Mitigação de estresses por micro-organismos
Por Karla Vilaça, engenheira agrônoma e consultora de Desenvolvimento Técnico da ICL
Será que agora chegou a hora da extinção das bananeiras? Há mais de vinte anos, o pesquisador Emile Frison, então Diretor da International Network for the Improvement of Banana and Plantain, afirmou que banana corria risco de extinção num artigo publicado na New Scientist (newscientist.com/article/mg17723784-800-going-bananas/). Na época, o avanço da Sigatoka Negra era a maior ameaça.
Mas o que mudou na bananicultura nestas duas décadas? No segmento da produção para exportação que cultiva predominantemente bananeiras do Subgrupo Cavendish, como Nanica, Grande Naine, Banana d’água, houve significativo aumento no custo de produção devido à Sigatoka Negra. Na América Central, chegam a ser feitas até 60 a 70 aplicações de fungicida por ano, com aviões sobrevoando os bananais uma vez por semana. Em áreas de produção para consumo local, os produtores que não conseguem fazer controle químico adequado da doença optam pelo cultivo de variedades mais resistentes ou simplesmente deixam de plantar banana.
Apesar de todos os danos causados pela Sigatoka Negra, que não chegou a extinguir as bananeiras, uma nova ameaça surgiu nos últimos anos e vem preocupando produtores e cientistas. Trata-se da raça 4 tropical do fungo Fusarium oxysporum f. sp. cubense (FOC), conhecida como TR4.
Recentemente, um estudo publicado na revista científica Frontiers of Plant Science reuniu pesquisadores do Brasil, Colômbia e México para discutir a disseminação e o impacto da TR4 na América Latina e Caribe, com foco nos aspectos epidemiológicos e nas opções mais recentes de manejo baseadas em evidências científicas. Os autores do estudo consideram que esta nova raça de Fusarium representa uma ameaça inegável à produção mundial de banana e que seu espalhamento para os principais países produtores de banana das Américas é apenas uma questão de tempo.
A murcha por Fusarium da bananeira se intensificou nos últimos anos, com a rápida disseminação da TR4. Desde 2018, o número de países afetados aumentou de 16 para 23, o que representa um desafio significativo para pesquisadores, produtores e Organizações Nacionais de Proteção Fitossanitária em todo o mundo (Figura 1).
O impacto potencial da TR4 na América Latina e no Caribe é particularmente preocupante. Essa região possui sete dos dez principais países exportadores de banana, sendo esta fruta essencial para a segurança alimentar e a geração de renda. Na Colômbia, onde a TR4 foi detectada em 2019, a doença já se espalhou de La Guajira para Magdalena e atualmente afeta 20 grandes fazendas comerciais de exportação. No Peru, a doença foi detectada em 2021 e, embora ainda restrita à região norte, a irrigação por inundação e as fortes chuvas associadas ao ciclone Yaku impulsionaram a disseminação do patógeno. Em 2024, mais de 400 pequenos produtores de banana orgânica já foram afetados. Na Venezuela, a detecção da TR4 ocorreu em 2023, com plantações afetadas dispersas em três estados. É preocupante o fato de o TR4 também ter sido confirmado em bananas-da-terra, um alimento básico na região. Atualmente, as respostas nacionais na América Latina e no Caribe baseiam-se principalmente em medidas preventivas de exclusão e reativas relacionadas ao manejo dos bananais. No entanto, a progressão contínua e silenciosa da doença sugere que a doença já possa estar presente em outras regiões produtoras.
A ameaça deriva de persistência do fungo no solo por até 30 anos, mesmo na ausência de bananeiras. A sobrevivência dos esporos é considerada o principal mecanismo, mas a multiplicação em outras plantas hospedeiras também contribui para a persistência dos seus esporos. Quando os solos são contaminados com TR4, variedades suscetíveis não podem ser replantadas.
O Fusarium é um fungo de solo que penetra nas bananeiras por meio de raízes secundárias. Uma vez dentro da planta, o patógeno coloniza e destrói o sistema vascular, causando sintomas externos que começam como amarelecimento e murcha das folhas mais velhas para as mais novas (Figura 2A) e sintomas internos caracterizados por necrose no sistema vascular (Figura 2B e C) e descoloração do rizoma (Figura 2D). As plantas infectadas também podem apresentar atraso no desenvolvimento e crescimento anormal das folhas. Uma comparação entre plantas afetadas e sadias (Figuras 2E, F e G) ilustra que o FOC priva as plantas afetadas da absorção de água e nutrientes, impedindo a produção normal de frutos e causando a morte da planta. Uma vez iniciada a epidemia, se as medidas de manejo não forem implementadas oportunamente, a destruição generalizada pode ocorrer rapidamente (Figura 2H).
Os principais componentes de uma abordagem integrada para sistemas de cultivo de banana compatíveis com o TR4 são exclusão, detecção precoce e destruição de plantas; biossegurança; variedades resistentes; controle biológico e práticas integradas voltadas para a saúde do solo e sistemas de cultivo.
A exclusão baseia-se na vigilância fitossanitária e na implementação de medidas de biossegurança em nível de país, região, fazenda ou campo. A biossegurança engloba todas as medidas para proteger a sociedade e seus membros dos efeitos negativos da disseminação de pragas e doenças. A biossegurança, assim como qualquer outra prática de manejo da TR4, deve se basear na epidemiologia da doença. Os fatores e as vias de dispersão de patógenos precisam ser compreendidos por meio de abordagens específicas para cada local. Independentemente do tamanho da fazenda ou da condição econômica do produtor, os princípios de biossegurança devem fazer parte do trabalho diário nos bananais.
Sem dúvida, o uso de variedades resistentes é a melhor estratégia para conviver com a murcha por Fusarium. Entretanto, ainda não estão disponíveis genótipos totalmente resistentes à TR4 para substituir as variedades suscetíveis de bananeira Cavendish ou outras variedades comerciais.
O desenvolvimento de plantas transgênicas e da edição gênica oferece um novo caminho para a produção de variedades resistentes à doença. Recentemente, o governo australiano aprovou a comercialização da variedade QCav4 geneticamente modificada, resistente à TR4 e que pertence ao Subgrupo Cavendish. Embora isso represente um progresso em termos regulatórios, a lógica da conversão generalizada para essa nova variedade ainda precisa ser testada. A produção e a exportação dessas variedades também encontrarão desafios importantes: 1) processos de autorização variados para testes de validação de campo em diferentes países; 2) defasagem de tempo entre a validação de campo e as licenças de produção comercial; e 3) aceitação nos mercados dos países importadores, como os da União Europeia. Em mais de 100 anos de exportação de bananas, a mudança de variedades na bananicultura de exportação ocorreu apenas uma vez, quando a R1 se disseminou na década de 1960. Os produtores de pequena escala para mercados domésticos, embora operem com mais flexibilidade de variedades, são altamente dependentes de material de plantio de baixa qualidade que terminam por disseminar pragas e doenças. Uma mudança para material de plantio de cultura de tecidos representaria uma grande transição logística e de custo.
A substituição de variedades suscetíveis que sejam aceitas pelo mercado ainda pode demorar. O mais provável é que sejam adotados sistemas de cultivo que contribuam para a supressão da doença e maior vigor das plantas. O solo é um ecossistema dinâmico repleto de interações complexas que podem afetar significativamente a prevalência e a gravidade da murcha por Fusarium e a produção de banana. Em Taiwan e nas Filipinas, os produtores adotam períodos de pousio, variedades tolerantes e produtos microbianos para recuperar a produção e tentar conviver com o patógeno. A expectativa é que o desafio de produzir banana em terras afetadas pela TR4 só aumentará à medida que a doença se espalhar.
Como exemplo de prática de manejo com foco na melhoria da saúde do solo, tem-se a controle da acidez do solo. O pH do solo é o indicador mais relacionado à murcha por Fusarium. Solos ácidos têm sido frequentemente associados à expressão severa da doença. Sabe-se que o aumento do pH para níveis ainda favoráveis às bananas, mas não ao FOC, pode ser eficaz para reduzir a doença. No entanto, solos com baixa acidez (pH acima de 7) não garantem a supressão ou redução da doença. Os bananais fortemente afetados pela TR4 no norte do Peru e na Venezuela apresentam pH do solo superior a 7,5. No nordeste do Brasil, também temos áreas afetadas pela Raça 1 que apresentam pH elevado.
A adubação nitrogenada é um fator que também afeta a severidade da doença. Tanto a dose como a fonte de N têm relação com a murcha por Fusarium. Doses mais elevadas de N frequentemente são associadas com o incremento da intensidade da doença. Ao estimular o crescimento, pode ocorrer um desequilíbrio no balanço entre os mecanismos fisiológicos que regem a relação entre aumento das defesas da planta e seu crescimento. É como se a planta canalizasse sua energia para crescer em detrimento de se armar para o combate ao patógeno. Fontes amoniacais como sulfato de amônio, DAP ou ureia que aumentam a disponibilidade de NH4 e causam acidez, também podem incrementar a doença. Emprego de fontes de N nítricas e aplicações de doses que atendam às demandas das plantas sem comprometer sua defesa, são medidas recomendáveis para aumentar a resistência das plantas à murcha por Fusarium.
Por fim, sabe-se que a matéria orgânica influencia muito a estrutura, a disponibilidade de nutrientes, a atividade microbiana e a saúde geral do solo. Devido a essas múltiplas funções, a adição de material orgânico pode ter implicações positivas na incidência e severidade da murcha por Fusarium. Sistemas de cultivo e o manejo orientados para aumentar e diversificar o aporte de matéria orgânica são aspectos essenciais para aumentar a supressividade do solo e possibilitar a convivência com a murcha por Fusarium da bananeira.
Embora não acreditemos na extinção das bananeiras, estamos convictos de que a bananicultura precisará passar por grandes mudanças a médio prazo para garantir sua sustentabilidade. A ameaça da TR4, combinada com as consequências das mudanças climáticas, torna a situação atual muito mais desafiadora do que há vinte anos, quando já se falava sobre a possível extinção das bananas. Adaptar-se às novas realidades e buscar soluções inovadoras é fundamental para garantir que as bananas continuem a ser uma parte vital da segurança alimentar e da economia global.
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