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Após vivenciar três safras de soja com atividades programadas pelo projeto SULCO, e a primeira safra com uso do cultivo de milho, a Embrapa Clima Temperado e instituições parceiras divulgaram os resultados no Seminário Técnico Sulco-Camalhão. Os dados demonstraram que a defasagem da produção de milho no RS e em SC pode ser resolvida com o potencial das lavouras e a tecnologia do uso do sulco-camalhão desenvolvidos em terras baixas. O evento oportunizou a apresentação do Programa Duas Safras com ênfase na diversificação de culturas, especialmente do cultivo de milho. Participaram mais de 200 técnicos e produtores, oriundos de várias regiões do RS e do Uruguai. O evento foi realizado no dia 2 de junho, nas dependências da Unidade de Pesquisas, em Pelotas.
O Projeto SULCO é centrado na tecnologia de uso do sistema sulco-camalhão que permite as práticas de irrigar e drenar o solo, ou seja, amenizar a seca e o encharcamento das lavouras, possibilitando também o estabelecimento da diversificação de culturas numa mesma propriedade, pois esta tecnologia é indicada para os sistemas de produção de arroz, soja, milho e outras culturas.
As ações foram programadas para a cultura da soja, em rotação ao arroz, mas ao longo do Projeto, decidiu-se implementar áreas com a cultura do milho, já que esta cultura sofre uma defasagem de oferta diante da crescente demanda da avicultura e suinocultura na região Sul do País. O Projeto, então, realizou uma safra de avaliação em milho, cujos resultados positivos motivaram a equipe a idealizar a renovação do Projeto para dar continuidade aos estudos.
O Projeto foi idealizado para três anos, com características de ações de transferência de tecnologias, não de pesquisa, e com término marcado para final de junho de 2022. A proposta enfrentou dificuldades em meio a situação da pandemia, mas seguiu em frente ao adaptar atividades. Segundo o pesquisador José Maria Parfitt, da Embrapa Clima Temperado, entre essas adaptações foi planejada a introdução da cultura do milho e o surgimento de ferramentas como novas funções na camalhoeira utilizada pela tecnologia sulco-camalhão e a apresentação de um aplicativo que apoia a decisão do produtor em qual momento ele deve realizar o processo de irrigação da sua lavoura.
O engenheiro agrônomo da Centeno AgroInteligência, Amilcar Centeno, disse que quando começaram o projeto era uma preocupação saber se a tecnologia sulco-camalhão era viável, ou não, economicamente. “Muitas pessoas diziam que seria muito caro. Ao longo das três safras fizemos o acompanhamento financeiro de todas as áreas e em média os custos adicionais foram em torno de 3,5 sc/ha de soja para fazer a suavização, o camalhão e a irrigação, o que equivale dizer, que ganhamos em média 30 sc/ha com uso da irrigação comparado com as lavouras de arroz de sequeiro. É uma viabilidade muito alta para um projeto, o produtor está dando sustentabilidade para os resultados ano após ano”, avaliou.
O Projeto também conseguiu alcançar resultados satisfatórios pelo empenho de empresas privadas que voluntariamente uniram esforços para colocar em prática o Projeto. “A Massey com adaptação das máquinas; a Trimble com o sistema de suavização; a Pipe BR com o sistema de irrigação; a KLR com o sistema de sulcação e recentemente a Pioneer. Tudo coordenado pela Centeno AgroInteligência e o grupo de pesquisadores da Embrapa”, lembrou o técnico da AGCO/Massey Ferguson, Werner Santos. Ele comenta ainda que um dos fatores mais importante do envolvimento dessas empresas é a busca pela sustentabilidade agrícola para a Região Sul. O crescimento da produtividade, da produção, da renda agrícola foi muito grande”, disse. Werner fala que o projeto inicialmente voltado para produção de soja, e testado posteriormente com o milho, faz hoje a equipe acreditar e querer produzir este grão de forma sustentável e suficiente. “O que estamos vendo hoje é uma nova fronteira agrícola dentro do próprio RS, isso vai mudar muito o perfil da agricultura, essa agricultura que era arroz e pecuária, agora teremos, arroz, soja, pecuária, milho”, completa.
Entre as inovações do Projeto estão o surgimento de ferramentas tecnológicas e a introdução de uma cultura de grãos, o milho. Estes dois braços dão ao Projeto uma visibilidade de interesse econômico e sustentável para a agricultura gaúcha, oportunizando a abertura de nichos de mercado.
Para Amilcar Centeno, esta foi a primeira safra com uso do milho para os produtores envolvidos no Projeto. “Eles falam que se não tivessem irrigação na propriedade não plantariam milho, por que é muito arriscado, é uma loteria pensar no impacto que o clima pode ter na cultura do milho. Foram investidos custos considerados baixos, mas ainda não se tem comparativos. A intenção é seguir mais algumas safras com a cultura do milho”, disse. O pesquisador da Embrapa Clima Temperado, José Maria Parfitt, fala que há muito interesse dos produtores de milho para que o Projeto tenha continuidade.
Segundo os estudos do Projeto, as terras baixas tem um potencial de resolver o problema do milho no RS. Anualmente é importado cerca de três milhões de toneladas de milho vindos do Estado do Paraná e da região Centro-Oeste para produção de frangos e suínos gaúchos. “O RS pode se tornar um grande exportador de milho. Se plantarmos um milhão de hectares de milho, dentro dos quatro milhões de área de plantio para terras baixas, o problema de falta de oferta do produto está resolvido”, pontua Centeno.
A experiência do produtor de arroz Daniel Hoerb, de Cachoeira do Sul/RS, foi apostar na cultura da soja, após a crise orizícola de 2012. “Fracassamos durante oito anos na irrigação da soja e a partir da safra 2019/2020 é que conhecemos a tecnologia sulco-camalhão e novas ferramentas, que fizeram melhorarmos nosso processo de irrigação na propriedade”, conta. Ele diz que após dominarem os processos de irrigação e drenagem apresentados pela tecnologia sulco-camalhão, a propriedade decidiu cultivar o milho em várzea. “Os resultados que este trabalho demonstra indica que ‘estamos com a faca e o queijo na mão’, isto é, temos tecnologia para superar a seca. Além disso, saímos da ideia de somente produzir arroz, sendo possível diversas culturas. Isto faz que a gente saia de um ciclo vicioso para um ciclo virtuoso”, disse.
Os resultados de produção de milho na propriedade do Daniel foi de 126 sc/ha contra a expectativa de 170 sc/ha. Mas, isso não desanimou o produtor, que identificou os pontos que precisa dar mais atenção na lavoura, como por exemplo, antecipar a época de semeadura para que a planta chegue mais desenvolvida para enfrentar a fase de ondas mais fortes de calor nos meses de janeiro e fevereiro; a suavização do solo, que com o passar do tempo, sofre um rebaixamento natural, perdendo seu potencial produtivo por acúmulo de água, onde precisa ser realizada drenagem do solo, entre outros pontos, que é necessário o cuidado nos detalhes do processo produtivo.
O produtor Gilberto Zambonatto Raguzzoni, de Dom Pedrito/RS, também se referiu que uma das dificuldades para quem trabalha com lavouras de soja sobre a resteva de arroz era ‘falta de chuva ou chuva demais’. “A tecnologia sulco-camalhão faz isso, ela tanto irriga na falta de chuva, quanto drena a chuva em excesso”, diz. Ele conta que desde 2016, vem trabalhando na propriedade com esta tecnologia, dentro de um área experimental de cerca de nove hectares, tendo resultados naquela época, de 70 sc/ha soja. “Temos certeza que daqui a 10 anos toda a Metade Sul do RS estará usando a tecnologia sulco-camalhão na várzea, plantando soja, arroz, milho, outras culturas. Isto é muito bom para o produtor, porque quando ele vê que não tem muitas perspectivas de resultado com uma lavoura, ele planta mais área para outro cultivo, ora mais soja, ora diminui o milho; e assim, vai construindo seu mapa de produção na propriedade de acordo com as demandas de mercado. É a vantagem de flexibilidade para o produtor rural ”, relata.
Os relatos do processo de produção de milho em sulco-camalhão na propriedade de Raguzzoni também foi abaixo das expectativas projetadas pela equipe do Projeto, no caso, conquistaram 111 sc/ha, mas também sabem onde precisam superar seus pontos fracos de manejo de produção. “Nesta safra de milho, empatamos os números de custos e benefícios, o que é muito bom”, confessou. Segundo ele, diante da rentabilidade que pode ser conquistada com o uso da tecnologia e os ajustes de manejo necessários para cada cultura, por exemplo, se é possível chegar a produção de 180 sc/ha ao preço de 80 kg/ha, isso daria entre 14 e 15 mil reais por hectare, sendo que o investimento é de 10 mil reais, isso daria, retornos fantásticos”, comparou.
Através do projeto SULCO surgiram adaptações para o equipamento de camalhoeira, via demanda dos produtores usuários da tecnologia. O equipamento está numa quarta geração. Da primeira versão para a atual, o que foi modificado foi o espaçamento, que era uma das dificuldades do sistema. A primeira versão estava condicionada ao plantio de 55/35 cm, e a versão atual conta com condição de plantio da semente de 45/45 cm. O diferencial do equipamento está na sua velocidade de trabalho, sendo possível alcançar entre 10 a 15 km/h.
Segundo o industriário da KLR Implementos Agrícolas, Nick Keller, o equipamento é a base de discos, tendo uma durabilidade enorme no campo. “Quando há desgastes a substituição desses discos tem um custo muito baixo, o que motiva o produtor que acaba tendo um ganho fantástico. A aquisição do equipamento está relacionada a 12 ha de produção, o que significa um baixo investimento, já que ao utilizar a camalhoeira, os ganhos de produtividade e produção ultrapassam o custeio para 12 ha e o produtor tem a oportunidade de ter acesso e uso da tecnologia sulco-camalhão”, destacou..
A estudante pós-doc no Programa de Pós-Gradução em Recursos Hídricos da UFPel, Marília Alves Pinto Brito, desenvolveu junto à colega Letícia Burkett, uma ferramenta que indicasse ao produtor rural qual seria o melhor momento para irrigar a sua lavoura.
A ideia surgiu pela observação das doutorandas que o produtor simplesmente irrigava a lavoura, utilizando a sua intuição. Havia a demanda de indicação do momento deste processo na lavoura. “Nós colocamos no aplicativo um planejamento de irrigação, o qual agenda o usuário, por exemplo, para irrigar daqui cinco dias, determinada cultura. Parece simples, mas é muito importante esse planejamento, pois são várias ações que acontecem ao mesmo tempo durante a safra e o produtor tende a se perder nos detalhes”, explicou. Ela comentou que receberam retorno de alguns produtores que utilizaram o aplicativo, os quais relataram que ajudou muito a irrigação nas suas áreas de plantio. “Os resultados do uso do conjunto tecnológico apresentado pelo sulco-camalhão comprovam que as lavouras que irrigam possuem maior desempenho produtivo”, defendeu. Nossa preocupação é fazer com que o produtor também não desperdice o recurso água, colocando-a fora, ou seja, irrigando sem necessidade. E também, não perca a sua lavoura por não irrigar. Além disso, dar a ele a opção de apostar em culturas de sequeiro, não tradicionais em terras baixas”, comentou. O aplicativo pode ser utilizado para culturas agrícolas variadas, não é voltado somente para culturas de grãos.
Conforme Marília, o primeiro ano do Projeto foi elaborada uma planilha em Excel, construída com três produtores; o segundo ano, a mesma planilha em Excel melhorada, contendo um painel de dados, com acesso a mais informações para os produtores; e no terceiro ano, essa planilha, se transformou num aplicativo web chamado Irrigação Terras Baixas. “Hoje este aplicativo está sendo utilizado por todos os produtores envolvidos no Projeto SULCO. Nossa ideia é lançá-lo oficialmente, por meio de uma startup, com algumas melhorias, para a próxima safra 2022/2023", completou.
O Seminário contou com o fechamento da agenda ao apresentar ao público participante a ideia do Programa Duas Safras, oferecer ao produtor rural a opção de desenvolver duas safras ao ano. O projeto é uma ação conjunta entre a Federação de Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) e a Embrapa, através de quatro Unidades de Pesquisa da região Sul do País.
O presidente da Farsul, Gedeão Pereira, explicou que o Programa é uma solução para os produtores, através do uso da diversificação de culturas, como uma alternativa especialmente para os arrozeiros. “Há um potencial incrível na região de terras baixas para o desenvolvimento de diversas culturas, dispomos de mananciais hídricos providenciados pelo cultivo do arroz em todo o Estado gaúcho, e tendo uma necessidade de oferta de milho para a produção de aves e suínos, a tecnologia sulco-camalhão surge para apresentar soluções para diversas culturas de grãos, pressupondo o uso do milho, e quem sabe também, poderá incluir o trigo, proporcionando uma revolução agrícola na Metade Sul”, enfatizou.
O economista da Farsul Antônio da Luz explicou para os participantes que o Programa Duas Safras mostra a janela de oportunidades que poderá ser vivida pelo Estado. Conforme ele, as áreas de arroz estão aumentando cada vez mais a sua produtividade e diminuindo o consumo, assim é necessário maior avanço da soja, embora já se utilizava áreas de arroz para plantio, e também introduzir especialmente o milho nestas áreas. “Ao se diminuir as áreas de produção do arroz, e colocarmos a produção de milho, o produtor tende a ter um preço melhor para o arroz pelo fato de ter uma produção menor. E o produtor tem ainda a renda do milho com resultados financeiros muito melhor”, explicou. Ele comentou que atualmente o milho é comercializado por um valor de mais de 25% em relação ao preço do arroz. Os custos de produção da lavoura de milho é 30% menor que a lavoura de arroz. “O momento de olharmos alternativas de produção é agora, pois quais são as perspectivas para safra 2023?”, questionou.
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