Prevenção como ferramenta de manejo dos nematoides na cultura da pimenta
Na luta contra nematoides em pimenta, que têm na espécie Meloidogyne incógnita a principal causadora de danos, a prevenção se apresenta como o melhor caminho
Fitonematoides são organismos vermiformes e microscópicos que habitam o solo e retiram os nutrientes necessários para o desenvolvimento e reprodução das células dos vegetais, geralmente das raízes, causando danos severos nas plantas hospedeiras. As principais espécies associadas às culturas anuais no Brasil são os nematoides das galhas (Meloidogyne incognita e M. javanica), o nematoide das lesões radiculares (Pratylenchus brachyurus e P. zeae), o nematoide de cisto da soja (Heterodera glycines) e o nematoide reniforme (Rotylenchulus reniformis), que ocorrem frequentemente associados a culturas como soja, milho, feijão, algodão, cana-de-açúcar, girassol, entre outras. No entanto, nas últimas safras, o nematoide que tem causado maiores problemas, especialmente em lavouras da região Centro-Oeste do País, é o P. brachyurus.
Os sintomas observados na parte aérea das plantas atacadas são praticamente os mesmos para todas as espécies citadas e consistem em reboleiras de plantas com tamanho reduzido e com amarelecimento. São frequentemente confundidos com outros agentes abióticos ou bióticos, como deficiência nutricional e patógenos de sistema radicular. Nas raízes das plantas atacadas observam-se sintomas específicos de cada espécie. Os nematoides das galhas, por exemplo, provocam o engrossamento das raízes na forma de nódulos ou tumores. Nas raízes com nematoides de cistos é possível observar, com auxílio de uma lupa de bolso, a presença de fêmeas na forma de limão, com coloração variando de branco leitoso até marrom escuro. Já os nematoides de lesões não são facilmente diagnosticados no campo, e talvez este seja um dos motivos pelo qual a ocorrência desta espécie tem passado despercebida.
Um dos agravantes dos problemas de nematoides no Brasil tem sido a ocorrência de populações mistas, ou seja, composta por duas ou mais espécies. Em geral, nestes casos, o efeito sobre a cultura tende a ser aditivo e, além disso, esse tipo de infestação dificulta o controle dos fitoparasitos.
Outro problema comum que contribui para o manejo incorreto de fitonematoides é o erro na diagnose. O produtor não deve confiar na análise visual realizada no campo, isto porque apesar de algumas espécies serem facilmente diagnosticadas pelo sintoma apresentado na planta, como os nematoides das galhas, outras podem estar presentes e não serem notadas. Por exemplo, quando nematoide das galhas ocorre associado ao das lesões radiculares, o produtor consegue observar com clareza apenas os sintomas do primeiro e, neste caso, a escolha das estratégias de manejo, poderá permitir o aumento da população de Pratylenchus. Somente com a análise laboratorial é possível saber quais os nematoides presentes na área, e isto reduzirá as chances de erros na escolha da estratégia, principalmente quando a opção de controle é a rotação de culturas, o uso de adubos verdes e de variedades resistentes.
O manejo destes patógenos é bastante complexo e medidas isoladas não surtem efeito satisfatório. O primeiro método indicado é a escolha de áreas indenes, porém, é quase impossível encontrar no Brasil áreas agrícolas onde não ocorra pelo menos uma das espécies de grande importância. Ainda assim, é importante que o produtor tome alguns cuidados básicos para evitar a entrada de diferentes espécies ou raças de nematoides, como aquisição de sementes de boa qualidade, realização de limpeza periódica de máquinas e implementos, principalmente quando estes vêm de outras áreas, cuidados com os tratos culturais, entre outros. No caso da ocorrência em reboleiras, recomenda-se que esta seja isolada e trabalhada separadamente do restante da área, especialmente nas grandes propriedades, o que pode reduzir o custo com o manejo e tornar possível o uso de algumas práticas para redução do nematoide.
Uma importante ferramenta para o controle é o uso de cultivares resistentes, por tratar-se de um método seguro e barato. Algumas cultivares, principalmente de soja, milho e algodão, apresentam resistência aos nematoides das galhas, porém, dois fatores precisam ser considerados na escolha dessa opção. O primeiro é que o uso contínuo de determinado genótipo pode promover o surgimento de populações capazes de quebrar a resistência da cultivar, devido à variabilidade genética do patógeno. O segundo fator é a ocorrência de populações mistas de fitonematoides na mesma área, já que a maioria dos genótipos apresenta resistência monoespecífica.
Desta forma, aliada à escolha de cultivares resistentes, é muito importante que o produtor adote outras estratégias de manejo. A rotação de culturas é uma das principais práticas para a redução populacional desses parasitos, com benefícios incontestáveis. No entanto, para a seleção das plantas que irão compor o esquema de rotação, são de extrema importância a identificação e a quantificação das espécies de nematoides presentes na área. Só após o resultado desta análise o produtor poderá fazer a escolha das plantas a serem introduzidas na área.
Este alerta, apesar de importante para todos os nematoides, vale principalmente para o nematoide das lesões radiculares, visto que espécies amplamente utilizadas em rotação nas áreas onde ocorrem nematoides das galhas e de cistos são suscetíveis ao nematoide das lesões, como milho, sorgo, braquiária e outras gramíneas forrageiras. Assim, tem sido recomendada a rotação com crotalária (Crotalaria spectabilis), que apresenta efeito antagônico aos diferentes nematoides que parasitam as principais culturas anuais. Outras plantas têm sido indicadas para a rotação em áreas com Pratylenchus, contudo, é necessário cuidado na escolha de espécies e/ou variedades, visto que pesquisas para o manejo deste nematoide ainda estão em andamento.
Outra prática que tem surtido bons resultados é o tratamento de sementes com produtos nematicidas. Dentre as principais vantagens deste método destacam-se o baixo custo gerado com a operação e a proteção da planta na fase inicial de desenvolvimento, sendo este o estágio em que as mesmas estão mais suscetíveis, pois os nematoides têm preferência por raízes jovens e é nesta fase que se define o potencial produtivo da cultura. O tratamento não deve visar apenas à proteção contra nematoides, mas também ter como alvo doenças causadas por fungos e bactérias, além de insetos. Dentre os princípios ativos para o tratamento de sementes visando ao controle de nematoides em culturas anuais, como soja e algodão, destaca-se a abamectina, cujos resultados são bastante promissores.
Para o futuro, algumas estratégias vêm sendo pesquisadas, como o uso de indutores de resistência e estimulantes vegetais. Apesar dos resultados recentes, pesquisas em condições controladas mostram que tais substâncias também auxiliam no manejo de fitonematoides. Vale salientar que esses produtos não têm efeito nematicida, mas podem aumentar o vigor vegetativo da planta e a sua capacidade de suportar condições de estresse ambiental ou ainda ativar algum mecanismo de resistência do vegetal aos nematoides.
Erradicar os nematoides presentes nas áreas agrícolas é impossível, por isso, é preciso conhecer e avaliar o custo/benefício de cada estratégia de manejo, a fim de traçar um programa de manejo integrado de nematoides. Lembrando que o investimento na adoção das práticas para o manejo será em vão caso o diagnóstico não seja correto.
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