Manejo de Spodoptera frugiperda: lagarta de cardápio variado!

Por Daniel de Brito Fragoso e Daniel Pettersen Custódio, Embrapa Arroz e Feijão, Pesca e Aquicultura

28.04.2023 | 17:09 (UTC -3)

A Spodoptera frugiperda (Smith, 1977), conhecida comumente como lagarta-militar ou lagarta do-cartucho-do-milho, é uma praga polífaga e que devidos aos prejuízos causados em diversas culturas como milho, arroz, feijão, soja, algodão, pastagens, entre outras, tem se tornado em um sério problema como praga da agricultura brasileira. Esta praga é originária da região tropical, com ocorrência em todo continente americano.

No Brasil está presente em todos os estados brasileiros, sendo a principal praga da cultura do milho, que sobre condições favoráveis podem causar severos danos, podendo as perdas chegar a 100% da produção.

Nas culturas do milho, sorgo e milheto, as lagartas de S. frugiperda atacam preferencialmente o cartucho das plantas, sendo que em alguns casos podem atacar também o colmo. No algodoeiro, as lagartas alimentam-se de folhas, de botões florais e, principalmente, de maçãs em formação. Na em soja, as lagartas alimentam-se inicialmente das folhas, passando depois a consumir também vagens na fase inicial de formação. Em feijão tem sido observado o corte de plantas novas, enquanto que em arroz e pastagens alimentam-se das folhas causando desfolhas.

Descrição da Spodoptera frugiperda

A praga tem desenvolvimento completo, passando pelas fases de ovo, lagarta, pupa e adulto (mariposa). As mariposas de Spodoptera frugiperda medem 35 mm a 38 mm de envergadura, com dimorfismo sexual (asas anteriores marrom-acinzentadas na fêmea e mais escuras no macho). Os ovos beges são colocados em massa.

Devido a comportamento de canibalismo, as lagartas de primeiro instar têm comportamento dispersivo. As lagartas têm coloração variada (verde-claras, marrom-escuras ou quase pretas) e medem cerca de 40 mm ao completarem o desenvolvimento.

Crescimento populacional de S. frugiperda

O potencial biótico de S. frugiperda é dependente das taxas de viabilidade de ovos e sobrevivência das lagartas em seus diferentes instares. Em condições de campo a viabilidade de ovos é variável, mas sob condições favoráveis pode chegar a 90%. Lagartas de primeiro instar são bastante vulneráveis aos fatores naturais de mortalidade naturais, principalmente chuva, bem como ação de inimigos naturais como predadores, inclusive canibalismo. A viabilidade de lagartas do segundo ao sexto instar pode variar de 30 a 60% dependendo das condições favoráveis como período seco ou estiagem.

Condições favoráveis à ocorrência da Spodoptera frugiperda

(a) Ambiente favorável

O conhecimento dos fatores ambientais favoráveis ao desenvolvimento e proliferação da praga é de suma importância para adoção das estratégias de manejo e medidas de controle. A temperatura é um dos principais fatores que interferem sobre o desenvolvimento das pragas. Para S. frugiperda, a faixa de temperatura de 25 a 28 ºC é considerada ideal para o seu desenvolvimento, onde a praga completa seu ciclo de vida de ovo a adulto em cerca de 30 dias. Em geral as lagartas aparecem em maiores populações e níveis de infestações em anos secos, podendo alcançar até mais de 10 gerações por ano.

(b) Alterações dos sistemas de produção e disponibilidade de alimentos

A intensificação e diversificação nos diferentes sistemas de produção, que por um lado, muito tem contribuído para a produção de alimentos e fibras, por outro lado, também tem favorecido o agravamento do problema de pragas nos agroecoecossistemas. Nos sistema intensivo de produção que empregam a sucessão de culturas, como milho ou soja verão, ou milho ou sorgo na safrinha, é comum se observar a grande oferta de alimentos e hospedeiros ao longo do ano, que constitui um dos fatores que a ser considerado para o manejo de S. frugiperda.

Nas grandes regiões produtoras e de fronteira agrícolas, como é o caso do Centro-Oeste brasileiro e MATOPIBA, onde é utilizada alta tecnologia nos sistemas de produção, o plantio de milho irrigado com pivô central no inverno aumenta a disponibilidade de hospedeiros nesse período. De maneira semelhante, o plantio em áreas próximas de diferentes culturas com fenologias distintas, como é o caso da soja, do milho e do algodão que são cultivados no verão, além de plantas de cobertura na entressafra, como o milheto, pode favorecer a manutenção e o movimento de S. frugiperda entre os cultivos.

Portanto, a intensificação dos sistemas de cultivo nas regiões produtoras brasileiras, que permitem a colheita de duas e até mesmo três safras/ano, formando a chamada “ponte verde”, associado ao grande número de plantas hospedeiras são os principais fatores da permanência desse inseto no campo durante todo o ano. A ocorrência de lagartas de S. frugiperda atacando as principais culturas está relacionada à presença delas em plantas hospedeiras, geralmente daninhas ou pastagens, pouco antes da semeadura.

(c) Medidas recomendadas para o manejo de S. frugiperda

Fato que se percebe nos campos de produção é que em função das frequentes ocorrências e das altas infestações, isso tem estimulado o uso indiscriminado do controle químico, mesmo com advento do uso de plantas geneticamente modificadas (Plantas Bt). Em muitos casos, o uso do controle químico é feito fora das premissas preconizadas pelo Manejo Integrado de Pragas (MIP), o que tem gerado uma série de consequências indesejáveis como aumento do custo de produção, aumento do risco de contaminação do ambiente, aplicadores e dos alimentos, além do grave problema que tem se tornado cada vez mais comum, que é o desenvolvimento de resistência dos insetos-praga aos inseticidas.

(d) Estratégias de manejo da praga

O monitoramento de S. frugiperda tem o objetivo de auxiliar o produtor a evitar perdas pelo ataque da praga e definir qual a melhor tática de controle e época certa de efetuar o controle, caso o nível de controle seja atingido. O ideal é que o monitoramento seja continuo por meio de uma rede de monitoramento para toda a região agrícola, quando isso não for possível recomenda-se o início do monitoramento antes da semeadura, ou seja, antes da dessecação, monitorando a presença de lagartas em plantas hospedeiras e na palhada da cultura antecessora. No monitoramento pode ser feito por meio de observações visuais e armadilhas luminosas e de feromônio. Deve se atentar também para a presença de outras pragas alvo e de inimigos naturais. As informações de monitoramento são importantes e devem serem usadas para planejar e propor estratégias de manejo considerando a região e o sistema de produção como um todo.

No caso do uso do controle químico com uso de inseticidas, é extremamente importante o uso com critérios, observando a classificação do modo de ação (MoA) dos inseticidas registrados para o controle de S. frugiperda e propor o uso quando necessário efetuando uma sequência de aplicação rotacionando ingredientes ativos com modo de ação diferentes. Isto, contribui para retardar a evolução e o desenvolvimento de populações de S. frugiperda resistentes a inseticidas.

A tecnologia de plantas geneticamente modificadas contendo genes Bt, atualmente se configura como uma importante ferramenta para o manejo de S. frugiperda. Mas deve se atentar para o uso correto dessa ferramenta, de forma a não comprometer ou reduzir a vida útil por perda de eficácia dos eventos. Para isso é necessário seguir à risca as orientações técnicas sobre a utilização das áreas de refúgio, e fazer a rotação de proteínas presentes nos diferentes eventos (Tabela 1).

Portanto, estratégias de manejo de resistência a inseticidas (MRI) são necessárias para garantir maior vida útil da tecnologia, pois fatores da espécie-praga como a existência de raças-hospedeiro, a distribuição endêmica, os relatos de resistência e os aspectos bioecológicos de polifagia e amplo crescimento populacional em culturas agrícolas (milho, soja e algodão) favorecem a evolução da resistência a proteínas Bt.

O controle biológico natural deve sempre ser favorecido por meio de boas práticas agrícolas, a citar o uso de produtos seletivos aos inimigos naturais. A liberação de parasitoides como Trichogramma na cultura é também uma prática a ser priorizada. Recomendam a liberação de cerca de 100 000 indivíduos por hectare quando aparecerem as primeiras posturas ou adultos da praga.

Portanto, para o manejo dessa importante lagarta que ataca as principais espécies cultivadas recomenda-se o Manejo Integrado de Pragas (MIP), cujos princípios básicos que o norteiam devem ser empregados dentro do enfoque de sistema de produção integrados. A variação populacional de S. frugiperda é determinada por um conjunto complexo de fatores, os quais, na medida do possível, devem ser manipulados para evitar que o seu crescimento populacional atinja níveis que causem danos econômicos. Não se deve, entretanto, empregar métodos de controle isolados, como por exemplo, apenas o uso do controle químico, e sim buscar a integração das práticas disponíveis para a manutenção da sustentabilidade do manejo da praga.

Cultivos de lavouras conduzidas em condições favoráveis podem tolerar melhor o ataque de S. frugiperda, e as recomendações disponíveis em relação a espaçamento, cultivares, épocas de plantio, adubação, condições de umidade e preparo do solo, rotação de culturas e associação de cultivos devem ser cuidadosamente observadas na instalação da cultura.

O controle químico deve ser visto como uma alternativa ou ferramenta a ser utilizada quando as outras medidas de controle não forem suficientes para um controle efetivo, sendo portanto complementar, e levando-se em consideração as relações entre os benefícios, riscos e custos. A escolha do produto, dose e número de aplicações deve se basear na gravidade e nível populacional da praga, no estádio de desenvolvimento e na economicidade do mesmo. Aplicações corretas significam reduções na quantidade de produto aplicado, nos custos de produção, na poluição ambiental e nos resíduos nos alimentos.

Outro aspecto importante, diz respeito a tecnologia de aplicação dos inseticidas também deve ser considerada no momento da aplicação do controle químico, com atenção para a manutenção e regulagem dos equipamentos, volume de calda, horário de aplicação e velocidade de vento. Assim, recomendam-se o uso de bicos apropriados, volume de calda suficiente para uma boa cobertura da área, realizar as aplicações nos horários mais frescos do dia, e velocidade de vento não superior a 10 km/hora.

Por Daniel de Brito Fragoso e Daniel Pettersen Custódio, Embrapa Arroz e Feijão, Pesca e Aquicultura

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