
A boscalida constitui um fungicida sistêmico desenvolvido pela BASF, pertencente à classe dos inibidores da succinato desidrogenase (SDHI).
Este princípio ativo apresenta eficácia comprovada contra amplo espectro de patógenos fúngicos em culturas como soja, milho, algodão, café e hortaliças.
Seu mecanismo de ação específico baseia-se na inibição da respiração mitocondrial, resultando em colapso energético e morte celular dos fungos alvo.
Características químicas e desenvolvimento
Nome comum (ISO): boscalida
Número CAS: 188425-85-6
Nome químico oficial: 2-cloro-N-(4'-clorobifenila-2-il)nicotinamida
Fórmula química bruta: C18H12Cl2N2O
Classe química: inibidor da succinato desidrogenase (SDHI) - Carboxamida
O desenvolvimento da boscalida teve início nos laboratórios da BASF durante a década de 1990, com a primeira síntese sendo divulgada em patentes depositadas pela empresa em 1995. Este desenvolvimento representou um marco na evolução dos fungicidas SDHI, uma vez que a classe anteriormente era dominada por carboxin, lançado em 1966 com espectro limitado principalmente para controle de fungos basidiomicetos.
A pesquisa e desenvolvimento da boscalida focaram na expansão do espectro de controle e aumento da potência em relação às gerações anteriores de SDHI. Os SDHIs com espectro e potência aumentados começaram a ser lançados a partir de 2003, período em que a boscalida entrou no mercado comercial. O código de desenvolvimento interno da BASF para este composto foi BAS 510F.
A estratégia de desenvolvimento da BASF visava criar um fungicida que pudesse controlar patógenos resistentes a outros grupos químicos, especialmente triazóis e benzimidazóis, que já apresentavam problemas de resistência em várias culturas. A boscalida foi posicionada como parte da segunda geração de fungicidas SDHI, oferecendo maior flexibilidade no manejo de resistência.
O processo de síntese desenvolvido pela BASF envolve uma reação complexa utilizando aminobifenil com cloreto de ácido 2-cloronicotínico. A preparação do aminobifenil requer duas etapas, incluindo uma reação de Suzuki catalisada por paládio. Esta complexidade sintética conferiu à BASF vantagem competitiva inicial, permitindo estabelecer posição de liderança no segmento de fungicidas SDHI de nova geração.
A comercialização da boscalida foi promovida como "a primeira química SDHI do mundo" em termos de eficácia comercial ampla, diferenciando-se das gerações anteriores mais limitadas. O histórico de uso demonstra eficácia consistente em sistemas agrícolas intensivos, consolidando a posição da BASF no mercado de fungicidas sistêmicos.
Mecanismo bioquímico de ação
A boscalida atua especificamente no complexo II da cadeia respiratória mitocondrial. O princípio ativo liga-se ao sítio de redução da ubiquinona, impedindo o funcionamento normal da succinato desidrogenase. Esta interferência bloqueia o ciclo do ácido tricarboxílico e a cadeia de transporte de elétrons.
O Comitê de Ação de Resistência a Fungicidas (FRAC) classifica a boscalida no grupo 7, código C2. Esta classificação indica risco moderado para desenvolvimento de resistência. O colapso energético celular resulta em inibição do crescimento micelial, redução da germinação de esporos e bloqueio da formação de estruturas reprodutivas.
Espectro de controle e aplicações
A boscalida demonstra eficácia contra diversos patógenos economicamente importantes. Em soja, controla Sclerotinia sclerotiorum (mofo-branco), Colletotrichum truncatum (antracnose) e Septoria glycines (mancha-parda). O algodão apresenta controle eficiente de Ramularia areola (mancha de ramulária). Em milho, reduz severidade de Cercospora zeae-maydis (cercosporiose) e Puccinia sorghi (ferrugem).
O cafeeiro representa cultura importante para aplicação contra Phoma tarda (mancha de Phoma) e Cercospora coffeicola (cercosporiose). Hortaliças beneficiam-se do controle de Botrytis cinerea (mofo-cinzento) e Alternaria solani (alternaria). Frutíferas apresentam redução de Monilinia fructicola (podridão-parda) e Venturia inaequalis (sarna).
As doses recomendadas variam entre 100-300 g ingrediente ativo por hectare, dependendo da cultura e pressão de doença. O intervalo de segurança oscila entre 7-21 dias conforme a cultura. O intervalo de reentrada varia de 24-48 horas após aplicação.
Manejo de resistência
Existem registros de resistência em populações de Botrytis cinerea em cultivos protegidos. Outros patógenos apresentam redução de sensibilidade após uso contínuo. O manejo adequado requer rotação obrigatória com fungicidas de grupos FRAC distintos, incluindo grupos 1, 3, 11 e multissítio (M).
O número máximo de aplicações não deve exceder 2-3 por ciclo de cultivo. Misturas com fungicidas multissítio como mancozebe e cobre reduzem pressão seletiva. O monitoramento de eficácia em campo permite detecção precoce de populações resistentes.
A estratégia de dosagem recomenda utilização da taxa plena registrada. Subdosagens favorecem seleção de isolados resistentes. Programas de manejo integrado incluem práticas culturais e monitoramento sistemático de sensibilidade.
Aspectos ambientais e toxicológicos
A classificação toxicológica situa a boscalida na Categoria 5 (improvável de causar dano agudo). A persistência no solo apresenta meia-vida entre 108 e 365 dias, dependendo das condições edafoclimáticas. O coeficiente de adsorção (Koc) de 1.590 mL/g indica mobilidade moderada.
O potencial de lixiviação classifica-se como baixo a moderado. Solos com maior teor de matéria orgânica apresentam maior retenção. O risco de contaminação de águas subterrâneas mantém-se limitado em solos argilosos. A toxicidade aquática exige cumprimento de faixas de proteção de corpos d'água.
Compatibilidade e interações
A boscalida apresenta compatibilidade com fungicidas multissítio, triazóis e estrobilurinas. Misturas permitidas incluem mancozebe, clorotalonil, tebuconazol, propiconazol, azoxistrobina e piraclostrobina. Fertilizantes foliares contendo micronutrientes demonstram compatibilidade adequada.
Produtos com reação alcalina (pH > 8,0) apresentam incompatibilidade. Óleos minerais em concentrações elevadas podem causar fitotoxicidade. Formulações contendo cobre em pH baixo requerem teste prévio de compatibilidade.
O potencial fitotóxico mantém-se baixo quando aplicado conforme recomendações técnicas. Condições de estresse hídrico severo ou temperaturas superiores a 30°C podem aumentar o risco de fitotoxicidade.
Eficácia e posicionamento estratégico
A temperatura ótima para máxima eficácia situa-se entre 15-25°C. Temperaturas acima de 30°C reduzem a atividade biológica. A umidade relativa entre 60-80% favorece absorção foliar. A resistência à lavagem estabelece-se após 2 horas da aplicação.
A estabilidade da calda mantém-se adequada em pH 6,0-7,0. Valores extremos de pH podem reduzir eficácia. A ação sistêmica e translaminar proporciona proteção prolongada. O período residual estende-se por 14-21 dias.
O posicionamento estratégico varia conforme a cultura. Em soja, aplicações preventivas nos estádios R1-R3 controlam mofo branco eficientemente. O algodão requer aplicação no início do florescimento para controle de ramulária. O milho beneficia-se de aplicação foliar no pendoamento.
O cafeeiro apresenta melhor resposta em aplicações pós-colheita para mancha de Phoma. Hortaliças em cultivo protegido requerem aplicações semanais preventivas. Frutíferas necessitam aplicação na floração e desenvolvimento de frutos.