Nuvem de gafanhotos está sob controle
Por José Otávio Menten, Presidente do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS), Eng. Agrônomo e Professor Sênior da ESALQ/USP
Um dos dispositivos legais a serem observados pelos trabalhadores e empregadores é a Norma Regulamentadora 31, que visa garantir a redução de riscos a que são expostos os trabalhadores no setor agrícola.
No Brasil existe uma vasta legislação que versa sobre a organização das relações de trabalho nos diversos setores da sociedade, inclusive no setor agrossilvopastoril, que vão desde a Constituição Federal, passando pela Consolidação das Leis do Trabalho, até leis, decretos e normas técnicas.
Um dos dispositivos legais a serem observados pelos trabalhadores e empregadores são as Normas Regulamentadoras (NR) do Ministério do Trabalho e Emprego aprovadas pela Portaria Mtb no 3.215, de 8 de junho de 1978, que tem por finalidade regulamentar as medidas de segurança, saúde e medicina do trabalho dispostas no Capítulo V da CLT.
Atualmente, entre as 36 NR existentes, destaca-se a NR 31 – Segurança e saúde no trabalho na agricultura, pecuária, silvicultura, exploração florestal e aquicultura, que é uma norma de conteúdo temático, diferindo-se de outras que apresentam conteúdo administrativo ou técnico. A mesma também se aplica às atividades de exploração industrial desenvolvidas em estabelecimentos agrários.
O presente artigo tem por finalidade analisar aspectos relevantes da NR 31 e relacioná-los com a sua aplicação no setor agrossilvopastoril, o que não exime trabalhadores e empregadores da aplicação de outras normativas. Como norma temática, a NR 31 abrange elementos encontrados e adaptados de outras Normas Regulamentadoras, incluindo responsabilidades de empregadores e trabalhadores.
Como se pode notar (Box), existe uma grande carga de responsabilidades ao empregador ou equiparado, mas todas de vital importância, já que a CLT, no artigo 2o define empregador como aquele que assume os riscos da atividade econômica, admitindo, contratando ou fazendo prestação pessoal de serviço.
Em relação à redução de riscos nas atividades, existe uma grande dificuldade de entendimento por parte dos envolvidos. Como exposto anteriormente, a redução de riscos em um ambiente de trabalho segue uma hierarquia: da fonte para o operador.
O uso do EPI (Equipamento de Proteção Individual) deve ser prescrito toda vez que as demais formas de eliminação de riscos tenham sido exauridas. O que se nota na prática é o contrário. Muitos empregadores acreditam que ao equipar os trabalhadores com os EPIs estão contribuindo para a eliminação dos riscos existentes no local de trabalho, quando na verdade apenas estão atenuando o efeito deste ao trabalhador.
Um aspecto interessante a se observar é a existência da CIPATR (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes no Trabalho Rural) prevista pela NR 31. Da mesma forma que a Cipa (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes), prevista pela NR 05, tem por objetivo a prevenção de acidentes e doenças relacionados ao trabalho, de modo a tornar compatível permanentemente o trabalho com a preservação da vida do trabalhador.
Todo empregador ou equiparado que mantiver 20 ou mais empregados contratados por prazo indeterminado fica obrigado a manter em funcionamento, por estabelecimento, uma CIPATR. O mandato da CIPATR tem vigência de dois anos, sendo permitida uma recondução, sendo que no primeiro ano o coordenador é o representante escolhido pelo empregador e no segundo ano, o eleito pelos trabalhadores (nesse ponto difere-se da Cipa, que tem mandato de um ano, e o presidente é somente o representante do empregador).
No Quadro 1 é exposto o dimensionamento da CIPATR em função do número de trabalhadores empregados no estabelecimento.
Os representantes, titulares e suplentes da CIPATR deverão receber treinamento em matéria de segurança e saúde do trabalho, fornecido pelo empregador (conforme a NR 05 – Cipa, o treinamento deverá ser conduzido por profissionais que tenham conhecimento na área, necessitando de aprovação pela autoridade competente), com carga horária mínima de 20 horas.
Já estabelecimentos com mais de 50 empregados devem compor um SESTR (Serviço Especializado em Segurança e Saúde no Trabalho Rural), composto por profissionais especializados, cuja função é o desenvolvimento de ações técnicas, integradas às práticas de gestão de segurança, saúde e meio ambiente. Os profissionais integrantes do SESTR são: engenheiro de segurança do trabalho, médico do trabalho, enfermeiro do trabalho, técnico de segurança do trabalho e auxiliar de enfermagem do trabalho.
Outro importante capítulo da NR 31 é o que trata sobre a segurança no trabalho com agroquímicos, adjuvantes e produtos afins. A norma classifica os trabalhadores em dois grupos: com exposição direta e com exposição indireta. O empregador deve proporcionar aos trabalhadores com exposição direta capacitação adequada, com carga horária mínima de 20 horas sobre segurança na manipulação de agroquímicos. Trabalhadores rurais relatam que cursos de capacitação, como os promovidos pelo Senar (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural) têm contribuído de forma satisfatória para a manipulação segura de defensivos.
Ao tratar de ergonomia, fica a cargo de empregador ou equiparado a adoção de princípios ergonômicos que visem a adaptação das condições de trabalho às características psicofisiográficas dos trabalhadores. Isso inclui pausas para descanso, principalmente para os trabalhadores que realizam atividades em pé, treinamento para transporte manual de cargas e adequação de máquinas, equipamentos, mobiliários e ferramentas para proporcionar boas condições de postura, visualização, movimentação e operação.
Em relação à segurança na operação de máquinas e equipamentos agrícolas, a NR 31 apresenta um capítulo extenso, em muitos aspectos transcrito da NR 12 – Segurança no Trabalho em Máquinas e Equipamentos. Esse talvez seja um dos pontos mais polêmicos da normativa. A adequação de máquinas, principalmente em relação às proteções móveis e fixas e à instalação de dispositivos de segurança, tem gerado desconfortos aos produtores rurais: algumas máquinas existentes no mercado não apresentam as adequações exigidas por lei, e uma possível adequação por parte dos produtores traria uma elevação substancial nos custos, tornando mais onerosa a produção agrossilvopastoril. Outros dispositivos legais, como o Decreto 1.255, de 29 de setembro de 1994, que regulamentou a Convenção OIT (Organização Internacional do Trabalho), trouxeram os primeiros parâmetros para proteção de máquinas e equipamentos e embasaram todas as normas posteriores sobre o assunto.
Existem algumas peculiaridades referentes ao setor agrossilvopastoril, muitas vezes negligenciadas nas execuções das tarefas, por falta de fiscalização e/ou desconhecimento do que a norma regulamenta. Por exemplo, é vedado o transporte de pessoas em máquinas autopropelidas e nos seus implementos, e devem ser instalados dispositivos de proteção na tomada de potência (TDP) de tratores agrícolas que cubram a parte superior e lateral. Essas duas normativas são comumente burladas em atividades práticas. Na execução das tarefas prima-se pela praticidade e agilidade das operações, deixando a segurança para segundo plano.
Os operadores de máquinas e implementos agrícolas devem ser capacitados e habilitados para tais funções. A capacitação deve ocorrer antes que o trabalhador assuma a sua função, providenciada pelo empregador ou equiparado, sem ônus para o trabalhador, com carga horária mínima de 24 horas, sendo 12 horas de atividades práticas. Em relação à habilitação exigida, o Código Brasileiro de Trânsito determina que condutores habilitados nas categorias B, C, D e E poderão conduzir tratores de roda e equipamentos automotores destinados a trabalhos agrícolas (a inclusão de condutores habilitados na categoria B se deu pela lei 13.097, de 19 de janeiro de 2015, anteriormente a condução desse tipo de veículo era permitida apenas aos habilitados nas categorias C, D e E).
A NR 31 ainda apresenta aspectos relacionados a acessos e vias de circulação, transporte de trabalhadores, cargas e animais, fatores climáticos e topográficos, edificações rurais e áreas de vivência. Em relação ao transporte de trabalhadores, deve ser realizado em veículo próprio para tal finalidade, com autorização do órgão de trânsito competente, conduzido por motorista habilitado, qualificado e devidamente identificado. O compartimento para guarda de ferramentas e materiais deve ser separado dos passageiros em compartimento resistente e fixo.
Em relação a áreas de vivência e condições sanitárias dos ambientes de trabalho, existem relatos de condenação judicial de grandes empresas e indenização por danos morais aos trabalhadores caso as condições mínimas de higiene e conforto não forem observadas.
Auditores do Ministério do Trabalho podem inclusive caracterizar como condição semelhante à escravidão situações em que ocorram violações da NR 31, principalmente nos ramos sucroalcooleiro e florestal, com empresas localizadas em áreas de difícil acesso, onde acreditam os empresários que a fiscalização tenha dificuldade de atuação.
Os mesmos auditores afirmam que, no momento das autuações os empregadores rurais alegam desconhecer a obrigatoriedade das práticas exigidas por lei e que em função disso não estariam realizando as medidas cabíveis para garantir a conformidade. Porém, independentemente desse fato, as punições são cabíveis, pois de acordo com o artigo 3o da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto-lei 4.657, de 4 de setembro de 1942) “Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece”. Ou seja, legalmente presume-se que todas as pessoas conhecem a legislação e não se pode alegar o contrário para justificar condutas ilegais.
Portanto, é importante que produtores rurais, empregadores ou equiparados, façam o conhecimento e cumprimento de todos os dispositivos legais necessários para a realização das atividades, em especial a NR 31, com a finalidade de evitar possíveis problemas de ordem jurídica. Como mencionado anteriormente, a norma é grande, complexa, mas apresenta uma boa abrangência em relação às questões de segurança no trabalho agrossilvopastoril e representa um grande avanço na segurança em operações neste segmento.
Entende-se como de grande importância que sejam destacados neste artigo os itens a seguir descritos, onde afirma que cabe ao empregador ou equiparado a garantia de:
Ao trabalhador cabe cumprir as determinações descritas na norma, colaborando para sua aplicação:
Entre as atribuições da CIPATR estão:
Rosito Zepenfeld Borges, Catize Brandelero, Airton dos Santos Alonço, Jaqueline Ottonelli, UFSM
Artigo publicado na edição 165 da Cultivar Máquinas.
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