No período da safrinha é importante contar com planejamento adequado para o bom uso das áreas de cultivo
14.07.2022 | 15:21 (UTC -3)
No
período da safrinha é importante contar com planejamento adequado para o bom
uso das áreas de cultivo. Deixar as lavouras em pousio desponta como a pior
opção. Outro fator fundamental reside no papel do aumento da biodiversidade
como alternativa para melhoria do manejo cultural no sistema de produção
soja/milho/algodão.
A safrinha, de milho ou de
sorgo, que surgiu como alternativa às culturas de inverno nas regiões menos
frias, principalmente em substituição ao trigo, atualmente ultrapassa, tanto em
área plantada, como na média da produtividade, a cultura de verão ou da safra.
Essa denominação de safrinha se deve mais ao potencial de produtividade, que é
menor nesse caso, que propriamente à área cultivada. Assim, o cultivo do milho
em sucessão à soja tornou-se a dobradinha perfeita em muitas regiões, pois a
soja fixa o nitrogênio (cerca de 1 kg de N/saca colhida) tão demandado pelo
milho e este aumenta a matéria orgânica do solo pelo resíduo deixado na forma
de palha. Portanto, nessas regiões sobram poucas alternativas para a rotação
dessas culturas. Por outro lado, a rotação de culturas com diferentes espécies
vegetais é uma prática fundamental para o aumento da biodiversidade, por
reduzir os problemas fitossanitários devido a um melhor equilíbrio biológico
(no ambiente acima e abaixo da superfície do solo), aumentar a quantidade de matéria
orgânica e, consequentemente, dar sustentabilidade à produção.
O atraso das chuvas ocorrido
nesse ano e os preços baixos do milho na última safra levaram a uma redução da
área semeada com o milho verão e aumento da área cultivada com a soja. Esses
fatos devem trazer algumas dúvidas ao produtor quanto às opções de cultivo na
safrinha. Outro fator que tende a afetar a decisão do produtor para a próxima
safra tem sido a alta incidência, em algumas regiões, de doenças cujos
patógenos são transmitidos pela cigarrinha-do-milho. Quanto a ocorrência de
outras pragas e doenças, o produtor deve estar atento ao monitoramento
periódico, para interferir no sistema sempre que necessário, mas seguindo as
recomendações baseadas nos níveis de ação. A incidência de lagartas, tanto na
soja, como no milho verão, não despertou maiores preocupações, em grande parte
pelas condições favoráveis do clima e pela atividade eficiente dos eventos Bt
utilizados nos últimos anos. É importante registrar que o manejo eficaz das
pragas ao longo dos anos tende a baixar a população geral de pragas na região. Também,
nenhum novo registro de resistência de inseto às tecnologias Bt a campo foi
documentado. A adoção das boas práticas agronômicas como: a dessecação
antecipada, o uso de sementes certificadas, o tratamento de sementes, o manejo
eficaz das plantas daninhas/tigueras e, principalmente, a inclusão das áreas de
refúgio nas culturas Bt e a realização
do monitoramento periódico (que deve ser iniciado mesmo antes da semeadura) constitui
a principal estratégia para o manejo fitossanitário efetivo.
Nas áreas semeadas com o
milho safrinha ou a serem cultivadas, além das observações já apresentadas,
deve-se reiterar o tratamento de sementes com inseticidas de ação sistêmica, como
aqueles à base de neonicotinoides para o controle de sugadores. Além disso, é indispensável
monitorar a incidência de cigarrinhas logo após a emergência das plantas para
reduzir a incidência de viroses e enfezamentos no milho. Nas áreas com
histórico de incidência dessas doenças ou onde a janela ideal para o plantio do
milho safrinha já tenha passado, uma alternativa é a utilização da safrinha de
sorgo, pois, além dele não ser afetado pelas doenças, por não ser hospedeiro da
cigarrinha, reduz sua população para os plantios na próxima safra. Além disso,
o sorgo é bem mais tolerante ao estresse hídrico, típico nos períodos de
veranico que ocorrem nos plantios mais tardios.
Caso não haja a
possibilidade de aproveitar toda ou parcialmente a área com uma cultura
comercial na safrinha (milho, algodão ou sorgo), ela não deve ser deixada em
pousio, pois essa é a pior opção. Nas áreas em pousio, o crescimento de plantas
tiguera constitui uma das principais ameaças ao sucesso da próxima safra, pela
sobrevivência de patógenos e pragas na área. Neste caso, surge a oportunidade
para se fazer uma melhoria da qualidade e quantidade de palhada para a próxima
safra, utilizando uma ou mais culturas de cobertura. O aumento de custo, em
função das novas tecnologias introduzidas no sistema de produção, e o crescimento
dos problemas no campo como, por exemplo, a exaustão da matéria orgânica do
solo e consequente maior incidência de nematoides, além do aumento na
complexidade do manejo fitossanitário, têm preocupado os produtores.
A rotação de culturas é uma
prática milenar, sempre utilizada com sucesso na agricultura convencional. Essa
prática é considerada uma forma eficiente de reduzir os impactos ambientais
provocados pela monocultura, melhorando as condições físicas, químicas e
biológicas do solo. Além disso, a rotação melhora as condições ambientais acima
do nível do solo, o que promove um manejo mais eficiente das plantas daninhas,
doenças e pragas, principalmente aquelas específicas para cada cultura
comercial.
Embora a rotação de culturas
seja uma prática bastante benéfica para o sistema de produção, nem sempre é
factível. A modernização das atividades agrícolas é cada vez mais necessária,
com a adoção de novas tecnologias e grandes investimentos em infraestrutura
(máquinas, equipamentos e insumos) e treinamento da equipe operacional
(“know-how”), para tornar a atividade mais competitiva, com ganhos em
produtividade e em escala na produção. Considerando esses e outros fatores, as
opções de culturas, economicamente viáveis para fazer rotação, ficam muito restritas.
Por exemplo, na região Centro Oeste do Brasil predomina o cultivo da soja no
verão e a sucessão com o milho safrinha ou algodão. Portanto, as opções para o
agricultor são realmente escassas e a solução para diversificar as espécies
cultivadas na área é a rotação das culturas de cobertura, aumentando assim a
biodiversidade no agro ecossistema.
Muitos produtores ainda não
perceberam os benefícios das culturas de cobertura e insistem em deixar as
áreas em pousio. Isto porque boa parte deles mantêm pouco registro sobre suas
atividades/resultados na propriedade. Assim, as pequenas perdas ao longo do
tempo ou os ganhos a médio e longo prazos ficam difíceis de serem percebidos em
função das flutuações comerciais e ambientais. Há resultados de pesquisa indicando
que o cultivo do solo com culturas de cobertura modifica a sua estrutura, deixando
seu perfil comparável ao da mata nativa. Então, um avanço no uso das culturas
de cobertura, introduzindo sua rotação, demanda ainda maior esforço. Portanto, como
os benefícios da rotação das culturas de cobertura só tem um retorno a médio e
longo prazos, a sua demonstração ao produtor deve ser muito convincente, para
que essa prática seja amplamente adotada.
Um exemplo concreto reside
no que vem sendo realizado na Fazenda Capuava em Lucas do Rio Verde, Mato
Grosso, pelo engenheiro Agrônomo José Eduardo de Macedo Soares Junior. A diversificação
e consorciação das culturas de cobertura no agro ecossistema promovem muitos
benefícios para o produtor e restauram a sustentabilidade agrícola e ambiental.
No curto e médio prazos, ela reduz a incidência de pragas, doenças e plantas
daninhas, ao mesmo tempo em que aumenta o teor de matéria orgânica do solo,
melhorando tanto a fertilidade, como a retenção de umidade, reduzindo os estresses
devido aos períodos de estiagem. A utilização de plantas de cobertura com sistema
radicular de alta capacidade de penetração no solo recicla os nutrientes minerais
reduzindo a lixiviação, melhora a penetração da água da chuva por aumentar a
porosidade do solo, reduzindo compactação, erosão, e pereniza as nascentes entre
vários outros benefícios.
O produtor, ao realizar a
transição do seu sistema de produção, com ou sem o uso da monocultura de
cobertura, para a rotação de culturas de cobertura, deve estar ciente que é um
processo gradual e deve estar atento a vários fatores. Paulatinamente vai
aumentar a diversidade biológica, tanto dos organismos que vivem na superfície,
como no solo. Muitos desses organismos são benéficos e têm importante papel em
manter o equilíbrio biológico alimentando-se de pragas importantes para a
cultura comercial. O maior teor de matéria orgânica no solo permite a
sobrevivência de microrganismos patogênicos para as pragas subterrâneas como,
por exemplo, os nematoides. Portanto, a adoção de práticas que protejam os
organismos benéficos no ambiente leva à redução no uso de defensivos no campo.
Cuidados para garantir
os benefícios e o sucesso do novo sistema
Monitorar tanto
as culturas comerciais como as de cobertura para pragas, doenças, plantas
daninhas e organismos benéficos (predadores, parasitoides e patógenos), bem
como o perfil do solo para avaliar a saturação do alumínio e profundidade de
raízes.
A adoção de
métodos de controle das pragas deve obedecer ao nível de ação estabelecido pela pesquisa para cada praga e
cultura, evitando assim as pulverizações desnecessárias, ou seja, aquelas que
não trazem benefício econômico e que podem promover um desequilíbrio causador
de explosão da população de outras pragas.
Caso o
monitoramento da praga indique controle, tratar com produtos específicos e com
maior eficiência para cada grupo de praga e monitorar a sua atividade, com
intervalo necessário para avaliar os resultados e o impacto no ciclo biológico da
praga.
Consorciar algumas
culturas de cobertura com culturas comerciais, oferecendo plantas alternativas
como alimento às pragas, o que reduz os danos na cultura comercial, aumentando
e mantendo a população dos organismos benéficos na área.
As pragas que atacam as
culturas durante a emergência são o grande desafio dos produtores que começam a
rotação das culturas de cobertura, especialmente aqueles que utilizam uma única
espécie de planta de cobertura. No inicio, a incidência de lagartas
cortadeiras, lesmas, larva-arame e outras pragas desafiam as novas práticas,
até que a rotação de diferentes culturas de cobertura começe a produzir
efeitos.
Mesmo nos sistemas de
plantio direto, onde há pouca palha, as glebas de encosta podem sofrer erosão
devido à compactação do solo pelo baixo teor de matéria orgânica, reduzindo
drasticamente a produtividade. Assim, inicialmente pode ser necessária uma
subsolagem. Mas só isso pode não ser suficiente e outras práticas talvez sejam
necessárias para manter as condições do solo favoráveis. Paulatinamente o
produtor vai descobrindo que a rotação e consorciação das culturas de cobertura
trazem maior diversidade de plantas na
área cultivada, operando uma verdadeira revolução para o seu sistema de
produção, reduzindo o uso de defensivos para o controle de pragas, doenças e
plantas daninhas, ao mesmo tempo em que aumenta a eficiência das culturas na
utilização dos fertilizantes, recuperando ou aumentando a sua produtividade. Além
disso, o aumento do teor de matéria orgânica no perfil do solo contribui para a
correção da acidez nas camadas mais profundas, o que permite maior
desenvolvimento do sistema radicular das culturas comerciais.
No sistema de produção das
culturas anuais, predominam as culturas comerciais soja, milho e algodão. O arroz,
feijão e sorgo, esporadicamente também são utilizados. Além dessas culturas, dependendo
da região são utilizadas, ainda, culturas de cobertura para produzir palhada para
o plantio direto. Como as opções de culturas comerciais para rotação são
restritas, a rotação planejada de culturas de cobertura torna-se essencial para
diversificar o agro ecossistema durante as estações do ano.
No sistema de plantio direto,
tão importante quanto a quantidade (camada de palha) é a qualidade da matéria
orgânica cobrindo o solo. Para manter uma boa relação carbono/nitrogênio (C/N)
na matéria orgânica do solo é fundamental a diversificação das fontes de palha,
pois as de gramíneas têm maior teor de carbono e as de leguminosas
(proporcionalmente) de nitrogênio. Assim, a combinação de espécies de
diferentes grupos melhora a relação C/N. A camada de palha deve ser espessa o
suficiente para proteger a superfície do solo do impacto mecânico das gotas de
chuva, evitando a desagregação das partículas do solo, bem como sua proteção
contra a dessecação pela incidência direta da luz solar. A abundância de
matéria orgânica, retendo um maior teor de umidade, permite inclusive uma maior
diversidade de organismos secundários da fauna e flora do solo, aumentando
assim a biodiversidade. Portanto, tanto a quantidade quanto a diversidade de
espécies de plantas para serem utilizadas como cobertura são igualmente
importantes.
Os ganhos são progressivos
com a incorporação de fitomassa no perfil do solo. O aprofundamento das raízes
no perfil do solo trás uma série de benefícios, como discutido anteriormente. Para
isso, a neutralização do alumínio do solo nas camadas mais profundas é
fundamental. Além dos corretivos de solo, a matéria orgânica tem papel
relevante nesse processo. A fitomassa produzida pelas raízes é até mais
importantes que a produzida pela parte aérea das plantas. Experimentos
conduzidos com braquiária têm demonstrado que a fitomassa das raízes resulta em
maior ganho em produtividade que a da parte aérea da planta, quando avaliados
separadamente. Ainda, cada cultura tem um sistema radicular com diferentes
capacidades de penetração no solo. À medida que vai se rotacionando as culturas
de cobertura, vai se aprofundando o perfil do solo explorado pelo sistema
radicular das plantas comerciais, podendo passar de menos de 80 cm para mais de
2,5 m de profundidade. Obviamente, plantas com um sistema radicular mais profundo
terão seu potencial produtivo bastante aumentado.
Há fortes evidências que o
atual gargalo para o aumento da produtividade das culturas anuais em muitas
propriedades está na qualidade física do solo, pois o plantio direto vem sendo
praticado com pouca palhada e geralmente uma única espécie vegetal. Assim, resta
um baixo teor de matéria orgânica, que limita o estabelecimento da população
ideal de plantas, o aprofundamento das raízes e reduz a tolerância das plantas
ao déficit hídrico por explorar apenas as camadas superficiais do solo, além de
aumentar o acamamento. Aparentemente, a principal vantagem dos solos de
cerrados, que reside na profundidade, tem sido pouco aproveitada pela maioria
dos produtores.
Artigo publicado na edição 225 da Cultivar Grandes Culturas, mês fevereiro, ano 2018.
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