Estratégias de manejo para controle de mofo branco

Medidas diversificadas adotadas em conjunto devem ser empregadas para manter baixo o nível de inóculo em lavouras infestadas

10.02.2020 | 20:59 (UTC -3)

A rápida disseminação de mofo branco em regiões de cultivo de grãos tem chamado a atenção pelo alto potencial de perdas provocadas pela doença, presente em 9% das áreas de produção agrícola no Brasil, em culturas como feijão, soja e algodão. Estratégias de manejo que envolvam diversas práticas adotadas em conjunto devem ser empregadas para manter baixo o nível de inóculo em lavouras já infestadas

O mofo branco, causado pelo fungo Sclerotinia sclerotiorum, é uma das principais e mais destrutivas doenças do feijoeiro, caracterizada por ser de ocorrência endêmica em algumas regiões do Brasil. Conforme a Sociedade Nacional de Agricultura (SNA), a doença está presente em 9% das áreas de produção agrícola no Brasil, incluindo feijão, soja, algodão, entre outras. Diversas estratégias de controle devem ser adotadas, desde a procedência da semente a ser utilizada até o trânsito de máquinas agrícolas, pois uma vez instalada na área, a erradicação do patógeno é quase impossível.

Características do patógeno

O agente causal Sclerotinia sclerotiorum é considerado um fungo polífago, pois ataca diversos tipos de plantas, sendo descritas mais de 400 espécies hospedeiras (Boland, 1994). Dentre as condições climáticas favoráveis ao desenvolvimento da doença estão as temperaturas amenas (18ºC – 23ºC) e a alta umidade relativa, sendo as áreas irrigadas com cultivo de feijão no inverno os locais onde a doença apresenta maior severidade (Oliveira, 2005). A doença tem início a partir das estruturas de resistência do fungo presentes no solo, denominadas de escleródios, que, ao germinarem, originam os apotécios, que contêm os agentes responsáveis pela infecção, os ascósporos, que, ao serem liberados, podem se depositar sobre as plantas e iniciarem a infecção (Tormen, 2014). A doença assume maior importância a partir do período de floração até o período de formação de vagens, exigindo um monitoramento criterioso durante estes estádios. Os sintomas típicos nas plantas são o encharcamento nos tecidos e a presença de micélios com aspecto cotonoso. Em estádios mais avançados, micélios aglomerados amadurecem e formam os escleródios, que podem se depositar nas partes externas e internas da planta (Link & Johnson, 2007).

Qualidade da semente

A semente é o principal meio de disseminação da doença, podendo carregar o patógeno na forma de micélio dormente em seu interior ou de escleródios, misturados às sementes. O uso de sementes não certificadas ou de procedência duvidosa está entre as principais causas do aumento da incidência de mofo branco em áreas do Brasil. Diante disto, o uso de sementes certificadas e sadias torna-se um potencial meio de prevenção à doença. Entretanto, apenas uma pequena parte dos produtores de feijão costuma aderir a esta prática, facilitando a disseminação e o aumento da incidência da doença. Além do uso de sementes certificadas, seu tratamento químico com fungicidas (tiofanato-metílico, fluazinam e tiram, entre outros) é uma importante alternativa para o controle da doença.

Controle cultural

Conforme Görgen et al (2009), os apotécios necessitam de luz para completarem seu desenvolvimento e, consequentemente, a produção de palhada torna-se importante ferramenta para a redução na incidência da doença. A função da palhada é a formação de uma barreira física contra o desenvolvimento dos apotécios e a liberação de ascósporos que possam atingir as plantas e começarem as infecções (Lobo Junior & Santos, 2013). Esta palhada deve ser oriunda de espécies gramíneas com alto potencial de produção de massa, como as do gênero Brachiaria, que o patógeno não parasita. A cobertura permitirá também aumento na atividade de micro-organismos que auxiliam na degradação de escleródios presentes no solo. Além da palhada, o aumento no espaçamento entre fileiras de plantas também é uma alternativa de manejo, pois permitirá menor adensamento e maior aeração na lavoura, evitando a formação do microclima favorável para o desenvolvimento da doença. Em locais onde foram realizadas operações agrícolas e que continham a doença, torna-se necessária a limpeza das máquinas, pois seu trânsito entre áreas também é uma forma de disseminação. O enterrio de escleródios em operações de preparo do solo em profundidades de 20cm a 30cm torna as estruturas de resistência do fungo inviáveis.

Controle químico

A aplicação de fungicidas deve ser feita de maneira preventiva, entretanto, esta prática poderá apresentar eficácia abaixo do esperado quando utilizada de maneira isolada para o manejo da doença. O período crítico da ocorrência do mofo branco se dá na floração à formação de vagens, o que determina a necessidade de uma boa cobertura das flores através da aplicação do fungicida (Vieira et al, 2001). A aplicação pode ser via terrestre ou por irrigação, com um período de proteção descrito em torno de 12 dias a 14 dias, exigindo média de duas a três aplicações, que podem variar de acordo com a incidência da doença e condições ambientais para seu desenvolvimento. Os fungicidas com os ingredientes ativos fluazinam, procimidona e fluopyram apresentam boa eficácia no controle da doença. Em condições experimentais, o fungicida de ingrediente ativo dimoxystrobin + boscalid tem despontado como outra alternativa eficaz.

Controle biológico

Resultados de pesquisa têm demonstrado eficácia no controle de mofo branco através do uso de agentes biológicos, mais especificamente fungos do gênero Trichoderma. Estes agentes estão presentes naturalmente no solo e produzem substâncias que inibem o crescimento de diversos fungos causadores de doenças em plantas, como o mofo branco, através da degradação dos escleródios e parasitismo. Entretanto, por se tratar de um organismo vivo, requer cuidados referentes às condições do ambiente e da aplicação para que possa colonizar e expressar controle satisfatório. Fernandes et al (2007) constataram que isolados de Trichoderma apresentaram maior crescimento em temperaturas entre 20ºC e 30ºC, sendo que temperaturas inferiores a 20ºC reduziram significativamente a atividade parasitária do fungo sobre os escleródios. A palhada também pode ser outro fator influente que potencializa a ação do agente biológico. Görgen et al (2009), ao avaliarem o efeito da palhada de Brachiaria ruziziensis em conjunto com aplicação de Trichoderma harzianum 1306 para o controle de mofo branco em soja, constataram aumento no parasitismo sobre os escleródios, reduzindo a incidência da doença no cultivo da oleaginosa e aumentando a produtividade. Sendo assim, haverá a necessidade de fornecer condições adequadas para o desenvolvimento do agente biológico, de forma que este possa atuar com significância sobre o patógeno.

Na cultura do feijão

Segundo levantamento realizado pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a área plantada de feijão, na safra 2013/2014, contabilizando as três safras, cobriu cerca de 4,37 milhões de hectares, com estimativa de produção de 3,30 milhões de toneladas. Estes valores de produção refletem o cenário em que a cultura está inserida no Brasil, onde o predomínio da baixa tecnologia resulta em produtividades muito aquém do potencial genético das cultivares, apesar de haver sistemas de cultivo baseados em alta tecnologia, onde os patamares produtivos podem superar 3.000kg/ha. Além da forte influência climática que pode condicionar significativas perdas, a suscetibilidade da cultura às doenças traz desafios relacionados ao manejo, para que o potencial produtivo das cultivares seja alcançado.

Considerações finais

Resta clara a agressividade do patógeno e o potencial da doença em interferir na produção agrícola. Entretanto, a associação de diferentes medidas de controle pode reduzir significativamente a incidência de mofo branco nos cultivos, permitindo a manutenção do potencial produtivo e tornando os sistemas de produção mais sustentáveis.

Apotécio germinado. - Foto: por Nédio Rodrigo Tormen
Apotécio germinado. - Foto: por Nédio Rodrigo Tormen
Escleródios de S. sclerotiorum. - Foto: Nédio Rodrigo Tormen
Escleródios de S. sclerotiorum. - Foto: Nédio Rodrigo Tormen


Pedro Ceretta Cadore, Universidade Federal de Santa Maria; Nédio Rodrigo Tormen, Universidade de Brasília


Artigo publicado na edição 193 da Cultivar Grandes Culturas. 

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