O Brasil, devido a sua grande extensão geográfica, flora diversificada, e ainda não totalmente conhecida e tipo de criação, predominantemente extensiva, é um país cujas características propiciam a ocorrência de intoxicações, principalmente as causadas por plantas tóxicas. Por diversas vezes, as intoxicações por plantas são erroneamente diagnosticados como envenenamento por outras substâncias, ou muito mais freqüentemente, confundidas com doenças infecciosas. Isto decorre do fato do veterinário ou do próprio fazendeiro desconhecerem as plantas tóxicas mais importantes, existentes nas diferentes regiões do Brasil.
Dos animais, os ruminantes são os mais suscetíveis à intoxicação, devido aos seus hábitos alimentares. Estes animais apresentam gustação quase inexistente, rápida deglutição e digestão lenta, o que favorece a absorção das toxinas, tornando-os vítimas fáceis, principalmente daquelas plantas que provocam morte súbita. As razões que levam um animal de criação a ingerir plantas tóxicas são muito variadas, e incluem a formação de pastagens de forma inadequada, a inclusão recente de animais num pasto desconhecido, a escassez de alimentos, falta de limpeza periódica do pasto ou cultura, e a perversão do apetite devido à deficiências minerais, entre outros. Sempre que houver suspeita de intoxicação por plantas, verificar o local onde estas se encontram e se existem evidências concretas de que o animal entrou em contato com a mesma (se existe a presença de folhas ou outras partes da planta consumidas).
Dentre as plantas que mais afetam os bovinos, a
(conhecida popularmente como “erva-de-rato”, “café”, “cafezinho”, “roxa”, “roxinha”, “vick”) é uma das mais importantes, por ser altamente palatável e causadora de morte súbita; cerca de meio quilo desta planta é capaz de causar a mortalidade de um bovino adulto em menos de 12 horas, por meio de convulsão. Não há tratamento viável para este tipo de intoxicação, sendo que a movimentação do animal afetado antecipa os sintomas neurológicos e a morte; somente a erradicação da planta da propriedade é que evita as intoxicações.
A
(“cipó-prata” ou “corona”) é outra planta causadora de morte súbita, encontrada no Triângulo Mineiro e no Estado de São Paulo, também caracterizada por morte antecipada por convulsão. Cresce em solos ricos, e a brotação, que coincide com a época da seca, parece ser a parte mais tóxica da planta. Os animais intoxicados deverão ter a movimentação restringida por uma ou duas semanas, pois assim, quando moderadamente intoxicados, existe a possibilidade de recuperação.
Uma planta de importância para a região Sudeste, principalmente na confluência dos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo é a
sp. Vulgarmente chamada de “cipó-ferro”, “cipó-vermelho”, “cipó-ruão”, “cipó-preto”, entre outros, quando consumida por dias seguidos, leva ao desenvolvimento de edema de barbela e da região esternal, dispnéia, fraqueza, anorexia, dificuldade de locomoção e tremores musculares, que culmina na morte, devido às lesões cardíacas. Verifica-se que os bezerros que amamentam em fêmeas intoxicadas apresentam lesões semelhantes a dos adultos, inclusive com mortalidade, indicando a passagem dos princípios tóxicos pelo leite. Este achado levanta outra questão relevante, que não meramente aquela relacionada à intoxicação animal, a respeito das graves conseqüências do consumo de leite e seus subprodutos destinados para o consumo humano.
O
, popularmente conhecido como “samambaia-do-campo”, cresce em terrenos de solo pobre, ácidos e arenosos, brotando vigorosamente depois de queimadas. Alguns animais o consomem continuamente, talvez pelas características fibrosas da folha, sendo que muitos pesquisadores acreditam que os animais se viciam em consumi-lo. É causadora de três quadros clínicos distintos em bovinos: a intoxicação aguda, ocasionada pela ingestão de grandes quantidades desta samambaia num curto período de tempo, leva à ocorrência de sangramentos de difícil estancamento em pele, mucosas e orifícios naturais; este quadro é conhecido como diátese hemorrágica. Nestas situações a morte é freqüente. Entretanto, o quadro clínico mais comum, encontrado por veterinários, são as formas crônicas. A primeira é a ocorrência de hematúria enzoótica. Neste caso, a ingestão por períodos prolongados, dois anos ou mais, leva ao desenvolvimento de pequenos tumores (ou pólipos) na bexiga urinária dos animais que, ao se destacarem da parede do órgão, promovem o aparecimento de vários pontos de sangramento, que tinge a urina de sangue, e leva ao quadro de hematúria. Por acometer vários animais ao mesmo tempo, designa-se este quadro de enzoótico. A segunda forma crônica ocorre pela ingestão mais prolongada que leva a um quadro conhecido como “figueira” ou “caraguatá”, em que verifica-se o desenvolvimento de grandes formações tumorais em esôfago e trato gastrointestinal. O leite deve ser descartado já que é fonte de excreção do princípio ativo tóxico, e como não há tratamento para estas síndromes, indica-se o abate dos animais. Destaca-se que intoxicações naturais também já foram relatadas em ovinos. A forma mais eficaz de profilaxia é a alteração do pH do solo, por aplicação de cal, ou o plantio competitivo de Brachiaria decumbens, para evitar o desenvolvimento da samambaia.
Dentre as plantas causadoras de lesões hepáticas, duas são freqüentes na Região Sudeste, o
sp. (“dama-da-noite”) e o
sp. (“flor-das-almas” ou “maria-mole”). Em geral, os ovinos e caprinos são menos sensíveis à intoxicação por Senecio, o que induz os produtores da Região Sul do Brasil a colocá-los em pastos assim contaminados; este procedimento é errôneo visto que altas doses desta planta podem levar estes animais à morte. Entretanto, alguns pesquisadores aconselham o pastejo de áreas contaminadas por ovinos e caprinos, quando a infestação do pasto é moderada, para evitar que os bovinos se intoxiquem, visto que esta espécie animal é mais suscetível à ação tóxica desta planta.
Por fim, embora longe de esgotar o assunto, relata-se também a ocorrência de intoxicações esporádicas por
(“fedegoso”), planta invasora de culturas de milho e sorgo, que quando coletadas mecanicamente, poderão compor, de forma contaminante, rações à base destes grãos. A intoxicação também poderá ocorrer por ingestão da planta no pasto, e caracteristicamente esta planta leva a lesões necróticas cardíacas e de musculatura esquelética, que leva o animal a apresentar mioglobinúria (a urina fica marrom escura). O animal entra em decúbito esternal (deita-se sobre o peito), e posteriormente, decúbito lateral (deita-se de lado), pois não tem força muscular para manter-se em pé, o que precede a morte.
Partindo-se do conhecimento das características botânicas, da substância tóxica envolvida, mecanismo de ação, e dos motivos que levam o animal a ingeri-la é que se poderá chegar ao diagnóstico correto, facilitando, principalmente, as medidas mais adequadas de profilaxia, que, na prática, são mais eficientes que o tratamento. Assim, espera-se que os conhecimentos técnicos obtidos a partir das pesquisas tenham ampla divulgação, para auxiliar os produtores no campo na adoção de medidas profiláticas, diminuindo, desta forma, os prejuízos econômicos que as plantas tóxicas possam acarretar no campo.
Ana Cristina Tasaka
Umesp,Unip, Unisa e Uniban
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