Sem perda

Veja as principais causas e como diminuir os prejuízos em batata, de forma a preservar seu valor comercial.

10.11.2015 | 21:59 (UTC -3)

O assunto perdas pós-colheita sempre suscita interesse de toda a sociedade brasileira, mas geralmente é tratado superficialmente e de forma emocional. Para a batata, as perdas devem ser consideradas dentro de um contexto maior, onde estão incluídos o sistema de manuseio, o mercado e o consumidor.

Perda é um termo relativo, e pode ser conceituado e considerado de várias maneiras de acordo com cada segmento do sistema de produção da batata. As perdas podem ser físicas, pela redução na quantidade do produto disponível, e econômicas, pela diminuição de seu valor comercial. Para o produtor, pode ser considerada como perda toda condição que reduza a produtividade ou a qualidade dos tubérculos, como a incidência de pragas e doenças, clima desfavorável, entre outros, e inclusive os tubérculos não colhidos no campo. Para o beneficiador, pode-se considerar como perda a quantidade de tubérculos descartados por defeitos e o percentual do produto classificado nos tipos de menor valor comercial. Na comercialização, o descarte é a principal causa de perdas, sendo também importantes as oscilações de preços de mercado que afetam a demanda da batata. Para o consumidor, a perda pode ser a redução na qualidade nutricional do produto ou a deterioração dos tubérculos no armazenamento doméstico.

As estimativas ou levantamentos de perdas pós-colheita refletem situações específicas no tempo e no espaço, como um retrato instantâneo, e por esta razão devem ser considerados sob esta perspectiva. Esta visão é mais facilmente constatada quando se considera uma situação prática, como por exemplo a determinação das perdas pós-colheita em batata lavada e não lavada em Brasília (DF) em 1991, onde comparou-se duas cultivares (Bintje e Radosa) em duas épocas diferentes, e determinou-se 10,3% e 93,0% de perdas para a batata não lavada e lavada da cv. Bintje após 30 dias e de 0% e 3,8% para a cv. Radosa após 16 dias. Neste caso, fica claro que o processo de lavagem pode aumentar a incidência de deterioração em relação aos tubérculos não lavados, mas é difícil prever a quantidade porque depende de uma série de fatores, como cultivar, época do ano, oscilações climáticas, incidência de pragas e doenças, alterações no mercado, etc. Ou seja, as porcentagens obtidas devem ser vistas com reservas, como uma indicação ou tendência e não como valores absolutos. Certamente o mesmo levantamento realizado em outra região ou época produziria percentuais diferentes.

Considerando-se estas limitações dos levantamentos de perdas, os resultados podem ser aproveitados para se fazer uma série de inferências sobre o sistema de produção. No Brasil, foram efetuados alguns levantamentos de perdas pós-colheita em produtos hortícolas, com percentuais muito diferentes entre si (Tabela 1 -

). A maior parte destes levantamentos foi efetuado através de questionários, e não através de uma análise direta, qualitativa ou quantitativa. O mais importante nestes levantamentos é a identificação das prováveis causas ou a descrição das condições em que ocorrem. De acordo com todos estes levantamentos, pode-se estimar que as perdas em batata no Brasil podem variar de 0% a 100%, dependendo da cultivar, beneficiamento, local, época do ano, classe do produto, etapa da cadeia considerada e outros fatores mais. As causas das perdas são diversas, e incluem deterioração dos tubérculos causada por patógenos, defeitos na aparência, como injúrias mecânicas e lesões de fungos e bactérias, e a demora na venda do produto no varejo.

Os tubérculos de batata podem apresentar diferentes tipos de problemas que afetam sua aparência e conseqüentemente seu valor comercial. Muitos dos problemas são causados durante o cultivo, envolvendo doenças, causadas por fungos, bactérias, nematóides e vírus; pragas, principalmente larvas ou brocas; e causas fisiológicas, relacionadas à condição ambiental, desbalanço nutricional, excesso ou falta de água, entre outros. Nos levantamentos realizados no Brasil entre 1971 e 1994, as principais causas de perdas relacionadas pelos diferentes autores são a demora entre a compra e a venda; produto comprado ruim; danos mecânicos; causas fisiológicas (esverdeamento); doenças (podridões); transporte inadequado; falta de aeração; colheita fora de época ou prematura; beneficiamento pós-colheita impróprio (lavagem e secagem); preços desfavoráveis ao produtor; falta de orientação do mercado.

A batata é suscetível a vários fungos, bactérias, pragas, nematóides e viroses que também podem afetar o desenvolvimento dos tubérculos e causar perdas pela depreciação do produto. Em todas as normas de classificação e padronização de batata no Brasil, os principais defeitos dos tubérculos têm nomes comuns que descrevem os sintomas de modo a estabelecer uma linguagem de fácil compreensão. Entretanto, mais de um microorganismo pode estar envolvido em muitas destas categorias de defeitos. Os defeitos mais comuns nos tubérculos de batata são os seguintes:

1. “podridão úmida”: deterioração do tubérculo causada por bactérias, geralmente Erwinia, que amolecem e desintegram os tecidos;

2. “podridão seca”: desenvolvimento de lesão nos tubérculos, mas os tecidos permanecem com aspecto seco; é geralmente causada por fungos, como Fusarium;

3. “rizoctonia”: desenvolvimento de agregados negros (“escleródios”) bem aderidos à superfície externa do tubérculo, causado pelo fungo

;

4. “nematóides”: os tubérculos apresentam galhas (“pipocas”) quando atacados por Meloidogyne e pontuações necróticas quando atacados por Pratylenchus;

5. “broca alfinete”: as larvas vaquinha (

) fazem furos nos tubérculos, que ficam com aparência de “alfinetados”;

1. “coração negro”: ocorrência de manchas escuras no interior do tubérculo; é causado pela falta de oxigênio e pode ocorrer a campo ou no armazenamento;

2. “coração oco”: falha no interior do tubérculo, formando uma cavidade, causada por um crescimento muito rápido devido ao desbalanço hídrico ou deficiência de potássio;

3. “vitrificado”: defeito na polpa do tubérculo, que fica endurecida e com aspecto cristalizado ou fibroso, de causa desconhecida;

4. “queimado”: queimadura do tubérculo causado pela insolação direta no campo;

5. “esfolado”: tubérculos com película mal-formada ou sem cura adequada que solta-se com facilidade e escurece devido ao manuseio;

6. “dano superficial”: lesão de origem diversa (mecânica, fisiológica, doença) com incidência em menos de 10% da superfície do tubérculo e menor que três mm de profundidade;

7. “dano profundo”: lesão de origem diversa que incide em profundidade maior que três mm e perda superior a 5% do peso do tubérculos para eliminar o dano;

8. “embonecamento”: formação irregular do tubérculo causada por crescimento desuniforme; pode ser causado por vários tipos de estresses ambientais ou desbalanço nutricional;

9. “esverdeamento”: mudança de coloração do tubérculo para esverdeado por exposição à luz e formação de clorofila;

10. “brotado”: brotação dos tubérculos devido à exposição em local quente e úmido.

A qualidade dos tubérculos e a produtividade da batata dependem das condições de cultivo, principalmente do clima, adubação, irrigação, tratos culturais e controle fitossanitário. A maior parte dos problemas apresentados pelos tubérculos têm origem no campo, ocasionados por doenças ou brocas. Na fase de pós-colheita, os problemas mais relevantes são causados por falhas no manuseio, como cura inadequada dos tubérculos e a incidência de ferimentos e injúrias mecânicas. Algumas medidas gerais que podem contribuir na redução de perdas podem ser adotadas pelos diferentes segmentos da cadeia produtiva da batata:

• monitorar constantemente a incidência de pragas e doenças que causam danos diretos nos tubérculos na fase de produção;

• só efetuar a colheita quando as hastes da batata estão secas e os tubérculos com película firme, o que ocorre 10-14 dias após a morte da parte aérea da planta;

• usar equipamento adequado na colheita para evitar tubérculos “esquecidos” no campo, que podem chegar a 10% da produção;

• não colher quando o solo estiver excessivamente molhado ou úmido, ou logo após a ocorrência de chuvas;

• respeitar o período de “cura” dos tubérculos no campo (30-60min) para manter a resistência da película e evitar perdas por danos mecânicos;

• treinar os colhedores para evitar ferimentos desnecessários nos tubérculos no recolhimento da batata no campo;

• acompanhar o beneficiamento da batata colhida para ter uma idéia da qualidade e do valor da produção;

• selecionar para plantio cultivares bem adaptadas à região, e que apresentem alta produtividade e tubérculos de boa aparência, com maior valor comercial;

• ajustar as máquinas de beneficiamento para evitar quedas acentuadas e ferimentos desnecessários nos tubérculos;

• para a batata lavada, ajustar a temperatura e a velocidade do vento do túnel de secagem para evitar danos excessivos à película dos tubérculos;

• treinar os operários que fazem a seleção visual dos tubérculos a respeito dos defeitos mais graves para uma classificação mais eficiente do produto;

• identificar mercados e consumidores alternativos para tubérculos de tipos e classes de menor valor econômico, como batata “Bolinha” e “Diversos”;

• para a batata de melhor qualidade e destinada a um público mais exigente, acondicionar os tubérculos em caixas de papelão ou de plástico;

• evitar quedas dos sacos e danos mecânicos nas operações de carga e descarga dos sacos;

• utilizar paletes de madeira para acomodar as pilhas de sacos, que devem ter no máximo seis a oito sacos;

• no caso de armazenamento temporário nos próprios “boxes”, manter as pilhas de sacos sob os paletes afastados para que haja uma maior ventilação;

• fazer inspeções diárias para verificar a incidência de deterioração dos tubérculos, e reclassificar os sacos para eliminar as batatas doentes;

• armazenar em local com pouca luz, fresco, seco e bem ventilado por períodos curtos (até cinco dias);

• para armazenamento mais prolongado utilizar refrigeração (7-12oC);

• comprar quantidade de produto coerente com a demanda;

• identificar a variedade e apontar sua aptidão culinária para o consumidor;

• evitar ferimentos na movimentação do produto na loja (carga, descarga, exposição em gôndolas);

• no caso da batata exposta em gôndolas e vendida a granel, fazer inspeções periódicas para descartar os tubérculos deteriorados ou com defeitos muito evidentes;

• ofertar pelo menos dois tipos de batata, com cultivares diferentes ou formas de apresentação, como tubérculos de película creme e rosada, a granel e embalada em redes, tubérculos escovados e lavados, tubérculos grandes e “bolinha”, etc;

• comprar batata com mais freqüência e em menores quantidades para evitar deterioração;

• armazenar fora da geladeira para não ocupar muito espaço, mas em local escuro, fresco e ventilado;

• usar sacos plásticos para embalar somente quando armazenar em geladeira; dar preferência para redes ou sacos de papelão;

• descascar a batata com cuidado para evitar desperdícios necessários;

• as partes escurecidas do tubérculo podem ser eliminadas e a parte sadia pode ser aproveitada sem problemas;

• pedir informações sobre a identificação da batata (variedade ou cultivar) e sua aptidão culinária no momento da compra.

A batata é um alimento nobre e muito apreciado pelo consumidor brasileiro. A manutenção da qualidade e da boa imagem do produto junto ao público deve ser uma preocupação constante de todos os envolvidos no sistema produtivo, para que a batata continue sendo parte da alimentação diária do brasileiro.

Embrapa Hortaliças

* Confira este artigo, com fotos e tabelas, em formato PDF. Basta clicar no link abaixo:

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