Qualidade na produção é grande diferencial do controle biológico

Um dos maiores especialistas em controle biológico do mundo, dá panorama de como está a prática hoje no Brasil e no mundo e as expectativas para o futuro

23.08.2019 | 20:59 (UTC -3)

Um dos maiores especialistas em controle biológico do mundo, José Roberto Postali Parra é professor titular do Departamento de Entomologia e Acarologia da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (Esalq/USP), e um dos precursores do manejo integrado de pragas no Brasil. Ele se dedica ao controle biológico há mais de quatro décadas e deu um panorama de como está a prática hoje no Brasil e no mundo e quais as expectativas para os próximos anos.

Como você vê o desenvolvimento do uso do controle biológico no Brasil e no mundo?

Parra - Existe uma euforia mundial em torno da agricultura sustentável. O controle biológico como componente deste sistema que está sendo buscado, vem aumentando no mundo na ordem de 10 a 15% ao ano. No Brasil, especialmente para micro-organismos (fungos, vírus, bactérias, etc) este número está até maior do que o resto do mundo. Entretanto, existem muitos desafios a serem transpostos para nossa agricultura, baseada em sistemas de produção com grandes áreas e considerando-se a cultura do agricultor brasileiro voltada para agroquímicos. Especialmente para macro-organismos a disponibilidade de insumos biológicos é ainda um grande problema, ao lado da transferência de tecnologia para um agricultor não acostumado a trabalhar com biológicos.

O manejo integrado de pragas e doenças vem ganhado espaço. O que ainda falta para ser mais utilizado?

Parra - O MIP (Manejo Integrado de Pragas) é a filosofia ideal de controle de pragas. Entretanto, é, em muitos casos, ainda teórico e como dizem os norte-americanos, tem muito pouco “I” neste IPM (Integrated Pest Management), ou seja, temos pouca integração de métodos sendo utilizada na prática. Na Austrália, existem excelentes resultados em algodoeiro. No Brasil, o MIP se baseia, na maioria dos casos, em utilização de nível de dano econômico da praga, às vezes com feromônios, rotação de princípios ativos de agroquímicos, plantas geneticamente modificadas e em muitos poucos casos, utilização de produtos seletivos. A cultura de citros tem um bom programa de MIP para controle do HLB (Greening), embora utilize muito inseticida nas áreas comerciais.

Quais os maiores entraves para o uso dos biológicos pelos agricultores brasileiros?

Parra - Ainda existem poucas empresas com produtos de qualidade e o portfólio delas, especialmente para macro-organismos é ainda pequeno. Para micro-organismos a situação é melhor, pois além da maior semelhança com agroquímicos para aplicação (o agricultor se identifica mais com eles) eles são mais fáceis de serem produzidos e têm o chamado “tempo de prateleira”, diferente de macro que precisam ser utilizados logo após a emergência dos inimigos naturais.

Outros problemas como monitoramento e liberação em grandes áreas, vêm sendo resolvidos com a utilização de drones e aviões e com métodos mais modernos de monitoramento de pragas.

A massa crítica na área de controle biológico é ainda pequena para novos programas inter e multidisciplinares. A logística de armazenamento e transporte, considerando-se as grandes extensões territoriais do país, é um outro sério problema, que só será melhorado com a profissionalização das empresas produtoras de insumos biológicos.

Entretanto, ainda persiste a cultura de agroquímicos do agricultor, e faltam insumos alternativos disponíveis, havendo necessidade do surgimento de novas empresas que se dediquem à formulação de micro e à produção automatizada de macro-organismos.

Vejo um futuro promissor para o controle biológico, desde que esses obstáculos sejam transpostos.

Como está o desenvolvimento de novos inimigos naturais?

Parra - Esta é uma área diferente, pois não se tem buscado novos agentes de CB (controle biológico), a despeito da nossa rica biodiversidade. Um Centro de CB está para ser criado na Escola de Agricultura “Luiz de Queiroz” (Esalq/USP), em conjunto com a Koppert e a Fapesp (Fundação de Amparo a Ciência do Estado de São Paulo) visando a busca de novos agentes de CB. Os pesquisadores devem ser incentivados, pois o desenvolvimento de um produto biológico pode ser demorado e para chegar ao agricultor depende de ações inter e multidisciplinares.

O Trichogramma galloi, hoje utilizado em mais de 2 milhões de ha para controlar Diatraea saccharalis, iniciou-se em 1984 e foi lançado para o agricultor em 2000.

Qual o manejo ideal para controle de pragas e doenças na agricultura tropical, considerando-se também o menor impacto ao meio ambiente e a saúde?

Parra - É o manejo integrado de pragas, ou seja, um conjunto de medidas que visa manter as pragas abaixo do NDE (nível de dano econômico), levando-se em conta critérios econômicos, ecológicos e sociais.

Existem alguns mitos sobre CB e um deles é que deveria resolver isoladamente o caso de pragas. Entretanto, na maioria das vezes, ele deve ser considerado como um componente do MIP.

O que podemos aprender com o controle biológico desenvolvido em outros países?

Parra - Na utilização em grandes áreas, temos muito pouco a aprender, pois os grandes resultados são em casas-de-vegetação.

O nosso desafio é realmente desenvolver (estamos fazendo isso) um modelo de CB para região tropical, como fizemos com a nossa agricultura nos últimos 40 anos.

Sem ser pretencioso, é lógico que há sempre algo a aprender e muitos trabalhos básicos têm sido desenvolvidos em parcerias com as principais universidades do mundo, mas a parte mais aplicada devemos desenvolvê-la com os nossos pesquisadores, adequada à nossa realidade.

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