Uma verificação sobre o comportamento do mercado de milho nos últimos anos indica claramente o estabelecimento de sucessivos patamares de preços. Entre os anos de 2004 e 2006, os preços variaram no intervalo entre US$ 2,00 e US$ 3,00 por bushel (algo entre US$ 80 e US$ 120 por tonelada). No período entre fins de 2006 e o ano de 2007, um novo patamar, entre US$ 3,00 e US$ 4,00 por bushel (atingindo cerca de US$ 160 por tonelada) vigorou. Este mesmo patamar foi atingido na estabilização que se seguiu à crise do ano de 2008 e permaneceu até meados de 2010. A partir desta época, os preços do milho começaram a subir novamente e alcançaram os recordes verificados no período pré-crise de 2008, situando-se ao redor dos US$ 7,00 (equivalente a US$ 275 por tonelada). O que existe de novo é que os picos de 2008 duraram poucos meses e os níveis de preços atuais já duram desde o início do ano.
Embora uma série de fatores tenha afetado este mercado durante estes anos (um pouco de especulação no ano de 2008, secas que se verificaram na Argentina e, em outro ano, na antiga União Soviética), o principal fator que tem contribuído para o estabelecimento de novos patamares de preço no mercado internacional do milho é a utilização deste cereal para produção de etanol nos Estados Unidos. Em um período de cerca de 10 anos, uma demanda de aproximadamente 100 milhões de toneladas foi criada no maior país exportador e provocou um desbalanço nos estoques, que davam segurança contra possíveis frustrações de safras localizadas. Esta nova situação cria uma indefinição a cada ano, na medida em que surgem dúvidas acerca da capacidade dos Estados Unidos, maior produtor e exportador de milho, em atender a sua demanda interna e gerar excedentes exportáveis. O problema é que o acréscimo na quantidade demandada foi grande e o espaço de tempo para realizar o ajuste na produção foi curto, em um país com pouca extensão de área ainda sem uso. Um estudo recente do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (
) indica que a expansão da produção de milho foi em uma primeira instância resultante do crescimento da produtividade agrícola. Em uma fase posterior (após 2006) o crescimento da produção de milho resultou do avanço sobre áreas tradicionais de soja e sobre áreas ociosas ou de pastagem. Por sua vez, a soja em conjunto com milho avançou sobre áreas ocupadas com outras culturas em áreas não tradicionais, registrando-se também o crescimento da soja no sistema de plantio de mais de uma cultura, em sucessão na mesma área em um mesmo ano agrícola (double-cropping).
Aparentemente este aumento na quantidade de milho com esta finalidade está se esgotando. Na safra de 2009/10 a quantidade de milho utilizada foi de 116 milhões de toneladas, em 2010/11 foi de 128 milhões e a previsão para o ano agrícola de 2011/12 é de 129 milhões de toneladas. O governo dos Estados Unidos está apoiando o desenvolvimento do chamado etanol de segunda geração, elaborado a partir de resíduos agrícolas, um porto mais seguro de ataques contra a utilização de um cereal para produção de energia. Algumas indústrias pilotos já estão em operação.
Posto isto, a situação do milho fica resolvida? Aparentemente ainda não. Neste ano a China começou efetivamente a importar maiores quantidades de milho dos Estados Unidos. Por vários anos esta possibilidade vinha sendo levantada e nada acontecia. Considerando que a China é um sorvedouro de matéria-prima do mundo como um todo, este início de importações pode fornecer uma nova pressão sobre a produção de milho no mundo, e consequentemente sobre os preços. Para finalizar, o problema está em que as informações sobre os estoques da China podem não ser tão confiáveis. O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos informa um estoque de mais de 50 milhões de toneladas de milho existentes na China (equivalentes a cerca de 25% do consumo anual) em um total de cerca de 120 milhões existentes no mundo. Caso este estoque chinês esteja superdimensionado, a situação fica difícil.
Por outro lado, o aperto do governo americano e de alguns países da Europa pode estar conduzindo o mundo para uma restrição dos gastos governamentais e consequentemente da renda das pessoas. No caso dos EUA, existem sinais de redução no consumo de combustíveis, o que reduziria a demanda por etanol. Ajuda a resolver o problema do milho, mas o consumo de combustíveis na China cresce velozmente e compensa a eventual redução americana. Ou seja, como a China não consome etanol o problema passa para o lado do petróleo. Mas mesmo deste lado, os possíveis sinais de recessão no mundo desenvolvido têm estabilizado as cotações mundiais do petróleo.
Em resumo, tempos difíceis para o atendimento das necessidades globais de milho aparentemente devem continuar no futuro próximo. Já se iniciaram novamente os clamores relativos à inflação dos alimentos. Como as perspectivas futuras de preços são de manutenção nos patamares elevados (e somente seriam modificadas no caso da ocorrência de uma recessão generalizada), antes de reclamar contra os preços altos, seria mais efetivo que os governos nacionais iniciassem ações concretas para aumentar a produção de milho nos diversos países para melhor garantia de sua segurança alimentar.
No Brasil, os preços continuam se situando na faixa entre R$ 22,00 e R$ 26,00 o saco, nas principais regiões consumidoras, porém com comportamento desencontrado. Com o fim da colheita da safrinha, as quebras de produção que ocorreram no Mato Grosso reduziram as perspectivas de milho barato como no ano passado. Em regiões consumidoras cujo abastecimento é beneficiado por este milho barato (tais como Uberlândia, MG, e Rio Verde, GO), o sentimento de que a oferta não será tão farta como no ano passado já empurra os preços para cima. Em regiões consumidoras do milho produzido no Paraná, o produto que está entrando no mercado está conseguindo empurrar os preços para baixo, ou mantê-los relativamente estáveis em estados consumidores, como Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Preços estáveis, mas consideravelmente mais altos do que no ano passado.
Com o abastecimento garantido, começa agora a corrida da nova safra. Os bons preços do milho neste ano certamente influenciarão os agricultores com relação ao aumento da área plantada com este cereal e com relação ao uso de maior quantidade de insumos (e de sementes com maior potencial produtivo) e melhor cuidado nas operações de campo. Os agricultores da região Sul, que na safra passada não receberam a tempo os sinais de recuperação do preço do milho (que começaram após o término do plantio na maior parte das áreas), certamente poderão tomar a decisão com melhor informação. O resultado fica por conta do clima, mas isto ainda é futuro. Os produtores das regiões Sudeste e Centro-Oeste podem esperar um pouco mais para a tomada de decisão.
Do lado das exportações, estas começaram a se recuperar no mês de julho. Apesar dos preços em dólar estarem superiores aos do ano passado, parte deles desaparece por conta da valorização do real. Mesmo assim, já exportamos da safra nova quase a mesma quantidade do que exportamos no ano passado, o que contribui para manter o mercado mais enxuto. Como os preços estão altos, fica mais fácil exportar os menores excedentes do Mato Grosso e manter os preços sem intervenções do governo.
Pesquisadores da área de economia agrícola da Embrapa Milho e Sorgo
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