaturas extremas (>40°C ou <5°C) comprometem significativamente a viabilidade dos conídios e velocidade de infecção.

Umidade relativa: superior a 85% é essencial para germinação e esporulação. Condições de baixa umidade (<60%) reduzem drasticamente a eficácia, enquanto saturação hídrica (>95%) favorece desenvolvimento vegetativo e conidiogênese.

Radiação UV: radiação ultravioleta constitui fator limitante principal na persistência de campo. UV-B (280-320 nm) causa danos ao DNA e proteínas, reduzindo viabilidade em 50-90% após 4-6 horas de exposição direta. Formulações devem incluir protetores UV ou aplicação no final do dia.

pH do substrato: crescimento ótimo ocorre em pH 6,0-7,5. Condições extremamente ácidas (pH <4,0) ou alcalinas (pH >9,0) inibem germinação e desenvolvimento fúngico, afetando a eficácia em solos com pH inadequado.

Métodos de aplicação

Pulverização foliar: Método mais comum, utilizando suspensões aquosas de conídios. Concentração típica: 1×108-1×109 conídios/mL. Aplicação preferencial no final da tarde ou início da noite para minimizar degradação UV. Volume de calda: 200-400 L/ha dependendo da cultura e equipamento.

Tratamento de solo: aplicação de conídios em substrato granulado ou líquido diretamente no solo para controle de pragas edáficas. Dosagem: 1×1012-1×1013 conídios/ha. Incorporação superficial (2-5 cm) melhora distribuição e contato com pragas-alvo.

Revestimento de sementes: tecnologia emergente utilizando polímeros biodegradáveis para aderência dos conídios às sementes. Concentração: 1×106-1×107 conídios/semente. Oferece proteção durante germinação e estabelecimento inicial da cultura.

Liberação controlada: sistemas de encapsulamento permitem liberação gradual de conídios no ambiente. Microcápsulas de alginato ou quitosana protegem contra condições adversas e estendem período de ação para 15-30 dias.

Dose e frequência recomendadas

Concentração de conídios: para controle de mosca-branca e afídeos: 1×108-5×108 conídios/mL. Pragas mais resistentes (tripes, lepidópteros): 1×109-2×109 conídios/mL. Concentrações superiores a 1×1010 conídios/mL raramente aumentam eficácia proporcionalmente.

Intervalo entre aplicações: aplicações sequenciais a cada 7-14 dias durante períodos de alta pressão de pragas. Em condições de baixa infestação, intervalos de 21-28 dias podem ser suficientes. Monitoramento populacional da praga deve orientar frequência de aplicação.

Compatibilidade com adjuvantes: espalhantes adesivos não-iônicos (0,05-0,1%) melhoram cobertura e adesão. Evitar surfactantes catiônicos que podem afetar viabilidade fúngica. Óleos minerais ou vegetais (0,5-1,0%) podem proteger contra dessecação e UV.

Manejo integrado de pragas

Sinergia com parasitoides: C. javanica demonstra compatibilidade com parasitoides de ovos (Trichogramma spp.) e larvo-pupais (Encarsia e Eretmocerus spp.). Aplicações devem ser programadas para minimizar impacto sobre inimigos naturais, preferencialmente em estágios não-suscetíveis dos parasitoides.

Uso alternado com produtos químicos: rotação com inseticidas de diferentes modos de ação previne desenvolvimento de resistência e mantém eficácia do programa de controle. Intervalos mínimos de 7-10 dias entre aplicação fúngica e química são recomendados para evitar antagonismo.

Janelas de aplicação: aplicações preventivas durante estabelecimento da cultura e início da colonização por pragas maximizam eficácia. Condições meteorológicas favoráveis (alta UR, temperaturas amenas) devem orientar cronograma de aplicações.

Manejo da resistência

Rotação de modos de ação: alternância entre diferentes espécies de fungos entomopatogênicos (Beauveria bassiana, Metarhizium anisopliae) e outros agentes microbianos reduz pressão seletiva e risco de resistência.

Monitoramento de eficácia: avaliações periódicas da mortalidade natural e induzida em populações de campo permitem detecção precoce de redução na suscetibilidade. Bioensaios laboratoriais com isolados locais complementam monitoramento.

Boas práticas agrícolas: manutenção de refúgios com hospedeiros suscetíveis, diversificação de culturas, conservação de inimigos naturais e manejo adequado de aplicações contribuem para sustentabilidade do controle biológico.

Impacto ambiental

Seletividade para inimigos naturais: C. javanica apresenta baixa patogenicidade para a maioria dos artrópodes benéficos. Predadores (coccinelídeos, crisopídeos) e parasitoides são geralmente pouco afetados nas concentrações de campo, mantendo equilíbrio ecológico do agroecossistema.

Degradação no ecossistema: o fungo é rapidamente degradado por fatores abióticos e microbiota do solo, não persistindo no ambiente por períodos prolongados. Metabólitos secundários são biodegradáveis e não bioacumulativos na cadeia trófica.

Segurança e toxicologia

Efeitos em mamíferos: C. javanica não é patogênico para mamíferos devido à termosensibilidade (crescimento inibido a 37°C) e ausência de fatores de virulência específicos para vertebrados. Não foram relatados casos de micoses em humanos ou animais domésticos.

LD₅₀ oral e dérmico: testes de toxicidade aguda em ratos indicaram: LD₅₀ oral > 5×109 conídios/kg peso corporal; LD₅₀ dérmico > 2×109 conídios/kg peso corporal. Ausência de mortalidade, sinais clínicos ou alterações histopatológicas nas doses testadas.

Resultados de campo

Estudos de eficiência em diferentes culturas: ensaios de campo em soja demonstraram controle de 70-85% de B. tabaci com duas aplicações de C. javanica (1×108 conídios/mL) em intervalo de 14 dias. Em citros, reduções de 60-75% na população de D. citri foram observadas com aplicações quinzenais durante brotação.

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