Dicas de plantio para obter uma colheita de sucesso
Por Bruno Sartori, coordenador de treinamento da Trimble Agricultura no Brasil, empresa que é referência global em agricultura de precisão
Nematoides são parasitos cujos danos variam de acordo com a espécie presente no canavial, cuja redução de produtividade pode superar 50% em casos de níveis populacionais muito altos. Devido à ausência de variedades comerciais resistentes, se sobressai o uso de nematicidas químicos aplicados no plantio e/ou nas soqueiras.
Os nematoides são importantes redutores de produtividade em canaviais brasileiros. A análise do banco de dados do laboratório DMLab, referente às amostras coletadas em canaviais da Região Centro-Sul do Brasil, entre 2001 e 2013, revelou que Pratylenchus zeae é, sem dúvida, a espécie mais frequentemente encontrada em populações altas o suficiente para causar danos econômicos, presente em 97% das amostras analisadas. As espécies Meloidogyne javanica e Pratylenchus brachyurus foram encontradas em aproximadamente 35% das amostras, enquanto Meloidogyne incognita, em somente cerca de 20% das amostras, embora seja a espécie mais patogênica para a maioria das cultivares de cana-de-açúcar (Dinardo-Miranda, 2014).
Os danos causados por esses parasitos variam em função das espécies ocorrentes, da população de cada uma delas, do tipo de solo, da variedade de cana e de muitos outros fatores, mas se situam em média entre 20% e 40% de redução de produtividade no primeiro corte, podendo chegar a mais de 50 %, em casos de níveis populacionais muito altos e variedades muito suscetíveis. Nas soqueiras, a produtividade também é seriamente reduzida, comprometendo a longevidade da lavoura, que precisa ser renovada mais frequentemente em áreas infestadas (Dinardo-Miranda, 2014). A grandeza dos danos causados por nematoides em cana-planta e em cana-soca podem facilmente ser observados em campo, pelo uso de nematicida em áreas infestadas, em comparação com áreas não tratadas: plantas maiores apresentam menores populações de nematoides em suas raízes devido ao uso de nematicidas, no plantio ou nas soqueiras.
O primeiro passo para reduzir os problemas com nematoides é conhecer as áreas onde ocorrem. Para isso, é imprescindível realizar uma boa amostragem, que pode ser feita em qualquer ciclo da cultura, sendo os resultados utilizados na adoção de medidas de controle no ciclo seguinte. Dois parâmetros devem ser considerados para realizar uma boa amostragem: a época e o número de amostras a serem coletadas na área.
Em relação à época de amostragem, deve-se considerar que as populações de nematoides nas raízes e no solo são influenciadas por inúmeros fatores, como temperatura e umidade do solo. Ambos exercem tanto influência direta sobre as populações de nematoides, afetando sua sobrevivência e capacidade de multiplicação, como indireta, interferindo no desenvolvimento das raízes. Uma vez que esses nematoides são parasitos obrigatórios, o desenvolvimento das raízes tem influência preponderante sobre seu desenvolvimento.
Em épocas de temperaturas mais baixas e falta de água no solo, a cana-de-açúcar perde parte de seu sistema radicular e as populações de nematoides se reduzem, tanto devido às condições de umidade e temperatura baixas como por conta da morte das raízes das plantas. As populações de nematoides só voltam a crescer quando as temperaturas se elevam e a água no solo se torna abundante, condições favoráveis também para o bom desenvolvimento das raízes. Assim, o período mais adequado para amostragem é o mais quente e chuvoso do ano, que na região Centro-Sul do Brasil corresponde à primavera e ao verão. Nessa região, o pico populacional de nematoides em canaviais geralmente ocorre entre janeiro e março. O ideal é iniciar as amostragens cerca de 30 a 40 dias depois do início das chuvas e estendê-las até 30 a 40 dias após o fim da estação chuvosa (Dinardo-Miranda, 2014).
Devido à grande variabilidade espacial das populações de nematoides é recomendável que a amostra que representa determinado talhão seja composta por duas subamostras para cada hectare do talhão. São as amostras compostas que devem ser enviadas ao laboratório para análise. As amostras devem conter cerca de 100g de raízes (Figura 3) e 1L de solo (Dinardo-Miranda, 2014).
Considerando as espécies de nematoides presentes na amostra, a quantidade de cada uma delas, a época de amostragem, o ciclo da cultura, o ambiente de produção e outros fatores, baseado em dados experimentais o nematologista interpreta os resultados da análise, informando ao produtor o nível populacional de nematoides na área. Populações médias e altas de nematoides são consideradas superiores ao nível de dano econômico e em áreas com tais populações medidas de controle devem ser adotadas.
O uso de variedades resistentes seria, sem dúvida, um dos métodos mais práticos para reduzir as populações de nematoides (Lordello, 1981). Entretanto, são raras as variedades atualmente em cultivo resistentes a, pelo menos, uma das espécies de nematoide de importância econômica. Além disso, em campo é frequente a ocorrência de duas ou mais espécies de nematoides na mesma área, fazendo com que o emprego de uma variedade resistente a uma única espécie não seja efetiva.
A adição de matéria orgânica ao solo também é frequentemente citada como efetiva na redução populacional de certos nematoides, por criar condições favoráveis à multiplicação de seus inimigos naturais, principalmente fungos, e por liberar, durante sua decomposição, substâncias orgânicas com ação nematicida (Lordello, 1981). Em canaviais, a matéria orgânica mais utilizada é a torta de filtro, mas trabalhos conduzidos em campo por Novaretti & Nelli (1985) e Dinardo-Miranda et al. (2003) revelaram que a torta de filtro não tem efeito significativo sobre as populações de nematoides, pelo menos nas doses em que é empregada em canaviais. Os autores de ambos os trabalhos concluíram que os aumentos de produtividade observados pelo uso da torta de filtro deveriam ser atribuídos a seus efeitos nutricionais. Na implantação da lavoura em áreas infestadas por nematoides, a torta de filtro tem sido uma ferramenta valiosa para obtenção de produtividades mais elevadas, principalmente quando utilizada em conjunto com nematicidas, porque aos seus efeitos benéficos (umidade e nutrientes) se somam os benefícios dos nematicidas (redução populacional de nematoides).
Outro material muito empregado em canaviais é a vinhaça, cujos efeitos na redução populacional de nematoides foi verificado por Pedrosa et al. (2005), em estudos em laboratório e casa de vegetação. Embora os autores tenham observado que a vinhaça em altas doses (até 1500 m³/ ha) pudesse prejudicar a eclosão de ovos de M. javanica e M. incognita, ressaltaram a necessidade de avaliações em campo, principalmente porque a vinhaça naquelas doses prejudicou o desenvolvimento das plantas.
A torta de mamona teve efeitos mais expressivos. Em ensaio em campo, esse produto reduziu as populações de nematoides e, em função disso, promoveu incrementos de produtividade (Dinardo-Miranda & Fracasso, 2010a). Apesar disso, esse material tem sido pouco estudado e raramente empregado em canaviais devido ao seu alto custo.
A rotação com plantas não hospedeiras, para diminuir os prejuízos causados por nematoides, também tem sido alvo de estudos, em várias culturas. Em áreas cultivadas tradicionalmente com cana-de-açúcar, as crotalárias estão entre as plantas mais empregadas, por serem muito produtivas, o que reflete diretamente na produtividade do canavial subsequente. Estudos conduzidos no Nordeste do Brasil, revelaram que as crotalárias podem reduzir as populações de nematoides do gênero Meloidogyne, quando cultivadas por pelo menos dois anos na área (Moura, 1991; Rosa et al., 2003). Entretanto, podem aumentar as populações de P. zeae (Rosa at al., 2003).
Quando o período de rotação de culturas se limita a quatro ou cinco meses, tempo entre a destruição do canavial antigo e a implantação da nova lavoura, como ocorre na região Centro-Sul do Brasil, faz-se apenas um ciclo de cultivo de crotalárias. Neste caso, não há efeito significativo da rotação com crotalárias sobre as populações de Meloidogyne no canavial implantado em seguida, embora possa ocorrer aumento nas populações de Pratylenchus (Dinardo-Miranda & Gil, 2005). Apesar disso, a rotação com crotalárias geralmente contribui para aumentos de produtividade no canavial subsequente, devido aos seus benefícios como adubo verde (Dinardo-Miranda & Gil, 2005), razão pela qual a rotação com crotalárias em áreas infestadas com nematoides tem sido bastante empregada em cana, sem dispensar, entretanto, o uso de nematicidas na implantação da lavoura de cana-de-açúcar.
Devido à falta de variedades comerciais resistentes a nematoides e à baixa eficiência da matéria orgânica e da rotação de culturas na redução populacional de nematoides em canaviais, o manejo de áreas infestadas baseia-se no uso de nematicidas químicos aplicados no plantio e/ou nas soqueiras, associados ou não ao emprego de matéria orgânica e à rotação de culturas.
No plantio, os nematicidas são aplicados sobre os toletes, imediatamente antes do fechamento dos sulcos. Por reduzirem as populações de nematoides pelos primeiros dois a cinco meses de idade da cultura, promovem um melhor desenvolvimento das raízes e, consequentemente da parte aérea das plantas, o que resulta em 15% a 50 % de aumento de produtividade, em relação às áreas sem nematicida (Dinardo-Miranda, 2014).
Nas soqueiras, os nematicidas são aplicados em corte ao lado das linhas de cana ou sobre elas, contribuindo para incrementos de produtividade de 10% a 25 % (Dinardo-Miranda, 2014). A grandeza dos incrementos de produtividade está intimamente ligada à época em que se faz a aplicação do nematicida na soqueira e esta, ao desenvolvimento do sistema radicular da cana-de-açúcar.
Como ocorre morte de raízes no período seco do ano e crescimento de raízes no período chuvoso, independentemente do corte da parte aérea das plantas (Vasconcelos, 2006), a aplicação de nematicidas em soqueiras colhidas na época seca do ano (entre junho e outubro, na região Centro-Sul do Brasil) tem se mostrado mais vantajosa quando feita de 30 a 90 dias depois da colheita, de maneira a ficar próxima do período chuvoso subsequente. Por outro lado, para canaviais colhidos em pleno período chuvoso, as aplicações são mais efetivas e resultam em maiores incrementos de produtividade se realizadas logo depois do corte (Dinardo-Miranda, 2014).
Leila Luci Dinardo-Miranda, Centro de Cana-de-açúcar, Instituto Agronômico, Ribeirão Preto (SP), Brasil
Artigo publicado na edição 213 da Cultivar Grandes Culturas.
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