A clorose variegada dos citros, considerada a mais grave doença da citricultura brasileira, é causada pela bactéria
. Por se tratar de uma bactéria sistêmica, restrita ao xilema e transmitida apenas por cigarrinhas ou por material de propagação, seu controle em pomares já estabelecidos é muito difícil. Não há defensivos que sejam eficientes, e o uso de inseticidas para controle de seus vetores não é efetivo se usado isoladamente. O manejo integrado - com uso de borbulhas livres do patógeno, produção de mudas sob telado, aplicação de inseticidas via solo ou tronco e remoção de material sintomático (poda ou arranquio) – tem sido o único caminho possível para o citricultor.
Dentro da idéia do manejo integrado, o melhoramento genético, por sua eficiência, baixo custo e durabilidade, também tem sido priorizado. Basicamente os trabalhos têm sido feitos seguindo duas vertentes: a primeira é a caracterização da reação de variedades já conhecidas por meio de transmissão natural em condições de campo; a segunda é a seleção de plantas aparentemente sadias em pomares altamente afetados, ou a seleção de mutações localizadas (ramos ou borbulhas). A primeira estratégia é a que, no momento, tem dado os melhores resultados. Até o momento já foi constatada a presença daquela bactéria em todas as variedades comerciais de laranja doce. Assim sendo, a procura de novas variedades por parte de produtores tem aumentado, exigindo a devida caracterização do material disponível. A segunda vertente - seleção de plantas-elite e de mutações -, embora ainda não apresente resultados concretos, tem boas perpectivas, considerando o tamanho do parque citrícola brasileiro e a grande ocorrência de mutações em plantas cítricas.
Os resultados aqui apresentados são oriundos basicamente de experimentos conduzidos em locais com baixa, média e alta pressão de inóculo, em quatro regiões do Estado de São Paulo (Norte, Noroeste, Centro e Sul). Esses experimentos foram realizados com recursos do Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus) e com material do Centro de Citricultura Sylvio Moreira – IAC.
Detectou-se a CVC por meio de avaliações visuais, considerando sintomas em folhas e/ou em frutos. Não foram feitas inoculações, e toda transmissão ocorreu de forma natural por meio de cigarrinhas. A presença de X. fastidiosa foi determinada através de testes serológicos (DIBA e “Western-blotting”) e por PCR (“Polimerase Chain Reaction”).
Laranjas doces
A constatação de sintomas de CVC nessa espécie ocorreu em todas as áreas, embora a intensidade da doença tenha variado em função da região ou variedade cultivada. Já foi relatado que as mais suscetíveis são a Pêra e a Valência, embora não haja muita variação quanto a perdas. As cultivares menos afetadas são a Westin (meia estação) e Lue Gim Gong (tardia, similar à Valência), mas ainda não se conhece sua reação quando em plantio monovarietal extensivo. Nas condições mais adversas possíveis, os danos à Westin e Lue Gim Gong chegaram a 48% e 37%, enquanto que a média de outras treze variedades ficou em 80%. Um problema para a seleção de laranjas doces é que a intensidade de sintomas não se correlaciona com danos à produção.
Dessa forma, há cultivares com muito pouco sintoma (Rubi), mas que apresentam mais de 90% de redução na produção, enquanto outras (Pineapple, por exemplo) são bastante afetadas, mas a produção, proporcionalmente, não é tão reduzida. Esse fato tem estendido o prazo de seleção de cultivares e restringido o uso de técnicas de inoculação em estufa, embora alguns trabalhos venham sendo feitos nesse sentido.
Tangerinas e híbridos
Os sintomas observados em tangerinas e seus híbridos não apresentam diferenças daqueles descritos para laranjas doces. Manchas cloróticas na face superior das folhas, assim como as lesões na inferior estão sempre presentes, diferindo daquelas encontradas nas laranjas apenas em relação à tonalidade. Sintomas foram observados apenas nas variedades Carvalhais, Wilking, Tankan, Bower, Clementina x Honey e Emperor. A Tankan foi a única variedade fora das laranjas doces a apresentar sintomas em frutos. Foi possível detectar a bactéria em cerca de doze variedades menos plantadas, sendo a mais conhecida delas, a Dancy (Tabela 1 -
).
As variedades comerciais brasileiras (Ponkan, Mexerica do Rio e Cravo) não apresentaram sintomas de CVC e não tiveram amostras positivas para
em nenhuma circunstância. Mesmo o teste PCR, mais sensível, e realizado nas plantas da área experimental com maior número de fontes de inóculo, apresentou-se negativo para essas variedades (Tabela 2). Passados quase quinze anos da primeira constatação de CVC no Brasil, ainda não há registros de plantios comerciais dessas tangerinas afetados pela doença ou atuando como fonte de inóculo para pomares de variedades suscetíveis.
As tangerinas normalmente utilizadas como porta-enxerto (Sunki e Cleópatra) não apresentaram sintomas ou bactéria em seus tecidos. No entanto, como só foi possível testá-las em área com baixa pressão de inóculo, uma resposta definitiva quanto a sua suscetibilidade só será possível quando testadas em locais como a região noroeste de São Paulo, com alta incidência de CVC.
Em relação aos híbridos, foi dada uma atenção maior ao tangor Murcott (híbrido de tangerina e laranja) por ser uma das frutas cítricas mais importantes para o mercado de consumo in natura. Todos os testes foram consistentemente negativos e, em conseqüência, nenhuma planta apresentou sintomas da doença, mesmo nos locais com maior número de fontes de inóculo (Tabela 2). A relação entre os tangores e X. fastidiosa não segue um padrão; enquanto a Murcott não hospeda a bactéria, as variedades Hansen, Tangor do Rei, Dweet, Temple, Clemelin 1120, 2870, Umatilla e Ortanique apresentam sintomas foliares em áreas com alta pressão de inóculo. Por outro lado, nenhuma variedade de tangor mostrou sintomas em frutos.
Outros híbridos de interesse são os tangelos (híbridos de tangerina e pomelo), graças ao seu bom comportamento frente à CVC. A reação das cultivares variou desde a presença de sintomas (Page, Swanee e Williams) até ausência de bactéria nos tecidos (Tabela 2). As variedades testadas em área de alta pressão de inóculo foram positivas apenas quando se usou o teste mais sensível, o PCR. Em nenhum caso foram observados frutos com sintomas. Além de boa resistência à CVC, os tangelos provaram também ser resistentes à leprose, doença causada por vírus e transmitida pelo ácaro Brevipalpus phoenicis. Em função desses resultados e também da boa qualidade de seus frutos, já há mais de 400.000 árvores das variedades Nova, Fairchild e Orlando plantadas no Estado de São Paulo.
Pomelos e toranjas
Nos locais com maior pressão de inóculo foram testadas apenas duas variedades de pomelo, a Marsh Seedless e a Star Ruby. Essas cultivares permaneceram livres de sintomas e/ou de
(Tabela 2). Na área de menor pressão de inóculo, nenhuma variedade de pomelo apresentou sintomas ou reação serológica positiva para a bactéria. Por outro lado, a Periforme foi a única variedade de toranja que apresentou
em seus tecidos, em constraste com a toranja ‘Vermelha’ que mostrou reação negativa para a bactéria, tanto nos testes serológicos quanto em PCR (Tabela 2). Esses resultados sugerem que essas espécies cítricas possuem um grau de resistência maior que as anteriores, mas uma caracterização por variedade seria interessante em locais com alta pressão de inóculo.
Limas doces e ácidas
Nenhuma variedade de lima doce ou de lima ácida apresentou sintomas ou bactéria em seus tecidos. Nenhum clone da lima ácida Tahiti foi sintomático ou hospedeiro de
, ainda que apenas um clone tenha sido estudado em locais com alta pressão de inóculo (Tabela 2). De qualquer forma, os resultados aqui apresentados, especialmente os referentes às áreas com maior pressão de inóculo, dizem respeito ao clone de Tahiti mais utilizado em São Paulo, o IAC 5.
Limões verdadeiros
Nas regiões de maior pressão de inóculo foram testadas as variedades Eureka, Monachello, Lisboa tetraplóide e Feminello de Siracusa, sendo que nenhuma apresentou sintomas ou bactéria em seus tecidos (Tabela 2). Na área com menor pressão de inóculo os limões Sanguíneo 2, Camargo e Amber foram positivos para
em testes serológicos (Tabela 1). Em relação ao Eureka há necessidade de um acompanhamento futuro, pois na região de Misiones, na Argentina, é considerado hospedeiro de
.
Outros citros
foi detectada também em C. celebica, C. natsukan, cidra ‘Comprida’ e em duas seleções de limão Rugoso, por meio de testes serológicos. Não foi possível detectar a bactéria em laranja ‘Azeda’ na região Sul de São Paulo, mas, nas áreas com alta pressão de inóculo (regiões Norte e Noroeste) a laranja ‘Azeda’ testada apresentou sintomas de CVC após três anos do plantio. Os sintomas, apesar de típicos, ficaram restritos a poucas folhas em cada planta, tendo sido observados apenas na primavera, e não foram acompanhados por uma redução no tamanho dos frutos, como é comum nas laranjas doces.
Apesar de uma variedade de cidra ter tido reação positiva na região Sul, nas outras áreas a variedade Etrog mostrou-se assintomática e mesmo o teste por PCR não foi capaz de detectar
em seus tecidos (Tabela 2). Não foi possível detectar sintomas de CVC ou
em plantas de
e de gêneros relacionados a Citrus como Fortunella e Poncirus, mesmo nos locais com maior pressão de inóculo (Tabela 2).
Francisco F. Laranjeira,
Embrapa Mandioca e Fruticultura
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