Manejo integrado de mofo-branco em soja

Práticas integradas, com foco especialmente em medidas preventivas, são essenciais para enfrentar de modo correto e sustentável o mofo branco na cultura da soja

28.07.2022 | 15:26 (UTC -3)

Práticas integradas, com foco especialmente em medidas preventivas, são essenciais para enfrentar de modo correto e sustentável o mofo branco na cultura da soja, doença fúngica com alto potencial destrutivo, cujo patógeno uma vez introduzido na área de cultivo é quase impossível de ser erradicado.

O mofo branco ou podridão branca da haste, causado pelo fungo Sclerotinia sclerotiorum(Lib.) de Bary, é uma das mais antigas doenças que acometem a cultura da soja, com ocorrência em diferentes regiões produtoras do Brasil. Possui capacidade de infectar mais de 500 espécies de plantas, em sua maioria dicotiledôneas.

O mofo branco da soja está amplamente distribuído em todos os continentes, com capacidade de ocasionar perdas na produtividade de aproximadamente 30%. Contudo, quando as medidas de controle não são eficientes, pode ocorrer a perda total da produção. Além disso, é importante salientar que o fungo tem potencial para causar doença em inúmeras culturas de importância agrícola, como alface, amendoim, batata, berinjela, canola, cenoura, girassol, feijão, tomate e diversas espécies de flores.

Estágios iniciais do desenvolvimento micelial de Sclerotinia sclesotiorum em plantas de soja. Santa Bárbara do Sul/RS
Estágios iniciais do desenvolvimento micelial de Sclerotinia sclesotiorum em plantas de soja. Santa Bárbara do Sul/RS

A disseminação em áreas de cultivo é favorecida pela utilização de sementes contaminadas, ausência de rotação de culturas, combinada com a adoção do plantio direto, introdução de espécies sensíveis em áreas infestadas como nabo forrageiro, crotalária, algodão, girassol e feijão e, em soja cultivada sob sistema de irrigação por aspersão. O fungo infecta a planta em qualquer estádio de desenvolvimento. No entanto, o período mais vulnerável compreende os estádios de plena floração (R2) até o início da formação das vagens (R3/R4).

As condições climáticas são os principais fatores moduladores da infecção, crescimento e desenvolvimento do fungo, bem como, da formação de suas estruturas de resistência (escleródios). As condições favoráveis ao patógeno são elevada umidade relativa do ar e temperaturas entre 10ºC e 21ºC.

A infecção por S. sclerotiorum começa quando os escleródios germinam e produzem o micélio, que penetra diretamente nos tecidos da planta. Ao infectar a planta hospedeira, a doença ocasiona podridão e seca, principalmente na haste da soja, devido à colonização dos tecidos verdes. Os primeiros sintomas visíveis são lesões encharcadas, que evoluem para uma coloração castanho-clara. É possível ainda observar um profuso crescimento micelial de coloração branca, característica que originou o nome da doença. Em poucos dias os micélios se transformam em escleródios.

Escleródios de Sclerotinia sclerotiorum completamente formados e sintoma reflexo de seca da haste da soja
Escleródios de Sclerotinia sclerotiorum completamente formados e sintoma reflexo de seca da haste da soja

O fungo S. sclerotiorum pode persistir na área de um ciclo de cultivo para outro, pela colonização de restos culturais presentes no solo, através da formação de estruturas de resistências, popularmente conhecidas como escleródios. Tais estruturas possibilitam que o fungo permaneça viável por até 11 anos e são responsáveis por armazenarem substâncias de reserva, que permitem a sobrevivência do patógeno até que as condições ambientais sejam favoráveis ao seu desenvolvimento. Os escleródios formados pelo micélio do fungo apresentam coloração escura e tamanho variável, de alguns milímetros a até alguns centímetros.

Os sintomas apresentados por plantas infectadas englobam o amarelecimento, murchamento e secamento dos ramos e folhas. Em estágios mais avançados de desenvolvimento da doença, tem-se a formação dos escleródios. O emaranhado de micélios transforma-se, portanto, em uma massa negra e rígida dando origem aos escleródios, que podem estar presentes tanto na superfície como no interior de hastes e vagens colonizadas pelo fungo.

O manejo desta doença deve, preferencialmente, ser realizado através da adoção de várias medidas de controle integrado, ambas com objetivo de reduzir o inóculo inicial. O primeiro passo para o controle do mofo branco é evitar a entrada do patógeno na área, através da limpeza de implementos agrícolas utilizados em lavouras com histórico da doença e da aquisição de sementes certificadas com qualidade fitossanitária atestada. Além disso,recomenda-se a realização do tratamento de sementes com fungicida. Atualmente existem três produtos registrados para uso no tratamento de sementes de soja para o controle de S. sclerotiorum: tiofanatometílico + fluazinam, carboxina + tiram e fludioxonil + metalaxil-M + tiabendazol.

Planta de soja severamente infectada com Sclerotinia sclerotiorum (esquerda). Interior da hasta da soja infectada com mofo-branco, a seta em destaque indica a presença de escleródios e micélio de Sclerotinia sclerotiorum na parte interna da haste (direita)
Planta de soja severamente infectada com Sclerotinia sclerotiorum (esquerda). Interior da hasta da soja infectada com mofo-branco, a seta em destaque indica a presença de escleródios e micélio de Sclerotinia sclerotiorum na parte interna da haste (direita)

A rotação e/ou sucessão de culturas com espécies não hospedeiras é fortemente recomendada, principalmente com o uso de espécies gramíneas como o milho, o trigo e a aveia branca. Em sistemas de cultivos convencionais, com o revolvimento do solo, os escleródios são expostos à luminosidade e a temperaturas elevadas e, consequentemente, degradados. Um eficiente manejo de daninhas também é importante para a redução do inóculo inicial de S. sclerotiorum, uma vez que essas plantas podem ser hospedeiras do patógeno responsável por causar a doença.

Para o controle químico do mofo branco em soja, os fungicidas registrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) são fluazinam, procimidona, carbendazin, boscalida, metam-sódico, iprodiona, procimidona, picoxistrobina, boscalida+ dimoxistrobin, além de misturas de tiofanato metílico com fluazinam, clorotalonil, mancozeb e procimidona. Entretanto, é importante ressaltar que a eficiência do controle químico vai depender, sobretudo, da época, qualidade e modo de aplicação. Uma das principais dificuldades encontradas nessa medida de controle é propiciar condições para que o produto possa atingir as partes inferiores das plantas e a superfície do solo em um momento em que o dossel de plantas já tenha fechado totalmente.

Diante das dificuldades enfrentadas no controle químico do mofo branco em soja, a utilização do controle biológico tem se tornado uma prática recorrente. Diversas pesquisas têm demonstrado a eficiência do uso de fungo Trichoderma spp. no controle biológico de S. sclerotiorum. Em áreas com histórico da doença, o Trichoderma spp. é geralmente aplicado no solo antes ou no início do desenvolvimento da cultura.

Genótipos de soja com algum grau de resistência ao mofo branco já foram relatados na literatura. No entanto, atualmente não se tem registro de cultivares de soja que apresentem aceitável nível de resistência genética ao mofo branco no mercado brasileiro.

Para um manejo eficiente do mofo branco na cultura da soja deve-se fazer uso de práticas que compõem o manejo integrado de doenças. Quando combinadas, essas técnicas contribuem para uma medida de controle mais sustentável e racional. As medidas preventivas sempre serão preconizadas, devido ao fato de que uma vez introduzido o patógeno na área de cultivo a sua erradicação torna-se uma tarefa de grande dificuldade.

Box – Soja no Brasil

A soja (GlycinemaxL. Merril) está entre as culturas leguminosas de maior importância agrícola. Sua área mundial de cultivo na safra 2016/17 foi de 120,3 milhões de hectares, com produção de 351,3 milhões de toneladas, de acordo com as informações do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA).

O Brasil possui a maior área cultivada com soja do mundo, com 33,9 milhões de hectares. Entretanto, quando observada a produção brasileira, que na última safra foi de 113,9 milhões de toneladas, o país é o segundo maior produtor, ficando atrás apenas dos Estados Unidos, que produziu aproximadamente 117,21 milhões de toneladas. Os EUA possuem a segunda maior área de cultivo de soja do mundo. Apesar de contar com maior área plantada, o Brasil apresenta menor produtividade média (3.36 kg/ha) em relação aos EUA (3.50 kg/ha). É importante salientar que, juntos, estes dois países correspondem a 65,8% da produção mundial de soja.

De acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), os três estados brasileiros com maior produção de soja são Mato Grosso (30,51 milhões de toneladas), Paraná (19,53 milhões de toneladas) e Rio Grande do Sul (18,71 milhões de toneladas), em uma área de 9,32 milhões de hectares, 5,25 milhões de hectares e 5,57 milhões de hectares, respectivamente. Ao observar-se a produtividade média de cada estado, o Paraná destaca-se em primeiro lugar com aproximadamente, 3.72 kg/ha, seguido pelo Rio Grande do Sul com 3.36 kg/ha e Mato Grosso do Sul com 3.27 kg/ha.

O potencial produtivo genético da soja é influenciado por diversos fatores ambientais, denominados de estresses bióticos e abióticos. As doenças estão entre os principais estresses bióticos limitantes ao rendimento desta cultura. Os fungos são agentes patogênicos responsáveis por causar doenças com maior frequência na soja cultivada comercialmente no Brasil. A maior frequência de doenças fúngicas se deve às condições climáticas favoráveis ao desenvolvimento de fungos, juntamente com a prática da monocultura e o uso, em alguns casos, de sementes contaminadas.

Artigo publicado na edição 227 da Cultivar Grandes Culturas, mês abril, ano 2018.

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