Além das perdas por conta da competição por recursos como luz, água e nutrientes, plantas de buva servem como hospedeiras de insetos como percevejos e lagartas, o que agrava os prejuízos em produtividade. Com capacidade vertiginosa de multiplicação e histórico de resistência a herbicidas, essa planta daninha precisa ser corretamente manejada, com a utilização em conjunto de práticas culturais e de controle químico
22.03.2022 | 14:36 (UTC -3)
Além das perdas
por conta da competição por recursos como luz, água e nutrientes, plantas de
buva servem como hospedeiras de insetos como percevejos e lagartas, o que
agrava os prejuízos em produtividade. Com capacidade vertiginosa de
multiplicação e histórico de resistência a herbicidas, essa planta daninha
precisa ser corretamente manejada, com a utilização em conjunto de práticas
culturais e de controle químico.
Atualmente a
necessidade de manejar plantas daninhas em áreas agrícolas é uma prática
recorrente e importantíssima ao agricultor. Algumas espécies invasoras são
comumente encontradas em campos de cultivo devido a características atreladas a
sua adaptabilidade ecológica, a capacidade de se moldarem ao sistema de manejo
empregado e a evolução da resistência a herbicidas. A presença de tais espécies
acarretam perdas em produtividade às culturas em virtude da competição por
recursos como luz, água e nutrientes e, por serem hospedeiras alternativas de
pragas. Dentre as inúmeras espécies daninhas incidentes em áreas agrícolas, em
especial naquelas cultivadas com soja no Brasil, a buva é considerada a mais
importante devido ao seu elevado potencial competitivo e impacto sobre a
produtividade da cultura. A redução da produtividade ocorre em função do número
de plantas por m². Portanto, elevadas infestações podem reduzir em até 80% do
rendimento da cultura da soja e, mesmo que a sua ocorrência seja baixa as
perdas são significativas.
As
plantas conhecidas popularmente por buva pertencem ao gênero Conyza, e podem ser de três diferentes
espécies, Conyza canadensis, C.
bonariensis e C. sumatrensis. No Brasil, C. bonariensis é a que apresenta maior importância agrícola,
presente principalmente na região centro-sul. A buva apresenta elevada capacidade
de multiplicação. Uma única planta de C.
canadenses e C. bonariensis pode
produzir de 200 mil sementes a mais de
800 mil sementes, respectivamente. Estas
sementes são leves e apresentam “papus”,
estrutura que permite sua disseminação pelo vento a longas distância. Essa característica
possibilita sua presença nos mais diversos cultivos, como milho, trigo,
algodão, frutíferas e pastagens. É importante ressaltar que plantas de buva são
frequentemente encontradas em áreas marginais, como encostas, beira de
estradas, áreas abandonadas, entre outros. Permitindo, deste modo, a sua
multiplicação e reinfestações futuras em áreas cultivadas próximas.
O manejo de Conyza spp. foi realizado até pouco tempo, em especial na cultura
da soja transgênica (RR), com o herbicida glifosato. Após muitos anos utilizando-se
constantemente esta molécula, mais de uma vez no ciclo da cultura, a evolução
da resistência ocorreu de forma generalizada, inviabilizando o uso desse
herbicida no manejo de Conyza spp. No
Brasil os primeiros casos de resistência ao glifosato foram identificados em
2007 para as espécies C. bonariensis e
C. canadensis. Já em meados de 2010,
o primeiro caso de resistência ao glifosato foi relatado para C. sumatrensis. A resistência é
resultado do uso contínuo de um mesmo herbicida ou de herbicidas diferentes, com
mesmo mecanismo de ação. Essa prática seleciona plantas naturalmente resistentes,
que sobrevivem e produzem sementes, o que
culmina no aumento em frequência da resistência em áreas agrícolas. A partir da
ocorrência da resistência ao glifosato, outros herbicidas passaram a ser
utilizados para o controle desta invasora, como o chlorimuron-ethyl, que é um
produto com mecanismo de ação diferente do glifosato. Novamente, o uso contínuo
e de forma isolada deste herbicida proporcionou a evolução à resistência, sendo
encontrados no ano de 2011 biótipos de C.
sumatrensis com resistência múltipla aos herbicidas glifosato e
chlorimuron-ethyl. Os relatos de casos com resistência múltipla estreitam o espectro
de herbicidas disponíveis para o controle de Conyza e, que não causem fitointoxicação na cultura de interesse
econômico.
Em
diferentes regiões do mundo já foram confirmados casos de resistência de Conyza spp. a herbicidas com os mecanismos de ação:
inibidores do fotossistema II (atrazina, simazina, diuron e linuron),
inibidores do fotossistema I (paraquat e diquat), inibidores da enzima ALS
(chlorsulfuron, imazapyr, cloransulam-methyl e chlorimuron-ethyl) e inibidores
da enzima EPSPs (glifosato). Da mesma forma, confirmaram-se casos de
resistência múltipla: inibidores da enzima EPSPs + inibidores do fotossistema
I, inibidores da enzima ALS + inibidores do fotossistema II, e inibidores da
EPSPs + inibidores da ALS. Este cenário alerta para a elevada variabilidade
genética das populações de buva e do potencial evolutivo da resistência múltipla
a herbicidas, pois engloba praticamente todos os mecanismos de ação utilizados
no Brasil para seu controle. Neste contexto, é imprescindível o correto uso
destes herbicidas, respeitando doses, sucessões e estádios das plantas
aspergidas, de modo a evitar a perda por completa, em um futuro próximo, da
eficiência desses produtos.
O
controle da buva deve ser realizado de forma integrada, utilizando métodos
culturais em concomitância ao químico. A presença de densas camadas de palhada
(mais de 4 ton/ha), a partir de culturas ou coberturas de inverno, proporciona
redução drástica na capacidade de germinação e emergência dessa daninha. Essa
redução ocorre porque a buva apresenta germinação fotoblástica positiva, ou
seja, precisa de luz para germinar. As pequenas sementes da Conyza sob densas camadas de palha não
recebem o estímulo luminoso para a germinação e, portanto, não há o
estabelecimento na área. A viabilidade das sementes ainda tende a diminuir em
função do tempo que permanecem no solo, além de aumentar a possibilidade da
ação de microrganismos que as destroem, diminuindo o banco de sementes no solo
e reinfestações futuras.
O
efeito físico da palhada sobre o solo de forma isolada dificulta a emergência
das plântulas, exigindo uma maior demanda energética para que atinjam a superfície,
comecem o processo fotossintético e se estabeleçam. Durante este período,
muitas sementes com baixo vigor não conseguem emergir, diminuindo a incidência
de buva na área. De forma complementar, plantas que conseguem ultrapassar a
camada de palha, apresentam desenvolvimento lento e menos vigoroso, facilitando
o controle químico. Culturas de inverno como, trigo e aveia, além de serem uma
fonte de renda, proporcionam a obtenção de uma densa camada de palha que
acarreta redução de mais de 90% no número de plantas infestantes na área. Ervilhaca
e nabo forrageiro também têm se mostrado como excelentes formadores de palhada
na redução da emergência de buva.
A
utilização do controle químico de forma isolada ainda é uma ferramenta eficaz,
porém exige atenção. Herbicidas pré-emergentes, como o diclosulan, são uma
alternativa promissora na redução da infestação de buva. Já para os herbicidas
pós emergentes, a utilização de produtos de diferentes mecanismos de ação de
forma associada ou em sucessão, proporcionam ótimos resultados. Atualmente, não
há relatos confirmados de resistência de buva aos herbicidas auxínicos,
tornando-os uma importante ferramenta no manejo dessa planta daninha. Contudo,
é importante salientar que o uso isolado desses produtos poderá selecionar
genótipos resistentes, inviabilizando mais essa tecnologia.
Estudos
científicos têm relatado que a buva pode se comportar como hospedeiro
alternativo para pragas, como o percevejo verde-pequeno (Piezodorus guildinii), percevejo-marrom-da-soja (Euschistus heros) e percevejo-asa-preta
(Edessa meditabunda), e também de
lepidópteros, como a lagarta-da-soja (Anticarsia
gemmatalis), lagarta falsa-medideira (Chrysodeixis
includens) e lagarta-do-cartucho-do-milho (Spodoptera frugiperda). Além destes insetos, produtores e técnicos
no ano de 2013 encontraram a lagarta Helicoverpa
armigera, em estágio avançado de desenvolvimento, alimentando-se de plantas
de buva no estado do Mato Grosso do Sul, durante a fase de preparo para o
plantio da soja. A buva ganha importância para essas pragas principalmente nos
momentos em que a oferta de alimento é reduzida, ou seja, entressafras e
períodos próximos à colheita. Outra espécie que pode utilizar buva como hospedeiro
alternativo é o ácaro Brevipalpus
phoenicis, vetor da leprose dos citros, que é uma espécie polífaga. Estudos
constataram a preferência do ácaro B.
phoenicis por se alimentar na base dos tricomas presentes na superfície do
caule da planta, servindo, portanto, como hospedeira alternativa, o que pode
contribuir para a disseminação do ácaro e, consequentemente, da leprose nos
pomares de citros.
O
manejo integrado da buva é a ferramenta mais eficaz na redução dos prejuízos
causados por essa planta daninha. A utilização em conjunto de práticas
culturais e controle químico, buscando a eliminação por completa dessa planta
durante o período de desenvolvimento das culturas, na entressafra e em pomares,
é imprescindível para evitar perdas diretas de rendimentos causado pela
competição, ou indiretos gerados por pragas alojadas oportunamente na buva. Por
fim, é fundamental o uso racional de herbicidas, principalmente aqueles que ainda
desempenham controle satisfatório sobre a buva, de modo a evitar a seleção de
plantas resistentes e prolongar a utilização desta ferramenta de manejo.
Artigo publicado na edição 217 da Cultivar Grandes Culturas, mês junho, ano 2017.
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