A produção de alimentos sempre foi tema de debates para apaixonados ou críticos do agronegócio brasileiro. Construtivos ou não, estes moldaram a agricultura nacional, tornando-a responsável por mais de um quarto das riquezas produzidas pelo Brasil, garantindo desempenho favorável da balança comercial durante a última década. Porém, para produzir alimentos e gerar divisas, nossa agricultura precisou evoluir em vários quesitos, tendo como demanda as severas exigências ambientais. Serão citadas 10 respostas da agricultura à sociedade, o que fez da agricultura brasileira a mais sustentável e competitiva do mundo, levando em consideração o tripé social, ambiental e econômico.
1. Aumento da eficiência do uso de fertilizantes: Os alertas ambientais detectaram casos esporádicos de contaminação de água por nitrato e uso irracional de outros fertilizantes químicos. A agricultura respondeu de forma racional. Através da pesquisa agrícola, a eficiência do uso dos fertilizantes subiu a passos largos, alterando a dose, a fonte, a época e a modalidade da adubação, reduzindo os custos de produção e gerando a tecnologia de Boas Práticas no Uso de Fertilizantes. A atual tecnologia culminou na agricultura de precisão, em fertilizantes de liberação lenta e controlada e em fertilizantes foliares de alta eficiência, fornecedores de nutrientes, aminoácidos e hormônios em fases específicas de cada cultura, garantindo o uso racional das reservas mundiais de fertilizantes. Além do mais, muitos estudos têm sido realizados para potencializar o aproveitamento de resíduos industriais na agricultura. Como exemplo, destacam-se os resíduos de frigoríficos e da indústria siderúrgica.
2. Aumento da eficiência do uso da água: As críticas ligadas à utilização da água na agricultura são antigas e tem pouco cabimento, levando em consideração o ciclo dela na natureza. Porém, a evolução na agricultura se deu mais pelos custos da irrigação sobre o custo de produção. Neste sentido, a evolução se deu nos mecanismos de irrigação (aspersores, microaspersores e gotejadores eficientes) e também na tomada de decisão, baseada na real necessidade da cultura, levando em consideração as características edafoclimáticas e o estágio de desenvolvimento da espécie vegetal. Atualmente a pesquisa busca selecionar genes que garantam maior resistência ao deficit hídrico, garantindo boas produtividades em locais sujeitos a veranicos. Deve-se destacar também os onerosos experimentos conduzidos por muitos anos que baseiam o Zoneamento Agrícola de Riscos Climáticos, que tem como objetivo finalístico recomendar épocas de cultivo em determinado local em que as restrições climáticas para as plantas são menores.
3. Redução do impacto dos defensivos agrícolas: O desenvolvimento de novas moléculas e a constante pesquisa em novas tecnologias de aplicação resultaram em grande salto evolutivo no uso dos defensivos agrícolas, garantindo menor toxicidade, baixo risco de contaminação e alta seletividade, possibilitando que seu uso racional cause mínimo ou nenhum risco ambiental. As exigências dos órgãos competentes sobre a liberação de um novo produto pressiona as indústrias a utilizarem a mais alta tecnologia para o desenvolvimento de defensivos. Contudo, a morosidade deste processo ainda limita a retirada dos defensivos tradicionais (de maior impacto) do mercado, sejam eles herbicidas, inseticidas ou fungicidas. Ainda temos de avançar muito na capacitação de técnicos e produtores quanto ao uso destas tecnologias (e também de outras, como a transgenia), evitando que estas novas moléculas deixem de ser eficientes pelo desrespeito ao uso correto das mesmas.
4. Redução do monocultivo: Esta prática tende a cair em desuso, principalmente após o domínio e difusão do Sistema Plantio Direto (SPD), que tem como uma de suas premissas a rotação de culturas. Até mesmo os produtores de cana-de-açúcar, durante o período de reforma, vem utilizando esta prática, seja com culturas comerciais (soja, feijão, amendoim, milho e, mais recentemente, o sorgo sacarino) ou com adubação verde (crotalárias). Com a rotação de culturas, propriedades tecnificadas conseguem produzir 3 safras de grãos em um único ano, ou incluir no sistema pastagens e espécies florestais, no chamado sistema de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (iLPF). Todos estes sistemas possuem linhas de créditos específicas, premiando e/ou incentivando a agricultura racional.
5. Respeito às Áreas de Preservação Permanentes (APP) e Áreas de Reserva Legal (RL): Com leis específicas e mais detalhadas pelo Novo Código Florestal, aliado à fiscalização mais ativa, e principalmente a impossibilidade de acesso à crédito agrícola, o desrespeito às leis ambientais tende a ser reduzido drasticamente, visto que as multas ao infrator foram agravadas e a comercialização destes produtos tende a ser inaceitável no comércio legal. Esta legislação, inédita no mundo, torna a agricultura brasileira ainda mais respeitada perante o mercado internacional, favorecendo a imagem de celeiro do mundo.
6. Melhorias para o trabalhador rural: As condições de transporte, do alojamento e da alimentação dos trabalhadores rurais foram melhoradas na última década, especialmente com o aumento da fiscalização dos órgãos competentes. Os empregadores tiveram de se adaptar e dar boas condições para o trabalhador rural, respeitando a jornada de trabalho, com pagamento de horas-extra, adicional noturno e cumprimento das outras leis da CLT, extinguindo as mazelas das condições de trabalho escravo no setor.
7. Redução da emissão de Gases do Efeito Estufa (GEE): A última grande demanda ambiental tange à emissão de gases do efeito estufa na agropecuária. A pesquisa já mostrou que com o aumento da eficiência do setor, aliado a práticas conservacionistas, podemos reduzir a emissão dos GEE, e mais, sequestrar e armazenar quantidades significativas de carbono no solo, por meio do aumento da matéria orgânica. Como exemplos, destacam-se as áreas sob Sistema Plantio Direto e os canaviais com colheita de cana crua, onde há grande acúmulo de palha na superfície do solo. Vindo de encontro a esta necessidade, o Governo Federal propôs o Plano de Agricultura de Baixa Emissão de Carbono, que culminou no Programa ABC (Agricultura de Baixo Carbono), aglutinando ações para melhorar o papel da agricultura no balanço de carbono do planeta.
8. Eficiência da mecanização das operações: A modernização do parque de máquinas teve efeito não só nos quesitos agronômicos, como já citado nos itens 1, 2 e 3, mas também no item 5, em decorrência do treinamento que o trabalhador rural deve receber para operar tais tecnologias, resultando na capacitação do mesmo e melhores condições de salário e conhecimento técnico.
9. Redução do êxodo rural: Ganhos em eficiência produtiva culminam em maiores rendimentos ao produtor rural, que tende a se fixar em uma propriedade produtiva em detrimento a se arriscar profissionalmente nas grandes metrópoles. As melhores condições no campo garantem uma vida digna ao agricultor e à sua família, garantindo também o crescimento econômico de regiões fora dos eixos das grandes cidades. Os produtores ainda contam com a possibilidade de se unir em associações e cooperativas, modalidades que ganham particular destaque na região centro-sul do Brasil, e que pode viabilizar a produção de alimentos nas regiões Norte e Nordeste, reduzindo a dependência de alimentos que estas regiões têm e possibilitando a descentralização da ocupação nestes estados, focados principalmente no entorno de suas capitais.
10. Redução do desmatamento: A pressão pela geração de alimentos, ocorrida principalmente pelo aumento da expectativa de vida, mas também pela elevação da renda e inclusão social de milhões de pessoas no mundo, escancarou a necessidade de novas áreas agricultáveis. A agricultura respondeu com tecnologia e aumento de produtividade, resultando em mais alimento em menos área, reduzindo drasticamente a necessidade de desmatamentos, derrubando a lenda infundada da expansão da produção de grãos sobre a Floresta Amazônica. O que atinge este bioma, na verdade, é a exploração ilegal de madeira, e não o setor agropecuário. Além do mais, grandes esforços têm sido feitos para exploração de áreas já abertas e que se encontram subutilizadas com pastagens degradadas e pouco produtivas.
A junção de todas estas respostas da agricultura, e de outras não citadas, só foi possível graças ao fortalecimento de uma aliança antiga, que se manteve adormecida por um período, mas que vem novamente ganhando força. Trata-se do tripé Pesquisa-Extensão-Produtor. A pesquisa agrícola, historicamente focada nas universidades federais e estaduais e nos centros de pesquisa agrícola, como a Embrapa no âmbito federal, e os institutos estaduais, são fonte de conhecimento e da validação das tecnologias adotadas pelo produtor, que raramente tinha acesso a estes estudos.
Isso se deu com o enfraquecimento da assistência técnica e extensão rural (ATER), fazendo com que o agricultor moderno buscasse se qualificar e se informar sobre estas novas tecnologias estudadas, ou optar pela prestação de serviço de consultores, profissionais visionários que investiram esforços na lacuna deixada pela ATER, fazendo a ponte entre a pesquisa e o produtor. Contudo, o investimento governamental no setor de transferência de tecnologia ainda é fundamental para que estas novas tecnologias cheguem aos médios e pequenos produtores, ainda carentes de informação de qualidade e que não dispõem de acesso à informação ou capital para arcar com as despesas de consultoria agrícola particular. Assim, toda a cadeia do agronegócio beneficiar-se-á das modernidades do campo.
Gustavo Spadotti Amaral Castro, Embrapa Amapá
Rodrigo Arroyo Garcia, Embrapa Agropecuária Oeste
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