
O mancozebe é um fungicida de contato pertencente ao grupo dos ditiocarbamatos, amplamente utilizado no controle preventivo de doenças fúngicas em diversas culturas agrícolas.
Caracteriza-se por sua ação multissítio, apresentando baixo risco de desenvolvimento de resistência em patógenos. É eficaz contra oídios, míldios, ferrugens, manchas foliares e antracnoses em culturas como batata, tomate, uva, citros, café, soja e hortaliças.
Sua aplicação requer manejo cuidadoso devido às restrições toxicológicas e ambientais, sendo classificado como produto de classe II (altamente tóxico).
Identificação química
Nome comum (ISO): Mancozeb
Nome químico oficial: complexo de coordenação de íon manganês com íon zinco de etilenobis (ditiocarbamato)
Fórmula química bruta: C8H12MnN4S8Zn
Número CAS: 8018-01-7
Classe química: Ditiocarbamato
Estrutura molecular:
- Peso molecular: 541,1 g/mol
- Complexo organometálico contendo manganês e zinco coordenados com ligantes ditiocarbamato
Histórico: Desenvolvido pela Rohm and Haas Company na década de 1960, o mancozebe foi introduzido no mercado agrícola em 1961. Representa uma evolução dos fungicidas à base de enxofre e cobre, oferecendo maior eficácia e espectro de controle. No Brasil, foi registrado pela primeira vez na década de 1970, tornando-se um dos fungicidas mais utilizados na agricultura nacional.
Modo de ação
Mecanismo bioquímico específico: mancozebe atua como fungicida multissítio, interferindo em múltiplas vias metabólicas dos fungos patogênicos. Sua principal ação ocorre através da inibição de enzimas contendo grupos sulfidrilas (-SH), essenciais para o metabolismo energético e síntese proteica dos fungos.
Alvo bioquímico: grupos sulfidrilas de cisteína em enzimas críticas como piruvato desidrogenase, succinato desidrogenase, aconitase, enzimas do ciclo de Krebs.
Grupo FRAC: M (Multissítio) - Código M3
Consequências fisiológicas no patógeno: a inibição enzimática resulta em comprometimento da respiração celular, síntese de ATP, formação da parede celular e divisão nuclear. Isso leva à morte celular do patógeno por colapso metabólico generalizado, impedindo a germinação de esporos e o crescimento de hifas.
Espectro de Controle
Alguns exemplos de fungos controlados por mancozeb, divididos por culturas...
Batata (Solanum tuberosum): requeima (Phytophthora infestans), pinta-preta (Alternaria solani). Dose: 1,5-3,0 kg p.c./ha
Tomate (Solanum lycopersicum): requeima (Phytophthora infestans), pinta-preta (Alternaria solani), septoriose (Septoria lycopersici). Dose: 2,0-3,0 kg p.c./ha
Uva (Vitis vinifera): míldio (Plasmopara viticola), antracnose (Elsinoe ampelina). Dose: 2,0-4,0 kg p.c./ha
Café (Coffea arabica): ferrugem (Hemileia vastatrix), cercosporiose (Cercospora coffeicola). Dose: 2,5-4,0 kg p.c./ha
Soja (Glycine max): ferrugem-asiática (Phakopsora pachyrhizi), mancha-alvo (Corynespora cassiicola). Dose: 1,5-2,5 kg p.c./ha
Intervalos de segurança:
- PHI (Pré-colheita): 7-21 dias (varia conforme cultura)
- REI (Reentrada): 24-48 horas após aplicação
Gerenciamento da Resistência
Histórico de resistência: devido ao seu modo de ação multissítio, o mancozeb apresenta baixo risco para desenvolvimento de resistência. Casos documentados de resistência são raros, limitando-se a algumas populações de Plasmopara viticola na Europa após uso intensivo por décadas. No Brasil, não há relatos confirmados de resistência ao mancozeb em condições de campo.
Recomendações de manejo:
- Rotação com fungicidas de diferentes grupos FRAC (triazóis - FRAC 3, estrobilurinas - FRAC 11, SDHI - FRAC 7)
- Uso em mistura com fungicidas sítio-específicos para reduzir pressão de seleção
- Aplicação preventiva respeitando intervalos recomendados
- Monitoramento constante da eficácia em campo
Estratégias de dose: recomenda-se o uso de doses plenas (taxa alta) em condições de alta pressão de doença, evitando subdoses que podem favorecer seleção de isolados menos sensíveis.
Segurança e Impacto Ambiental
Classificação toxicológica: classe II - altamente tóxico (faixa amarela)
Persistência no solo:
- Meia-vida (DT50): 7-30 dias em condições tropicais
- Koc: 1.000-5.000 mL/g (adsorção moderada a forte)
- Degradação por hidrólise e ação microbiana
Potencial de lixiviação: baixo a moderado risco de contaminação de águas subterrâneas devido à adsorção ao solo e degradação relativamente rápida. Maior preocupação está na formação de metabólitos como ETU, que apresenta maior mobilidade.
Risco para organismos não-alvo:
- Abelhas: moderadamente tóxico (LD50 oral > 100 μg/abelha)
- Peixes: altamente tóxico (LC50 96h: 1-10 mg/L para várias espécies)
- Organismos aquáticos: requer cuidados especiais próximo a corpos d'água
- Aves: moderadamente tóxico (LD50 > 2.000 mg/kg)
Interações e Compatibilidades
Misturas possíveis: fungicidas triazólicos (tebuconazol, propiconazol); estrobilurinas (azoxistrobina, piraclostrobina); fungicidas cúpricos em baixas concentrações; adjuvantes não iônicos
Misturas proibidas ou problemáticas: produtos alcalinos (pH > 8,0) causam decomposição; óleos minerais em altas concentrações; fertilizantes foliares com alta concentração de ferro
Fitotoxicidade: rara quando usado em doses recomendadas, mas pode ocorrer em:
- Aplicações em condições de estresse hídrico severo
- Mistura com óleos em altas temperaturas (> 30°C)
- Sobreposição de aplicações com intervalos muito curtos
Eficácia Agronômica e Posicionamento Estratégico
Condições que afetam a eficácia:
- Chuva: lavagem após 2-4 horas reduz significativamente a eficácia
- Temperatura: eficácia reduzida acima de 35°C devido à volatilização
- Umidade: maior eficácia em condições de alta umidade relativa
- pH da calda: ótimo entre 6,0-7,0
Vantagens competitivas: amplo espectro de controle; baixo risco de resistência; ação residual adequada (7-14 dias); compatibilidade com programas integrados; custo relativamente baixo.
Limitações: ausência de ação curativa ou erradicante; restrições toxicológicas e ambientais; necessidade de reaplicações frequentes; limitações climáticas para aplicação.
Posicionamento estratégico por sistema:
- Soja - uso preventivo no início do período reprodutivo (R1-R3), alternado com triazóis e estrobilurinas para manejo de ferrugem asiática.
- Milho - aplicação preventiva em V8-VT para controle de helmintosporiose e cercosporiose, especialmente em sistemas de alta tecnologia.
- Algodão - posicionamento no terço médio da cultura para controle de ramulária e alternária, em rotação com SDHI.
- Café - uso preventivo antes do período chuvoso para controle de ferrugem, intercalado com triazóis sistêmicos.
- Cana-de-açúcar - aplicação em mudas e plantas jovens para controle de ferrugem e helmintosporiose.
- Hortaliças - base dos programas preventivos, especialmente para controle de míldios e requeimas em solanáceas e cucurbitáceas.