Controle químico contra cigarrinha do milho
Controle químico, via tratamento de sementes e aplicação de inseticidas, é uma das ferramentas recomendadas para o combate ao inseto
O manejo de percevejos deve acompanhar a evolução do cultivo da soja, principalmente considerar o aumento das populações da praga, as dificuldades de controle (espécies do inseto e a eficiência dos inseticidas), os severos danos que produzem e o alto valor da soja. Juntos esses componentes determinam que o controle deve ser feito em baixas populações sob pena de se tornarem incontroláveis, sugando os lucros do produtor.
O manejo de percevejos deve considerar as importantes alterações que ocorreram no cultivo da soja nos últimos tempos, (i) o crescimento da área cultivada avançando sobre regiões antes não exploradas; (ii) o cultivo em diferentes épocas servindo de pontes verdes que hospedam pragas; (iii) o uso intenso de fungicidas, inseticidas e herbicidas e seu impacto sobre organismos benéficos; (iv) o aumento do período reprodutivo com a oferta de legumes nas cultivares modernas e (v) a redução do uso de inseticidas nos cultivos Bt.
Nos Sistemas Integrados de Grãos a distribuição dos percevejos é influenciada pela sucessão de cultivos, pela presença de plantas daninhas e pelos cultivos do entorno da área, pois passam a maior parte do ano em outras plantas hospedeiras ou na palhada e apenas dois a três meses na soja. Os cultivos do entorno das lavouras de soja e da entressafra influenciam na migração e na prevalência de algumas espécies de percevejos, contribuindo para sua permanência e sobrevivência nas áreas ou no seu entorno.
As espécies de percevejos que ocorrem na soja do Brasil variam em resposta a diversos fatores como: o crescimento da área cultivada, o número e o tempo de oferta de hospedeiros, as falhas operacionais de controle, a resistência aos inseticidas e a falta de inovações no controle químico. Nesse cenário, o percevejo-marrom e os percevejos-barriga-verde se destacaram e atualmente predominam na grande maioria das lavouras do Brasil.
O Percevejo-marrom (Euschistus heros) na fase adulta tem a coloração que o próprio nome já sugere, mede 11mm em média, tem pronoto pontiagudo que termina em espinhos e o escutelo apresenta uma mancha clara em forma de “v”. As fêmeas fazem a postura agrupada nas folhas e legumes, dispostas em duas ou três linhas paralelas, com aproximadamente 15 a 20 ovos amarelos. Após a incubação, emergem as ninfas que inicialmente são de coloração marrom-amarelado, com bordos serreados, mudando para o marrom-esverdeado com manchas. Como as ninfas de outros percevejos elas permanecem agrupadas até o 30 instar, quando ficam mais ativas, se dispersam e começam a se alimentar. A fase de ninfa dura em média 33 dias e os adultos podem viver mais de 100 dias.
Os Percevejos-barriga-verde (Dichelops spp.) já foram considerados pragas secundárias na soja, no entanto, em função das mudanças no sistema de manejo das lavouras (rotação com milho e trigo, principalmente), apresentam populações fora de controle em muitas culturas. Os adultos medem de 9mm a 10mm de comprimento e coloração entre castanho amarelado ao acinzentado, com abdome verde. A cabeça termina em duas projeções pontiagudas e o pronoto com margens anteriores denteadas e expansões laterais em espinhos. As posturas são feitas sobre folhas ou legumes, em massas de aproximadamente 14 ovos de coloração verde-clara. As ninfas são castanhas, com abdome claro e pontuações escuras sobre o corpo. A fase de ninfa dura em média 18 dias.
Após a colheita da soja o percevejo-marrom e os percevejos-barriga-verde se abrigam sob a palhada, onde se alimentam de grãos secos caídos no solo. Essas espécies colonizam e atacam o milho safrinha e no inverno o trigo, e mudam seus hábitos alimentares ao longo do ano, passando de sugadores de grãos a sugadores de tecidos vegetativos.
As alterações observadas no cultivo da soja se refletiram na proporção de espécies de percevejos da soja. O efeito do controle químico, variável sobre as espécies, as estratégias bioecológicas e comportamentais e a maior polifagia (leguminosas e gramíneas), permitiram o maior sucesso do percevejo-marrom e dos percevejos-barriga-verde. O percevejo-verde-pequeno (Piezodorus guildinii) e o percevejo-verde (Nezara viridula) diminuíram muito sua importância no Brasil e mesmo no Rio Grande do Sul. Nas safras 2006/07 e 2007/08, essa alteração já estava clara. No primeiro ano, a espécie predominante foi P. guildinii, com 76% do total de percevejos, seguido por N. viridula e E. heros, respectivamente.
Na safra seguinte, predominaram as espécies P. guildinii, D. furcatus e E. meditabunda. Embora E. heros não esteja entre as três que apresentaram maior proporção, esta espécie passou de 4% em 2006/07 para 12% do total de percevejos e atualmente é a espécie que predomina na maioria das lavouras de soja do Brasil (Figura 1). A predominância e as altas populações do percevejo-marrom e dos percevejos-barriga-verde no sistema produtivo da soja podem compensar sua baixa capacidade natural de causar os danos.
Os danos dos percevejos variam ao longo do seu desenvolvimento. As ninfas pequenas (de 1o instares e 2o instares) ficam agrupadas e não se alimentam, como as ninfas grandes e os adultos. As ninfas grandes (de 3o, 4o e 5o instares) se alimentam para se desenvolver e cumulativamente causam 2/3 dos danos. O 1/3 restante é provocado pela alimentação do adulto. Por isso, quando se observa percevejos adultos na soja, parte dos lucros já foi sugada por essa praga na fase de ninfa.
Os cotilédones das plantas de soja recém emergidas são atacados por percevejos remanescente de culturas anteriores (como milho, trigo ou mesmo a soja), resultando em menor altura inicial das plantas, por cessar o fornecimento de energia para o seu crescimento inicial. A partir da formação dos legumes até o final do enchimento dos grãos ocorrem danos diretos, quando os percevejos se reproduzem e aumentam em número nas lavouras, sugando os legumes e grãos que ficam menores, chochos, enrugados e com menos peso, diminuindo o rendimento e a qualidade dos grãos. Além disso, o ataque de percevejos em legumes recém-formados (R3-R4) provoca o seu abortamento, que pode ser ainda mais severo em períodos de estiagem.
Quando se cultiva soja para sementes uma picada de percevejo no eixo embrionário inviabiliza a germinação. Picadas na região vascular, por onde passam vasos que ligam o eixo embrionário aos cotilédones, comprometem o transporte de nutrientes dos cotilédones à planta em desenvolvimento, reduzindo a emergência, o vigor e a sanidade das plantas. Por isso, sojas cultivadas para a produção de sementes devem ser protegidas e estarem livres do ataque de percevejos durante a fase reprodutiva.
Os danos dos percevejos não são percebidos durante o ciclo da soja e sua visualização só é possível com o teste de Tetrazólio, que permite ver o local da picada e a região morta no grão, alertando o produtor sobre os severos danos que os percevejos ocasionaram em sua lavoura de soja.
O monitoramento das populações de percevejos em soja serve para determinar as fases (ninfas pequenas, grandes e adultos), espécies e número de percevejos/m2 na lavoura. Esses dados são usados para a tomada de decisão de controle, determinando se controla ou não, qual inseticida e a dose a ser usada. A maneira de amostrar percevejos depende do estágio de desenvolvimento da soja. Nos estágios iniciais e na entressafra é feita pela contagem direta do número de percevejos em uma área de 1 m2, nas plantas e na palhada. Com as plantas mais desenvolvidas se usa o pano-de-batida vertical com calha, com duas tomadas (batidas) em uma fileira de soja (2 m), totalizando 1 m2 de área amostrada. Essa amostragem deve ser semanal em tantos pontos na lavoura que permita ter certeza da variação espacial das populações (Tabela 1).
A base para decidir o controle de percevejos é o Nível de Dano Econômico (NDE) e o Nível de Controle (NC). A decisão de controle tem relação direta com quatro fatores: 1) custo do controle (inseticida + aplicação); 2) valor da saca de soja; 3) dano dos percevejos e 4) eficiência do inseticida. Estes são os fatores que alimentam a equação do NDE e norteiam a decisão de controle. O produtor deve calcular para a sua situação o momento de controle de percevejos, pois o valor do NDE (valor dado em percevejos/m2) estimado pela fórmula, expressa o limite máximo de percevejos que o produtor pode tolerar em sua lavoura. Na prática o produtor deve aplicar o inseticida antes que os percevejos cheguem ao valor do NDE. Esse número é conhecido como NC.
Os danos que os percevejos causam em soja já foram estudados e uma estimativa de 36 resultados mostra um dano de aproximadamente 75 kg/percevejo/m². Utilizando esse valor na fórmula do NDE, com custo de controle de R$50,00/ha e o valor da saca de soja de R$70,00, o NDE é de 0,71 percevejos/m². Na Tabela 2 são apresentados os dados que mostram que o NDE varia com o custo de controle e o valor da saca de soja.
A redução das aplicações de inseticidas em sojas Bts favoreceram os percevejos, o que já ocorreu em algodão nos EUA entre 2001 e 2007 e no Brasil em meados de 2010. Com a redução das aplicações de inseticidas de amplo espectro para o controle de lagartas, que também controlavam populações iniciais de percevejos, estes insetos ocorrem mais cedo na cultura, se reproduzem e aumentam sua densidade populacional. Em lavouras com soja Bt há pelo menos 10% a mais de percevejos do que em lavouras não Bt, conforme foi observado em pesquisa do Laboratório de Manejo Integrado de Pragas (LabMIP) da Universidade Federal de Santa Maria.
O sucesso do manejo de percevejos depende do monitoramento das populações e da otimização das oportunidades de manejo dessa praga no sistema de cultivo da soja. Isso inclui o controle dos percevejos colonizadores nas culturas antecessoras, na palhada antes da semeadura e nas pulverizações associadas com fungicidas, no final do vegetativo e durante o período reprodutivo da soja. A falta de monitoramento (pano-de-batida) e do correto diagnóstico (espécies e população) leva a aplicações tardias com infestações acima do nível de controle e a diminuição do lucro dos produtores.
Jerson V. C. Guedes, Clérison R. Perini, Leonardo Burtet, Regis F. Stacke, Adriano A. Melo, Jonas A. Arnemann, Universidade Federal de Santa Maria
Artigo publicado na edição 205 da Cultivar Grandes Culturas.
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