Agro 4.0 na prática: o campo na era da transformação digital
Por Carlos Barbosa, CEO da ALIARE
Cultivos sucessivos são altamente favoráveis a infestações de pragas como a mosca-branca, que na proporção de 10 ninfas por folha tem levado a prejuízos da ordem de 12 sacas por hectare em soja. As aplicações de inseticidas, sempre aliadas a outras estratégias de manejo integrado, devem ser realizadas na primeira cultura implantada no campo, a fim de quebrar o ciclo e evitar novas gerações do inseto.
A região do cerrado brasileiro caracteriza-se pela presença de áreas extensas e altamente mecanizadas. O agroecossistema utilizado apresenta-se altamente favorável à multiplicação de pragas, pois prevalece um sistema de produção em que a soja é a principal cultura a se estabelecer na grande maioria das áreas, sendo rotacionada muitas vezes com algodoeiro ou milho em determinadas regiões e anos. Esse cultivo sucessivo fez com que muitas pragas se adaptassem ao sistema. Aliado a isto, outros fatores, como condições climáticas favoráveis, com altas temperaturas e inverno ameno, tornam-se ideais para a multiplicação dos insetos. Entre as pragas, a mosca-branca, Bemisia tabaci biótipo b, têm causado grande preocupação e prejuízos para alguns produtores das culturas de soja, algodão, feijão, etc.
A mosca-branca, Bemisia tabaci biótipo b (Gennadius,1889), é um inseto polífago, cuja reprodução já foi observada em mais de 500 diferentes espécies vegetais, pertencentes a diversas famílias botânicas. Pertence a ordem Hemiptera e família Aleyrodidae. O ciclo biológico da mosca-branca pode variar de 17 dias a 45 dias, sendo influenciado principalmente pela temperatura.
Os adultos apresentam tamanho de cerca de 2mm de comprimento com quatro asas membranosas de coloração branca. A fêmea pode colocar mais de 200 ovos. Os ovos de coloração verde claro a castanho claro são colocados na face inferior das folhas. Eclodindo, as ninfas são móveis em seu primeiro estádio. Após selecionarem um local, introduzem seu estilete e fixam-se, não se movendo mais. Os adultos emergem depois de quatro estádios.
Por ser um inseto sugador, durante a sucção de substâncias ricas em nutrientes e água das plantas, a mosca-branca pode introduzir toxinas que provocam desenvolvimento desuniforme na planta e queda na produtividade. Além disso, secreta substância açucarada sobre as folhas que favorecem o crescimento de fungos oportunistas, no caso do gênero Capnodium spp. levando ao recobrimento da folha por este fungo, comumente chamado de Fumagina. Isto leva à redução de área foliar e da taxa fotossintética, e consequentemente da produtividade.
Outra característica é a habilidade na transmissão de viroses, em especial do gênero Begomovirus – Geminiviridae, além também do gênero Carlavirus Cowpea mild mottle virus – CpMMV (que leva à necrose da haste e posterior morte de plantas).
Algumas áreas no Brasil têm apresentado plantas com virose, que levam a pequenos prejuízos. No entanto, é necessário que os técnicos, ao perceberem a presença de plantas anormais, façam a coleta e envio a laboratórios para identificação das possíveis viroses. Este problema em soja deve ser tratado com grande importância uma vez que é a principal commoditie brasileira no agronegócio.
O biótipo Q ou do mediterrâneo já se encontra no Brasil, sendo alvo de estudos por entomologistas da IAC e Embrapa Arroz e Feijão. Os estados de Rio Grande do Sul e São Paulo já tiveram sua ocorrência reportada. Este biótipo teve sua introdução nos EUA por volta de 2004 e a ocorrência identificada no Uruguai e Argentina em 2012.
Na cultura da soja a mosca-branca pode começar sua ocorrência nos primeiros dias, em algumas regiões de pressão maior da praga. O seu prejuízo comumente só é percebido na fase do enchimento dos grãos, pois as plantas tendem a terminar o seu ciclo antes do prazo normal, com os grãos menores e consequentemente diminuindo a produção. Isso ocorre muitas vezes pela presença da fumagina.
Altas infestações em soja quando não controladas ou mantidas em populações que não comprometam a produtividade, podem vir a migrar para culturas adjacentes ou mesmo em sucessão. É o caso de algumas regiões onde o sistema de produção é mais intensivo, como nos Chapadões e mesmo nas áreas irrigadas de Mato Grosso, Goiás, Tocantins, Minas Gerais, Bahia e Maranhão, com culturas como feijão, soja e algodoeiro.
Na cultura do algodão a mosca-branca pode ainda causar o problema de manchas nas fibras, com a ocorrência da fibra açucarada (caramelização), causando decréscimo na qualidade, principalmente no tipo. A sua dispersão pode ocorrer por ventos, o que a leva a grandes distancias. Apresenta distribuição desuniforme nas lavouras, devendo o técnico se atentar às bordaduras que porventura podem receber populações migrantes de outros talhões/culturas.
O monitoramento desta praga no início das infestações pode ter como foco a presença dos adultos e com o desenvolvimento da cultura deve ser dada atenção às ninfas e ovos da praga, em função da colonização. Nesta fase o auxílio de lupas de aumento de 20X ou mais devem estar dentro das ferramentas a serem levadas para o campo ou mesmo a coleta de folhas para se remeter aos laboratórios.
Com o advento da soja Bt tem se observado certo descuido em função da menor ocorrência de lagartas, levando o técnico e o produtor a uma falsa sensação de tranquilidade em relação às pragas, que acabam por atingir altas populações, sendo percebidas de forma tardiamente para o seu manejo.
Normalmente as medidas de controle para a mosca-branca devem ser intensificadas nos períodos quentes, quando ocorrem aumentos populacionais do inseto. O produtor e seu técnico, quando da presença comum da praga na região, ou mesmo na propriedade, devem traçar estratégias para diminuir a população. O manejo integrado desta importante praga faz necessário evitar o plantio escalonado de culturas pois isso tende a aumentar as populações nos plantios finais. Recomenda-se eliminar restos culturais, retirando plantas com viroses e hospedeiras, como daninhas. A utilização de armadilhas amarelas com óleo para monitoramento podem também diminuir a população.
O índice de controle para esta praga ainda faz parte de estudos de diversas instituições no Brasil. No entanto, vale destacar que em trabalhos na cultura da soja, a planta convivendo com uma média de 10 ninfas por folha levou a prejuízos na ordem de 12 sacas por hectare (TOMQUELSKI et al 2011).
A alternativa mais utilizada e prática é o controle químico no qual se faz uso de neonicotinóides como Acetamiprid, Clothiadinim, Imidacloprid, Thiacloprid e Thiametoxan, inseticidas de maior sucesso, utilizados com ação sobre adultos e formas jovens. No mercado existem ainda os reguladores de crescimento que atuam sobre as formas jovens como cyantraniliprole, pyriproxyfen, espiromesifeno e buprofezin com ação sobre ovos e ninfas. Novos inseticidas estão sendo desenvolvidos como misturas prontas (neonicotinóides+juvenóides) para o produtor, além de novas moléculas. É possível citar o dinotefuran, além do flupyradifurone, com excelente ação sobre ninfas.
O controle biológico é uma ferramenta interessante para o manejo, uma vez que existem poucos inseticidas ativos no controle desta praga. Beauveria bassiana é a espécie mais utilizada para o controle da mosca branca. Os inseticidas devem ser aplicados no final do dia e com umidade para um controle satisfatório do inseto.
Inseticidas biológicos também podem ser utilizados dentro de programas de manejo, intercalados com o químico ou mesmo associados, em determinados momentos. Vale ressaltar, neste caso, que o produtor deve consultar a empresa fabricante sobre a compatibilidade. Em alguns trabalhos desenvolvidos na Fundação Chapadão têm se observado eficiências interessantes.
O que se observa muitas vezes é a aplicação tardia para o controle desta praga, em alguns casos por falta de conhecimento ou má amostragem. Algumas aplicações em altas infestações podem não surtir o efeito desejado em função da tecnologia de aplicação e de outros fatores. Neste caso deve se analisar as sobras da praga no sistema, levando a reaplicações para o controle.
Quando da presença de cultivos sucessivos na propriedade, as aplicações devem ser realizadas na primeira cultura implantada no campo, a fim de evitar que os últimos talhões venham a apresentar altas infestações. Esta prática de atacar ovos e ninfas muitas vezes deve ser analisada como a quebra do ciclo da praga, evitando as novas gerações.
Nesta batalha, o conhecimento da mosca branca, a boa amostragem e definições de estratégias integradas de controle são ferramentas que auxiliam o produtor no controle e consequentemente propiciam o aumento da produtividade na cultura da soja.
Porcentagem de eficiência de alguns inseticidas na população de ninfas de B.tabaci biótipo B na cultura da soja. Fundação Chapadão. Chap.Sul/MS. 2016.G.39.
Artigo publicado na edição 215 da Cultivar Grandes Culturas, mês abril, ano 2017.
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