Como lidar com a resistência de capim-pé-de-galinha

Herbicidas alternativos são uma opção para o emprego em sistemas de rotação de mecanismos, mas outros métodos de controle também devem ser considerados para evitar a seleção de resistência múltipla

22.04.2022 | 15:07 (UTC -3)

Planta daninha que figura entre as espécies resistentes ao glifosato o capim-pé-de-galinha é um sério desafio enfrentado pelos produtores de soja e de milho. Herbicidas alternativos são uma opção para o emprego em sistemas de rotação de mecanismos, mas outros métodos de controle também devem ser considerados para evitar a seleção de resistência múltipla.

O capim pé-de-galinha é uma das mais importantes plantas daninhas do mundo. Suas características de ciclo fotossintético do tipo C4, rápido crescimento e elevada produção de sementes que podem germinar em diferentes condições de solo (alta salinidade, alto ou baixo pH, compactação e temperatura), fazem com que esta espécie seja extremamente competitiva no ambiente. Ocorre principalmente em beiras de estradas e rastros de maquinários devido à compactação do solo nestes locais e à ausência de outras plantas ao seu redor.

A resistência de plantas daninhas ao glifosato constitui o principal problema de resistência a herbicidas no mundo. A seleção de espécies resistentes a este herbicida tem ocorrido em resposta às atuais práticas de manejo empregadas no campo como a utilização repetida de herbicidas com o mesmo mecanismo de ação. Portanto, o manejo efetivo da resistência a herbicidas deve considerar todas as opções disponíveis de controle cultural, mecânico e químico, com o objetivo de minimizar a pressão de seleção causada por uma única ferramenta.

O uso de doses recomendadas de herbicidas, a associação de princípios ativos, bem como a rotação de diferentes mecanismos de ação são fundamentais para o manejo de plantas daninhas resistentes. Neste sentido, quatro experimentos foram conduzidos pela Universidade Estadual de Maringá (UEM - Maringá/PR) com o objetivo de avaliar alternativas químicas para o controle de capim pé-de-galinha resistente ao glifosato. Estes experimentos incluíram herbicidas recomendados para as culturas da soja e do milho em diferentes modalidades de aplicação. As doses dos herbicidas que foram utilizadas são aquelas registradas na bula dos produtos comerciais.

O capim-pé-de-galinha é uma das mais importantes plantas daninhas do mundo.
O capim-pé-de-galinha é uma das mais importantes plantas daninhas do mundo.

No caso da soja e do milho, uma vez que a aplicação do herbicida em pré-emergência é realizada no momento da semeadura, o controle residual até 20 dias após a aplicação (DAA) pode ser suficiente para manter a cultura no limpo entre a semeadura e a aplicação em pós-emergência. Mesmo que o controle residual de alguns herbicidas seja menor após 35 DAA ou 60 DAA, a supressão imposta por estes produtos permite que a aplicação em pós-emergência ocorra em uma situação mais tranquila (menor infestação e plantas em estádio inicial de crescimento). Um outro ponto importante reside no fato que a utilização de herbicidas residuais é determinante para o manejo de populações de capim pé-de-galinha resistentes ao glifosato.  Considerando todos estes aspectos, dentre os herbicidas avaliados, sulfentrazone, pendimethalin, s-metolachlor e trifluralin são os herbicidas com maior eficácia. No entanto, flumioxazin, fomesafen, clomazone, isoxaflutole, diuron e [flumioxazin + imazethapyr] também podem ser utilizados no controle de capim pé-de-galinha resistente ao glifosato em pré-emergência.

Para a pós-emergência, ambos os herbicidas paraquat e [paraquat + diuron] são eficazes para o controle de capim pé-de-galinha com até um perfilho. Paraquat (600 g/ ha) e [paraquat + diuron] controlam plantas com até quatro perfilhos em mais de 80%. Estes herbicidas possuem recomendação para aplicação em dessecação pré-plantio tanto para a cultura da soja quanto para a cultura do milho, sendo alternativas viáveis para a semeadura das culturas no limpo.

De modo geral, a maioria dos herbicidas inibidores da ACCase aplicados isolados proporcionam controle maior ou semelhante àquele obtido pela associação destes herbicidas com glifosato. No caso de plantas pequenas (um perfilho), exceto para fenoxaprop e sethoxydim, mesmo sendo o controle mais lento, a associação destes graminicidas com glifosato foi eficaz. Por outro lado, em plantas maiores (quatro perfilhos), o controle final de capim pé-de-galinha é limitado na maioria dos casos, especialmente em associações com glifosato. Mesmo os herbicidas inibidores da ACCase apresentando eficácia sobre algumas populações de capim pé-de-galinha, é importante lembrar que outras populações resistentes a este mecanismo de ação já foram documentadas no Brasil. Portanto, o uso destes herbicidas deve ser feito de maneira sustentável, para a preservação da sua eficácia sobre a espécie.

Avaliar alternativas químicas para o controle de capim-pé-de-galinha resistente ao glifosato é uma necessidade.
Avaliar alternativas químicas para o controle de capim-pé-de-galinha resistente ao glifosato é uma necessidade.

Dentre os herbicidas avaliados neste experimento, glifosato isolado apresenta no máximo 65% de controle em plantas pequenas e 55% de controle em plantas grandes. Todos os graminicidas isolados ou associados ao glifosato apresentam eficácia acima de 80% sobre capim pé-de-galinha com um perfilho, com exceção de glifosato+ fenoxaprop (960 g/ ha + 110 g/ ha e 960 g/ ha + 220 g/ ha) e glifosato + sethoxidim (960 g/ ha + 384 g/ ha). Para plantas com quatro perfilhos, as opções eficazes são clethodim (108 g/ ha e 192 g/ ha), haloxyfop (60 e 120 g/ ha), quizalofop-tefuril (70 g/ ha e 120 g /ha), quizalofop-methyl (75 g/ ha e 100 g/ ha), glifosato + haloxyfop (960 g/ ha + 120 g/ ha), glifosato + quizalofop-tefuril (960 g/ ha + 120 g/ ha), glifosato + quizalofop-methyl (960 g/ ha + 100 g/ ha), glifosato + fluazifop (960 g/ ha + 250 g/ ha e 960 + 500 g/ ha).  

No caso do milho, nicosulfuron (50 g/ ha e 60 g/ ha), glifosato + nicosulfuron (960 g/ ha + 50 g/ ha e 960 g/ ha + 60 g/ ha), bem como todas as associações de atrazine com mesotrione, tembotrione e nicosulfuron são eficazes no controle de plantas com até um perfilho. Por outro lado, em plantas com quatro perfilhos as opções são extremamente restritas. Mesmo que estes herbicidas sejam recomendados para a cultura do milho, o controle de capim pé-de-galinha em estádio avançado se torna bastante limitado nesta cultura.

De forma generalizada, o número de opções de tratamentos eficazes para o controle de capim pé-de-galinha em estádio mais avançado é sempre menor que para plantas com até um perfilho. Para esta espécie, o tempo entre a emergência e o início do perfilhamento é de apenas nove dias, o que significa pouco tempo para que a aplicação seja feita no estádio adequado. Existe uma hipótese importante para explicar a menor eficácia de herbicidas sobre plantas de capim pé-de-galinha em estádio avançado. A cutícula das plantas com mais de três perfilhos apresenta maior acúmulo de ceras, o que pode limitar a absorção pela planta. Estas ceras atuam como um compartimento de acúmulo de herbicidas e, portanto, impedem parcialmente a entrada do ingrediente ativo em células epidérmicas e consequentemente no floema. Neste sentido, para o controle efetivo de plantas de capim pé-de-galinha em estádio avançado, aplicações complementares ou aplicações sequenciais são necessárias.

Outro fato importante é que diferentemente do capim-amargoso, as misturas de glifosato com herbicidas inibidores da ACCase, aparentemente não apresentam efeito sinérgico no controle de capim pé-de-galinha. A associação destes herbicidas constitui uma das principais ferramentas para o controle de capim-amargoso resistente ao glifosato.

A utilização de herbicidas residuais é determinante para o manejo desta espécie, uma vez que a maioria dos herbicidas aplicados em pós-emergência controlam apenas plantas pequenas. A rotação de mecanismos de ação de herbicidas, bem como misturas destes produtos, geralmente apresentam efeito retardador na seleção de populações resistentes, especialmente para espécies que são autopolinizadas, que possuem mecanismo de resistência baseado em alteração no sítio de ação e a dispersão de suas sementes é restrita. Esta série de características adequam-se justamente ao capim pé-de-galinha, que é uma espécie autógama, cuja dispersão ocorre estritamente por sementes e o mecanismo de resistência ao glifosato é uma mutação no gene da EPSPS.

Portanto, herbicidas alternativos ao glifosato eficazes no controle de capim pé-de-galinha podem ser recomendados em sistemas de rotação de mecanismos de ação com o objetivo de manejo deste caso de resistência. Além da rotação de mecanismos de ação de herbicidas, outros métodos de controle devem ser considerados para evitar a seleção de resistência múltipla, em curto prazo. O uso de culturas de cobertura, a descompactação do solo e o rápido fechamento de entrelinhas são métodos alternativos aos herbicidas que também diminuem a infestação destas plantas na lavoura. Por fim, o uso de herbicidas residuais para o controle de capim pé-de-galinha resistente ao glifsato constitui uma ferramenta de extrema importância para o seu manejo efetivo, e o estádio de aplicação é determinante para obtenção de eficácia em pós-emergência (no máximo um perfilho).

Artigo publicado na edição 220 da Cultivar Grandes Culturas, mês setembro, ano 2017. 

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