Como identificar Leptodelphax maculigera e Dalbulus maidis

Por Glauber Renato Stürmer, CCGL – Cooperativa Central Gaúcha Ltda

18.06.2025 | 17:14 (UTC -3)
Diferenças morfológicas para identificação das espécies <i>Dalbulus maidis</i> e <i>Leptodelphax maculigera</i> (Stürmer, G.R. 2023)
Diferenças morfológicas para identificação das espécies Dalbulus maidis e Leptodelphax maculigera (Stürmer, G.R. 2023)

Cigarrinhas das famílias Cicadellidae e Delphacidae são comuns em gramíneas e formam um grupo reconhecidamente importante de insetos vetores de vírus e molicutes, agentes causais de doenças em diversas espécies vegetais, incluindo a cultura do milho.

A cigarrinha-do-milho Dalbulus maidis é da família Cicadellidae. São insetos fitófagos e é o grupo mais diversificado de Membracoidea (superfamília), com cerca de 21 mil espécies descritas. Já a cigarrinha-africana (Leptodelphax maculigera) é da família Delphacidae, uma família de cigarrinhas contendo cerca de 2 mil espécies, distribuídas mundialmente.

A família Delphacidae ocorre comumente em monocotiledôneas (gramíneas, arbustos e árvores), com a capacidade de serem vetores de fitopatógenos, principalmente de vírus. No entanto, existem espécies que transmitem fitoplasmas e causam doenças, especialmente em cana-de-açúcar e arroz (Eumetopina flavipes, Javesella discolor, Nilaparvata lugens, Saccharosydne saccharivora). Por exemplo, a cigarrinha-marrom (N. lugens) é um inseto-praga muito destrutivo no arroz, com a descrição de 18 bactérias simbiônticas que podem ser transmitidas.

Dentro da família Delphacidae, existem cigarrinhas do gênero Leptodelphax, que, em nível mundial, têm as seguintes espécies: Leptodelphax dymas (Fennah 1961), Leptodelphax maculigera (Stal 1859) e Leptodelphax cyclops (Haupt 1927). Na África, Leptodelphax dymas é responsável pela transmissão de Napier grass stunt (NGS), que é um fitoplasma do gênero "Candidatus", extremamente danoso para a cultura do capim elefante. E, recentemente, Leptodelphax maculigera foi identificada como transmissor de MRFV em plantas cultivadas, e potencialmente vetor da virose-da-risca na cultura do milho no Brasil.

Monitoramento de cigarrinhas através do uso armadilhas adesivas em área cultivada com trigo (Sturmer, G.R., 2023)
Monitoramento de cigarrinhas através do uso armadilhas adesivas em área cultivada com trigo (Sturmer, G.R., 2023)

No Brasil, recentemente foi encontrada nos Estados de Goiás, Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, São Paulo e Mato Grosso do Sul, sendo que, no Estado do Rio Grande do Sul, L. maculigera foi verificada nos municípios de Cruz Alta, Passo Fundo e Santa Rosa. Nesses locais, ela foi capturada em armadilhas adesivas de coloração amarela.

Essa captura ocorreu em áreas de milho tiguera, milho cultivado e em lavoura de trigo. Essa espécie mostra sua capacidade de adaptação e tem como hospedeiros não apenas o milho, mas também capim kikuio (Pennisetum clandestinum), cana-de-açúcar (Saccharum officinarum), capim setária (Setaria sphacelata), brachiaria (Brachiaria sp.), capim elefante (Pennisetum purpureum), em plantas daninhas dentro de lavouras de feijão, trigo e pomares de citros. Nesse contexto, é demonstrado que L. maculigera é uma espécie oligófaga, isto é, alimenta-se de um número relativamente restrito de plantas hospedeiras de diferentes gêneros dentro de uma mesma família, sendo que nesse caso o inseto está associado à família poaceae, plantas economicamente importantes no Brasil.

Locais onde foram capturados indivíduos de <i>Leptodelphax maculigera</i> no Estado do Rio Grande do Sul (Stürmer, G.R., 2023)
Locais onde foram capturados indivíduos de Leptodelphax maculigera no Estado do Rio Grande do Sul (Stürmer, G.R., 2023)

No entanto, a similaridade com outras espécies de cigarrinhas como Dalbulus maidis, pode acarretar erro de identificação de sua ocorrência nas áreas - ou não detecção. Nesse contexto, saber algumas características morfológicas da cigarrinha-africana pode auxiliar no correto monitoramento e evitar possíveis erros de identificação.

A espécie L. maculigera apresenta coloração palha, asas hialinas e olhos pretos, e tamanho 0,4 cm menor quando comparado com D. maidis. A cigarrinha-do-milho (D. maidis) é caracterizada por apresentar pontuações escuras na cabeça, enquanto na cigarrinha-africana (L. maculigera) há uma mancha escura no clípeo (região localizada na parte inferior da cabeça), característica desta espécie.

Diferenças morfológicas da superfície anterior da cabeça da cigarrinha-do-milho (<i>Dalbulus maidis</i>) e cigarrinha-africana (<i>Leptodelphax maculigera</i>) (Stürmer, G.R. 2023)
Diferenças morfológicas da superfície anterior da cabeça da cigarrinha-do-milho (Dalbulus maidis) e cigarrinha-africana (Leptodelphax maculigera) (Stürmer, G.R. 2023)

Uma característica marcante que difere a cigarrinha-africana da cigarrinha-do-milho é a questão da antena. A cigarrinha-africana apresenta antena com pedicelo dilatado bem visível. O pedicelo fica próximo à inserção da antena na cabeça do inseto. A antena de D. maidis não apresenta o pedicelo dilatado, sendo afilada em toda sua extensão.

Diferenças na morfologia da antena da cigarrinha-do-milho (<i>Dalbulus maidis</i>) e  cigarrinha-africana (<i>Leptodelphax maculigera</i>) (Stürmer, G.R. 2023)
Diferenças na morfologia da antena da cigarrinha-do-milho (Dalbulus maidis) e cigarrinha-africana (Leptodelphax maculigera) (Stürmer, G.R. 2023)

Outra característica da família Delpachidae, e que pode ser utilizada para diferenciar as duas especies, encontra-se no terceiro par de pernas (o mais distante da cabeça), apresentando tíbias com esporão apical móvel.

Diferenças morfológicas entre as pernas da cigarrinha-do-milho (<i>Dalbulus maidis</i>) e cigarrinha-africana (<i>Leptodelphax maculigera</i>) (Stürmer, G.R. 2023)
Diferenças morfológicas entre as pernas da cigarrinha-do-milho (Dalbulus maidis) e cigarrinha-africana (Leptodelphax maculigera) (Stürmer, G.R. 2023)

A ocorrência da cigarrinha-africana tem gerado preocupação em relação ao iminente risco de ser um inseto vetor para os patógenos do enfezamento do milho, ou seja, o fitoplasma do enfezamento vermelho (“Candidatus Phytoplasma asteris”, Subgrupo 16SrI-B); o espiroplasma do enfezamento pálido (Spiroplasma kunkelii); o vírus do rayado-fino (maize rayado fno virus – MRFV) e o vírus do mosaico estriado (maize striate mosaic vírus – MSMV), todos transmitidos por Dalbulus maidis.

Os trabalhos conduzidos até o momento já sinalizam, por meio de análises moleculares, que vários espécimes da cigarrinha-africana capturados estavam infectivas com o MRFV no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e São Paulo. Entretanto, falta ainda confirmar a possibilidade de infecção na cultura do milho e também os riscos em relação às bactérias.

Em resumo, Leptodelphax maculigera é uma espécie de inseto da família Delphacidae, encontrada em diversas regiões do mundo; alimenta-se de seiva de plantas, principalmente de gramíneas. Assim, há necessidade de observar os seguintes aspectos, a fim de criar uma robustez de informações e evitar criar pânico desnecessário sobre o problema da cigarrinha-africana na cultura de milho.

  1. Identificar L. maculigera para conhecer o tamanho problema em nível de Brasil e qual seu percentual em relação a D. maidis (principal problema nas lavouras de milho)
  2. Conhecer o potencial de L. maculigera como bacterilífera na cultura de milho
  3. Conhecer seu desenvolvimento em diferentes hospedeiros, podendo comprovar sua possível adaptação ao sistema de cultivo do milho
  4. Monitoramento das lavouras e sintomas com análises para confirmação de infectividade nas plantas
  5. Integração de táticas de manejo de D. maidis também devem ser implementadas para áreas com a presença de L. maculigera.

Nesse contexto, a cigarrinha-africana é mais uma praga com capacidade de se alimentar e ocasionar danos às lavouras de milho. Assim, o correto monitoramento, manejo adequado e técnicas do MIP devem ser empregados, minimizando impactos na produtividade e qualidade da lavoura de milho.

Por Glauber Renato Stürmer, CCGL – Cooperativa Central Gaúcha Ltda

Artigo originalmente publicado na edição 298 da Revista Cultivar Grandes Culturas

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