
A azoxistrobina é fungicida sistêmico de amplo espectro, pertencente à classe das estrobilurinas. Foi desenvolvida pela Imperial Chemical Industries (ICI), que em 1993 tornou-se Zeneca e passou a ser Syngenta em 2000.
Breve histórico
Em 1977, grupos de pesquisa acadêmica publicaram detalhes sobre dois novos antibióticos antifúngicos que haviam isolado do fungo basidiomiceto Strobilurus tenacellus. Os primeiros produtos naturais parentais, denominados estrobilurinas A e B, demonstraram atividade excepcional contra leveduras e fungos filamentosos, despertando imediato interesse da comunidade científica internacional.
Contudo, as estrobilurinas naturais apresentavam uma limitação crítica que impedia sua aplicação comercial direta: a extrema fotolabilidade. Os compostos se degradavam rapidamente quando expostos à luz solar, tornando-os inadequados para aplicações agrícolas práticas em campo aberto. Esta descoberta iniciou um programa de pesquisa e desenvolvimento que se estenderia por duas décadas. Tudo na busca pela otimização estrutural que mantivesse a potente atividade biológica enquanto conferisse estabilidade fotoquímica adequada.
O processo de desenvolvimento da azoxistrobina ilustra a complexidade inerente à criação de produtos fitossanitários modernos. Durante este período, centenas de derivados estruturais foram sintetizados e testados, em um processo iterativo de otimização molecular. O composto final foi a azoxistrobina.
A azoxistrobina foi a primeira estrobilurina comercializada, estabelecendo um novo paradigma no controle de doenças vegetais.
Atualmente, as estrobilurinas constituem ramo de fungicidas amplamente usado mundialmente, incluindo derivados como cresoxim-metílico, fluoxastrobina, picoxistrobina, piraclostrobina, piraoxistrobina e trifloxistrobina.
Características químicas
A azoxistrobina, cujo nome químico oficial é metil (E)-2-{2-[6-(2-cianofenoxi)pirimidin-4-iloxi]fenil}-3-metoxiacrilato, apresenta fórmula molecular C₂₂H₁₇N₃O₅ e peso molecular de 403,39 g/mol.
Registrada sob o número CAS 131860-33-8, esta molécula incorpora elementos estruturais que conferem suas propriedades biológicas únicas.
A estabilidade fotoquímica da azoxistrobina, uma das principais melhorias em relação aos compostos naturais originais, deriva de modificações estruturais específicas que protegem a molécula da degradação por radiação ultravioleta. Esta característica é fundamental para a eficácia do produto em condições de campo, onde a exposição solar intensa é inevitável.
Mecanismo de ação bioquímico
O modo de ação da azoxistrobina fundamenta-se em um mecanismo bioquímico altamente específico e letal para organismos fúngicos.
O princípio ativo atua como um potente inibidor da respiração mitocondrial, exercendo sua ação através da ligação específica ao sítio Qo (quinol oxidase externa) do complexo III da cadeia de transporte de elétrons mitocondrial.
O mecanismo foi classificado pelo Comitê de Ação contra Resistência a Fungicidas (FRAC) como Grupo 11.
O processo bioquímico inicia-se quando a molécula de azoxistrobina se liga ao sítio Qo do complexo III, competindo com o substrato natural ubiquinol pela mesma posição de ligação. Uma vez estabelecida esta ligação, a azoxistrobina impede fisicamente a transferência de elétrons do ubiquinol para o citocromo c₁, interrompendo o fluxo normal de elétrons na cadeia respiratória. Esta interrupção desencadeia uma cascata de eventos bioquímicos devastadores para o organismo fúngico.
A consequência imediata do bloqueio da cadeia respiratória é a impossibilidade de criação do gradiente de prótons transmembrana necessário para a síntese de ATP pela ATP sintase. Esta interrupção resulta em severa depleção energética celular, comprometendo todos os processos metabólicos dependentes de energia. Simultaneamente, a interrupção do fluxo de elétrons leva ao acúmulo de intermediários reativos, gerando espécies reativas de oxigênio que causam dano oxidativo extenso às estruturas celulares.
As consequências fisiológicas deste mecanismo manifestam-se em múltiplos níveis organizacionais do patógeno.
No nível celular, observa-se cessação imediata da respiração aeróbica e colapso do potencial de membrana mitocondrial.
No nível de crescimento, há inibição completa da germinação de esporos e paralização do crescimento de hifas.
No nível reprodutivo, ocorre bloqueio da formação de estruturas reprodutivas como conídios e esporângios.
O resultado final é a morte celular por privação energética crítica, que tipicamente ocorre entre 2 a 6 horas após exposição ao princípio ativo.
A seletividade da azoxistrobina para fungos versus plantas superiores constitui um aspecto fundamental de sua segurança agronômica. Esta seletividade deriva das diferenças estruturais significativas nos complexos mitocondriais entre estes grupos de organismos, permitindo que o fungicida exerça ação letal sobre patógenos sem comprometer significativamente a fisiologia da planta hospedeira.
Eficácia agronômica
A versatilidade da azoxistrobina manifesta-se através de seu amplo espectro de aplicação, abrangendo culturas extensivas, fruticultura, olericultura e plantas ornamentais.
Em culturas extensivas como soja, o produto demonstra eficácia excepcional no controle de doenças críticas como ferrugem-asiática (Phakopsora pachyrhizi), oídio (Microsphaera diffusa), mancha-alvo (Corynespora cassiicola), cercosporiose (Cercospora kikuchii) e antracnose (Colletotrichum truncatum), utilizando doses que variam entre 100 a 150 g de ingrediente ativo por hectare.
Na cultura do milho, a azoxistrobina proporciona controle efetivo de ferrugem-polissora (Puccinia polysora), ferrugem-comum (Puccinia sorghi), helmintosporiose (Exserohilum turcicum), cercosporiose (Cercospora zeae-maydis) e mancha de phaeosphaeria (Phaeosphaeria maydis), com doses recomendadas entre 60 a 100 g i.a./ha.
Em trigo, o espectro de controle inclui ferrugem da folha (Puccinia triticina), ferrugem do colmo (Puccinia graminis), oídio (Blumeria graminis), septoriose (Septoria tritici) e mancha-amarela (Pyrenophora tritici-repentis), utilizando doses de 100 a 125 g i.a./ha.
A fruticultura representa outro segmento de grande importância para a azoxistrobina. Em citros, o produto controla eficazmente pinta-preta (Phyllosticta citricarpa), melanose (Diaporthe citri), sarna (Elsinoe fawcetti) e podridão-parda (Phytophthora spp.), com doses entre 75 a 100 g i.a./ha.
Na viticultura, demonstra excelente performance contra míldio (Plasmopara viticola), oídio (Erysiphe necator), podridão-cinzenta (Botrytis cinerea) e antracnose (Elsinoe ampelina), utilizando doses de 80 a 120 g i.a./ha.
A olericultura também se beneficia significativamente da versatilidade da azoxistrobina. Em tomate, o produto controla pinta-preta (Alternaria solani), septoriose (Septoria lycopersici), antracnose (Colletotrichum spp.) e oídio (Leveillula taurica), com doses de 100 a 150 g i.a./ha.
Em batata, é eficaz contra requeima (Phytophthora infestans), pinta-preta (Alternaria solani) e sarna-prateada (Helminthosporium solani), utilizando doses de 75 a 125 g i.a./ha.
Resistência e estratégias de manejo
O sucesso comercial da azoxistrobina trouxe consigo um desafio significativo: o desenvolvimento de resistência por parte dos patógenos alvo.
A resistência a estrobilurinas tem sido documentada globalmente desde o início dos anos 2000, representando uma das principais ameaças à sustentabilidade desta classe de fungicidas.
Os primeiros casos significativos foram reportados na Europa entre 2000 e 2005, afetando Blumeria graminis (oídio dos cereais) na Alemanha, Reino Unido e França, além de Plasmopara viticola (míldio da videira) na França, Alemanha e Itália.
Na América do Norte, casos de resistência foram documentados entre 2001 e 2008, particularmente em Blumeria graminis f. sp. tritici e Podosphaera xanthii (oídio de cucurbitáceas) nos Estados Unidos.
No Brasil, a resistência tornou-se uma preocupação crescente a partir de 2008, com casos confirmados em Pyricularia oryzae (brusone do arroz) no Rio Grande do Sul e Santa Catarina; Phakopsora pachyrhizi (ferrugem asiática da soja) no Mato Grosso e Paraná; e Cercospora zeae-maydis (cercosporiose do milho) em Minas Gerais e São Paulo.
O mecanismo primário de resistência envolve mutações no gene cytb, principalmente a substituição G143A (glicina por alanina na posição 143), que confere alto nível de resistência, frequentemente superior a 100 vezes a dose normal eficaz. Esta resistência qualitativa representa um desafio significativo, uma vez que compromete completamente a eficácia do produto quando presente.
As estratégias de manejo da resistência fundamentam-se em princípios científicos sólidos e requerem implementação rigorosa.
A rotação de grupos FRAC constitui a base do manejo, alternando azoxistrobina com triazóis (Grupo 3) como tebuconazol, propiconazol e cyproconazol, benzimidazóis (Grupo 1) como carbendazim e tiofanato-metílico, e SDHI (Grupo 7) como boscalida, fluopyram e fluxapyroxad.
A incorporação de fungicidas multissítios como cobre, enxofre, clorotalonil e mancozebe adiciona uma camada extra de proteção contra o desenvolvimento de resistência.
A limitação rigorosa do número de aplicações representa outra estratégia fundamental, estabelecendo máximo de duas aplicações por safra para culturas anuais e limitando a 33% das aplicações totais em culturas perenes. A implementação de "janelas" sem aplicação de estrobilurinas entre safras permite que populações sensíveis se restabeleçam, contribuindo para a sustentabilidade a longo prazo.
Interações e compatibilidades técnicas
A azoxistrobina demonstra compatibilidade com fungicidas triazólicos como tebuconazol, propiconazol, cyproconazol e difenoconazol, além de benzimidazóis como carbendazim e tiofanato-metílico. Esta compatibilidade facilita a implementação de programas de rotação e mistura essenciais para o manejo da resistência.
A compatibilidade com inseticidas organofosforados, piretróides, neonicotinóides e diamidas permite a otimização de aplicações, reduzindo custos operacionais e minimizando impactos ambientais através da redução do número de pulverizações.
Contudo, certas incompatibilidades devem ser observadas rigorosamente, particularmente com produtos alcalinos (pH > 8,0), óleos minerais em concentrações elevadas e produtos cúpricos em altas doses.
A fitotoxicidade da azoxistrobina é geralmente baixa nas doses recomendadas, embora condições específicas possam aumentar o risco.
Estresse hídrico severo, temperaturas extremas superiores a 35°C e aplicações em horários inadequados podem predispor as culturas a sintomas fitotóxicos.
Algumas variedades de videira podem apresentar sintomas de clorose, enquanto cucurbitáceas jovens podem experimentar retardo temporário de crescimento.
Eficácia e posicionamento
A eficácia agronômica da azoxistrobina é influenciada por múltiplos fatores ambientais e operacionais que devem ser considerados para otimização dos resultados. A temperatura representa um fator crítico, com eficácia máxima observada entre 15 a 30°C e redução significativa acima de 35°C. A umidade relativa superior a 70% favorece a absorção e redistribuição do produto, enquanto o período mínimo de 2 a 4 horas livre de chuva pós-aplicação é essencial para eficácia adequada.
As condições de aplicação também influenciam significativamente os resultados. O pH da calda deve ser mantido entre 5,5 a 7,0 para estabilidade ótima, enquanto água com baixa dureza (< 200 ppm CaCO₃) contribui para melhor performance. O volume de aplicação deve ser ajustado conforme a cultura, variando de 100 a 200 L/ha para culturas extensivas e 300 a 600 L/ha para fruticultura.
O timing de aplicação constitui aspecto fundamental do posicionamento estratégico. A azoxistrobina demonstra máxima eficácia quando aplicada preventivamente, antes da infecção dos patógenos. Contudo, mantém atividade curativa significativa até 72 horas após infecção inicial e atividade erradicante limitada a 48 horas pós-infecção.