A cultura do milho é a mais difundida no Brasil, integrante do grupo dos maiores produtores mundiais, sendo superado apenas pelos Estados Unidos e pela China. No entanto, a produtividade média brasileira é muito baixa em relação à dos países mais desenvolvidos, segundo as últimas projeções fornecidas pelo AGRIANUAL (1999) : 2600 kg. ha-1. Logicamente, no Brasil existem produtores que atingem patamares de produtividade equivalentes àqueles obtidos pelos americanos. Entretanto, a existência de grande número de pequenos produtores com economia de subsistência, emprego de baixa tecnologia e do mínimo de recursos, promove acentuada queda na produtividade nacional. Além disso, grande parcela da área destinada ao plantio do milho é composta de solos já depauperados por uma agricultura descompromissada com a conservação do agroecossistema.
Os preços dos fertilizantes químicos, notadamente derivados do petróleo, geram grande evasão de recursos financeiros da propriedade rural. Por isso, fontes alternativas de adubação, principalmente orgânica, têm despertado o interesse, tanto dos produtores quanto dos pesquisadores, nos últimos anos.
Adubos orgânicos
O adubo orgânico, aplicado por vários anos consecutivos, proporciona efeito residual por longo tempo, o que causa estabilidade na disponibilidade de nutrientes para as culturas, em relação à adubação mineral.
A adubação orgânica é de uso restrito em grandes culturas por gerar grandes problemas de execução, principalmente com relação à quantidade e à forma de aplicação ao solo. Entretanto, os resíduos orgânicos podem nutrir equilibradamente as plantas, proporcionando também melhor condicionamento do solo, tornando-o, a longo prazo, menos propenso aos efeitos depauperantes do cultivo intensivo.
Portanto, a utilização de composto orgânico, obtido pela combinação da palhada retirada das lavouras com o esterco de animais (bovinos, suínos e aves), poderia tornar-se prática útil para os pequenos produtores, contribuindo para a melhoria da fertilidade e conservação do solo e maior aproveitamento dos recursos existentes na propriedade.
Para os pequenos produtores o cultivo de produtos alimentícios é opção muito importante; por isso, a introdução de tecnologias alternativas que aumentam a produtividade do milho sem aumentar custos, além de promover a recuperação e conservação do solo, são de grande importância para a melhoria das condições sócio-econômicas do produtor, promovendo também a sustentabilidade da propriedade.
Segundo Bernard Geier (1998), a melhor definição de sustentabilidade foi descrito por Lady Eve Balfour: "os critérios para uma agricultura orgânica podem ser resumidos numa palavra: permanência, o que significa a adoção de técnicas que mantenham a fertilidade do solo indefinidamente, que utilize quanto possível apenas recursos renováveis, que não polua o meio ambiente e que estimule a energia vital (ou atividade biológica) no solo através dos ciclos das cadeias alimentares envolvidas no sistema".
Recomendações da pesquisa
A recomendação de qualquer tecnologia deve ser baseada em pesquisa. Para o caso da adubação orgânica, tempo é fator primordial. Assim, para recomendá-la são necessários experimentos de longa duração, que poucos pesquisadores têm oportunidade de realizar, e, além disso, poucas são as instituições interessadas no assunto.
No Programa Milho do Departamento de Fitotecnia da Universidade Federal de Viçosa, há um projeto de pesquisa, atualmente financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do estado de Minas Gerais, que se encontra instalado no campo há 15 anos e consiste na aplicação de adubações orgânica, mineral e organo-mineral contínuas em cultivos de milho exclusivo e consorciado com feijão.
A quantidade de composto orgânico (matéria seca) aplicada a 10 a 15 t /ha/ano. Para a adubação mineral utiliza-se, na maior dose, 500 kg/ha da fórmula 4-14-8 mais 60 kg de nitrogênio/ha em cobertura. Nas áreas que recebem somente composto orgânico não são realizadas adubações de cobertura com nitrogênio.
O composto orgânico é obtido pela combinação de esterco bovino e restos de palhadas, tais como, palha de feijão, palha de trigo, capim seco e palha de milho. A meda de compostagem é construída conforme metodogia tradicional, ou seja, com três revolvimentos e atingindo a maturação, em média, após 90 dias da confecção.
Nestes 14 anos de experimentação (1984 a 1998), avaliaram-se a produtividade do milho e, periodicamente, também foram avaliadas as características físicas e químicas do solo, além da incidência de pragas e seus inimigos naturais.
Resultados do programa
A produção do milho cresceu com a aplicação tanto de composto orgânico quanto da adubação mineral. A adubação orgânica forneceu quantidades de nutrientes suficientes para incrementar a produção, inclusive no primeiro ano de aplicação.
Verificou-se, também, que a utilização de composto manteve produtividades estáveis e acima dos 5000 kg/ha em vários anos agrícolas, a partir do 4º ano de aplicação anual. Vale ressaltar que esta produtividade representa quase 3 vezes à obtida pelos produtores da região onde está inserida a Universidade.
Dados recentes de produtividade, obtidos após o 12º ano, registram produtividade do milho de 6500 kg/ha com o uso isolado de composto orgânico enquanto, com o uso da maior dose de adubo químico, a produção não passou dos 4900 kg/ha. No 13º ano os resultados obtidos revelaram uma diferença maior de produção do milho adubado organicamente, que produziu 1800 kg/ha a mais em relação aquele adubado com 500 kg de 4-14-8 + 300 kg de sulfato de amônio/ha.
No ano agrícola 1997/98, ou seja, 13 anos após a aplicação contínua de composto orgânico, a produção de 7200 kg/ha de milho representa 4 vezes a produtividade média obtida pelos pequenos produtores da Zona da Mata de Minas Gerais.
A aplicação de composto orgânico no sulco de plantio promoveu melhorias na fertilidade do solo e proporcionou melhor condicionamento do solo, reduzindo danos às propriedades físicas.
Aumento de nutrientes
Com a aplicação de composto orgânico, os teores de fósforo no solo elevaram-se em até quatro vezes; os de potássio em 2,5 vezes.
Os teores de cálcio e magnésio e o pH do solo mantiveram-se em níveis apropriados à cultura. Estes resultados mostram a capacidade do composto em melhorar a fertilidade do solo ao longo dos anos, contribuindo para a sustentabilidade da produção.
Vale a pena ressaltar que estes ganhos na fertilidade do solo foram obtidos com aplicações anuais de 40 m3/ha, ou seja, 10 a 15 t/ha de composto orgânico, confirmando que aplicações de baixas dosagens de composto orgânico em intervalos mais curtos é mais racional e de alta eficiência do que altas dosagens em intervalos longos. Estes resultados tornam-se muito importantes, pois a maioria dos trabalhos realizados com adubação orgânica na cultura do milho utilizam doses elevadas, tornando o seu uso restrito no sistema de produção.
Trabalhos recentes desenvolvidos na UFV e utilizando o mesmo experimento revelam que a aplicação contínua de composto orgânico permitiu efeito residual, contribuindo para o fornecimento de nitrogênio para o milho. O uso contínuo da adubação mineral, mesmo suprindo até 780 kg de N/ha em 13 cultivos, não atingiu a biodisponibilidade residual de N atingida pelo tratamento que recebeu apenas composto orgânico. Isto indica que o efeito residual do composto é elevado e persistente.
Avaliação de pragas
Com relação às avaliações de pragas e seus inimigos naturais realizadas em dois anos (1996 e 1997), constataram-se que tanto a adubação mineral quanto a orgânica favoreceram a ocorrência da maioria das pragas do milho. Ressalta-se que nas áreas adubadas com composto orgânico houve maior população do predador
(tesourinha) que é um eficiente inimigo natural da principal praga do milho, a lagarta-do-cartucho. Os trabalhos revelaram que a população do inimigo natural foi alta em toda a fase vegetativa do milho. Isto tem proporcionado controle bastante satisfatório da lagarta-do-cartucho, mantendo-a abaixo do nível de dano econômico, evitando a aplicação de defensivos na área.
Perspectivas futuras
No cenário de agricultura sustentável as diversas áreas da ciência precisam ser redirecionadas e algumas modificações nas metodologias são necessárias para atuar no cenário da agricultura sustentável. Várias modificações, entre as quais, práticas culturais que melhor respeitem o agroecossistema e variedades com maior tolerância às condições extremas de clima; maior eficiência na absorção de nutrientes; maior resistência a doenças e pragas entre outras.
Os objetivos dos trabalhos de longa duração com adubação orgânica envolvem, além das avaliações de produtividade do milho, o desenvolvimento de cultivares de milho para a agricultura sustentável. Assim, numa das linhas de pesquisa pertencente ao Programa Milho da UFV, tem sido dada prioridade à obtenção de cultivares de polinização aberta e híbridos duplos que sejam eficientes no uso de nutrientes, principalmente o nitrogênio, tolerantes à seca, estáveis quanto à produção, resistentes às principais doenças e aos insetos e adaptáveis ao consórcio com feijão. Desta forma, diferentes materiais genéticos de milho têm sido selecionados e avaliados em diversos ensaios, inclusive com adubação orgânica, em diferentes condições ambientais. O programa de melhoramento tem sido realizado de forma contínua e progressiva obtendo ganhos constantes. Este programa de melhoramento tem-se colocado como uma alternativa ao modelo de desenvolvimento proposto pelas empresas multinacionais.
Considerações Finais
Pelos trabalhos desenvolvidos na UFV e para as condições inerentes ao pequeno produtor, que cultiva pequenas áreas, utiliza mão-de-obra familiar e possui economia de subsistência, a opção pelo milho "orgânico" é de fundamental importância, tornando-o capaz de exercer uma agricultura produtiva, sustentável e de qualidade.
João Carlos C. Galvão, Glauco V. Miranda e Isabel Cristina dos Santos
UFV
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