Cana no canteiro

Estudo feito em lavouras comerciais mostra que o preparo de solo profundo canteirizado reduz os custos operacionais além de proporcionar um ambiente mais favorável ao desenvolvimento da cana-de-açúcar

13.05.2016 | 20:59 (UTC -3)

O setor sucroalcooleiro destaca-se pela participação extremamente importante no agronegócio brasileiro representando 25% do PIB do país, mas atualmente passa por uma crise e perda de competitividade. Com a entrada de grandes investidores e multinacionais,baseada na hipótese que o etanol seria o grande protagonista em matéria de energia renovável na matriz energética brasileira, o setor viveu um “boom” em 2006, o que levou a uma grande expansão e investimentos. Porém,em 2008,o setor foi atingido pelacrise econômica mundial fato esse agravado pela queda na produtividade dos canaviais nas safras 2010/11 e 2011/12,pela elevação dos custos de produção e pelaconcorrência com os combustíveis fósseis, que não apresentam uma evolução de preços no mercado interno de acordo com o mercado mundial.

Mesmo com esse cenário desfavorável, o Brasil precisa dobrar a oferta desse combustível e produzir aproximadamente 16 milhões de toneladas de açúcar a mais do que produziu na safra 11/12 até o ano de 2020, para atender a demanda do mercado interno e externo, segundo a União da Indústria de Cana-de-açúcar (UNICA), a partir de dados da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (ANFAVEA) e Secretária de Comércio Exterior (SECEX) em 2013.

Acompanhando a crise enfrentada pelo setor, algumas mudanças na cadeia de produção ocasionaram a queda de produtividade agrícola do canavial. Dentre elas se destacama expansão da cultura da cana-de-açúcar para ambientes menos favoráveis ao seu cultivo;a concentração em poucas e antigas variedades; a falta de formação deviveiros e tratamento de mudas, e asperdas com a acelerada entrada da mecanização que exigiu mão-de-obra qualificada e sistematização de áreas. A mecanização por si só cobrou, ou ainda cobra, uma curva de aprendizado muito grande, tanto para o plantio quanto para a colheita e, além disso, trouxe um novo ambiente ao sistema de produção. Apenas as duas últimas safras (2012/13 e 2013/14)mostraramuma recuperação da produtividade do canavial no Centro-Sul brasileiro, que só foi possível devido ao clima chuvoso dos últimos dois anos.

Para atender as necessidades do mercado e vencer as dificuldades da produção, novas tecnologias que visem reduzir o custo e o aumento da produtividade devem ser avaliadas. Dentre essas tecnologias, a operação de preparo do solo é uma das mais importantes no manejo da cana-de-açúcar,cultura que apresenta um ciclo relativamente longo. O preparo de solo é a etapa que deve garantir à cultura as melhores condições para o desenvolvimento e longevidade, o que reflete na produtividade, além de permitir uma boa sistematização do terreno para o tráfego de máquinas nas operações subsequentes, relação cliente-fornecedor. Além disso, apresenta grande participação no custo de formação da lavoura. Segundo a ORPLANA, 2013(Organização de Plantadores de Cana da região Centro-Sul do Brasil) o preparo de solo chega a representar aproximadamente 20% do custo de formação do canavial.

Uma nova tecnologia que vem surgindo no setor é o conceito do preparo de solo profundo canteirizado (PSPC). Esse conceito tem como princípio fornecer as melhores condições químicas e físicas ao solo para o desenvolvimento das raízes, permitindo maior crescimento e aprofundamento do sistema radicular, e consequentemente o aumento da produtividade e longevidade da soqueira.Ensaios realizados por Tomaz (2013) mostraram que o volume de raízes do sistema de preparo de solo profundo canteirizado (PPF) foi maior ao se comparar com o preparo convencional (CON-D) e o cultivo mínimo (MIN-D) (Figura 1). Além desses benefícios, o preparo profundo diminui o número de operações necessárias, quando comparado ao preparo convencional,o que pode contribuir para a reduçãodo custo operacional.

Neste sistema de preparo profundo,o preparo é realizado na forma de um canteiro, o que permite a sistematização da área no espaçamento “combinado” (1,5 x 0,9 m), auxilia no controle de tráfego de máquinas na área,aumenta a quantidade de metros lineares de cana ao se comparar com o espaçamento tradicional (1,5m x 1,5m) e reduz a distância percorrida pelas máquinas agrícolas por unidade de área.

Para verificar a viabilidade do emprego dessa nova tecnologia, realizada por um implemento de preparo de solo profundo canteirizado fabricado pela empresa Antoniosi Tecnologia Agroindustrial Ltda, modelo PSPC-1101, foi realizada uma avaliação para verificar a qualidade da operação, definida pela profundidade de trabalho, e comparou-se os custos da utilização desse implemento com o preparo convencional, aqui considerado como composto por 4 operações: três gradagens(pesada, intermediária e niveladora) euma subsolagem.

O implemento possui uma haste subsoladora que atinge até 80cm de profundidade e uma caixa de depósito com capacidade para duas toneladas e para a aplicação de corretivos em profundidade. Localizada atrás da haste subsoladoraencontra-se uma enxada rotativacom largura de trabalho de 1,2 m. A enxada rotativa é acionada por um motor hidráulico independente e permite a incorporação de restos vegetais e corretivos, além de formar o canteiro para o plantio da cana-de-açúcar. Em uma única operação o implementorealiza a subsolagem,a aplicação de corretivos em profundidade e a incorporação de matéria vegetal ao solo por meio da enxada rotativa.

Para a operação de preparo profundo foi utilizado um trator de 235 cv(172,7kW) de potência no motor. Para as demais operações do preparo convencional foi considerado o uso de um trator de 180 cv (132,3 kW) de potência no motor tracionando os implementos : grade niveladora 64 x 22”; grade intermediária 28 x 28”; grade “pesada” 16 x 34”; subsolador AST Matic 500 (5 hastes). Os valores iniciais dos tratores e implementos utilizados nos cálculos foram obtidos em concessionários no mês de novembro de 2013.

Para o dimensionamento de máquinas e o cálculo de custo operacional empregou-se o a metodologia proposta por Milan e Borges (2004a) e Milan e Borges (2004b), apresentada na Figura 2. A necessidade de máquinas e implementos é baseada no ritmo operacional das operações e na capacidade de trabalho dos conjuntos trator-implemento envolvidos. A metodologia considera como custo fixo aquele relacionado à depreciação, juros, alojamento, seguros e taxas dos equipamentos. Já o custo variável é a somatória dos custos com reparo, manutenção e consumo de combustível. A capacidade de campo operacional é a razão entre capacidade efetiva (largura x velocidade de trabalho) e a eficiência da operação, considerada em 65% no estudo.Ocusto operacionalé a razão entre o custo horário (custos fixos + variáveis) do trator-implemento e a capacidade de campo operacional. Os valores utilizados para os cálculos de custo são apresentados na Tabela 1.

Figura 2- Fluxogramageral para o desenvolvimento de um algorítmo para a seleção de um sistema

Tabela 1 – Base de dados para o cálculo dos custos operacionais.

Dados Estimados

PSPC-1101

Case MX240 Magnum

Valor Inicial (R$)

130.000,00

280.000,00

Valor Final (R$)

6.500,00

84.000,00

Taxa de juros (%)

6%

6%

Preço Diesel (R$/l)

2,30

Consumo de Combustível (l/h)

24,6

Vida Útil em Horas

10.000

16.000

Fator de Reparo e Manutenção

0,8

0,8

Custo Mão de Obra(R$/h)

15,94

Dados Estimados

PSPC-1101

Case MX240 Magnum

Valor Inicial (R$)

130.000,00

280.000,00

Valor Final (R$)

6.500,00

84.000,00

Taxa de juros (%)

6%

6%

Preço Diesel (R$/l)

2,30

Consumo de Combustível (l/h)

24,6

Vida Útil em Horas

10.000

16.000

Fator de Reparo e Manutenção

0,8

0,8

Custo Mão de Obra(R$/h)

15,94

A profundidade foi medida de forma indireta, com auxílio de um penetrômetro manual, estabelecendo-se um limite no valor de 2 MPa como indicador da profundidade de trabalho. O valor de 2 MPa é considerado em muitos estudos como limite ao crescimento radicular. Acima desse valor considerou-se que o solo não sofreu a ação do implemento. Otamanho da haste do penetrômetro(0,7m) é um fator limitante nesta análise. As avaliações foram feitas em regiões situadas no município de Lençóis Paulista (SP e contaram com o apoio da empresa agrícola Tecnocana.

Para avaliar a profundidade de trabalho foi realizado um conjuntocomposto de sete amostras distantes 30 cm uma da outra, transversais ao sentido de trabalhoe dispostas na largura total do canteiro (Figura 3). Um total de cinco conjuntos, um grupo,foi avaliado, e os conjuntos foram distanciados de 20 centímetros entre si na longitudinal. Para cada cinco pontos localizados na mesma posição longitudinal, (ponto central, 30 cm à direita, 30 cm à esquerda...) calculou-se a média da profundidade atingida, Figura 4. A 30 cm de distância das amostras finais, pontos localizados a 90 cm à direita e esquerda, situa-se a área de tráfego das máquinas e, portanto, considerou-se a resistência acima de 2,0 MPa nesses locais. Desta forma é possível visualizar a profundidade de trabalho, valores inferiores a 2,0 MPa, na área total de trabalho do conjunto (trator + implemento), de 2,4m.

Dessa maneira, os cinco conjuntos de pontos, grupo, representam trinta e cinco amostras e na área foram analisados quinze grupos, espaçados de forma aleatória dentro da área de abrangência dos talhões, totalizando 525 amostras.

Com os dados obtidos das amostragens obteve-se um mapa da profundidadede trabalho para cada posição transversal ao longo da área, sentido longitudinal(Figura 5).

Nota-se que do ponto central até 30 cm para direita e para a esquerda não há oscilação da profundidade. Dentro desta faixa central do canteiro de 60 cm de largura a resistência à penetração foi menor que 2 Mpa até 70 cm de profundidade, limite do comprimento da haste do penetrômetro. Os pontos a 60 cm de distância do ponto central mostram uma oscilação na faixa de trabalho, mas também em níveis profundos, oscilando na grande maioria entre 60cm e 70cm de profundidade.

Os pontos a 90cm de distância do ponto central representam a faixa final da formação do canteiro e mostram um aumento da resistência à penetração com uma oscilação da profundidade, variando dentro de uma faixa entre os 30 e 50 cm de profundidade do solo.

Com base na média para todas as análises de profundidade em cada ponto ao longo da largura, estabeleceu-se o perfil do canteiro formado (Figura 6).

A Figura 7 mostra o perfil obtido com o trabalho realizado peloimplemento. Da área total possível de ser preparada, 1,68 m2, (largura de 2,4m e profundidade de 0,7m), a área mobilizada correspondeu a 72% aproximadamente. Com base nos dados iniciais apresentados na Tabela 1 estabeleceu-se a comparação entre os custos operacionaisdo preparo de solo profundo canteirizado e do Convencional,em função da área a ser trabalhada.

O preparo de solo profundo canteirizado apresentou redução de custo operacional em até 40% em relação ao preparo convencional. O aumento da área mostra atuação diretanos custos fixos, que podem ser diluídos atéum limite, quando então se mostra necessária a aquisição de novos conjuntos, trator/implemento, para suprir a necessidade de trabalho da área.O principal motivo da diferença entre os custos dos dois sistemas é a diminuição do número de operações necessárias para o preparo de solo no sistema de preparo profundo canteirizado.

Para a utilização desse sistema devem ser analisadas as condições de sua aplicabilidade, porém o seu emprego propicia o aprofundamento das raízes, fator de grande relevância para aumento de produtividade, resistência à seca e longevidade de canavial, principalmente em áreas localizadas em ambientes de produção menos favoráveis. Outras vantagens que podem advir do uso desse sistema é uma melhor conservação do solo, armazenamento da água e a redução do consumo de combustível.


Este artigo foi publicado na edição 144 da revista Cultivar Máquinas. Clique aqui para ler a edição.

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