Ouro de tolo

Apesar do aspecto externo normal, tomates com desordem fisiológica de impacto têm qualidade inferior.

10.11.2015 | 21:59 (UTC -3)

O tomate é uma das principais hortaliças consumidas no país, quer na forma fresca ou processada. A demanda por tomates de excelente qualidade tem aumentado significativamente em todo o mundo, nos últimos anos, em função das propriedades terapêuticas comprovadas do licopeno, pigmento que dá coloração avermelhada ao fruto. Trabalhos desenvolvidos em Israel, Itália e Estados Unidos demonstraram a capacidade que o licopeno, um carotenóide com propriedades antioxidantes, tem de prevenir o aparecimento de alguns tipos de câncer no ser humano.

Apesar de toda a importância que o fruto possui, observa-se que o manuseio pós-colheita é feito ainda de maneira precária. Em sua grande maioria, os frutos são embalados em caixas do tipo K, feitas de madeira e com superfície abrasiva, o que acaba por danificar os tomates, comprometendo sensivelmente a qualidade. Dentre os principais, figura o dano mecânico de impacto, que causa a desordem fisiológica de impacto.

Estudada desde a década de 50, a desordem fisiológica de impacto causa uma série de alterações de ordem visual, sensorial, química e física nos frutos. No início dos trabalhos, pesquisadores americanos observaram que impactos em tomates, em diferentes estádios de amadurecimento, resultavam em frutos com aspecto interno alterado. Àquela época não se tinha idéia de que tais alterações visuais eram apenas um indício dos sérios problemas causados à qualidade intrínseca dos frutos. Em estudos realizados posteriormente nos EUA, durante o transporte de tomates, verificou-se que frutos maduros deterioravam-se ou tornavam-se senescentes mais rapidamente quando transportados por caminhão do que quando por ferrovia, e que os frutos verdes eram mais resistentes ao transporte. Tal observação estava provavelmente relacionada a um maior dano fisiológico ao fruto causado pelo transporte rodoviário, onde as acelerações e desacelerações são mais constantes do que no transporte ferroviário.

No início da década de 90 pesquisadores americanos verificaram que frutos no início do estádio de amadurecimento eram mais suscetíveis ao desenvolvimento da desordem fisiológica de impacto do que frutos maduros. Observaram ainda que diversos fatores como a variedade, a energia e o número de impactos estavam associados ao desenvolvimento da desordem.

Em trabalhos mais recentes, desenvolvidos pela Embrapa Hortaliças em parceria com pesquisadores da University of Florida (EUA), constatou-se que a desordem fisiológica de impacto está associada à alteração do curso normal do amadurecimento causando alterações químicas, físicas e sensoriais significativas. Em um conjunto de trabalhos desenvolvidos ao longo de 4 anos, observou-se que tomates injuriados possuíam aumento da evolução de gás carbônico e etileno, elevação da atividade da enzima poligalacturonase e do extravasamento de eletrólitos no pericarpo de frutos injuriados e redução do teor de vitamina C total, licopeno e acidez titulável no tecido locular injuriado. Tomates injuriados também possuíam menor aceitação por parte dos consumidores, indicando que, além da qualidade, a injúria interna de impacto modificava o sabor e aroma de tomates com essa desordem fisiológica.

Utilizando-se de um “nariz eletrônico”, equipamento dotado de sensores que analisam os compostos voláteis emanados de uma amostra, verificou-se que frutos com desordem fisiológica de impacto possuíam cheiro significativamente diferente de frutos sem dano mecânico. Focando-se ainda no sabor e aroma dos frutos injuriados, foram estudados compostos-chave voláteis relacionados ao aroma e sabor de tomates submetidos a dano mecânico de impacto. Tomates possuem aproximadamente 400 compostos-chave relacionados com o aroma e o sabor característico do fruto. Destes, foram estudados 16 que têm maior importância na determinação do sabor e aroma característicos do fruto. Observou-se que a desordem fisiológica de impacto alterou significativamente o conteúdo destes voláteis, informação que contribui para a confirmação da alteração no sabor e aroma percebida pelos painelistas que participaram do painel de análise sensorial.

Finalizando os estudos, avaliou-se o armazenamento sobre atmosfera controlada visando a minimização da ocorrência da desordem fisiológica de impacto em tomates. Verificou-se que frutos submetidos a danos mecânicos de impacto não tiveram os sintomas ou mesmo as alterações químicas e físicas minorizadas pelo armazenamento sob atmosfera controlada.

A desordem fisiológica de impacto é um problema significativo durante o manuseio de pós-colheita de tomates, que tem sérias implicações na determinação da qualidade pós-colheita e vida de prateleira dos frutos. Esforços devem ser concentrados por pesquisadores, produtores e extensionistas visando minimizar a ocorrência de tal problema, garantindo que tomates de melhor qualidade cheguem à mesa do consumidor.

Celso Luiz Moretti,

Embrapa Hortaliças

Steven A. Sargent,

University of Florida / EUA

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