STF: função social é requisito para impedir desapropriação de terras produtivas

Em decisão unânime, ministros validaram normas que regulamentam dispositivos constitucionais relativos à desapropriação para reforma agrária

05.09.2023 | 18:00 (UTC -3)
Texto do STF, com edição Cultivar
Foto: Nelson Jr./SCO/STF
Foto: Nelson Jr./SCO/STF

O cumprimento da função social é requisito para que um imóvel produtivo não possa ser desapropriado para fins de reforma agrária. Esse entendimento foi fixado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), por unanimidade, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3865.

Segundo o artigo 186 da Constituição Federal, a função social é cumprida quando a propriedade rural atende simultaneamente a alguns requisitos, como a utilização adequada dos recursos naturais disponíveis, a preservação do meio ambiente e a observância da legislação trabalhista.

Produtividade e função social

A ação foi ajuizada pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) contra trechos da Lei 8.629/1993, que regulamenta dispositivos constitucionais relativos à reforma agrária.

Segundo a entidade, ao admitir a desapropriação de imóveis produtivos que não cumpram a função social, a norma dá a eles tratamento idêntico ao dispensado à propriedade improdutivas. Para a CNA, a exigência simultânea dos requisitos da produtividade e da função social é inconstitucional.

Uso adequado

No voto pela improcedência do pedido, o relator, ministro Edson Fachin, explicou que é o uso socialmente adequado que legitima a propriedade.

Fachin observou que o artigo 184 da Constituição Federal autoriza a desapropriação por interesse social do imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social. Por sua vez, o artigo 185 veda a desapropriação de propriedades produtivas e remete à lei a fixação de normas para o cumprimento dos requisitos relativos à função social.

Ou seja, a própria Constituição exige o cumprimento da função social como condição para que a propriedade produtiva não possa ser desapropriada e delega à legislação infraconstitucional a definição do sentido e do alcance do conceito de produtividade, para que esse critério seja considerado.

Assim, para o relator, está de acordo com a Constituição a opção do Legislativo por uma interpretação que harmonize "as garantias constitucionais da propriedade produtiva com a funcionalização social exigida de todas as propriedades".

Os dispositivos constitucionais citados têm as seguintes redações:

Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei.

§ 1º As benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro.

§ 2º O decreto que declarar o imóvel como de interesse social, para fins de reforma agrária, autoriza a União a propor a ação de desapropriação.

§ 3º Cabe à lei complementar estabelecer procedimento contraditório especial, de rito sumário, para o processo judicial de desapropriação.

§ 4º O orçamento fixará anualmente o volume total de títulos da dívida agrária, assim como o montante de recursos para atender ao programa de reforma agrária no exercício.

§ 5º São isentas de impostos federais, estaduais e municipais as operações de transferência de imóveis desapropriados para fins de reforma agrária.

Art. 185. São insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária:

I - a pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde que seu proprietário não possua outra;

II - a propriedade produtiva.

Parágrafo único. A lei garantirá tratamento especial à propriedade produtiva e fixará normas para o cumprimento dos requisitos relativos a sua função social.

Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:

I - aproveitamento racional e adequado;

II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.

Na petição inicial, a CNA pedia a declaração de inconstitucionalidade das expressões "explorada econômica e racionalmente", "simultaneamente" e "utilização da terra e" do artigo 6º da Lei 8.629/1993. Essa declaração atingiria dispositivos do artigo primeiro do mesmo artigo. 

Os dispositivos impugnados têm a seguinte redação:

Art. 6º Considera-se propriedade produtiva aquela que, explorada econômica e racionalmente, atinge, simultaneamente, graus de utilização da terra e de eficiência na exploração, segundo índices fixados pelo órgão federal competente.

Art. 9º [...] § 1º Considera-se racional e adequado o aproveitamento que atinja os graus de utilização da terra e de eficiência na exploração especificados nos §§ 1º a 7º do art. 6º desta lei.

Decisão dos ministros: o "Tribunal, por unanimidade, julgou improcedente a ação direta de inconstitucionalidade, nos termos do voto do Relator".

Ainda não se tem acesso ao acórdão para avaliar as razões dos ministros.

Algumas informações extras podem ser obtidas em "Função social da propriedade rural e ADI 3865".

A petição inicial da ADI pode ser lida no link abaixo:

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