El Niño faz lembrar das boas práticas agrícolas

10.08.2015 | 20:59 (UTC -3)
Sílvia Zoche Borges

"Poucos períodos de outono-inverno foram tão favoráveis ao milho safrinha quanto este de 2015, na região sul de Mato Grosso do Sul e do Brasil", diz Claudio Lazzarotto, pesquisador e agrometeorologista da Embrapa Agropecuária Oeste (Dourados, MS). Em MS, o milho safrinha ocupa uma área de 1,65 milhão hectares, a mesma do ano passado, e até o fim do mês passado, já havia sido colhido 35,9%, o que significa um atraso de 10% em relação a 2014, como constata Leonardo Portalete, engenheiro agrônomo da Aprosoja/MS. “Exceto o norte do Estado, onde as chuvas não atrapalharam”, diz Portalete.

No período de cultivo do milho, a quantidade e frequência de chuvas registradas no sul de Mato Grosso do Sul, as noites de temperatura amena e os dias quentes favoreceram o desenvolvimento das lavouras e "promoveram produtividades acima da média dos demais anos. Mesmo nos casos de plantio mais tardio (para MS, o zoneamento agrícola é até 10 de março e, segundo a Aprosoja/MS, cerca de 30% foi plantado após esse período devido ao atraso no plantio da soja em 2014), as produtividades estão acima dos padrões médios de rendimento. As chuvas ocorridas na época de colheita não prejudicaram a qualidade dos grãos", relata Lazzarotto, pesquisador da Embrapa.

O motivo das chuvas no outono-inverno no Sul de Mato Grosso do Sul, período tipicamente de estiagem e geadas, foi a volta da ocorrência do El Niño, depois de cinco anos sem registros do fenômeno. O El Niño, que começou a se estabelecer em abril deste ano, altera, entre outros componentes climáticos, o regime de chuvas em várias áreas do planeta.

Já no Norte e Nordeste do Brasil, o fenômeno provocou acentuada redução das chuvas de abril a junho de 2015, segundo Mozar de Araújo Salvador, meteorologista da Coordenação Geral de Desenvolvimento e Pesquisa (CDP) do Inmet, em Brasília/DF. "No Norte e Nordeste há uma tendência de chuvas abaixo da média. Na Região Sul, o principal efeito é o aumento no volume de chuvas com maior frequência de tempestades".

Segundo Salvador, do CPD/Inmet, "em virtude da grade extensão das regiões brasileiras, as médias variam muito de uma localidade para outra, não sendo climatologicamente correto fazer uma média única para toda uma região. No Centro-Oeste, por exemplo, a média do período de abril a agosto varia entre 150 mm e 450 mm. No Nordeste, o contraste espacial é ainda maior: entre 180 e 1400 mm", declara.

Por esse motivo, os produtores rurais que mantiveram os terraços de proteção do solo, conseguiram evitar que o excesso de chuva, como aconteceu nesse período em Mato Grosso do Sul, prejudicasse as lavouras por erosão hídrica, "como aconteceu em alguns casos no Estado", conta Lazzarotto.

Os terraços são estruturas construídas para subdividir ou secionar terrenos muito inclinados em partes menores e administrar o excesso de água das chuvas. O objetivo é que a água infiltre no solo ou seja removida de forma segura e ordenada para fora da lavoura. Com isso, diminui-se o processo erosivo e promove-se a proteção de mananciais.

Mas é necessário ressaltar que o terraceamento sozinho não controla totalmente a erosão. A função do terraço é de administrar a enxurrada, como dizem os pesquisadores José Eloir Denardin e Rainoldo Alberto Kochhann, da Embrapa Trigo (Passo Fundo, RS), e Luis Carlos Hernani e Júlio César Saíton, da Embrapa Agropecuária Oeste, em publicação "500 perguntas, 500 respostas sobre Sistema Plantio Direto".

Já a associação do terraceamento a outra prática conservacionista, como o consórcio de milho com braquiária, faz o controle da erosão ser mais efetivo. Entre os benefícios do consórcio estão a melhoria da cobertura do solo - e por mais tempo - retenção de umidade por diminuir a evapotranspiração do solo, aumento da fertilidade do solo, do crescimento de raízes e da flora microbiana. Isso confere estabilidade ao Plantio Direto e produtividade das culturas em sucessão (caso da soja na safra de verão), como explica o engenheiro agrônomo Gessí Ceccon, analista do grupo da pesquisa da Embrapa Agropecuária Oeste.

No sul de Mato Grosso do Sul, especificamente, o pesquisador Carlos Ricardo Fietz, agrometeorologista da Embrapa Agropecuária Oeste, relata que, com base nos registros de algumas estações meteorológicas da Embrapa, em Dourados e Rio Brilhante, e do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), as chuvas foram abundantes em quase toda a região em julho: Itaquiraí (329mm), Ponta Porã (234mm), Juti (210mm), Bela Vista (109mm), Sidrolandia (102mm), Amambai (98mm), Rio Brilhante (91mm), Jardim (92mm), Campo Grande (86mm) e Maracaju (63mm). " No município de Dourados, por exemplo, choveu 108mm, mais que o dobro da média histórica do mês de julho, que é de 50mm. As chuvas foram bem distribuídas, com nove dias chuvosos, sendo a maior chuva 17mm, em 14 de julho", menciona Fietz.

Mas, desde 25 de julho, não tem chovido na região da Grande Dourados, de acordo com dados da estação agrometeorológica da Embrapa Agropecuária Oeste, o que é positivo neste momento. Por esse motivo, os produtores rurais estão aproveitando para dar um gás na colheita dos grãos de milho. Segundo dados do Sistema de Informação Geográfica do Agronegócio (Siga) em cerca de sete dias, a colheita passou de 25% para 35% em Mato Grosso do Sul. Comparando-se ao ano passado, há um atraso de 9, o que a Associação dos Produtores de Soja de Mato Grosso do Sul (Aprosoja/MS) considera relativamente baixo.

Outro segmento do agronegócio beneficiado pela estiagem que deverá predomonar em agosto é o sucroenergético que, com condições plenas de colheita poderá recuperar a produção de etanol e açúcar que foi interrompida durante julho pelo excesso de chuvas que impediu a colheita.

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