Poupança (de fósforo no solo) é um bom investimento?
Por Roberto Reis - Eng. Agr., D.Sc. – Wirstchat
11.04.2022 | 13:59 (UTC -3)
Não, este
texto não trata de investimento financeiro em bancos ou bolsas de valores.
Trata-se de uma estratégia tradicional na agricultura e defendida por muitos: o
uso de adubo fosfatado para formar uma reserva de fósforo no solo, a chamada
poupança, usada para garantir disponibilidade futura de fósforo às plantas.
Mas antes de
entrar nesse assunto, vamos utilizar as informações do mercado financeiro para
responder à pergunta: Poupança é um bom investimento? Consultando o Google (12/jan/2022),
encontramos a reposta abaixo:
De fato, o
investimento em Poupança é relativamente seguro, porém, pouco rentável. Existem
outras opções tão seguras quanto e que podem proporcionar um resultado melhor
que o rendimento da Poupança.
Poupança de fósforo no
solo: é o resultado da aplicação contínua, por anos e anos, de quantidades
de fertilizante fosfatado acima da necessidade das plantas, gerando um acúmulo
de fósforo no solo. Tecnicamente não existe erro neste posicionamento; a
fosfatagem é um exemplo disso. Trata-se de uma técnica de correção de fósforo
do solo com aplicação de fertilizantes fosfatados, sendo os mesmos incorporados
ou não no perfil do solo. Essa é uma prática que tem como objetivo a elevação
da disponibilidade de fósforo do solo. Porém, até que ponto vale a pena colocar
todos seus recursos neste investimento? Este questionamento é feito porque o
equilíbrio entre ações práticas, técnicas e econômicas deve ser alcançada, pois
de nada adianta adotar uma estratégia tecnicamente justificada sem ser economicamente
viável ou prática. Por exemplo, o GAPE (Grupo de Apoio à Pesquisa e Extensão),
faz a orientação ao lado para tomar decisão sobre o uso da fosfatagem.
Para dar números à essa estratégia (Fosfatagem) e poder analisar matematicamente esta prática, faremos uma análise de manejo de adubação fosfatada ao longo de 20 anos de cultivo em um sistema de rotação soja (safra verão)/milho (safrinha). Sabemos que o uso contínuo deste sistema de rotação tem pontos negativos, pois o uso de outras plantas de cobertura traz benefícios ao sistema; mas para facilitar os cálculos, este foi o sistema de rotação considerado.
Adubação fosfatada: Quantidade
aplicada versus Aproveitamento: vamos considerar uma situação de um
agricultor que cultiva, há 20 anos, soja e milho safrinha na mesma área. Ao
longo deste período ele usou, em média, todo ano, 90 kg P2O5/ha
e 60 kg P2O5/ha na adubação da soja e do milho,
respectivamente. Neste manejo, ao longo dos 20 anos de cultivo, este agricultor
colocou 3.000 kg P2O5/ha no seu solo. Vamos considerar
que neste período, a produtividade média de soja e de milho safrinha foi de 50
sc/ha e 80 sc/ha, respectivamente. Sabe-se que para produzir 1,0 t de soja e
1,0 t de milho, estas culturas exportam (retiram da lavoura) 11,0 kg P2O5/t
e 6,87 kg P2O5/t, respectivamente. Ou seja, ao longo
destes 20 anos, a quantidade de fósforo que saiu da lavoura (na colheita) foi
de 660 kg P2O5/ha (na soja) e 659 kg P2O5/ha
(no milho safrinha), totalizando 1.319 kg P2O5/ha.
Resumindo, haveria um saldo 3.000 – 1.319 = 1.681 kg P2O5/ha
após 20 anos de cultivo.
Este saldo
(1.681 kg P2O5/ha) deveria mostrar um acréscimo de 367,0
mg P/dm3 ao teor de fósforo no solo. Entretanto, sabemos que na
prática esta conta não “fecha” desta forma, pois existem pesquisas mostrando o
quanto se eleva o teor de fósforo no solo a cada quilo de fósforo aplicado no
solo. Segundo a Embrapa, para um solo com 45% de argila, são necessários 18 kg
P2O5/ha para elevar em 1 mg/dm3 o teor de
fósforo determinado em Mehlich 1. Usando esta informação no nosso exemplo, o
saldo de fósforo que “ficou” no solo (1.681 kg P2O5/ha)
resultaria em acréscimo de 93,4 mg P/dm3 ao teor de fósforo do solo.
Segundo a Comissão de Fertilidade do Solo no Estado de Minas Gerais, solos com
teor de argila = 45% e teores de P superiores a 12 mg/dm3 são
classificados como “Bom Teor de Fósforo”. No nosso exemplo temos um aumento do
teor de P 7,78x ao que é considerado “Bom”. Entretanto, na prática, temos visto
que as chamadas “áreas velhas” de cultivo agrícola que apresentam altos teores
de fósforo apresentam teores na ordem de 25 a 30 mg/dm3 (teores
elevados).
Onde foi parar este
“Excedente” de fósforo???
Muito se fala da fixação de
fósforo no solo, mas pouco se fala sobre o processo de envelhecimento de
fósforo no solo. Trata-se de um fenômeno conhecido e que explica por que, com o
passar do tempo, a disponibilidade do fósforo aplicado via adubação vai se reduzindo.
Sabemos que as plantas não
precisam de solos com altos teores de nutrientes, pois o que elas
precisam são solos com adequados teores de nutrientes. Logo, a chamada
poupança de fósforo no solo (elevados teores de fósforo no solo) não traria, de
imediato, benefícios à lavoura.
Pelo exposto acima, verifica-se
que para fazer a chamada poupança de fósforo no solo é necessário a aplicação
de fertilizante fosfatado em quantidade maior do que futuramente ficará
disponível às plantas. Como fertilizante fosfatado não é gratuito (tem alta
participação no custo de produção) e as reservas utilizadas para sua produção
são finitas, seu uso, para elevar os teores de fósforo no solo em valores acima
do que as plantas precisam, deve ser reconsiderado.
O solo não é o melhor lugar
para estocar adubo fosfatado!
E agora, vale investir
na melhoria do solo? A resposta é SIM, pois sem a devida correção
de fertilidade, no caso do fósforo, teremos uma “ripa” curta no famoso barril
da Lei do Mínimo e, consequentemente, limitação de produtividade. A questão a
refletir não é SE VALE INVESTIR e sim COMO INVESTIR na correção
da fertilidade.
Voltando ao exemplo do mercado
financeiro, temos que pensar no “5 investimentos melhores que a poupança para
aplicar seu dinheiro”. Fazendo um paralelo ao tema que estamos abordando, Investir
somente na aplicação de fertilizantes fosfatados (fornecimento de fósforo),
fazendo a chamada poupança de fósforo no solo, não é a única estratégia
disponível para garantir a boa disponibilidade de fósforo às plantas e,
consequentemente, a boa produtividade. Como o exemplo da figura acima sugere,
existem outras estratégias que irão garantir melhor retorno do investimento
realizado, que são:
Práticas que eliminam limitação de crescimento radicular (Correção
de acidez; Neutralização de alumínio em profundidade; Correção de compactação
de solo)
Práticas que promovam acúmulo de matéria orgânica no solo
Práticas que promovam o acúmulo de umidade no solo (umidade do solo
influencia significativamente a difusão de fósforo no solo – principal
mecanismo de transporte de fósforo até as raízes das plantas)
Uso correto do Sistema Plantio Direto
Práticas que promovam o crescimento radicular (estimulantes
hormonais, microrganismos, etc)
Também não podemos esquecer do
Conceito 4C, utilizado para amentar a eficiência da adubação:
Dose Certa (análise de solo é
fundamental para isso)
Local Certo (aplicação
localizada x área total - “à lanço”/superficial/incorporado)
Época Certa (lembrar dos
problemas de envelhecimento do fósforo)
Produto Certo (hoje existem
adubos fosfatados de eficiência aumentada no mercado)
Ao Conceito 4C
poderíamos adicionar mais um item (Conceito 5C?), que seria o Manejo (do solo)
Correto, envolvendo práticas como Sistema Plantio Direto, correção de
compactação e acidez do solo, incremento do teor de matéria orgânica do solo,
etc.
“E agora José?” Qual sua opinião sobre fazer a poupança de
fósforo no solo?
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