Controle eficaz das lagartas Helicoverpa e falsa-medideira

Além da escolha correta do produto, o uso adequado da tecnologia de aplicação é fundamental para o sucesso no controle destes insetos

05.07.2022 | 15:14 (UTC -3)

Helicoverpa armigera e Chrysodeixis includens são duas pragas com alto potencial de provocar danos a diversas culturas como soja, milho, feijão e algodão.  Pelo modo como se alojam nas plantas tornam-se  alvos difíceis de serem atingidos pela aplicação de inseticidas. Por isso além da escolha correta do produto, o uso adequado da tecnologia de aplicação é fundamental para o sucesso no controle destes insetos.

Produção agrícola exige esforços constantes, dedicação, conhecimento e discernimento. Grandes desafios se apresentam dia após dia ao produtor, que para enfrentá-los se vale das tecnologias mais avançadas, maquinário moderno e de alto rendimento, sementes certificadas, fertilizantes, modelos de gestão adaptados e sistemas de cultivo altamente rentáveis. No controle de pragas, no entanto, apesar da oferta de todas estas ferramentas, não é raro o insucesso de uma pulverização porque o alvo não é atingido. Por vezes há pragas de difícil controle, seja por sua tolerância ou resistência a determinadas moléculas, pela sua localização e posições na planta onde não é fácil a gota chegar, ou ainda pela dose inadequada do produto inseticida. Entre estas pragas estão espécies polífagas, como Helicoverpa armigera e Chrysodeixis includens, cujo controle populacional nem sempre é obtido pelas pulverizações, induzindo a intensificação cada vez maior do uso e das doses de inseticidas químicos, resultando no aumento do custo de produção e em danos diretos à produção. O mau uso da tecnologia de aplicação tem sido constantemente citado entre as prováveis causas do insucesso no controle desses insetos, demandando pesquisas mais específicas para a aplicação de inseticidas químicos e biológicos utilizados no controle destes lepidópteros.

Culturas como a soja, milho, feijão e algodão são atacadas pelas duas pragas que se deslocam entre cultivos em diferentes épocas, o que favorece sua sobrevivência e o aumento das populações. Nas últimas safras as lagartas Helicoverpa (Helicoverpa armigera) e falsa-medideira (Chrysodeixis includens) têm se tornado mais frequentes, causando danos significativos e exigindo ações de controle por parte dos agricultores. A extensão e proximidade de lavouras de feijão, girassol e soja, principalmente, determinam a permanência e consequente migração de mariposas para cultivos de algodão. Esta sucessão de hospedeiros permite a estas pragas se manter em alta densidade no agroecossistema, outra razão para seus surtos frequentes.

Nas últimas safras de lagartas Helicoverpa e falsa-medideira têm se tornado mais frequentes em áreas de cultivos
Nas últimas safras de lagartas Helicoverpa e falsa-medideira têm se tornado mais frequentes em áreas de cultivos

Praga conhecida em outras regiões produtoras de grãos e fibras do mundo, Helicoverpa armigera teve sua ocorrência registrada pela primeira vez no Brasil na safra 2012/2013 em áreas do cerrado, associada aos cultivos da soja e algodoeiro. Desde então, surtos populacionais se tornaram frequentes, inclusive em algumas lavouras transgênicas. Estas lagartas se alimentam de folhas e hastes, mas tem preferência por estruturas reprodutivas. Os adultos são fortemente atraídos pelo néctar das flores, o que influencia de maneira significativa a escolha das plantas hospedeiras. Além disso, H. armigera possui grande capacidade de adaptação a condições ambientais adversas de temperaturas extremas e baixa umidade relativa do ar. Mas, evidentemente que se o clima for favorável maior será a capacidade de manter populações elevadas, fato comum em alguns estados brasileiros, como a Bahia, que possui clima quente e seco aliado à diversidade de plantas cultivadas hospedeiras, onde a ocorrência desta praga e seus danos são maiores. Atualmente distribuída pelas regiões produtoras de grãos e fibras do Brasil, de Sul a Nordeste, é encontrada se alimentando de plantas dicotiledôneas como feijoeiro, soja, também em culturas como algodoeiro e em menor extensão em lavouras de milheto, sorgo e milho. Ademais, o que agrava a situação é o fato de que esta espécie tem apresentado linhagens que possuem tolerância ou até resistência a inseticidas e a plantas geneticamente modificadas. Estima-se que a perda mundial ocasionada por essa praga chegue a cinco bilhões de dólares. No Brasil os prejuízos estimados são da ordem de dois bilhões de reais até a safra 2012/2013. 

Chrysodeixis includens têm sua forma jovem popularmente conhecida como falsa-medideira, e tanto lagartas pequenas como grandes são encontradas alimentando-se do terço inferior das plantas e de folhas tenras de ramos secundários de soja, girassol, feijão e algodão. Mas é constante notar que durante o primeiro e segundo ínstar as lagartas apenas raspam as folhas, enquanto, a partir do terceiro ínstar, conseguem perfurá-las, deixando, entretanto, as nervuras centrais e laterais intactas, proporcionando aspecto característico de folhas rendilhadas, reduzindo a capacidade fotossintética da planta. Sua polifagia permite que se desenvolva em 73 espécies de plantas hospedeiras no Brasil. Os surtos de falsa-medideira parecem ser maiores em agroecossistemas onde a soja e o algodão são cultivados próximos. Alguns estudos constataram um aumento na longevidade, oviposição e frequência de cópulas, quando foi fornecido o néctar das flores de algodoeiro para adultos de C. includens. Isso em parte pode explicar o maior índice populacional de C. includens em soja, quando existe área de algodão nas proximidades. Tal condição ocorre comumente no Brasil Central, em áreas agrícolas onde há a sucessão destas culturas e constante sobreposição de áreas de cultivo envolvendo culturas de soja e algodoeiro.

Nas últimas safras de lagartas Helicoverpa e falsa-medideira têm se tornado mais frequentes em áreas de cultivos
Nas últimas safras de lagartas Helicoverpa e falsa-medideira têm se tornado mais frequentes em áreas de cultivos

O principal método de controle dessas pragas tem sido o químico, muitas vezes realizado de forma indevida, sem uma correta amostragem que indicaria o momento ideal de aplicação. Autores mencionam que o momento adequado para o controle químico destas espécies seria nos primeiros ínstares larvais, pois as lagartas alimentam-se preferencialmente das partes mais tenras das plantas e, portanto, estariam mais expostas e suscetíveis ao contato dos produtos aplicados. Entretanto, nem sempre a pulverização é feita sob esta situação ideal, sendo necessárias mais informações a respeito do comportamento destas pragas, difíceis de serem atingidas pelo controle químico. A dificuldade de alcançar o alvo passa a ser maior nas situações em que essas pragas ocupam preferencialmente as regiões do interior das culturas (porções média e inferior das plantas), exigindo maior penetração das gotas para que os produtos possam agir sobre a praga alvo. Em função disso, é comum considerar a técnica de aplicação utilizada e/ou condição operacional associada como uma das causas do insucesso no controle.

Para a adequação de recomendações de inseticidas com satisfatória eficiência de controle, na safra 2016/2017, foram realizados bioensaios com Helicoverpa armigera e Chrysodeixis includens, além de avalições de quatro inseticidas distintos com modos de ação em lagartas de terceiro instar, estágio mediano do ciclo de desenvolvimento.

Tabela 1
Tabela 1

Eficiência de controle de Helicoverpa armigera maior que 75% foi verificada com o uso de dose inteira (dose recomendada em bula) e dobro da dose de Baculovirus (HzSNPV) e todas as doses de flubendiamida (Figura 1). Os demais produtos resultaram em eficiência de controle inferior a 75%. Contra Chrysodeixis includens, eficiência de controle igual ou acima de 75% foi verificada com o uso de lufenuron e flubendiamida. Os demais produtos resultaram em eficiência de controle máxima de 53%. Nos testes com ambas as espécies de lagartas, a eficiência dos produtos e respectivas doses na fase pupal foi sempre relativamente baixa, atingindo no máximo 5%, o que demonstra que a ação letal dos produtos se concentrou na fase larval.

Figura 1. Eficiência de controle (%) de Helicoverpa armigera (a) e Chrysodeixis includens (b) após aplicação de inseticidas com diferentes doses. Valores corrigidos por Schneider-Orelli.
Figura 1. Eficiência de controle (%) de Helicoverpa armigera (a) e Chrysodeixis includens (b) após aplicação de inseticidas com diferentes doses. Valores corrigidos por Schneider-Orelli.

A mortalidade larval diária acumulada de H. armigera promovida por B. thuringiensis variou ao longo do tempo, porém pouco ultrapassou o valor de 50%, independentemente da dose utilizada (Figura 2a). Tendência de incremento da mortalidade com o aumento da dose foi observada com Baculovirus (HzSNPV), sendo que a dose recomendada promoveu mortalidade larval final próximo a 80% e o uso do dobro da dose elevou tal mortalidade a valores próximos a 100%. Lufenuron promoveu mortalidade larval crescente nos primeiros cinco dias, estabilizando após este período em patamares entre 50% e 60% quando utilizadas meia dose e dose inteira, e próximo a 80% quando empregado o dobro da dose. Quanto a flubendiamida, a mortalidade larval foi significativamente incrementada logo nos primeiros cinco dias após a exposição, estabilizando em valores elevados entre 90% e 100%, mesmo quando meia dose foi adotada (Figura 1d).

A mortalidade larval diária acumulada de C. includens promovida por B. thuringiensis aplicado em meia dose e dose recomendada não atingiu 40%. Quando utilizado o dobro da dose recomendada, a mortalidade atingiu valor um pouco acima de 60% no final da fase larval. Baculovirus (ChinSNPV) promoveu mortalidade crescente ao longo da fase larval, porém a mortalidade larval acumulada variou entre 50% e 65%, sendo este valor máximo resultante do uso do dobro da dose recomendada. A mortalidade devido ao uso de lufenuron ocorreu nos primeiros sete dias da fase larval e atingiu valores próximos a 100%. O mesmo padrão de mortalidade foi verificado com flubendiamida, sendo que os valores finais resultantes variaram entre 80% e 100%, proporcionalmente à dose utilizada.

Figura 2. Mortalidade larval de H. armigera (a) e Chrysodeixis includens (b) ao longo do tempo, causada pela aplicação de inseticidas.
Figura 2. Mortalidade larval de H. armigera (a) e Chrysodeixis includens (b) ao longo do tempo, causada pela aplicação de inseticidas.

Os resultados permitiram concluir que dentre os produtos testados, os mais eficientes para o controle de Helicoverpa armigera foram flubendiamida na dose de 75 ml p.c./ha, baculovirus (HzSNPV) na dose de 1500 g p.c./ha e lufenuron na dose de 2000 ml p.c./ha. Contra Chrysodeixis includens, lufenuron na dose de 500 ml p.c./ha e flubendiamida na dose de 75 ml p.c./ha foram os mais eficientes.

Importante salientar que para ambas as espécies foi necessária apenas a metade da dose recomendada de flubendiamida para a obtenção do controle desejado. Da mesma forma, para o controle de C. includens, lufenuron foi eficiente mesmo com meia dose (500 ml p.c./ha). Na prática, porém, é de bom senso a manutenção da dose recomendada, pois os testes foram efetuados em ambiente de laboratório, sem a presença de outros fatores adversos à pulverização, enquanto no campo a ação dos produtos pode ser afetada por fatores bióticos e abióticos.

Produtos e doses adequadas ao controle das pragas das culturas fazem parte da tecnologia de aplicação. A interação dos fatores relativos ao produto e aqueles relacionados à cultura, ao ambiente e às características e condições do equipamento aplicador concorrem para o controle eficiente, a redução do custo e dos impactos ambientais. Assim, além do produto e dose adequada, deve-se atentar para a boa regulagem do pulverizador e o momento correto de aplicação, considerando-se a fase suscetível da praga, o horário de aplicação, as condições de temperatura, umidade e vento. As condições de clima devem ser favoráveis à absorção e translocação dos produtos, indicando-se temperaturas entre 20ºV e 30ºC, umidade relativa entre 60% e 70% e ventos com velocidade inferior a 10 km/h. Não é prudente realizar aplicações em caso de chuva iminente, pois pode haver perda do produto por escorrimento. O volume de calda a ser aplicado, o número e o tamanho das gotas, a pressão de funcionamento dos bicos, a agitação e adição de adjuvantes devem ser verificados cuidadosamente. Finalmente, recomenda-se que o produtor consulte sempre um engenheiro agrônomo para auxiliá-lo no aferimento de todos estes fatores.

Artigo publicado na edição 225 da Cultivar Grandes Culturas, mês fevereiro, ano 2018.

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