Manejo de grama-seda e tiririca em cana-de-açúcar

Com alta capacidade de propagação e de interferir negativamente na cultura, ambas plantas daninhas demandam muita atenção e esforço dos produtores para prevenir e minimizar os prejuízos

09.09.2022 | 14:24 (UTC -3)

Grama seda e tiririca são duas plantas daninhas de difícil controle nos canaviais. Com alta capacidade de propagação e de interferir negativamente na cultura, ambas demandam muita atenção e esforço dos produtores para prevenir e minimizar os prejuízos.

A origem exata da grama-seda não é bem definida, possivelmente tenha surgido primeiramente na África, Eurásia, Índia ou Malásia. Mas, é uma espécie muito primitiva e, atualmente, considerada a planta daninha de maior distribuição geográfica no planeta (KISSMANN, 1997), só perde para a tiririca. Pode ser encontrada, nas regiões tropicais e subtropicas, ao redor do globo, estando presente em aproximadamente 100 países. No Brasil está presente de norte a sul, seja como infestante ou planta cultivada (no caso de forrageira em pastagens).

A tiririca é originária da Índia e é a planta daninha mais disseminada no mundo, sendo encontrada nos mais diversos tipos de agroecossistemas. Está presente em todos os países de clima tropical e subtropical e em muitos de clima temperado (KISSMANN, 1997).

Existem relatos que esta planta daninha foi introduzida no Brasil desde o início da colonização europeia, em vasos trazidos da Índia com outras espécies. O seu estabelecimento inicial teria sido nas regiões de Rio de Janeiro, Recife e Salvador (DEUBER, R. 1992).

Características

A grama-seda também é conhecida como capim-bermuda e possui nome científico de Cynodon dactylon (GURGEL, 2003). No Brasil, é uma gramínea perene de crescimento herbáceo que atinge no máximo 40 cm de altura. Quando as plantas são novas apresentam porte rasteiro e atingem o porte ereto somente após sua floração (KISSMANN 1997).

A reprodução pode ser tanto sexuada como assexuada, mas como suas sementes são bem pequenas e possuem vida curta, tornam a reprodução por sementes insignificante, se reproduzindo principalmente por rizomas e estolões (PROCÓPIO et al., 2003). O desenvolvimento dos estolões ocorre sobre a superfície do solo, com comprimentos que variam de centímetros a metros. Já os rizomas se encontram subterrâneos e bastante ramificados.

A tiririca (Cyperus rotundus) é também conhecida como junça aromática, e apresenta semelhanças com a grama-seda, desde características morfológicas até medidas de controle e prejuízos causados. As plantas de tiririca são perenes, e sua parte aérea (conhecida como epígea) possui porte herbáceo com até 50 cm de altura. As raízes originam diferentes tubérculos que permanecem ligados em forma de cadeia (KISSMANN, 1997).

Sua reprodução pode ser tanto sexuada como assexuada, mas a reprodução por sementes é pouco significativa porque, menos de 5% são viáveis. Assim, a principal multiplicação se dá por tubérculos e bulbos subterrâneos. A tiririca se adapta aos diferentes ambientes edafoclimáticos, o que inclui localidades de elevadas temperaturas. Nas regiões de temperatura baixa o seu desenvolvimento e a multiplicação tornam-se lento, somente o congelamento do solo mata seus tubérculos. Também toleram prolongados períodos de seca ou inundação (KISSMANN, 1997).

Propagação

Os principais meios de disseminação da tiririca e grama-seda ocorrem pelo uso das máquinas e implementos para o preparo de solo (subsoladores e grades), plantio (plantadoras de colmos ou MPBs) e tratos culturais (aplicadores de fertilizantes e inseticidas na linha da soqueira). Os implementos distribuem suas partes vegetativas (tubérculos de tiririca e estolões de grama-seda) no próprio talhão, bem como transportam para outros talhões. Como possuem elevada capacidade de reprodução e facilidade de se adaptar em diversos ambientes produtivos, rapidamente a infestação é observada no talhão, caso nenhum controle específico seja praticado.

Para grama-seda cada hectare infestado pode produzir até 40 toneladas de rizomas na camada de 0-15 cm do solo. Uma única planta pode produzir até 5 metros de rizomas em 80 dias, que tendem a permanecer dormentes no solo proporcionando fluxos de emergência irregulares. Essa característica contribui para persistência das partes vegetativas no solo por longos períodos, podendo ser encontradas a até 80 cm de profundidade (JAKELAITIS et al., 2003).

Já, a tiririca pode ter seus tubérculos encontrados em até 40 cm de profundidade no solo. Segundo Lorenzi (1983), a intensidade na formação das cadeias de tubérculos, atingem densidades de 3000 tubérculos em 0,4 m3 (40 cm solo x 1 m2 superfície), com até 2000 manifestações epígenas na superfície (1 m2). Jakelaitis et. al (2003) destacaram que um único tubérculo no espaço de um ano origina uma densidade de até 700 novos tubérculos, sendo que um hectare infestado pode desenvolver até 40 toneladas de tubérculos na camada de 0-15 cm do solo.

Prejuízos

Na cultura da cana-de-açúcar a grama-seda domina a comunidade infestante, ou seja, se transforma rapidamente na espécie dominante. Proporciona perdas na produtividade que chegam até 85%, quando não controladas adequadamente (VICTORIA FILHO & CHRISTOFFOLETI, 2004). Também reduzem o número de cortes e a vida útil do canavial (KISSMANN, 1997).

Os prejuízos ocasionados por essa daninha devem-se, principalmente, a sua alta capacidade de propagação, o que acaba “sufocando” a cana particularmente na sua fase juvenil, leva os perfilhos à morte e as falhas no estande do canavial tornam-se evidentes (Figura 2). Normalmente, em uma reboleira de grama-seda, a cana praticamente desaparece.

Uma única planta de grama-seda pode originar uma reboleira de 25 metros de diâmetro em apenas dois anos e meio. Estima-se que um canavial com soqueira no terceiro corte e com potencial produtivo de 80 t/ ha produzirá apenas 45 t/ ha/ (redução de 35 t/ha) se infestado com grama-seda (CANAONLINE, 2017).

Os prejuízos, em sua maioria, são decorrentes da competição exercida pela grama-seda quanto aos recursos naturais (água, luz, nutrientes, espaço), mas deve-se também considerar sua capacidade de produção e liberação de aleloquímicos no solo, o que afeta e inibe as brotações e causa dificuldade de crescimento na cultura (SILVA et al., 2005).

A grama seda tem grande potencial de causar aumento de impurezas minerais e vegetais na indústria, dado o volume de massa vegetal formada. Também pode ser hospedeira de nematoides dos gêneros Meloidogyne e Pratylenchus, os mais danosos à cultura da cana-de-açúcar.

A tiririca possui enorme capacidade de interferir no desenvolvimento das culturas, de modo que em mais de 100 países indicam-na como “praga nacional” (KISSMANN, 1997). A espécie precisa da presença do sol para seu estabelecimento e tolera muito pouco o sombreamento. Devido a essa característica sua presença nos canaviais ocorre nos primeiros meses após colheita ou plantio da cultura (máximo até 120 dias).

No Brasil a tiririca é a mais conhecida das plantas daninhas, e mais de 1 milhão de hectares de cana-de-açúcar apresentam infestação (LORENZI, 1983). Os prejuízos são decorrentes, em sua maioria, pela competição da tiririca pelos recursos do meio (água, luz e nutrientes), mas também possuem potencial alelopático. Em cana-planta, as substâncias, exudada inibem a brotação de gemas e o perfilhamento da cana, o que resulta em estandes mais baixos.

Em casos de extrema infestação a produtividade dos colmos cai em 75%, além da redução de 65% no acumulo da sacarose (KISSMANN, 1997). Pela sua enorme capacidade de multiplicação pode formar até 40 toneladas de matéria vegetal por hectare e, ainda ser hospedeira alternativa para fungos como Fusarium spp. e para diversas espécies de nematoides.

Manejo complementar

O principal meio de disseminação da grama seda e da tiririca é realizado por suas partes vegetativas (estolões e tubérculos) que ficam presas nas máquinas e implementos agrícolas. A medida que utilizam-se dos implementos (grades, subsoladores, sulcadores) os estolões da grama-seda ou os tubérculos da tiririca se desprendem e são disseminados pelo canavial.

Particularmente, quanto a tiririca, a distribuição da torta de filtro (subproduto rico em fósforo), seja nas soqueiras ou sulcos de plantio, também é grande responsável pela dispersão dos tubérculos. É muito comum a torta de filtro estar contaminada com tubérculos de tiririca oriundos dos locais de depósito.

A limpeza das partes internas dos implementos ou máquinas agrícolas é eficaz para impedir que restos vegetativos sejam levados para outros canaviais, particularmente para os que não são infestados pelas espécies. Nesse caso, o controle preventivo soma-se eficazmente ao manejo químico a ser adotado sobre grama-seda e tiririca em canaviais.  

O controle cultural também pode ser somado ao manejo químico da grama-seda e tiririca, plantando-se a cultura nos períodos de maior umidade (dezembro a março). Ocorre que a umidade e temperatura do verão favorecem o crescimento da cana-de-açúcar, que ao sombrear rapidamente o solo dificulta o desenvolvimento de ambas as plantas daninhas. Salienta-se que o controle cultural colabora com o manejo das espécies, particularmente quando associado ao químico, porém, por si só não resulta em resultados de controle eficazes.

Também para agregar ao manejo da tiririca e grama-seda o controle mecânico deve ser considerado. Segundo Azania (2006), implementos, geralmente usados no preparo do solo, segmentam os tubérculos e estolões, expondo-os a desidratação pelo sol na superfície do solo. Quando o preparo de solo é realizado em canaviais infestados por grama-seda e tiririca em períodos de menor umidade, geralmente entre março a outubro (período semi-seco e seco), os resultados no controle são melhores.

Herbicidas recomendados

De acordo com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) há diferentes herbicidas para manejo químico de tiririca e grama seda (Tabela 1), mas não são todos seletivos a cana-de-açúcar. A partir da listagem proposta o agricultor precisa identificar quais são seletivos à cana-de-açúcar e depois a época do ano em que o herbicida será usado, particularmente quanto a umidade no solo.

Para o período úmido (chuvas mais regulares) usar herbicidas de baixa solubilidade (Sw), para período semi-seco, seco ou semi-úmido (chuvas irregulares) empregar herbicidas de solubilidade intermediária ou alta. A dose do herbicida deve ser ajustada para o tipo de solo, evitar usar as maiores doses recomendadas para solos arenosos.

Manejo químico plantio

O manejo da grama-seda e tiririca deve ser complementado com o controle químico. Certamente, se os herbicidas forem aplicados após medidas preventivas, culturais e mecânicas, a eficácia no controle será ainda melhorada. 

Para cana-planta, ao final do preparo do solo, a aplicação de herbicidas em pré-plantio incorporado (PPI) ajudará a reduzir significativamente a quantidade de estolões e rizomas presentes no solo. Entretanto, melhores resultados de controle são observados quanto maior o tempo que se deixa o herbicida em contato com as partes vegetativas das espécies. Sugere-se tempo mínimo entre 20 dias a 30 dias antes do plantio da cana-de-açúcar.

Tabela Manejo Químico
Tabela Manejo Químico

Após o plantio, também deve-se aplicar herbicidas preferencialmente em pré-emergência. Ocorre que com o plantio o solo será novamente revolvido na abertura dos sulcos e é desejável a aplicação de herbicidas específicos à grama-seda e tiririca. 

Transcorridos aproximadamente 60 dias após plantio, há necessidade de nivelar a superfície do solo da entrelinha e linha de plantio, operação chamada de “quebra lombo”. Por haver revolvimento do solo e o canavial ainda não estar totalmente fechado é sugerida também nova aplicação de herbicidas. Nesse caso, deverá ser realizada em jato semi-dirigido evitando-se as folhas da cultura. Dessa forma, no período em que o canavial não proporcionou sombra o suficiente para conter o desenvolvimento das plantas daninhas, os herbicidas utilizados inibem seus fluxos de emergência (Figura 1).

Figura 1 - (A) Planta adulta de grama-seda; (B) Tiririca adulta
Figura 1 - (A) Planta adulta de grama-seda; (B) Tiririca adulta

Manejo químico soqueira

Nas soqueiras infestadas com grama-seda e tiririca, o produtor também precisa optar por um dos herbicidas da Tabela 1, de acordo com o regime pluviométrico na época da aplicação. Para infestações distribuídas uniformemente pelos talhões deve-se aplicar o herbicida em pré-emergência da planta daninha e em área total, geralmente antes da cultura ter brotado.

Tabela 1
Tabela 1

Para infestações distribuídas em reboleiras, o controle deve ser localizado. Havendo falhas de estande a cultura pode ser erradicada no local (reboleira), seguida de aplicação de herbicida residual. Espera-se o pousio (entre 20 dias a 30 dias até a morte da soqueira) e planta-se a reboleira com mudas pré-brotadas (MPB), complementando nova aplicação de herbicida após 40 dias e com uso de pingente (Figura 2).

Figura 2 - Infestação de canavial com grama-sede (A) e tiririca (B)
Figura 2 - Infestação de canavial com grama-sede (A) e tiririca (B)
Tabela Manejo Soqueira
Tabela Manejo Soqueira

Carlos Alberto Mathias Azania,  Lucas Carvalho Cirilo,  João Eduardo Brandão Boneti, Ana Rosália Calixto da Silva Chaves,  Vitor Simionato Bidóia, Grupo de Matologia, IAC Centro Cana

Artigo publicado na edição 228 da Cultivar Grandes Culturas, mês maio, ano 2018.

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