Indução de resistência em trigo

O uso de Trichoderma spp e de outros eliciadores pode contribuir para a indução de resistência de plantas de trigo, com reflexos no aumento de produtividade e diminuição da severidade de doenças que afetam a cultura

13.04.2022 | 14:36 (UTC -3)

O uso de Trichoderma spp e de outros eliciadores pode contribuir para a indução de resistência de plantas de trigo, com reflexos no aumento de produtividade e diminuição da severidade de doenças que afetam a cultura.

Quando se pensa em qualidade do grão de trigo, logo se relaciona este assunto a um conjunto de condições de cultivo (características do solo, temperatura, umidade, doenças, manejo da cultura) e de procedimentos de colheita, secagem e armazenamento. Tais fatores afetam de forma direta o uso industrial do produto final. Por isso é tão importante evitar e controlar as doenças nesta cultura, buscando por substâncias que facilitem o manejo com menor custo. Neste contexto, a indução de resistência em plantas trigo pode auxiliar no quesito: menos doença e maior produtividade.

Quando as plantas reconhecem indutores de resistência são acionadas vias de sinalização e estas ativam processos nas plantas tais como produção de enzimas, engrossamento da parede celular e produção de fitoalexinas. É importante que estas vias de indução de resistência sejam ativadas, pois assim a planta estará de certa forma “vacinada” e preparada para se defender de patógenos. Ativará o sistema de defesa de forma mais rápida e eficaz e, quanto menos o patógeno agir, mais saudável a planta permanecerá e, assim melhor será sua produtividade.

Os mecanismos da indução de resistência, que ocorrem nas plantas, para que estas se defendam dos patógenos, são estudados há muito tempo. Uma das primeiras pesquisas realizadas nesta área foi de Bernard em 1911, que trata sobre a ativação de mecanismos de indução de defesa em plantas contra microrganismos. Ao estudar a relação de orquídeas e fungos de solo observou que pedaços de bulbos sem sinais de doença, quando em proximidade com esses fungos dos solos, não eram infectados. O pesquisador concluiu que os bulbos não tratados respondiam a secreções produzidas pelos fungos com a produção de substâncias com propriedades microbianas.

Mesmo sendo comum o uso de fungicidas para o controle de doenças fúngicas é possível utilizar outras substâncias que são menos tóxicas em conjunto, no planejamento de prevenção e controle, a fim de minimizar o desenvolvimento destas doenças.

Substâncias que podem ativar a indução de resistência

Uma substância indutora é qualquer composto ou fator capaz de ativar mecanismos de defesa da planta. Um indutor de resistência contém uma ou mais moléculas responsáveis diretamente pela ativação da defesa, sendo que essas moléculas são denominadas eliciadores.

Os eliciadores, podem ser agrupados de acordo com sua origem, em bióticos e abióticos. Os eliciadores bióticos são divididos em exógeno (moléculas ou fragmentos de parede celular de micro-organismos patogênicos ou não patogênicos ou compostos isolados do meio de cultivo do micro-organismo) e endógeno (moléculas liberadas da planta) como por exemplo, oligogalacturonídeos ou outros oligômeros de parede celular. Os indutores de resistência variam muito e podem incluir fungos, bactérias, vírus, nematoides, insetos, metabólitos e produtos de patógenos ou não patógenos, polímeros orgânicos e inorgânicos (KUC, 2001).

Dentre os compostos abióticos, incluem-se agentes físicos (temperatura, radiações UV e gama) e químicos como moléculas orgânicas sintetizadas, como o acibenzolar-S-metil (ASM), ácido salicílico, ácido jasmônico, etileno, íons metálicos, alguns antibióticos e alguns fungicidas de efeitos fisiológicos. Esta classificação se sobrepõe à medida que as substâncias de origem biológica estão sendo sintetizadas em condições de laboratório.

Os compostos elicitores bióticos podem ser ou conter moléculas químicas ou então, ser ou ter em sua constituição extratos celulares dos microrganismos ou substâncias produzidas pelos microrganismos, ou até mesmo uma mistura dessas substâncias. E quando os microrganismos endofíticos estão fazendo parte do ambiente da planta, seja nas folhas, raiz ou caule, contribuem para a promoção de crescimento (PGPR) e ajudam a planta no controle de doenças, induzindo sua resistência.

Alguns microrganismos, além de terem o efeito inibidor de patógenos de forma direta, através do antagonismo, também possuem característica de promotores de crescimento de planta (PCP) e induzem resistência. A proteção contra os mais diversos patógenos é manifestada tipicamente na redução dos sintomas da doença e também na inibição do seu crescimento.

Já foi comprovado que alguns fungos, como os do gênero Trichoderma,, possuem a ação de contribuir tanto com a indução de resistência, como promotores de crescimento.

Acredita-se que os fungos endofíticos são capazes de produzir produtos naturais biologicamente ativos. E devido a esta incrível capacidade em residir em nichos diferenciados, apresentam um estado metabólico de agressividade constante, sintetizando assim diversos metabólitos.

Os metabólitos com propriedades bioativas produzidos por microrganismos endofíticos têm mostrado capacidade de inibir uma grande variedade de fungos, bactérias e vírus patogênicos. Podem apresentar atividade antitumoral e atuarem como agentes antidiabéticos e imunossupressores. Os fungos endofíticos tem propriedades de ativar os mecanismos de indução de resistência em plantas.

Principais efeitos de indutores de resistência na cultura do trigo

Diminuição da severidade doença

A aplicação de substâncias indutoras diminuiu a severidade da mancha marrom em trigo cultivar BRS Sabiá, como pode ser verificar na Figura 2. A aplicação das suspensões dos fungos endofíticos, ácido salicílico e também do Acibenzolar-S metil (ASM) diminuíram a AACPD da doença quando comparados com a testemunha. Estes tratamentos são eficazes por atrasarem e/ou impedirem o progresso da doença.

Figura 1 - Progresso da severidade (%) da mancha marrom na cultivar BRS Sabiá, avaliada a cada sete dias, em campo experimental no município de Paula Freitas/ PR, safra 2016. Tratamentos T1: A. japonicus, T2: T. tomentosum, T3: ácido salicílico, T4: Acibenzolar-s-metil (ASM), T5: fungicida (Azoxistrobina com Tebuconazol) e T6: testemunha (água destilada esterilizada).
Figura 1 - Progresso da severidade (%) da mancha marrom na cultivar BRS Sabiá, avaliada a cada sete dias, em campo experimental no município de Paula Freitas/ PR, safra 2016. Tratamentos T1: A. japonicus, T2: T. tomentosum, T3: ácido salicílico, T4: Acibenzolar-s-metil (ASM), T5: fungicida (Azoxistrobina com Tebuconazol) e T6: testemunha (água destilada esterilizada).
Figura 2 - Área abaixo da curva de progresso da doença – AACPD, da mancha marrom na cultivar BRS Sabiá, campo em Paula Freitas/ PR, safra 2016. Médias seguidas de letras distintas entre os tratamentos diferem pelo teste de Tukey (p<0,05). Barras indicam desvio padrão da média. T1: A. japonicus, T2: T. tomentosum, T3: ácido salicílico, T4: Acibenzolar-s-metil (ASM), T5: fungicida (Azoxistrobina com Tebuconazol) e T6: testemunha (água destilada esterilizada).
Figura 2 - Área abaixo da curva de progresso da doença – AACPD, da mancha marrom na cultivar BRS Sabiá, campo em Paula Freitas/ PR, safra 2016. Médias seguidas de letras distintas entre os tratamentos diferem pelo teste de Tukey (p<0,05). Barras indicam desvio padrão da média. T1: A. japonicus, T2: T. tomentosum, T3: ácido salicílico, T4: Acibenzolar-s-metil (ASM), T5: fungicida (Azoxistrobina com Tebuconazol) e T6: testemunha (água destilada esterilizada).

Aumento da atividade de enzimas

A aplicação de elicitores (substâncias com capacidade de ativar a indução de resistência), pode desencadear na planta a produção de metabólitos secundários. Estes metabólitos constituem diversas substâncias que participam dos mecanismos de indução de resistência. Um dos exemplos reside na ativação de enzimas que fazem parte da cascata de ativação de proteção da planta. Estudos em plantas de trigo tratadas com diferentes indutores aumentaram a atividade das enzimas fenilalanina amônia liase e peroxidase (Figura 3). Observa-se pico de atividade destas enzimas quando tratadas com diferentes eliciadores, indicando que estas substâncias proporcionam a ativação dos mecanismos de defesa das plantas de trigo.

Figura 3 - Atividade das enzimas peroxidase (A) e fenilalanina amônia liase (B) em plantas de trigo cultivar BRS Sabiá, tratadas com: A. japonicus, T. tomentosum, ácido salicílico, Acibenzolar-s-metil (ASM), fungicida (Azoxistrobina com Tebuconazol) e testemunha (água destilada esterilizada) e também inoculadas com o patógeno B. sorokiniana. Guarapuava/PR, safra 2016.
Figura 3 - Atividade das enzimas peroxidase (A) e fenilalanina amônia liase (B) em plantas de trigo cultivar BRS Sabiá, tratadas com: A. japonicus, T. tomentosum, ácido salicílico, Acibenzolar-s-metil (ASM), fungicida (Azoxistrobina com Tebuconazol) e testemunha (água destilada esterilizada) e também inoculadas com o patógeno B. sorokiniana. Guarapuava/PR, safra 2016.

A fenilalanina amônia liase (FAL) é uma enzima chave da via metabólica, pois está envolvida na formação de lignina, proporcionando seu aumento na parede celular e, assim ajudando na defesa da planta. Esta enzima catalisa a reação para produção de suberina, cumarinas, flavonóides, antocianinas e fitoalexinas. Essas substâncias também ajudam na proteção da planta.

As enzimas peroxidases são glicoproteínas que estão relacionadas com algum estresse que a planta venha a sofrer. Esta enzima tem propriedade de catalisar diversas reações, como por exemplo, a produção de peróxido de hidrogênio, reforçando a parede celular, pois atuam na formação da lignina, suberina e papilas, possibilitam a ligação entre glicoproteínas ricas em hidroxiprolina, estão envolvidas na peroxidação de lipídeos, aumentam as espécies reativas de oxigênio e as fitoalexinas, são tóxicas para os patógenos, catalisam as auxinas, auxiliam na cicatrização dos tecidos, têm propriedade de oxidar os compostos fenólicos e também participam da senescência, germinação de sementes e floração.

Aumento da produtividade

As aplicações de determinadas substâncias podem contribuir na promoção de crescimento das plantas e consequentemente proporcionar aumento da produtividade, como observado na Tabela 1.  Com relação aos índices de desenvolvimento das plantas, número de espigas, de grãos por espiga e altura de plantas, todos os tratamentos atingiram avaliações superiores ao da testemunha. Isto evidencia o potencial existente para a utilização destas substâncias via foliar, para melhorar o desenvolvimento das plantas de trigo e contribuir para a produtividade.

Neste contexto os fungos do gênero Trichoderma podem contribuir significativamente. De modo geral a pesquisa com fungos tornou-se uma importante atividade de investigação nos últimos anos, principalmente por causa dos valiosos metabólitos com várias atividades biológicas, bem como um importante potencial de aplicação na agricultura, medicina e na indústria alimentar.

É possível constatar que algumas espécies de fungos podem diminuir a severidade de doenças fúngicas, aumentar a atividade de algumas enzimas e ainda contribuir para o aumento da produtividade. Mostra-se uma alternativa com baixo impacto ambiental e pequeno custo na cultura do trigo, com potencial para identificação de novos compostos químicos.

Artigo publicado na edição 220 da Cultivar Grandes Culturas, mês setembro, ano 2017. 

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